Escrito por Laerte Braga |
Qui, 09 de Fevereiro de 2012 |
É fato que policiais militares ganham pouco. É uma realidade que
professores ganham muito pouco e são espancados por policiais militares
quando entram em greve e buscam condições dignas de trabalho.
Ou moradores do bairro Pinheirinho, em São José dos Campos. A
“reintegração de posse” – uma posse malandra, fraudulenta – foi feita da
forma mais violenta que se possa imaginar, sem qualquer respeito
àqueles moradores. Há suspeitas de abuso sexual, de roubo de pertences
das pessoas que foram expulsas de suas casas, há evidências claras de
barbárie por parte da PM de São Paulo. Vai ficar por isso mesmo e
ninguém tem dúvidas de que isso aconteceu, levando em conta os
antecedentes da “corporação”.
Polícia é uma instituição civil. Polícia Militar com a estrutura que temos é uma anomalia no Estado de direito.
Policiais militares são trabalhadores?
É claro que são. Só não têm consciência de classe trabalhadora, “ou lugar de classe”, como bem disse a socióloga Vanessa Dias.
Servem às elites econômicas e políticas em seus respectivos estados.
Quando terminar a “greve” – motim – na Bahia, sem qualquer vacilo vão
espancar camelôs, professores, desocupar áreas para o latifúndio, muitos
voltarão às atividades segundas (segurança de traficantes, de
contraventores, etc.).
O aumento dos índices de homicídios na capital da Bahia e numa ou
outra cidade do interior, 132% segundo dados da Secretaria de Segurança
Pública, não significa como querem fazer crer os policiais militares que
sua presença é indispensável nas ruas. A presença da Polícia, sim, mas
da instituição civil, com o objetivo de prevenir e combater o crime,
manter a ordem pública.
Parte dos “grevistas” ocupa a Assembléia Legislativa, parte está nas
ruas portando armas que pertencem ao poder público. Semeando terror para
forçar negociações com o governo do estado.
Dois únicos governadores enfrentaram o poder paralelo das polícias
militares em seus estados. Leonel Brizola, no Rio de Janeiro, e Olívio
Dutra, no Rio Grande do Sul. Proibiram prisões ao arrepio da lei.
Invasões de casas sem mandados judiciais. Revistas humilhantes a homens e
mulheres e repressão a manifestações populares.
Os dois foram vítimas de toda a sorte de imputações caluniosas sobre
suposta “ligação com o crime organizado através de acordo”. Com o tempo
essas acusações se mostraram falsas, foram orquestradas nos porões da
bandidagem oficial e encontraram guarida na mídia de mercado, parte
desse sistema corrupto. Sócia desse modelo.
Quando os telejornais se “indignam” com a situação na Bahia não estão
preocupados com o cidadão comum, o trabalhador, o que mora em Salvador,
nada disso. No caso o jogo é desgastar um governador (não estou
entrando no mérito, não sou do partido dele) para beneficiar em eleições
municipais os caciques que durante anos sufocaram aquele estado e agora
tentam voltar à prefeitura da capital através da sigla do terror e da
corrupção: ACM Neto.
Para além desse objetivo existem outros que se alastram por todo o
país. Existe a possibilidade que mais seis ou sete dessas “corporações”
entrem em “greve” em outros estados brasileiros.
É motim puro e simples. Uma demonstração de força da pistolagem
oficial na tentativa de levar pânico ao cidadão, mostrar as garras aos
seus próprios chefes e tentar reagir à imagem cada vez mais negativa
dessas forças anômalas ao chamado Estado democrático (como se o
tivéssemos em sua essência).
O caso Pinheirinho ganhou repercussão internacional e deve ser levado
a instâncias de direitos humanos em vários lugares do mundo. Isso
desagrada a grupos de extrema-direita como o governo do estado de São
Paulo (controlado pela seita terrorista OPUS DEI).
Não há um só dia que os jornais – da mídia de mercado, logo deles –
não noticie violências cometidas por policiais militares, ou prisões
desses “trabalhadores” por ilícitos – como gostam de dizer – tais como
tráfico de drogas, assassinatos a mando de criminosos, assaltos etc.
Em Belo Horizonte, há menos de três dias, um PM matou um motoqueiro
dominado e sem qualquer reação da vítima, ou possibilidade disso, pura
covardia. Foi preso, e daí?
A hipótese de fim da “greve” na Bahia e anistia – como reivindicam –
para os “grevistas” soa como absurda. Professores, por exemplo, quando
entram em greve buscando condições dignas de trabalho são rechaçados
violentamente pelos governos de seus estados e através das respectivas
polícias militares. Pagam os dias parados ao final da greve.
E com uma diferença fundamental. Não saem às ruas portando armas do
poder público e intimidando e ameaçando pessoas, quiçá matando para
reforçar os “índices” de homicídio e justificar as pressões sobre o
governador, em última instância, a própria população.
É hora de repensar a instituição Polícia. Esse assunto foi discutido
no Congresso Nacional Constituinte de 1986 (gerou a Constituição de
1988) e um forte lobby de polícias militares estaduais evitou o fim
dessa aberração em termos de Estado de direito.
Sem levar em conta que o próprio modelo/sistema está falido, enfrenta
perspectivas de crise e de tocaia. A extrema-direita já percebeu que
Dilma Rousseff é menor que o cargo que ocupa, a despeito da “boa
vontade”. Como disse o ex-presidente FHC, “Dilma desmistificou a
privatização”. Deu a colher de chá que faltava para justificar a
privataria tucana, criando a privataria petista.
Por trás de cada movimento semelhante aos dos policiais militares
baianos existem objetivos inconfessáveis de um Estado autoritário,
prepotente, privatista e que em todas as suas dimensões serve às elites
econômicas, que por sua vez controlam as elites políticas (executivos,
legislativos e judiciários) em grande maioria.
Eu ouço sempre falar em progresso. Não percebo essa afirmação como
real. Só é progresso aquilo que é comum a todas as pessoas. Se somente a
alguns, é privilégio.
E progresso não são sedes suntuosas de bancos, de grandes empresas,
nem extensas áreas de cultivo de transgênicos regados a agrotóxico do
latifúndio brasileiro - mas nem tanto, pois o etanol já é dos gringos.
Progresso representa educação, saúde, condições dignas de existência,
coexistência e convivência humanas, trabalho, moradia (as casas do
programa Minha Casa Minha Vida são construídas com verbas repassadas a
prefeituras e superfaturadas, além de serem gaiolas de qualidade
duvidosa), enfim, toda uma gama de direitos básicos e fundamentais que,
normalmente, as polícias militares reprimem.
São trabalhadores sem “consciência de classe”, servem aos donos, são
como que cães amestrados que neste momento estão sem coleira e
focinheira, caso da Bahia.
Não há “greve”, apenas um motim. E um erro colossal de setores ditos
de esquerda – a esquerda que a direita adora – em tentar transformar um
motim num movimento de trabalhadores com consciência de classe, com
consciência do lugar de classe.
Isso não existe, soa a oportunismo eleitoral e eleições neste sistema que temos não são caminhos para a democracia.
O sistema é como uma bolha. Isolado da classe trabalhadora. Voltado
para seu interior – o da bolha – sem a menor intenção de mudar as
regras.
Por isso está falido, por isso o governo Dilma Rousseff vai ficando cada vez mais com cara de PSDB.
A luta popular é outra, tem outro viés.
Laerte Braga é jornalista.
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