Elaine Patricia Cruz - Repórter da Agência Brasil.
São Paulo – O presidente da Comissão da Anistia e secretário
nacional de Justiça, Paulo Abrão, disse hoje (20), em São Paulo, que a
deficiência estrutural do sistema de Justiça brasileiro dificulta os
trabalhos de busca e de identificação das ossadas que foram encontradas
em 1990 na vala clandestina do Cemitério de Perus, em São Paulo.
Entre
os restos mortais, acredita-se que muitos são de desaparecidos políticos
da ditadura militar. “Esse caso, da vala clandestina de Perus, aponta na cara do Estado
uma deficiência estrutural e organizacional do nosso sistema de Justiça.
O fato de não podermos constituir uma expertise e uma carreira de
Estado de antropólogos e arqueólogos forenses demonstra um vácuo, uma
lacuna no Estado de Direito brasileiro”, disse Abrão, ao participar na
tarde de hoje (20) de uma audiência pública na Assembleia Legislativa de
São Paulo, promovida pela Comissão Estadual da Verdade de São Paulo
para discutir a questão das ossadas do Cemitério de Perus.
Segundo Abrão, a dificuldade de cada estado brasileiro em criar a
carreira de antropólogos e arqueólogos forenses, “têm impedido novos
avanços” em casos envolvendo os mortos e desaparecidos políticos. “Não
existe no Brasil um órgão específico, com uma carreira profissional e
estatal, de antropólogos e arqueólogos forenses. É o momento de
pensarmos sobre isso. Isso compete aos estados, que constitucionalmente
são responsáveis pela matéria de segurança pública, e poderia também
existir uma unidade administrativa federal”, disse ele.
A vala clandestina de Perus foi aberta em setembro de 1990 durante o
governo da então prefeita de São Paulo Luiza Erundina. No local foram
encontradas 1.049 ossadas sem identificação. Na época, a prefeitura
determinou a apuração dos fatos e fez um convênio com a Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp) para a identificação das ossadas, mas o
trabalho foi interrompido e as ossadas foram levadas, em 2001, para o
Cemitério do Araçá, onde estão guardadas até hoje, sob responsabilidade
da Universidade de São Paulo (USP).
Além de Paulo Abrão, também participaram da audiência pública os
deputados estaduais Adriano Diogo (presidente da Comissão Estadual da
Verdade) e Carlos Giannazi, o membro da Comissão da Verdade e da
Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos Ivan Seixas, a integrante
da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos Suzana
Lisboa (que foi casada com Eurico Tejera Lisboa, o primeiro desaparecido
político do Brasil e que foi o primeiro corpo de desaparecido político a
ser localizado no país), a procuradora da República Eugênia Gonzaga, a
ex-vereadora Tereza Lajolo (que foi relatora de uma Comissão Parlamentar
de Inquérito Municipal sobre Perus), o ex-superintendente do Serviço
Funerário Municipal Rui Alencar e o secretário municipal de Direitos
Humanos e Cidadania Rogério Sottili.
Durante a audiência pública, a procuradora da República Eugênia
Gonzaga citou outro problema que afeta a identificação das ossadas de
Perus. Para ela, falta vontade política e verba governamental para
desenvolver o trabalho. Citando os versos da música Pesadelo,
de Maurício Tapajós e Paulo César Pinheiro e gravada pelo grupo MPB4,
que diz “Você corta um verso, eu escrevo outro/ Você me prende vivo, eu
escapo morto/De repente olha eu de novo/ Perturbando a paz, exigindo
troco”, a procuradora disse que o governo não tem dado "nem troco" sobre
a questão envolvendo os mortos e desaparecidos.
“Um pouco eu acho que é esse medo das autoridades, que não querem
dar esse troco e, na verdade, não estão dando nem troco, nem trocado”,
disse ela. Eugênia acrescentou que há falhas também na destinação do
dinheiro. “Tem milhões [do governo] para se digitalizar documentos [da
ditadura], documentos que não estão nem sendo lidos, mas não há dinheiro
para fazer a identificação dos mortos aqui [no cemitério de Perus]”,
reclamou ela.
A falta de recursos também foi citada por Ivan Seixas como um grande
problema para a identificação das ossadas. “O governo federal tem a
obrigação de oferecer recursos para fazer a identificação, seja
antropométrica seja por DNA. E isso não está sendo feito”, disse. “É
preciso ter uma equipe que entenda disso, com tecnologia, e ter recursos
para pagar um laboratório que faça o teste de DNA, que hoje não é uma
coisa muito cara como já foi no passado. Tem que colocar recursos para
fazer a catalogação [das ossadas] e depois fazer a identificação, seja
por DNA ou por outro meio qualquer”.
Paulo Abrão, no entanto, disse que é preciso reconhecer que o
governo tem investido na busca e identificação das ossadas de
desaparecidos políticos, citando o trabalho que vem sendo desenvolvido
no Araguaia. “Têm sido investido nos últimos quatro anos em torno desse
trabalho”.
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Matéria Lincada de: http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2013-05-20/falta-de-antropologos-e-arqueologos-forenses-dificulta-identificacao-de-ossadas-do-cemiterio-de-perus
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