Os 94 deputados recebem R$ 2.250 por mês, mas não comprovam os gastos
Fausto Macedo, de O Estado de S. Paulo
SÃO
PAULO - A Justiça determinou a “imediata suspensão” do pagamento de
auxílio moradia a todos os 94 deputados estaduais de São Paulo. A ordem é
do juiz da 13.ª Vara da Fazenda Pública, Luís Manuel Fonseca Pires, que
concedeu tutela antecipada em ação civil do Ministério Público do
Estado. O bloqueio liminar do benefício terá de ser acatado pela Mesa
Diretora da Assembleia “sob pena de os responsáveis, em caso de
descumprimento da medida, responderem por ato de improbidade
administrativa em ação própria pelo manifesto dolo de ofensa aos
princípios jurídicos da administração pública”.
O Ministério
Público estima que o corte no privilégio dos deputados vai gerar
economia anual de R$ 2,5 milhões para os cofres públicos. Os
parlamentares recebem R$ 2.250 todo mês, cada um - verba embutida no
subsídio, sem amparo legal e sem apresentação de qualquer comprovante de
despesa. A concessão é indistinta e indiscriminada, recebem até aqueles
que moram a poucas quadras da sede do Legislativo, no Ibirapuera.
A regalia é
concedida aos deputados com base na Lei 14.926/13. “Há ofensa ao
princípio da legalidade na medida em que o artigo 1.º da Lei 14.926 não
se mostra suficiente, logo, é inconstitucional, a justificar o pagamento
indiscriminado desta verba porque não há qualquer suporte fático à
indenização”, adverte o juiz.
Fonseca Pires
argumenta que “não há suporte fático porque inexiste diferença entre o
parlamentar que reside em imóvel próprio ou alugado, próximo ou distante
da Assembleia Legislativa, como ainda não há o condicionamento do
pagamento à comprovação de gastos com a moradia.” Ele aponta “ausência
de critérios claros ao reembolso” e “omissão sobre a comprovação das
despesas”.
A Lei 14.926, de 4
de janeiro de 2013, e as que a precederam, invoca o Ato 104/88 da Câmara
dos Deputados, que prevê o auxílio aos deputados federais. Essa verba
tem caráter indenizatório. O beneficiário tem que exibir comprovante do
gasto para, então, pleitear o reembolso.
A ação aponta
quatro ilegalidades: inexiste lei que regulamente o auxílio; a benesse
foi incorporada ao subsídio com base em lei “manifestamente
inconstitucional”; o pagamento é feito indistintamente, permanentemente e
“sem qualquer critério legal ou razoável”; é concedido sem qualquer
comprovação de despesas de aluguel ou estadia.
“Cuida-se de
prejuízo de monta, que não pode ser ignorado, sobretudo considerando a
realidade do povo paulista, que exige melhorias em diversos setores,
como educação, saúde e moradia da população carente”, afirmam os
promotores de Justiça Saad Mazloum e Silvio Marques.
Eles calculam
prejuízo ao Tesouro de R$ 230 mil por mês. Cravam que a vantagem “é uma
imoralidade” e burla o princípio do subsídio em parcela única.
Privilégio. A regra
do subsídio, prevista no artigo 39, parágrafo 4.º, da Constituição
Federal, veda expressamente a remuneração por rubricas distintas a serem
somadas em composição de um valor final. “Inadmissível que uma verba
indenizatória seja incluída permanentemente na remuneração dos
parlamentares. O auxílio moradia aos deputados estaduais é absolutamente
ilegal, verdadeiro privilégio”, sustentam os promotores.
A ação civil,
lastreada em longa investigação da Promotoria de Justiça do Patrimônio
Público e do Social, mostra que todo inicio de ano a Mesa da Assembleia -
formada por três deputados, o presidente da Casa, o primeiro secretário
e o segundo - edita lei estadual que fixa remuneração dos parlamentares
para o exercício financeiro.
Os promotores
denunciam que a Mesa do Legislativo usa o Ato 104 para assegurar o
benefício, mas “ignora deliberadamente” os artigos 1.º e 2.º daquela
norma da Câmara dos Deputados. Tais artigos impõem que poderão ser
contemplados com o moradia aqueles que não têm unidade residencial
funcional e que o reembolso só deve ser garantido mediante despesa
comprovada.
“A mera menção à
aplicação do Ato 104/88, sem a consequente regulamentação, tem dado
margem ao arbitrário e indiscriminado pagamento da benesse sem o
estabelecimento de limites legais”, sustentam os promotores. O Ato 104,
de incidência exclusiva à Câmara dos Deputados, não pode ser vinculado
aos parlamentares paulistas.
“É absolutamente
inconstitucional o artigo 1.º da Lei 14.926/13, na parte que manda
aplicar aos deputados estaduais o Ato 104. Não se admite a alegação de
que a Constituição Federal estabeleceu uma simetria entre os
parlamentares federais e os estaduais, mas apenas proporcionalidade
entre os subsídios de ambos. O que não inclui verbas de natureza
indenizatória.”
Amparo legal. A
Assembleia Legislativa informou que o subsídio de seus deputados para
2013 foi fixado pela Lei 14.926, que dispõe que a remuneração tem valor
correspondente a 75% do que recebem os federais: “Nos termos do
parágrafo 2.º do artigo 27 da Constituição Federal, incluindo-se os
valores resultantes da aplicação do Ato 104/88 da Câmara, recebidos a
título remuneratório reconhecido por decisão judicial.”
A Casa ainda não
foi notificada da decisão judicial que manda barrar o auxílio moradia.
Quando isso ocorrer vai estudar eventual recurso.
Além do subsídio
mensal de R$ 20.042,34, os deputados paulistas recebem verba
indenizatória de R$ 21.812,50 - para custeio de despesas como passagens
aéreas, contas de telefone, impressos e correspondências -, verba de
gabinete que soma cerca de R$ 60 mil, para manter até 15 assessores de
cada deputado, e mais o moradia. À Justiça eleitoral, 36% dos deputados
declararam possuir imóveis residenciais na capital; 16% na Grande São
Paulo; 10% a menos de 100 quilômetros da Capital; 25% a mais de 100
quilômetros; 13% afirmaram não possuir imóveis.
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