segunda-feira, 17 de outubro de 2016

Tarso Genro. Os assassinos estavam no Comitê Central.

tarso-genro2Por Tarso Genro
Enquanto o articulista da Folha, Contardo Calligaris, diz que “a política brasileira está muito difícil para a ficção” (UOL 25.05), o líder do “Movimento Brasil Livre” declara (Clic-RBS 25.05) que a máquina dos partidos “foi utilizada” para financiar os “movimentos pró-impeachment”, informação tratada pela Folha como uma grande novidade. Vou argumentar em sentido contrário. Ficção e realidade se entrecruzam de forma permanente, na nossa esfera política e esta -por sua vez- é facilmente acessada pela ficção. 
Assim como a ficção se expressa, por maneirismos jornalísticos muito específicos, quase todos os dias na mídia tradicional, a ficção propriamente literária, com o tempo, acessa e inspira-se em situações iguais ou análogas às que vivemos hoje e ilumina o passado através da grade literatura. Lembro-me de “Doctor Faustus” de Thomas Mann, “Os Thibault” de Roger Martin-dGard” ou “As Vinhas da Ira”, de Steinbeck. Quando Faulkner, por exemplo, publicou “Enquanto agonizo”, em 1930, ele já tinha acúmulo suficiente, para dar voz aos pobres do Sul dos Estados Unidos e dizer , na voz de Cash: “…é melhor construir um galinheiro bem-feito do que construir um tribunal malfeito, e se forem bem ou mal construídos não importa, porque não é um ou outro, que vai fazer um homem se sentir bem ou mal”. Um dia os nossos grandes escritores levarão para o plano da arte os nossos atuais galinheiros e Tribunais, com as suas grandezas e misérias.
A imagem da política nacional passada pela grande imprensa, no que refere ao processo de impedimento da Presidenta Dilma -com as exceções de praxe- foi um péssimo jornalismo. Ele ainda vai inspirar uma grande ficção literária, quem sabe para um Raduan Nassar, um Luis Antonio Assis Brasil ou um Antonio Callado redivivo . Esta inspiração poderá partir do comportamento desta imprensa que, insistindo na “espontaneidade”, “despartidarização” e “autenticidade” -tanto das jornadas de 2013, como dos atuais movimentos pró-impeachment- promoveu um vasto painel de ficções. Seus relatos dos movimentos de rua, como se eles fossem sinceramente dirigidos por líderes avessos à corrupção, foi um feito ficcional extraordinário.
Neste processo, a maior parte da grande mídia “fazia de conta” que não sabia, que o que estava sendo armado era a vitória do capitalismo rentista, com a radicalização do “ajuste”. Ela estava consciente, contudo, que quem poderia fazer isso, sob pressão, seria uma Confederação de Investigados e Denunciados: a redução dos gastos públicos com a educação e com o Sistema Único de Saúde, bem como o gradativo sumiço dos demais “gastos supérfluos” -relacionados com as políticas de coesão social em andamento- era o objetivo maldito. E ele só poderia ser cumprido por desesperados ou ameaçados. É o que estava e está em jogo, na cena política brasileira, o que indica que não está difícil para a ficção literária, pois esta vem sempre mais tarde e o presente retratado pela mídia, já é a ficção ao vivo e também matéria bruta da ficção como literatura, que certamente os grandes escritores construirão mais tarde..
Em 1981, Manuel Vàsquez Montalban publicou uma grande novela -“Asesinato en el Comite Central”- apenas seis anos depois da morte do general Francisco Franco. Ali, Montalban abriu um debate, em parte sobre a transição espanhola, mas sobretudo a respeito da falência da esquerda comunista em dirigir aquele processo, pela sua escassa compreensão do problema da integração europeia. Na sua ficção literária, o comunista Montalban relata o assassinato – numa reunião do Comitê Central – do Secretário Geral do Partido, Santiago Carrillo, que se fizera defensor do “eurocomunismo”, teoria que apontava a falência da União Soviética, como experiência socialista universal. A crítica de Carrillo centrava-se, tanto na questão democrática, como na questão da organização da produção. Mas pairou, no livro de Montalban, uma dívida atroz: o assassinato de Carrillo (que no livro tem o nome de Fernando Garrido), teria sido encomendado pela CIA, interessada em fazer fracassar uma transição democrática mais “pela esquerda”, ou pela KGB, interessada em não permitir prosperar um “dissenso comunista” renovador? Quais as forças externas que interferiram na transição espanhola, não se sabe com segurança até hoje. Como não se sabe, nos anos de chumbo da Itália, quem orientou a mão dos fascistas que fizeram explodir, com dezenas de mortos, a Estação Férrea de Bolonha.
Um livro do falecido professor Reneé Dreifuss publicado em 1981, fruto de uma extensa pesquisa documental e bibliográfica (“1964 a Conquista do Estado”), mostrou que naquele ano não ocorreu no Brasil uma simples quartelada , mas uma profunda mudança no padrão de acumulação, obedecendo a uma lógica de dominação imperial, por parte dos EEUU. A obra do grande professor Dreifuss mostrou, ainda, que o golpe militar teve uma expressiva participação de setores da sociedade civil anticomunista, com seus interesses empresariais associados a este novo padrão de desenvolvimento, integrado e submisso à geopolítica americana. Diferentemente do que ocorreu naquela época, cujo revestimento central da política golpista era se opor comunismo soviético, as mobilizações contra o Governo eleito da Presidenta Dilma, trouxeram às ruas um contingentes de pessoas, cujas motivações tem diversas origens. Seja porque ela manejou mal a economia, porque o Governo não correspondeu as suas expectativas eleitorais, ou por puro ódio colonial-escravista, contra as políticas sociais dos Governos do PT.
Ficou claro, porém, nesta última semana, que a central do golpismo institucional passou longe dos militares e foi formado pelo oligopólio da mídia, articulado com setores do Ministério Público, dos Juízes e das lideranças políticas do rentismo “liberal”, que unificaram esta diversidade. E o fizeram -pautados pela mídia- a partir da raiva contra tudo que foge aos seus padrões de civilidade elitista, ao mesmo tempo permissiva e fascista, “liberal” e reacionária, amoral e fisiológica: de Alexandre Frota a Bolsonaro, de Fernando Henrique a Aécio, de Pauderney a Jucá. Mas não pensemos que as instituições do Estado Democrático de Direito estão falidas e que a nossa democracia não tem saída, pois isso é o que nos querem fazer crer a grande mídia e o nosso percentual de fascistas de turno. A questão é mais complexa, não é somente nacional, nem é fruto de uma crise contingente do capitalismo global, mas de um novo ciclo em que ele pretende se renovar. A crise é o pulmão capitalismo, dizia um barbudo subversivo, e através dela ele respira e se renova.
O que se diz aqui, não é que o PT seja uma comunidade de anjos ou que indivíduos dos nossos Governos não tenham cometido ilegalidades ou crimes, tanto nos Governos de Lula, como de Dilma, como de resto sempre ocorreu em todos os Governos que nos precederam, inclusive em maior grau. Nem se defende que a “lava-jato” tenha sido instituída para “aniquilar o PT”, como querem fazer crer alguns formuladores do nosso campo político-partidário, ou que somos vítimas, exclusivamente, dos nossos “acertos”. O que sustento é que a estratégia política de longo curso, da direita liberal-rentista, teve sucesso: hegemonizou uma maioria na sociedade e pôs boa parte dos aparatos institucionais do Estado a seu serviço. Montou uma Frente Política sem qualquer programa visível e uniu os corruptos e fisiológicos de todas as origens, bem como convenceu a maior parte da cidadania – através de um trabalho meticuloso feito pela grande mídia- que estavam “atacando a corrupção”.
Formaram, assim, aquela grande Federação de Investigados e Denunciados, boa parte deles originários dos nossos Governos, para se apropriar do Estado Brasileiro sem votos, o que por si só não revela uma debilidade estrutural do nosso estatuto democrático, pois o que vem daí é o “ajuste” mais severo das últimas décadas, não o fim da democracia política, tal qual a conhecemos. O “ajuste”, todavia, é capaz de reorganizar estrutura de classes da sociedade, através de uma acomodação conservadora, pois -vide a Espanha, França e Portugal- os ajustes também formam, na sociedade civil, as suas próprias bases estáveis, se a esquerda não tiver condições de ampliar a sua liderança para formar maiorias eleitorais. As lutas “sociais” podem mitigar as reformas mais duras, mas um outro ajuste de corte democrático, onde “quem tem mais paga mais”, só pode ser viabilizado a partir dos movimentos sociais, por maiorias políticas que tenham reflexos nos resultados eleitorais. Creio que este deve ser o ponto de partida de uma estratégia de esquerda, para o período que nos aguarda.
As caracterizações políticas do “centro”, da “esquerda” e da “direita”, não tem as mesmas propriedades em distintos períodos históricos. Para dar dois exemplos bem flagrantes, lembremo-nos que o PT chega ao Governo como partido de “esquerda”, pela via democrática e vai rapidamente ao “centro”, para poder governar, encontrando ali situado o PMDB. Este se torna nosso aliado, por um longo período de Governo, para que pudéssemos avançar em políticas sociais e educacionais que mudaram as condições sociais e econômicas de mais de 50 milhões de brasileiros. Hoje, porém, o PMDB é o eixo em torno do qual a direita “liberal” e a extrema direita, se reorganizam para fazer o “ajuste” exigido pelos credores da nossa dívida pública, cujos sacrifícios vão recair sobre os mais pobres e os remediados.
Neste sentido, o PMDB não só não mudou, como é falso dizer que ele traiu, pois a estratégia de enfrentamento da crise mundial, com um ajuste que onere internamente os mais ricos, nunca foi um compromisso deste Partido e nem o PT conseguiu formulá-la claramente. Creio que isso é suficiente para mostrar que o PT só pode se regenerar, como partido democrático de esquerda no interior de uma outra Frente Política, que não vise somente chegar ao Governo, mas, que possa chegar novamente nele com maioria social e parlamentar, para aplicar um novo programa de avanços no emprego, na democracia, no crescimento da economia. A falsa luta contra a corrupção, não o rentismo, foi o que conseguiu dar unidade à frente política do golpismo, por isso agora o “ajuste” passa ser motivo de dissenso, tanto no interior do próprio aparato estatal, como na própria base do Governo Temer, além de sê-lo na sociedade.
Uma estratégia democrática de mudanças sociais e econômicas requer uma tática política democrática coerente com os fins da estratégia desenhada. Opino que, hoje, o que é capaz de definir as propriedades dos campos políticos, tidos como de “esquerda” e “direita”, é a posição dos sujeitos políticos organizados, sobre quatro questões chaves: o enfrentamento com o “ajuste” liberal-rentista, que será inócuo se não apresentarmos qual o nosso “ajuste” e quais a suas consequências imediatas na vida do nosso povo; a proposta de uma reforma política, que será inócua se não deixar clara a proibição do financiamento dos partidos pelas empresas (fonte principal da corrupção) e não barrar os micro partidos de “negócios”; uma reforma para democratizar os meios de comunicação e permitir a livre circulação da opinião, que será inócua se não tiver a possibilidade de resgatar a comunicação para as suas finalidades, já proclamadas na Constituição de 88; e, finalmente -independentemente de continuarmos na luta para bloquear o “impeachment”- um amplo acordo para a relegitimação do Poder Político no país, seja por um referendo para novas eleições, seja por uma PEC que convoque eleições gerais, no menor prazo possível. Este “amplo acordo” será inócuo, se não resgatar, para o nosso lado, inclusive lideranças que transitaram em apoio ao “impeachment”, mas que se revelam hoje contra o “ajuste” liberal-rentista e já se sentem enganados pela cantilena da falsa luta contra a corrupção, promovida pela Rede Globo.
Na novela de Montalban, o tiro que assassinaria Carrillo veio de dentro do próprio Comitê Central, revelando a existência de um enigma sobre a transição espanhola, bem como a incompetência do seu Partido Comunista, para entender o que estava acontecendo na Europa. No golpismo brasileiro, o tiro que quer assassinar o mandato da Presidenta Dilma, também vem de dentro do “Comitê Central”: vem do âmago do Governo, do seu núcleo mais comprometido com todos os seus erros, do seu cerne político mais forte no Parlamento. 
Esta é a notável realidade, que a mídia nacional transformou numa cruzada fictícia contra a corrupção, que sai da crise, até agora, mais forte. E mais unida, pois quando os partidos mais influentes do país – sem separação de responsabilidades – são atingidos sem que se fixem politicamente as responsabilidades individuais, a tendência é o povo dizer que “se vayan todos”. E ficam, no fim do túnel, os vampiros do ajuste, com seus dentes afiados, celebrando o homem abstrato do mercado e levando ao desespero as pessoas concretas que trabalham.
.oOo. Tarso Genro foi Governador do Estado do Rio Grande do Sul, prefeito de Porto Alegre, Ministro da Justiça, Ministro da Educação e Ministro das Relações Institucionais do Brasil.

Em Cuba, a passagem do furacão Mathew não matou ninguém.

REUTERS/Carlos Garcia Rawlins
Foto Brasil 247.
Artigo copiado da Colunista do 247, Tereza Cruvinel é uma das mais respeitadas jornalistas políticas do País.

Num momento em que o Brasil volta a cultuar o Estado mínimo, que tem como medida inaugural a PEC do teto para o gasto público federal, alguma coisa podemos aprender com a passagem do furacão Mathew. O Haiti foi devastado, mais de mil pessoas morreram, sem contar as vítimas fatais e os desabrigados em toda a América Central e nos Estados Unidos. Sabem quantas pessoas morreram em Cuba? Nenhuma. A diferença: a ação do Estado. Isso não saiu na mídia e muito menos nas agências americanas de notícias.

No Haiti, além de causar mais de mil mortes e deixar 60 mil pessoas desalojadas,  o furacão provocou o adiamento da eleição presidencial do dia 9 passado para o dia 20 de novembro. O Haiti, que nem havia se recuperado da tragédia do terremoto de 2010, mergulhou no caos. Mas ali não existe ainda propriamente um Estado. O Haiti é uma nação sofrida e em frangalhos tentando virar um país. O furacão, entretanto, fez vítimas também no país mais rico do mundo. Pelo menos 43 pessoas morreram nos Estados Unidos, sendo 26 apenas na Carolina do Norte.

E o que houve em Cuba? Uma vigorosa ação preventiva comandada pelo Governo, evacuando as vítimas potenciais antes da chegada do furacão, mobilizando as pessoas para abrigar os que precisavam deixar suas casas, reforçando estruturas de atendimento e preparando eventual atendimento hospitalar. 

O presidente Raul Castro deslocou-se pessoalmente para Santiago, na costa oriental, de onde comandou as ações preventivas que  impediram mortes e devastações como as que atingiram o Haiti, a poucos quilômetros da ilha, bem como outros paises da região. O estado cubano dispõe de um sistema mais eficiente que o dos Estados Unidos para detectar furacões. Depois, entra em cena o governo, com ações junto à população para prevenir as consequências nefastas.

No Brasil do Estado mínimo, o sistema de defesa civil também sofrerá com a redução de verbas. Furacões não costumam passara por aqui, mas a seca sim, costuma castigar o Nordeste, que por sinal vai enfrentar uma das piores no ano que vem.  Podem ir rezando os nordestinos porque do Governo focado no ajuste fiscal não terão muito o que esperar.

Altamira/PA. Mais um socioambientalista é assassinado na Amazônia.



Luís Alberto Araújo. Foto: Prefeitura de Altamira

Luís Alberto Araújo, responsável por área ambiental da prefeitura de Altamira (PA), cidade mais afetada pela hidrelétrica de Belo Monte, foi alvejado por dois homens.
A reportagem é publicada por Instituto Socioambiental - Isa, 14-10-2016.
Uma dupla de assassinos, numa moto, executou, nesta quinta-feira (13/10), o secretário de Meio Ambiente de Altamira (PA), Luís Alberto Araújo, 54 anos. 
Segundo a Polícia Civil, a execução ocorreu diante dos seus familiares, quando chegavam ao condomínio em que moram, no bairro de Buritis, na periferia da cidade. Os assassinos fugiram em direção ao município de Brasil Novo e ainda não há informações sobre sua identidade ou dos mandantes.
O assassinato engrossa a alarmante contabilidade dos assassinatos de militantes socioambientais na Amazônia, sem paralelos em outros lugares do mundo.
Araújo também foi secretário de Meio Ambiente em São Felix do Xingu (PA), onde liderou um pacto para promover o cadastramento ambiental da quase totalidade das propriedades rurais. Por isso, acabou se indispondo com grileiros e desmatadores ilegais, que passaram a ameaçá-lo.
Em Altamira, Araújo conduziu os esforços pela instalação do saneamento urbano e o licenciamento do aterro sanitário da cidade. Também conseguiu implantar o cadastro ambiental em áreas tradicionalmente resistentes, fazendo diferença na luta contra as altas taxas de desmatamento. Sua gestão foi marcada pela isenção e seriedade na aplicação da legislação ambiental.
Altamira perde um excelente gestor, sempre disposto a reivindicar o cumprimento das condicionantes socioambientais pelos responsáveis da construção da usina de Belo Monte e a prestar apoio às populações ribeirinhas e a outros segmentos afetados”, lembra Rodrigo Junqueira, coordenador do Programa Xingu do ISA. Junqueira afirma que é fundamental que os governos federal e estadual façam esforços para investigar o crime e punir os responsáveis.

Quanto vai demorar uma terceira guerra mundial?

Foto - SPUTNIK/ MIKHAIL VOSKRESENSKY Tanque Russo Armata.
O portal destaca que poucas pessoas prestam atenção ao fato de quase todos os possíveis cenários de guerra preverem o uso de armas nucleares, e sublinha a rapidez com que um confronto local pode atingir o nível de guerra nuclear limitada. 


Vários representantes do comando militar americano acreditam que um conflito entre os Estados Unidos ou/e a OTAN com a Rússia ou, possivelmente, com a China, durará apenas "minutos", divulgou um artigo recente. De acordo com este, a terceira guerra mundial será "fatal e rápida".  

Mais cedo o chefe do Estado-Maior do Exército norte-americano, general Mark Milley, tinha declarado que a guerra entre as maiores potências do mundo é "quase inevitável" e que neste conflito a inteligência artificial e as armas de alta precisão serão usadas em grandes escala.


Outro general americano, William Hix, também mencionado no artigo, acha que um conflito militar tradicional poderá rapidamente se tornar mais sangrento. 

Além disso, ele nota que, no futuro, o progresso técnico atingirá tal nível que entre pessoas e máquinas se estabelecerão relações muito interessantes — a tecnologia trabalhará mais rapidamente, assumindo mais tarefas humanas, e apresentando novos desafios à humanidade.

A publicação destaca também que aqueles países que agora estão participando em conflitos atuais — na Ucrânia, Síria, região do Pacífico – serão aqueles que elaborarão a tecnologia para "as guerras das próximas gerações".


Link original: https://br.sputniknews.com/mundo/201610176569616-guerra-previsao-futuro/

domingo, 16 de outubro de 2016

Fapesp - Os homens-cangurus dos canaviais de Alagoas.

Estudo comprova que excesso de trabalho e jornadas de até 11 horas elevam a carga cardiovascular e provocam distúrbio hidroeletrolítico em cortadores de cana (Foto:Cortador de cana em Teotônio Vilela, Alagoas/Lúcio Vasconcellos de Verçoza)
Claudia Izique | Agência FAPESP – No dia 19 de novembro de 2014, “18” foi trabalhar equipado com um monitor de frequência cardíaca, além do podão, das botas e de outros equipamentos que utiliza no corte da cana-de-açúcar em uma usina do município de Teotônio Vilela, em Alagoas.
Na primeira hora de uma jornada que somaria 10, sob sol escaldante, o coração atingiu picos de 200 batimentos por minuto (bpm). “O coração sai pela boca”, descreveu “18” a Lúcio Vasconcellos de Verçoza que, com o apoio da FAPESP, analisou as condições de saúde e de trabalho nos canaviais alagoanos em tese de doutorado.
Neste dia, “18” – um dos 22 trabalhadores avaliados no estudo – cortou 7 toneladas de cana, ingeriu 10 litros de água, caminhou aproximadamente 6 quilômetros e gastou 4.395 calorias. “Ao final da jornada, a sua carga cardiovascular (CCV) foi calculada em 39,58%, bem acima dos 33% considerados aceitáveis ao final de um dia de trabalho”, sublinhou Verçoza. A média da CCV do grupo monitorado pelo pesquisador foi de 36,62% para uma produção média de 7,3 toneladas e jornada média de 11 horas de trabalho.
“Nos canaviais trabalha-se até a exaustão, num grau de desgaste equiparável ao de um corredor fundista”, compara Verçoza. A cada safra, os cortadores de cana perdem peso – no caso de “13”, por exemplo, foram 8,3 kg – e sais minerais, o que provoca distúrbios hidroeletrolíticos, cãibras e dores musculares. “E aí o canguru vai pegando”, diz o pesquisador.
“Canguru” – que nos canaviais paulistas é conhecido como birôla – é o fenômeno extremo de perda de controle sobre os movimentos do corpo. “Trava perna, barriga, braço. Alguns chegam a ter cãibra até na língua. A pessoa fica imobilizada, com o braço colado junto ao corpo. Daí o nome canguru”, explica Verçosa.
Quando o canguru pega, a vítima tem que aguardar até o final do dia, sob a lona onde os trabalhadores fazem a refeição – ao lado da carroçaria do caminhão que os transporta desde a cidade até o canavial –, antes de receber atendimento. “Nos canaviais de Alagoas, a exploração é levada ao extremo, anulando, inclusive, o futuro do trabalhador: muitos ficam incapacitados ainda em idade produtiva”, afirma Verçoza.
Com o título “Os saltos do canguru nos canaviais alagoanos”, a pesquisa de doutorado de Verçoza levou o prêmio de melhor tese no 7° Encontro Nacional da Rede de Estudos Rurais, no final de agosto, e será publicada em formato de livro no início de 2017.
Um médico na pesquisa sociológica
Verçoza foi orientado por Maria Aparecida Moraes Silva, do Centro de Educação e Ciências Humanas da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), que estuda as condições de vida e de trabalho dos boias-frias paulistas há mais de 30 anos. “O trabalho de Verçoza representa um salto porque, até então, não tínhamos como provar o nexo causal entre o esforço do trabalhador e inúmeros casos de doença e morte”, afirma Silva. “A tese preenche essa lacuna, já que ele teve a oportunidade de colocar um médico na pesquisa.”
Medo, resistências e excesso de burocracia foram alguns dos obstáculos que Verçoza – ele próprio, alagoano – teve que superar até conseguir “colocar um médico na pesquisa”. Teve que contar, principalmente, com a confiança de 22 safristas de Teotônio Vilela, cidade que já tinha sido palco de suas pesquisas na iniciação científica e no mestrado.
Os testes cardiorrespiratórios foram realizados durante a safra 2014/2015 no Hospital do Coração de Maceió; as avaliações físicas, testes ergométricos e o monitoramento da frequência cardíaca foram acompanhados por um especialista. Para avaliação dos distúrbios musculoesqueléticos foi utilizada a versão brasileira do Questionário Nórdico de Sintomas Osteomusculares.
Além dessas informações, registros em caderno de campo, imagens de cortadores de cana e entrevistas com trabalhadores, ex-moradores dos engenhos, trabalhadores desempregados por causa de doença, fiscais, gerentes de usinas, médicos, entre outros informantes, permitiram a Verçoza descrever e analisar – numa perspectiva marxiana, como ele diz – as condições de trabalho e de saúde nos canaviais alagoanos e identificar o que qualifica de “superexploração”.
Esse esforço incluiu até uma investida abortada na pesquisa etnográfica: na tentativa de “vivenciar” as condições de vida dos cortadores fora da situação de trabalho, se instalou em uma casa na vila onde eles residiam. “Mas a situação ficou insustentável: circulou o boato de que eu era policial infiltrado para rastrear drogas e tive que sair dali.”
Sete ruas por eito
Em Alagoas, desde os anos 1950 a cana-de-açúcar é explorada nas zonas dos tabuleiros que se estendem de Arapiraca, no agreste, até o litoral. A região alcança até 200 metros de altitude e inclina-se de forma abrupta em direção ao mar. “A produtividade por hectare é mais baixa, já que o solo é menos fértil – o Estado planta cana desde o século 16 – e poucas usinas adotaram a mecanização, algumas em razão da topografia”, afirma Verçoza.
A baixa produtividade é, em parte, compensada pela “superexploração” do trabalho. “Os safristas selecionados devem ser dotados de habilidade e resistência física máxima para atingir as metas fixadas pelo capital agroindustrial”, afirma Verçoza. Entre essas habilidades está “agarrar com um dos braços a touceira de cana, ao mesmo tempo em que se agacha e, com o outro braço, golpeia com o podão para cortar a cana o mais rente possível do solo; depois é preciso se erguer e carregar a cana cortada até o centro do eito”. E isso tudo em meio à fuligem e um calor “inimaginável”.
Nos canaviais paulistas, por exemplo, essa lida diária se traduz em 3.080 flexões de coluna – 1,88 flexão a cada 10 segundos – e, pelo menos, 3.498 golpes de facão no corte de 12,9 kg de cana por dia, nos cálculos de Erivelton Fontana de Laat, que, na tese de doutorado “Trabalho e risco no corte manual de cana-de-açúcar: a maratona perigosa nos canaviais”, realizou análise ergonômica dessa atividade.
O salário é calculado por tonelada de cana que cada trabalhador corta diariamente. Esse cálculo tem como base a quantidade de cana cortada numa área em formato de retângulo com sete “ruas”, chamadas de eito. “Eles ganham R$ 6,72 por tonelada cortada”, diz Verçoza. Considerando a média de produção dos 22 canavieiros avaliados na pesquisa, chega-se a um salário inferior a R$ 50 por dia. As regras foram estabelecidas em acordo entre os usineiros e a Federação dos Trabalhadores na Agricultura de Alagoas (Fetag).
Para alcançar o máximo de produtividade, as usinas ainda adotam um sistema de premiação – cestas básicas, bicicletas, fogões e rádio – que alimenta a competição entre os cortadores de cana e se traduz em mais esforço no trabalho. “Isso sem falar dos roubos na pesagem da cana, o que rebaixa ainda mais os salários.”
Um quadro semelhante, de superexploração, motivou a deflagração da greve dos boias-frias em Guariba, no Estado de São Paulo, há 32 anos. O mote foi a decisão dos usineiros paulistas de ampliar de cinco para sete o número de ruas nos eitos. Quanto maior o número de eitos, mais trabalho: o percurso que o trabalhador tem que fazer para dispor a cana cortada aumenta, assim como seu dispêndio de energia, reduzindo sua capacidade de corte entre 20% e 40%, afirma Verçoza.
Na greve de Guariba, além da volta do regime de cinco ruas de cana cortadas, os trabalhadores reivindicavam também registro em carteira de trabalho, roupas adequadas e equipamentos de proteção, alimentação e moradia decente enquanto estivessem em trabalho temporário. “A greve acabou tomando um vulto grande, com repercussão na imprensa e no Ministério Público e resultou, na década seguinte, em mudanças significativas nas lavouras de cana paulistas, inclusive no incremento da mecanização no Estado”, lembra Silva, orientadora de Verçoza.
No entanto, ela acrescenta, os altos índices de produtividade continuaram sendo exigidos, atualmente, em torno de 12 a 15 toneladas de cana cortada por dia. 

Russia - O Kremlin ordena a retirada das famílias dos seus diplomatas dos Países Ocidentais.

Foto - http://www.voltairenet.org
Considerando o risco iminente de uma III Guerra Mundial, o Kremlin ordenou aos seus diplomatas e pessoal alocados no Ocidente para repatriar as suas famílias de imediato.
As representações e instituições russas no Ocidente foram reduzidas ao mínimo de pessoal.
Por seu lado, o Ministério russo da Defesa procedeu na quarta-feira, 12 de Outubro de 2016, a três disparos de mísseis inter-continentais afim de afinar o seu sistema de lançamento.
Russia orders all officials to fly home any relatives living abroad, as tensions mount over the prospect of a global war” («A Rússia ordena a todos os funcionários para enviarem os seus familiares de volta a casa, no seguimento do aumento da tensão relativa a possível guerra mundial»- ndT), Julian Robinson, Daily Mail, October 13, 2016
Tradução - Alva.

sábado, 15 de outubro de 2016

Documento desconstrói a PEC 241 e o discurso da austeridade.

Documento desconstrói a PEC 241 e o discurso da austeridade. 25259.jpeg
Na ultima segunda-feira, dia 10 de outubro de 2016, foi lançado na  Câmara dos Deputados, o documento 'Austeridade e Retrocesso: Finanças Públicas e Política Fiscal no Brasil' desconstrói a PEC 241 e o discurso da austeridade.
A informação foi publicada por GT de MACTRO da SEP, e reproduzida por Brasil Debate.
Elaborado por iniciativa do Fórum 21, Fundação Friedrich Ebert, GT de Macro da Sociedade Brasileira de Economia Política (SEP) e Plataforma Política Social apresenta uma análise aprofundada da questão fiscal, apontando seus problemas reais, denunciando os problemas fictícios e desmascarando os mitos que sustentam um discurso que se traveste como técnico, mas que atende a interesses políticos.
A força desse discurso se materializa na proposição da PEC 241, a PEC da Maldade, que pretende instituir uma austeridade permanente no Brasil a partir de diagnósticos e argumentos equivocados e falaciosos. Na verdade, trata-se da imposição de outro projeto de país, incompatível com a Constituição de 1988 e com a expansão de bens públicos como saúde e educação.
Desde o final de 2014, o Brasil vem sendo submetido à retórica que propõe a austeridade como único caminho para recuperar a economia. Com o objetivo de melhorar as contas públicas e restaurar a competitividade da economia por meio de redução de salários e de gastos públicos, a austeridade se sustenta em argumentos controversos e até mesmo falaciosos. Entre os principais experimentos internacionais, vem predominando resultados contraproducentes, não resultando em crescimento, tampouco equilíbrio fiscal. O que sim é menos controverso é que tais experimentos têm como objetivo redesenhar o papel do Estado para atender interesses velados. No Brasil, o ajuste econômico ortodoxo, iniciado na gestão Levy, fracassou em retomar o crescimento e estabilizar a dívida pública, contribuindo para lançar o país no maior retrocesso econômico das últimas décadas.
Não obstante, o ajuste ajudou a criar as condições necessárias para mudança da correlação de forças políticas e para impor ao país, passando ao largo do crivo das urnas, um outro projeto de sociedade. Nesse contexto, esse documento procede uma análise das finanças públicas e política fiscal no Brasil, procurando esclarecer as principais causas da atual crise fiscal, assim como desconstruir simplificações e mitos, muitos dos quais baseados em argumentos econômicos supostamente técnicos que sustentam a austeridade. O documento também é propositivo ao apontar alternativas fiscais para um projeto de país que valorize a democracia, a distribuição da renda e da riqueza e a expansão dos direitos sociais.
Da agenda Fiesp ao austericídio
A economia brasileira entrou em uma trajetória de desaceleração no quadriênio 2011-2014 depois do desempenho extraordinário durante 2007-2010. Há fatores que escapam à política econômica e explicam essa desaceleração, dentre eles a perda de dinamismo de um ciclo doméstico de consumo e de crédito ou os desdobramentos da crise internacional.
Contudo, é importante apontar que a política fiscal praticada pelo governo contribuiu para essa trajetória de queda do crescimento.
Enquanto no quadriênio 2007-2010 o espaço fiscal foi canalizado prioritariamente para investimentos públicos, no quadriênio 2011-2014 a taxa de investimento parou de crescer e, em compensação, o governo elevou significativamente os subsídios e desonerações ao setor privado. O governo fez uma aposta no setor privado e acreditou que promoveria o crescimento econômico via realinhamento de preços macroeconômicos e incentivos aos investimentos privados - a chamada agenda FIESP. Ironicamente, a FIESP passou de beneficiada das políticas de um governo para algoz do mesmo.
Como resposta ao cenário de piora nos indicadores fiscais provocada pela queda no crescimento econômico e pelas desonerações, o segundo governo Dilma tem início adotando a estratégia econômica dos candidatos derrotados no pleito de 2014, ou seja, realizou um choque de preços administrados e um duro ajuste fiscal e monetário, na esperança de que o setor privado retomasse a confiança e voltasse a investir. Joaquim Levy foi o símbolo da implementação da austeridade econômica no Brasil que consiste em uma política deliberada de ajuste da economia por meio de redução de salários e gastos públicos para supostamente aumentar lucros das empresas e sua competitividade, assim como tentar estabilizar a trajetória da dívida, com resultados contraproducentes.
O forte ajuste fiscal, em uma economia já fragilizada, agravou os problemas existentes e contribuiu para transformar uma desaceleração em uma depressão econômica. O ajuste fiscal promovido se mostrou contraproducente, pois gerou aumento da dívida pública e do déficit público.
Em 2015, por exemplo, os investimentos públicos sofreram queda real de mais de 40% no nível federal, o gasto de custeio caiu 5,3%, e o governo não logrou a melhoria das expectativas dos agentes econômicos que justificaria esse ajuste com vistas a retomar o crescimento. Pelo contrário, a economia real só piorou e as expectativas se deterioraram, apesar de toda a austeridade fiscal manifestada e praticada. Naquele ano, apesar de todo o esforço do governo para reduzir as despesas, que caíram 2,9% em termos reais, as receitas despencaram e o déficit ficou ainda maior, evidenciando o caráter contraproducente do ajuste: o austericídio.
A virada para a austeridade foi um remédio equivocado para os problemas pelos quais a economia brasileira passava. O tratamento de choque fundado em uma contração fiscal, um rápido ajuste na taxa de câmbio, um choque de preços administrados e um aumento de juros contribuiu para criar a maior crise econômica dos últimos tempos. Contudo, para determinados interesses políticos, o ajuste se mostrou funcional ao gerar desemprego, queda de salários reais e assim mudar a correlação de forças para favorecer a imposição de outro projeto de país, sem passar pelo crivo das urnas.
O novo regime fiscal e a imposição de outro projeto de sociedade.
A gestão da política fiscal protagonizada pelo governo Temer lançou sinais contraditórios com relação à continuidade das políticas de austeridade. Para o curto prazo definiu-se o "keynesianismo fisioló-gico" e para o longo prazo, a "austeridade permanente".
O afrouxamento da meta fiscal para 2016 e 2017 evidencia por um lado o pragmatismo econômico e, por outro lado, hipocrisia dos que argumentam pela austeridade e, simultaneamente, passam a defender um déficit primário recorde no novo Governo.
Como medida de longo prazo, o governo Temer propõe estabelecer um "Novo Regime Fiscal" por meio de uma proposta de emenda constitucional (PEC 241) que cria por 20 anos um teto para crescimento das despesas públicas vinculado à inflação. Enquanto a população e o PIB crescem, os gastos públicos ficam congelados.
A proposta apoia-se em argumentos falsos de que nações desenvolvidas usam regras semelhantes. Desde 2011, membros da União Europeia estabeleceram um limite para o crescimento da despesa associado à taxa de crescimento de longo prazo do PIB e não em crescimento real nulo. Na maioria desses países já existe uma estrutura consolidada de prestação de serviços públicos, diferentemente do Brasil onde há muito maiores carências sociais e precariedades na infraestrutura.
Segundo nossas estimativas, a regra implicaria reduzir a despesa primária do governo federal de cerca de 20% do PIB em 2016 para algo próximo de 16% do PIB até 2026 e de 12% em 2036.
Adicionalmente, para que o teto global da despesa seja cumprido - dado que algumas despesas como os benefícios previdenciários tendem a crescer acima da inflação - os demais gastos (como Bolsa Família e investimentos em infraestrutura) precisarão encolher de 8% para 4% do PIB em 10 anos e para 3% em 20 anos, o que pode comprometer o funcionamento da máquina pública e o financiamento de atividades estatais básicas. Essa meta não parece ser realista.
A nova regra não prevê nenhum mecanismo para lidar com crises econômicas ou outros choques. Ao contrário, tende a engessar a política fiscal por duas décadas.
Na verdade, o que o novo regime se propõe a fazer é retirar da sociedade e do parlamento a prerrogativa de moldar o tamanho do orçamento público, que passará a ser definido por uma variável econômica (a taxa de inflação), e impor uma política permanente de redução relativa do gasto público.
Em suma, trata-se da imposição de um projeto de país que dificilmente passaria no teste de um pleito eleitoral, única forma de garantir sua legitimidade.
Quem ganha? Quem não quer financiar os serviços públicos por meio de impostos e o grande capital que enxerga o Estado como concorrente quando esse ocupa setores que poderiam ser alvo de lucros privados, como saúde e educação.
Quem perde? A população mais pobre, isto é, aqueles que são os principais beneficiários dos serviços públicos. Além disso, aqueles que vislumbram uma sociedade mais justa e igualitária.
O falacioso discurso da austeridade
A austeridade é uma política deliberada de ajuste da economia por meio de redução de salários e gastos públicos supostamente com o objetivo de reduzir a dívida e aumentar lucros e a competitividade das empresas.
A recomendação de que o Estado deve cortar gastos em momentos de crise parte de uma falácia de composição que desconsidera que se todos os agentes cortarem gastos ao mesmo tempo, inclusive o Estado, não há caminho possível para o crescimento. A solução mais razoável para tratar de um desajuste fiscal em meio a uma recessão é, portanto, estimular o crescimento, não cortar gastos.
No círculo vicioso da austeridade, cortes do gasto público induzem a redução do crescimento que provoca novas quedas da arrecadação que, por sua vez, exige novos cortes de gasto. Esse círculo vicioso só pode ser interrompido por decisões deliberadas do governo, a menos que haja ampliação das exportações líquidas em nível suficiente para compensar a retração da demanda interna, pública e privada. Esta exceção é pouco provável diante de uma crise internacional como a que o mundo enfrenta nesta década, com lenta recuperação da demanda e maior competição pelos mercados.
A obsessão alarmista contra qualquer elevação da dívida pública esconde uma agenda política permeada por interesses de grupos econômicos, mas travestida como uma questão meramente técnica, seja ao defender a retração de bancos públicos, seja ao demandar a redução dos gastos sociais.
No fundo, a austeridade é principalmente um problema político de distribuição de renda e não um problema de contabilidade fiscal. Os efeitos da austeridade afetam de forma distinta os diferentes agentes econômicos e classes sociais de forma que os mais vulneráveis, que fazem mais uso dos serviços sociais, são mais afetados.
Apesar das inúmeras evidências contrárias à sua eficácia, a austeridade persiste como ideologia e sempre retorna ao debate político por ser oportuna para os grupos dominantes de poder.
A insensatez do superávit primário
O regime fiscal brasileiro é extremamente pró-cíclico, ou seja, acentua as fases de crescimento e de recessão. Assim, em contextos de baixo crescimento, a busca pelo cumprimento da meta fiscal por meio de uma política fiscal contracionista retira estímulos à demanda agregada e reduz ainda mais o crescimento econômico e a própria arrecadação.
Um segundo fator a se sublinhar sobre o regime fiscal brasileiro é sua natureza "anti-investimento", porque, diante de uma estrutura de gastos públicos rígida, os cortes de despesa recaem primordialmente sobre o investimento público, um dos poucos gastos passíveis de contingenciamento. O mesmo regime impõe uma lógica curto-prazista à gestão da política fiscal e subordina o planejamento governamental.
Na ditadura do superávit primário, os fins são atropelados pelos meios, e tudo se submete à necessidade de cumprir a meta de curto prazo, inclusive o próprio crescimento, o emprego e o bem estar da população. Portanto, um novo modelo de gestão fiscal precisa ser constituído, de caráter anticíclico, que viabilize o planejamento e que priorize o investimento público.
Há diversas variantes institucionais para um regime fiscal, dentre essas estão as que estipulam metas fiscais ajustadas ao ciclo econômico, como a meta de "resultado fiscal estrutural". Ou alternativamente, pode-se adotar bandas fiscais de forma análoga ao que ocorre no regime de metas de inflação. Ainda há a opção, aplicada em alguns países, de retirar todo investimento público do cálculo do superávit primário (assim como o gasto com juros é excluído desse indicador) e assim incentivar o uso do investimento público como vetor de desenvolvimento e abrir espaço para atuação anticíclica do gasto público.
Desmistificando a dívida pública
A dívida brasileira é tão grande? Qual é o parâmetro para definição de "grande"? Na verdade, poucos economistas se arriscam a definir um parâmetro ótimo para dívida pública, simplesmente porque as evidências não parecem indicar que esse patamar exista. Não há um número mágico a partir do qual a relação dívida pública/PIB torna-se problemática. Isso vai depender das especificidades de cada país.
No Brasil, a excessiva preocupação com o patamar da dívida é carregada por preconceitos ideológicos e por uma visão estreita sobre a relação entre Estado, moeda estatal e dívida pública. Uma dívida elevada pode custar muito caro, mas um Estado soberano não quebra por conta de dívidas na sua própria moeda. Por isso, a natureza da dívida pública se diferencia substancialmente da gestão de dívidas privada e o governo não incorre nas mesmas restrições para gasto e endividamento. O paralelo com a economia da dona de casa não serve para as finanças públicas.
Entre 2003 e 2013 a redução da relação dívida líquida/PIB foi expressiva, de 54,3% para 30,6%, muito embora as taxas de juros continuassem pesando no orçamento público.
A dívida externa pública, por sua vez, caiu e, a partir de 2006 o país passou a realizar uma política de acumulação de reservas cambiais, tornando-se credor externo líquido. Por conta disso, quando em 2008 a crise mundial determinou forte depreciação da moeda brasileira, a acumulação de reservas cambiais propiciou significativos ganhos patrimoniais para o Estado brasileiro.
No final de 2014, pelo critério da dívida líquida não havia um cenário de tragédia fiscal, desenhado pelos economistas da mídia e do mercado. Havia sim, condições financeiras para realizar uma política anticíclica que ampliasse o investimento público e o gasto social para impedir que a desaceleração cíclica se transformasse em uma depressão. À época, a necessária e esperada desvalorização cambial apenas contribuiria para reduzir o patamar da dívida líquida, ampliando o espaço fiscal para políticas de estímulo ao crescimento.
Apesar da redução substancial da dívida líquida, na última década a dívida bruta manteve-se relativamente estabilizada e passou a crescer a partir de 2013. Diferentemente do senso-comum, essa dinâmica da dívida bruta não é explicada pela "gastança do governo" ou o resultado primário, mas principalmente pela acumulação de ativos por parte do Estado como a acumulação de reservas cambiais e de créditos junto ao BNDES.
Essa estratégia possui méritos como, por exemplo, a redução da vulnerabilidade externa do setor público. Da mesma forma a política de expansão dos empréstimos doBNDES, em 2009, foi importante para a ação contracíclica que assegurou a recuperação rápida da economia brasileira na maior crise da história do capitalismo mundial desde a década de 1930. No entanto, não devemos negligenciar seus elevados custos.
A estratégia de acumulação simultânea de ativos e passivos, com grande diferencial de rentabilidade entre eles, explica boa parte da elevada conta de juros. Em 2015, domando-se os custos de oportunidade da manutenção das reservas internacionais e dos créditos ao BNDES com o resultado das operações de swaps cambiais, chegamos a 4,9% do PIB.
Em suma, se o objetivo for equacionar a dívida bruta é preciso desatar o nó da gestão macroeconômica, reduzir substancialmente o gasto com juros e ponderar o custo da estratégia de acumulação de ativos. A ideia que se disseminou no Brasil de que ao governo só compete controlar os gastos primários, desconsiderando os custos e benefícios fiscais das demais políticas macroeconômicas, deve ser revista e amplamente debatida.
Mito da gastança federal
O diagnóstico convencional da crise pela qual passa o país se traduz simplificadamente na seguinte narrativa: os governos do PT expandiram demais os gastos públicos, encobriram o déficit público crescente por meio da chamada "contabilidade criativa" e das "pedaladas fiscais" e esse tipo de política fiscal expansionista e nada transparente destruiu a confiança do mercado e mergulhou o paisana estagflação.
Contudo, a análise dos dados mostra que, de fato, a despesa do governo vem crescendo a um ritmo elevado e estável há tempos. As taxas médias de crescimento real do gasto do governo federal dos últimos quatro governos foram: FHC II (3,9%), Lula I (5,2%),Lula II (5,5%) e Dilma I (3,8%).
O principal fator por detrás do crescimento das despesas na esfera federal não são os gastos com pessoal, como muitos acusam. Estes crescem sistematicamente abaixo do PIB e tiveram sua menor taxa de expansão real justamente no governo Dilma I (-0,3%), ao contrário do que ocorre, por exemplo, nos estados e municípios, onde o gasto com salários e aposentadorias de servidores tem crescido a 5,5% ao ano, independentemente da coloração partidária do governante.
O motor do gasto federal tem sido os benefícios sociais (aposentadorias e pensões doINSS, benefícios a idosos e deficientes, seguro-desemprego, bolsa família, etc), que hoje consomem metade do gasto da União (mais de R$ 500 bilhões em 2015) e crescem a taxas sistematicamente superiores ao PIB pelo menos desde 1999, por influência principal de fatores demográficos, da justa formalização e dos direitos consagrados na Constituição e, adicionalmente, pela política de valorização do salário mínimo.
Porém, uma visão mais acurada dos gastos sociais mostra que tampouco nesta área houve expansão desenfreada, sobretudo frente às demandas sociais brasileiras, e que a política de valorização do salário mínimo contribuiu para este cenário, mas com impactos sobre a redução da desigualdade relevantes. Certamente é possível discutir excessos e tornar o gasto mais eficiente, mas as possibilidades de fontes de financiamento discutidas neste documento evidenciam que este é um debate que deve envolver toda a sociedade brasileira.
Vale notar que, a despeito de gastos elevados, o governo conseguiu manter resultados fiscais positivos na última década e meia pelo aumento da carga tributária (1999-2005) ou pelo crescimento mais acelerado do PIB (2006-2011). Nos governos Lula, enquanto o país crescia, não havia desajuste fiscal apesar do crescimento do gasto público. Mas a partir de 2012, com a queda do crescimento econômico e com as desonerações tributárias, houve uma piora dos resultados fiscais.
Reforma tributária, já!
A estrutura tributária brasileira é extremamente perversa com os mais pobres e aclasse média e benevolente com os mais ricos. Esse sistema singular é reflexo tanto do federalismo brasileiro e da dualidade tributária (impostos e contribuições sobrepostos), quanto de algumas recomendações de política que o mainstream econômico propagou nas décadas de 80 e 90 e que foram incorporadas de forma bastante acrítica ou peculiar pelo Brasil.
A agenda de reformas da tributação sobre a renda e o patrimônio, que envolve um forte conflito distributivo, permaneceu totalmente embargada nos últimos 20 anos, não tendo o governo federal apresentado qualquer proposta de reforma mais substancial que visasse ampliar a progressividade ou mesmo corrigir as graves distorções ensejadas pela atual legislação.
O Brasil foi um dos primeiros países e até hoje um dos poucos que isentou e continua isentando de imposto de renda os dividendos distribuídos a acionistas, tal como a pequena Estônia.
De acordo com os dados das declarações de imposto de renda, as 70 mil pessoas mais ricas do Brasil, representando meio milésimo da população adulta, concentram 8,2% do total da renda das famílias, índice este que não encontra paralelo entre as economias que dispõem de informações semelhantes. Esse mesmo seleto grupo pagou apenas 6,7% de imposto de renda sobre esse montante.
Além de injusta, essa assimetria entre o tratamento tributário dispensado a dividendos e salários tem sido responsável por um fenômeno conhecido por "pejotização", que é a constituição de empresas por profissionais liberais, artistas e atletas com o objetivo de pagar menos impostos do que como autônomos ou assalariados.
Nesse contexto, a proposta de se aumentar alíquotas do imposto de renda das pessoas físicas sem revogar a isenção de dividendos não proporciona uma redistribuição de renda tão efetiva uma vez que as alíquotas progressivas da tabela do Imposto de Renda (IRPF) só atingem os "rendimentos tributáveis", o que não inclui atualmente adistribuição de lucros e dividendos que são as principais fontes de renda dos mais ricos. Então, qualquer proposta de reforma do imposto de renda que não passe pela tributação dos dividendos não será tão efetiva nos objetivos de contribuir com uma maior justiça fiscal e também gerar receitas extras para o governo.
Na atual conjuntura de crise, é pouco razoável crer na possibilidade de um equilíbrio fiscal com baixo crescimento. Isso implica que, no curto prazo, deveríamos no mínimo assegurar espaço fiscal para o investimento público e para gastos sociais de elevado impacto sobre o bem-estar das camadas mais vulneráveis da população.
Uma reforma tributária, que combine eficiência e equidade poderia atuar incentivando o crescimento econômico de longo prazo ao reduzir a tributação do lucro e da produção das empresas, ao mesmo tempo em que concentra o ajuste fiscal de curto prazo sobre uma pequena parcela da poupança dos mais ricos, não diretamente relacionada ao investimento, e, por conseguinte, vinculada a um maior nível de emprego e produto. Assim, ganha-se tempo para aprimorar outras propostas de reformas estruturais das despesas, debatê-las com a sociedade e pactuá-las democraticamente.
Leia a íntegra na Versão digital ou na versão PDF: Austeridade e Retrocesso Austeridade e Retrocesso: Finanças Públicas e Política Fiscal no Brasil.  http://brasildebate.com.br/wp-content/uploads/Austeridade-e-Retrocesso.pdf
Fonte: IHU On Line/Brasil Debate.

Link original desta materia: http://port.pravda.ru/cplp/brasil/13-10-2016/41918-documento_pec-0/