Para evitar ameaça, juiz pode decidir em grupo.
FAUSTO MACEDO - 26.07.2012. O Estado de S.Paulo.
Na batalha contra a máfia, a Itália criou os juízes sem rosto - magistrados que não tinham a identidade revelada nem na hora da sentença. No Brasil, contra as organizações criminosas que matam desafetos, negociam drogas ou avançam sobre o erário, os juízes agora vão poder atuar em colegiado quando tiverem que tomar decisões severas contra investigados. É o que prevê a Lei 12.694, publicada ontem no Diário Oficial da União, sancionada pela presidente Dilma Rousseff para assegurar à toga maior segurança.
Em processos ou procedimentos sobre delitos praticados por organizações criminosas, o juiz poderá decidir pela formação de um conselho para a prática de qualquer ato, especialmente decretação de prisão ou de medidas assecuratórias - interceptação telefônica, ordem de buscas e ação controlada.
"(A lei) Pode evitar episódios como o do juiz Paulo Augusto Moreira Lima, do caso Cachoeira", diz o desembargador Henrique Nelson Calandra, presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). "É muita pressão sobre um único magistrado. O trabalho em conjunto, compartilhando as deliberações, pode neutralizar intimidações."
Em junho, após ameaças, Moreira Lima deixou o comando do processo que envolve o contraventor Carlinhos Cachoeira. Alegou que não tinha mais condições de permanecer à frente da investigação. "Ele (Moreira Lima) estava exaurido", diz Calandra. "Intimidações são comuns nesse tipo de procedimento. Processo que derruba um senador da República (Demóstenes Torres). Quer mais o quê?"
Deliberações.
O colegiado poderá deliberar sobre concessão de liberdade provisória ou revogação de prisão, sentença, progressão ou regressão de regime de cumprimento de pena, concessão de liberdade condicional, transferência de preso para estabelecimento prisional de segurança máxima e inclusão do preso no regime disciplinar diferenciado.
O juiz poderá instaurar o colegiado, indicando os motivos e as circunstâncias que acarretam risco à sua integridade física em decisão fundamentada, da qual será dado conhecimento à Corregedoria do tribunal ao qual está vinculado. O colegiado será formado pelo juiz do processo e por dois outros juízes escolhidos por sorteio eletrônico, dentre aqueles de competência criminal em exercício no primeiro grau de jurisdição.
A competência do colegiado limita-se ao ato para o qual foi convocado. As reuniões poderão ser sigilosas "sempre que houver risco de que a publicidade resulte em prejuízo à eficácia da decisão judicial". As decisões do colegiado, "devidamente fundamentadas e firmadas, sem exceção, por todos os seus integrantes", serão publicadas sem nenhuma referência a voto divergente.
Identidade.
"É passo importante para fortalecer o Judiciário na parte mais próxima da população, a primeira instância, por isso sujeita às ameaças e vinganças daqueles que são contra o Estado de Direito", disse o desembargador Roque Mesquita de Oliveira, presidente da Associação Paulista dos Magistrados.
O presidente da Associação dos Juízes Federais em São Paulo, Ricardo Rezende, alerta que "em muitos casos o juiz realmente é um alvo fácil, uma figura totalmente desprotegida".
O advogado Pierpaolo Bottini diz que "é justificável o reforço a medidas de segurança aos juízes, diante de recentes atentados".
E adverte: "A formação de um colegiado para
atos como a sentença afeta a garantia da identidade física do juiz,
porque ao menos dois magistrados integrantes do grupo não estiveram
presentes no momento de produção da prova, não participaram dos
interrogatórios, das audiências de testemunhas". A criminalista Beatriz
Catta Preta considera a criação do colegiado "medida desnecessária,
porque é inerente ao cargo do juiz tomar decisões independentemente da
periculosidade ou não do investigado".
O Diário Oficial da União que circula no dia de hoje (25.07.2012), traz a publicação desta lei:
O Diário Oficial da União que circula no dia de hoje (25.07.2012), traz a publicação desta lei:
Dispõe sobre o processo e o julgamento colegiado em
primeiro grau de jurisdição de crimes praticados por organizações criminosas;
altera o Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 -
Código Penal, o Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941
- Código de Processo Penal, e as Leis nos 9.503, de 23 de
setembro de 1997 - Código de Trânsito Brasileiro, e 10.826, de 22 de dezembro de
2003; e dá outras providências.
|
A
PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o
Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o Em
processos ou procedimentos que tenham por objeto crimes praticados por
organizações criminosas, o juiz poderá decidir pela formação de colegiado para a
prática de qualquer ato processual, especialmente:
I - decretação de prisão ou de
medidas assecuratórias;
II - concessão de liberdade
provisória ou revogação de prisão;
III - sentença;
IV - progressão ou regressão de
regime de cumprimento de pena;
V - concessão de liberdade
condicional;
VI - transferência de preso para
estabelecimento prisional de segurança máxima; e
VII - inclusão do preso no
regime disciplinar diferenciado.
§ 1o O juiz
poderá instaurar o colegiado, indicando os motivos e as circunstâncias que
acarretam risco à sua integridade física em decisão fundamentada, da qual será
dado conhecimento ao órgão correicional.
§ 2o O
colegiado será formado pelo juiz do processo e por 2 (dois) outros juízes
escolhidos por sorteio eletrônico dentre aqueles de competência criminal em
exercício no primeiro grau de jurisdição.
§ 3o A
competência do colegiado limita-se ao ato para o qual foi convocado.
§ 4o As
reuniões poderão ser sigilosas sempre que houver risco de que a publicidade
resulte em prejuízo à eficácia da decisão judicial.
§ 5o A
reunião do colegiado composto por juízes domiciliados em cidades diversas poderá
ser feita pela via eletrônica.
§ 6o As
decisões do colegiado, devidamente fundamentadas e firmadas, sem exceção, por
todos os seus integrantes, serão publicadas sem qualquer referência a voto
divergente de qualquer membro.
§ 7o Os
tribunais, no âmbito de suas competências, expedirão normas regulamentando a
composição do colegiado e os procedimentos a serem adotados para o seu
funcionamento.
Art. 2o Para
os efeitos desta Lei, considera-se organização criminosa a associação, de 3
(três) ou mais pessoas, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de
tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou
indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de crimes cuja
pena máxima seja igual ou superior a 4 (quatro) anos ou que sejam de caráter
transnacional.
Art. 3o Os
tribunais, no âmbito de suas competências, são autorizados a tomar medidas para
reforçar a segurança dos prédios da Justiça, especialmente:
I - controle de acesso, com
identificação, aos seus prédios, especialmente aqueles com varas criminais, ou
às áreas dos prédios com varas criminais;
II - instalação de câmeras de
vigilância nos seus prédios, especialmente nas varas criminais e áreas
adjacentes;
III - instalação de aparelhos
detectores de metais, aos quais se devem submeter todos que queiram ter acesso
aos seus prédios, especialmente às varas criminais ou às respectivas salas de
audiência, ainda que exerçam qualquer cargo ou função pública, ressalvados os
integrantes de missão policial, a escolta de presos e os agentes ou inspetores
de segurança próprios.
Art. 4o O
art. 91 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 -
Código Penal, passa a vigorar acrescido dos seguintes §§ 1o e
2o:
“Art. 91. ........................................................................
§ 1o Poderá ser decretada a perda de bens ou valores equivalentes ao produto ou proveito do crime quando estes não forem encontrados ou quando se localizarem no exterior.
§ 2o Na hipótese do § 1o, as medidas assecuratórias previstas na legislação processual poderão abranger bens ou valores equivalentes do investigado ou acusado para posterior decretação de perda.” (NR)
Art. 5o O
Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de
Processo Penal, passa a vigorar acrescido do seguinte art. 144-A:
“Art. 144-A. O juiz determinará a alienação antecipada para preservação do valor dos bens sempre que estiverem sujeitos a qualquer grau de deterioração ou depreciação, ou quando houver dificuldade para sua manutenção.
§ 1o O leilão far-se-á preferencialmente por meio eletrônico.
§ 2o Os bens deverão ser vendidos pelo valor fixado na avaliação judicial ou por valor maior. Não alcançado o valor estipulado pela administração judicial, será realizado novo leilão, em até 10 (dez) dias contados da realização do primeiro, podendo os bens ser alienados por valor não inferior a 80% (oitenta por cento) do estipulado na avaliação judicial.
§ 3o O produto da alienação ficará depositado em conta vinculada ao juízo até a decisão final do processo, procedendo-se à sua conversão em renda para a União, Estado ou Distrito Federal, no caso de condenação, ou, no caso de absolvição, à sua devolução ao acusado.
§ 4o Quando a indisponibilidade recair sobre dinheiro, inclusive moeda estrangeira, títulos, valores mobiliários ou cheques emitidos como ordem de pagamento, o juízo determinará a conversão do numerário apreendido em moeda nacional corrente e o depósito das correspondentes quantias em conta judicial.
§ 5o No caso da alienação de veículos, embarcações ou aeronaves, o juiz ordenará à autoridade de trânsito ou ao equivalente órgão de registro e controle a expedição de certificado de registro e licenciamento em favor do arrematante, ficando este livre do pagamento de multas, encargos e tributos anteriores, sem prejuízo de execução fiscal em relação ao antigo proprietário.
§ 6o O valor dos títulos da dívida pública, das ações das sociedades e dos títulos de crédito negociáveis em bolsa será o da cotação oficial do dia, provada por certidão ou publicação no órgão oficial.
§ 7o (VETADO).”
Art. 6o O
art. 115 da Lei no 9.503, de 23 de setembro de 1997 - Código
de Trânsito Brasileiro, passa a vigorar acrescido do seguinte § 7o:
“Art. 115. ...................................................................................................................................................................
§ 7o Excepcionalmente, mediante autorização específica e fundamentada das respectivas corregedorias e com a devida comunicação aos órgãos de trânsito competentes, os veículos utilizados por membros do Poder Judiciário e do Ministério Público que exerçam competência ou atribuição criminal poderão temporariamente ter placas especiais, de forma a impedir a identificação de seus usuários específicos, na forma de regulamento a ser emitido, conjuntamente, pelo Conselho Nacional de Justiça - CNJ, pelo Conselho Nacional do Ministério Público - CNMP e pelo Conselho Nacional de Trânsito - CONTRAN.” (NR)
Art. 7o O
art. 6o da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro
de 2003, passa a vigorar acrescido do seguinte inciso XI:
“Art. 6o .......................................................................................................................................................................XI - os tribunais do Poder Judiciário descritos no art. 92 da Constituição Federal e os Ministérios Públicos da União e dos Estados, para uso exclusivo de servidores de seus quadros pessoais que efetivamente estejam no exercício de funções de segurança, na forma de regulamento a ser emitido pelo Conselho Nacional de Justiça - CNJ e pelo Conselho Nacional do Ministério Público - CNMP. ......................................................................................” (NR)
Art. 8o A
Lei
no 10.826, de 22 de dezembro de 2003, passa a vigorar
acrescida do seguinte art. 7o-A:
“Art. 7o-A. As armas de fogo utilizadas pelos servidores das instituições descritas no inciso XI do art. 6o serão de propriedade, responsabilidade e guarda das respectivas instituições, somente podendo ser utilizadas quando em serviço, devendo estas observar as condições de uso e de armazenagem estabelecidas pelo órgão competente, sendo o certificado de registro e a autorização de porte expedidos pela Polícia Federal em nome da instituição.
§ 1o A autorização para o porte de arma de fogo de que trata este artigo independe do pagamento de taxa.
§ 2o O presidente do tribunal ou o chefe do Ministério Público designará os servidores de seus quadros pessoais no exercício de funções de segurança que poderão portar arma de fogo, respeitado o limite máximo de 50% (cinquenta por cento) do número de servidores que exerçam funções de segurança.
§ 3o O porte de arma pelos servidores das instituições de que trata este artigo fica condicionado à apresentação de documentação comprobatória do preenchimento dos requisitos constantes do art. 4o desta Lei, bem como à formação funcional em estabelecimentos de ensino de atividade policial e à existência de mecanismos de fiscalização e de controle interno, nas condições estabelecidas no regulamento desta Lei.
§ 4o A listagem dos servidores das instituições de que trata este artigo deverá ser atualizada semestralmente no Sinarm.
§ 5o As instituições de que trata este artigo são obrigadas a registrar ocorrência policial e a comunicar à Polícia Federal eventual perda, furto, roubo ou outras formas de extravio de armas de fogo, acessórios e munições que estejam sob sua guarda, nas primeiras 24 (vinte e quatro) horas depois de ocorrido o fato.”
Art. 9o
Diante de situação de risco, decorrente do exercício da função, das autoridades
judiciais ou membros do Ministério Público e de seus familiares, o fato será
comunicado à polícia judiciária, que avaliará a necessidade, o alcance e os
parâmetros da proteção pessoal.
§ 1o A
proteção pessoal será prestada de acordo com a avaliação realizada pela polícia
judiciária e após a comunicação à autoridade judicial ou ao membro do Ministério
Público, conforme o caso:
I - pela própria polícia
judiciária;
II - pelos órgãos de segurança
institucional;
III - por outras forças
policiais;
IV - de forma conjunta pelos
citados nos incisos I, II e III.
§ 2o Será
prestada proteção pessoal imediata nos casos urgentes, sem prejuízo da adequação
da medida, segundo a avaliação a que se referem o
caput
e o § 1o deste artigo.
§ 3o A
prestação de proteção pessoal será comunicada ao Conselho Nacional de Justiça ou
ao Conselho Nacional do Ministério Público, conforme o caso.
§ 4o
Verificado o descumprimento dos procedimentos de segurança definidos pela
polícia judiciária, esta encaminhará relatório ao Conselho Nacional de Justiça -
CNJ ou ao Conselho Nacional do Ministério Público - CNMP.
Brasília, 24 de julho de 2012; 191o da Independência e 124o
da República.
DILMA ROUSSEFF
José Eduardo Cardozo
Este texto não substitui o publicado
no DOU de 25.7.2012
MENSAGEM DE VETO Nº
342, DE 24
DE JULHO DE 2012.
Senhor Presidente do Senado Federal,
Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do § 1o
do art. 66 da Constituição, decidi vetar parcialmente, por contrariedade ao
interesse público, o Projeto de Lei no 2.057, de 2007 (no
3/10 no Senado Federal), que “Dispõe sobre o processo e o julgamento colegiado
em primeiro grau de jurisdição de crimes praticados por organizações criminosas;
altera o Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 -
Código Penal, o Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941
- Código de Processo Penal, e as Leis nos 9.503, de 23 de
setembro de 1997 - Código de Trânsito Brasileiro, e 10.826, de 22 de dezembro de
2003; e dá outras providências”.
Ouvido, o Ministério da Justiça manifestou-se pelo
veto ao seguinte dispositivo:
§ 7º do art. 144-A do Decreto-Lei no
3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, acrescido pelo art.
5º do projeto de lei
“§ 7o Não serão submetidos à
alienação antecipada os bens que a União, por intermédio do Ministério da
Justiça, ou o Estado, por órgão que designar, indicarem para ser colocados sob
uso e custódia de órgão público, preferencialmente envolvido na operação de
prevenção e repressão ao crime organizado.”
Razão do veto:
“A proibição da alienação antecipada dos bens sob o uso e a custódia de órgão
público, ainda que sujeitos a qualquer grau de deterioração ou depreciação, ou
quando houver dificuldade para sua manutenção, desvirtua o objetivo daquela
medida assecuratória, que é a preservação do valor dos bens.”
Essa, Senhor Presidente, a razão que me levou a
vetar o dispositivo acima mencionado do projeto em causa, a qual ora submeto à
elevada apreciação dos Senhores Membros do Congresso Nacional.
Este texto não substitui o publicado
no DOU de 25.7.2012
Nenhum comentário:
Postar um comentário