Por Luciano Martins Costa em 10/11/2011 na edição 667.
Comentário para o programa radiofônico do OI, 10/11/2011.
Comentário para o programa radiofônico do OI, 10/11/2011.
Os jornais noticiam nesta quinta-feira, 10/11, que a Comissão de
Constituição e Justiça do Senado Federal aprovou novas regras para a lei
seca determinando que pode ser considerado crime dirigir sob o efeito
de qualquer nível de concentração de álcool.
Ainda antes de chegar à opinião pública o entendimento do que
representa tal mudança, a iniciativa dos parlamentares provoca grande
polêmica, que já vem anexada ao mesmo noticiário.
Isso porque certos temas são expostos ao longo do dia anterior nos
sites dos jornais, onde são colhidos comentários de leitores que
posteriormente serão reproduzidos nas edições de papel.
Assim, além do próprio conteúdo da notícia, o leitor do jornal
tradicional tem à disposição uma seleção de opiniões de leitores que se
informaram na edição online, o que dá outra dinâmica ao próprio
noticiário.
Ao coletar e reproduzir comentários depositados em seu site, os jornais
têm a possibilidade de melhorar a versão impressa de conteúdos que vão
amadurecendo ao longo do dia, porque entre esses comentaristas podem
eventualmente constar leitores especializados em determinados temas.
No caso da decisão da comissão do Senado, chama atenção uma nota, colhida na edição online do Estadão. Diz o leitor: “E as propagandas de álcool na TV são liberadas e incentivam os jovens a beber”.
A frase, curta e direta, amplia sensivelmente o alcance das análises sobre certas medidas legislativas.
Enquanto os juristas debatem contradições evidentes das novas regras, o
leitor desvia a conversa para uma questão que envolve também a mídia –
afinal, se beber qualquer quantidade de álcool passa a ser crime se o
cidadão assumir o volante de um carro, a publicidade de bebida deveria
obrigatoriamente ser tratada com critérios mais rigorosos.
Há muitas outras opiniões na imprensa sobre a decisão da Comissão de
Constituição e Justiça do Senado, como a de uma senadora que alerta para
a possibilidade de alguém ser enquadrado por dirigir após comer um
bombom de licor.
Pode-se dizer também que alguns xaropes ou até mesmo certos
medicamentos homeopáticos e sprays de própolis podem conter alguma
quantidade de álcool.
De qualquer modo, a controvérsia está instalada e vem a propósito para
esclarecer como é difícil legislar sobre certos problemas sociais que
envolvem grandes interesses econômicos e grande repercussão na
sociedade.
Ninguém discute a necessidade de colocar sob controle cidadãos que
dirigem sob o efeito de álcool ou drogas, mas o problema extrapola a
decisão individual.
Legislando para a platéia
Para alguns dos comentaristas ouvidos pelos jornais, ao tentar conter o
resultado de decisões judiciais que vêm reduzindo o efeito da lei seca,
os senadores acabam criando um “frankenstein” legislativo.
Como exemplo, citam o fato de que, se a nova norma for aprovada, um
motorista embriagado que causar a morte de alguém não será processado
por homicídio, mas apenas por dirigir alcoolizado, sendo considerado
agravante o fato de ter causado a morte de alguém.
O ponto central da polêmica é a proposta de acabar com a tolerância
mínima de dosagem alcoólica para considerar um motorista como criminoso.
A motivação da mudança no conceito é um conjunto de decisões judiciais
que, na prática, poderiam anular a lei seca. O Supremo Tribunal Federal
reafirmou, em setembro passado, que beber e dirigir é crime, mas o
Superior Tribunal de Justiça havia determinado que o bafômetro não é
impositivo, porque nenhum cidadão pode ser obrigado a produzir prova
contra si mesmo.
A proposta dos senadores é que qualquer pessoa que tomar qualquer
quantidade de álcool seja considerada criminosa se assumir o volante de
um veículo a motor em seguida.
A partir dessa qualificação inicial, as penas vão se agravando se
houver incidentes no trajeto: se de um acidente resultar lesão corporal
leve, como um arranhão, o motorista que tiver ingerido qualquer
quantidade de bebida alcoólica, como uma colher de licor, poderá ser
condenado à prisão por um período de um a quatro anos; se causar lesão
grave, como uma fratura, poderá cumprir de três a oito anos de cadeia;
se a lesão for gravíssima, a pena varia de seis a doze anos; em caso de
morte, a condenação pode chegar a dezesseis anos de cadeia.
Conclusão: o motorista que pegar o carro após tomar uma xícara de café
com conhaque e se envolver num acidente, mesmo que não tenha provocado o
acidente, poderá ser condenado a uma pena duas vezes maior do que a
daquele cidadão que matou a ex-namorada a tiros, sem chance de defesa.
Esse é o tipo de aberração que se produz quando um fato social grave –
como os acidentes provocados por motoristas bêbados – ganham grande
repercussão e os legisladores deixam o bom senso de lado para atender a
pressão da opinião pública.
Materia copiada: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/uma_proposta_controversa
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