quinta-feira, 18 de outubro de 2018

Bem-vindos ao G-20 dos Infernos, por Pepe Escobar.


 14/10/2018, Pepe Escobar, Asia Times

“Ê-ê gostosura de fim de mundo...
Deus mesmo, quando vier, que venha armado.
P’ra trás! P’ra trás! Chegou a minha vez!”

A Hora e a Vez de Augusto Matraga, 1965, Brasil, Roberto Santos, diretor)*

Traduzido pelo Coletivo Vila Mandinga

A reunião do G-20 em Buenos Aires, dia 30 de novembro pode pôr fogo no planeta – talvez literalmente. Comecemos pela guerra comercial EUA-China. Washington nem começará a discutir comércio com a China no G-20, se Pequim não comparecer com lista muito detalhada de concessões.

O mundo para os negociadores chineses não é sombrio, de modo algum. É possível alcançar alguma espécie de acordo sobre um terço das exigências dos EUA. Depois se pode conversar sobre mais outro terço. Mas o último terço está absolutamente fora de qualquer discussão – porque já imperativos da segurança nacional da China, como não admitir a abertura do mercado da nuvem de computação doméstica para concorrentes estrangeiros.

Pequim mandou o vice-primeiro-ministro Liu He e o vice-presidente Wang Qishan para supervisionarem todas as negociações com Washington. Todos esses têm diante deles tarefa dificílima: conseguir penetrar o muito limitado espectro de atenção do presidente Donald Trump.

Como se não bastasse, Pequim exige “pessoa de ponta” com autoridade para negociar em nome de Trump – considerando o complexo engarrafamento de mensagens que brigam para sair de Washington.

Agora comparem isso e a mensagem disparada pelo instituto de pesquisa que leva o fabuloso nome de “Pensamento de Xi Jinping sobre o Socialismo com Características Chinesas para uma Nova Era Integrado à Escola do Partido do Comitê Central do Partido Comunista da China (PCC)”: os EUA iniciaram o “atrito comercial” para impedir o avanço de modernização industrial da China.” 

É o pensamento consensual na cúpula.

E o confronto pode ainda piorar. O Vice-presidente Mike Pence acusou a China de “intrometer-se na democracia norte-americana”, de fazer “diplomacia de dívida”, de “manipular a moeda” e de “roubar IPs”. Em Pequim, o ministro de Relações Exteriores descartou a lista toda, como “ridícula.”

Entende-se melhor se se examina com muita atenção o que o ministro de Relações Exteriores Wang Yi disse ao Conselho de Relações Exteriores – o mais diplomaticamente possível: “A China seguirá uma trilha de desenvolvimento diferente das potências históricas”. E a China não buscará a hegemonia.

Do ponto de vista da Estratégia de Segurança Nacional dos EUA, é irrelevante; a China já foi eleita como concorrente feroz e talvez também como ameaça. O presidente Xi Jinping não cederá às demandas comerciais de Washington. Assim sendo, preparem-se para uma não reunião entre Xi e Trump em Buenos Aires.

A ameaça de um primeiro ataque nuclear 

As coisas parecem ainda mais cabeludas no front russo. Apesar de toda a paciência taoísta do ministro de Relações Exteriores Sergey Lavrov, os círculos diplomáticos de Moscou estão exasperados com ameaças sérias que os norte-americanos têm feito – como a ameaça de a Marinha dos EUA implantar um possível bloqueio para restringir o comércio de energia da Rússia. Ou, pior: o ultimatum de que a Rússia interrompa o desenvolvimento de um míssil que, para Washington, violaria o Tratado das Forças Nucleares de Médio Alcance [ing. Intermediate-Range Nuclear Forces (INF) Treaty, ou o Pentágono o destruirá.

Nada poderia ser mais sério – porque é os EUA ameaçando com um primeiro ataque nuclear.

Paralelamente, o presidente executivo da British Petroleum, Bob Dudley disse à conferência Oil & Money em Londres, que qualquer nova sanção dos EUA contra as grandes empresas russas de energia seria desastrosa. “Se houvesse sobre as empresas Rosneft ou Gazprom ou Lukoil sanções semelhantes às que foram impostas à Rusal, os sistemas de energia para a Europa estariam derrubados; é acontecimento extremo” – disse ele.

No front dos BRICS, Rússia e Índia manobraram com habilidade por conta própria e frustraram alguns dos planos estratégicos dos EUA contra os três principais polos da integração da Eurásia: Rússia, China e Irã.

O “Quad” – EUA, Japão, Austrália e Índia – foi concebido para cercar  a China no Indo-Pacífico, além de estreitar a margem de manobra da Rússia. O “Quad” não está na melhor forma imaginável depois que a Índia decidiu comprar sistemas de mísseis russos S-400. Trump jurou vingança.

Além do negócio dos S-400s, empresas russas construirão mais seis reatores nucleares na Índia, ao custo de $20 bilhões cada, ao longo da próxima década. Rosneft assinou acordo para, em dez anos, vender à Índia 10 milhões de toneladas de petróleo por ano. E a Índia continuará a comprar petróleo do Irã, pagando em rúpias.

No front da União Europeia, o caso é a Alemanha. Há poucas ilusões em Berlin sobre o oscilante futuro da União Europeia (UE). A economia alemã centrada na exportação é focada na Ásia. A Alemanha está redobrando esforços para firmar um modelo de estilo asiático – umas poucas grandes empresas que são campeãs nacionais, capazes de super turbinar as exportações. O mercado norte-americano – sob ventos protecionistas – já não passa de segunda possibilidade.

Tóxicos Trópicos 

E há também a tragédia brasileira. O presidente Mauricio Macri arruinou a Argentina com um “choque neoliberal”. O país foi entregue como refém ao FMI.

Cenário possível é um G-20 no qual a Argentina aprenderá a lidar com um fascista na presidência de seu vizinho e principal parceiro comercial, o Brasil.

Ex-paraquedista, Jair Bolsonaro é xenófobo e misógino, mas não é nacionalista. Esse Messias tropical [nome completo é Jair Messias B.] faz continência à bandeira dos EUA, logo no café da manhã. Seu homem para a economia é um Chicago Boy com tendências a vender o país na bacia das almas – para delícia de “investidores” e especialistas em “mercados” de New York e Zurique, até Rio e São Paulo.

Esqueçam assunto de criar empregos ou, sequer, de tentar resolver os imensos problemas sociais do Brasil: desigualdade social feroz, investimentos que faltam para saúde e educação, insegurança urbana. A única “política” de Bolsonaro é armar a população, para uma espécie de Mad Max remix.

Tudo, em governo Bolsonaro, deve seguir a regra sem mercê de um “livre” mercado Hobbesiano. Esqueçam qualquer possibilidade de intervenção moderadora do Estado nas relações complexas entre Capital e Trabalho.

É o ápice de processo complexo iniciado há anos, em think tanks como a Atlas Network, rios de dinheiro e, por último, mas não insignificante, um tsunami de evangélicos/neopentecostais.

Os pilares da carnificina do Brasil são poderosos interesses do agronegócio e da exploração mineral, a mídia-empresa brasileira tóxica, evangélicos, um setor financeiro totalmente rendido a Wall Street, indústria de armas, judiciário, polícia, serviços de inteligência e forças armadas completamente partidarizadas.

As estrelas do show são, claro, o bloco BBB, Boi, Bíblia, Bala – com legiões de representantes no Congresso – tudo ‘fiscalizado’ pelo Deus Mercado.

O neoliberalismo jamais vence eleições no Brasil. Assim, o único modo de fazer as tais ‘reformas’ é mediante uma ação tipo Pinochet-de-segunda-mão. Deve-se esperar agitação social, matança indiscriminada de líderes indígenas e de movimentos pró reforma agrária, arrasadora fartura para a indústria de armas, bancos festejando presentes de Natal todas as semanas, repressão abissal à cultura, desnacionalização absoluta da economia, e trabalhadores e aposentados pagando pelas tais ‘reformas’. Business, como sempre, pode-se dizer.

Os traços fascistas de Bolsonaro não estão sendo normalizadas só pelos poderes em ação no Brasil. O ministro de Relações Exteriores da Argentina Jorge Faurie descreveu-o como político “de centro-direita”.

Pequim e Moscou – por motivos BRICS – e a União Europeia em Bruxelas estão estarrecidos com a queda do Brasil nesse sorvedouro. Rússia e China contavam com um Brasil forte que contribuísse para um mundo multipolar como aconteceu nos governos do presidente Lula, que foi uma das grandes forças que conduzia os BRICS.

Quanto à União Europeia, é difícil engolir governante fascista na chefia de seu principal parceiro econômico na América Latina, coração do Mercosul. Para todo o Sul Global, a implosão do Brasil, um dos líderes do movimento, é tragédia sem remédio.

Façam as contas: Washington em surto de ameaças e sanções. Uma União Europeia fraturada até a medula – denunciando um iliberalismo asiático, ao mesmo tempo em que, em casa, é impotente para resistir à “ascensão dos deploráveis”. Os BRICS em total desmonte, com dois dos estados-membros em conflito grave com Washington, um fora de jogo e outro em cima do muro – dentre os quatro principais. A Casa de Saud em putrefação galopante que se alastra de dentro para fora. O Irã ainda distante, até, da mesa do G-20. Só resta cantar What a Wonderful World.*******


* Epígrafe acrescentada pelos tradutores.


quarta-feira, 17 de outubro de 2018

Maranhão. ANTT atende recomendação em parte do MPF e promove nova audiência pública para discutir concessão de estrada de ferro Carajás.

Foto da audiência pública mostrando a mesa principal e o público presente.
ANTT promoveu a segunda sessão da audiência pública presencial, em São Luís (MA), sobre a prorrogação antecipada da concessão da Estrada de Ferro Carajás.
Representantes do MPF fizeram, ao final, considerações quanto às ações nacionais e locais do órgão em relação à prorrogação antecipada de concessões de estradas de ferro.

Atendendo parcialmente à recomendação nº 13/2018, proposta pelo Ministério Público Federal (MPF) em 10 de outubro, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) promoveu a segunda sessão da audiência pública presencial nº 9/2018, no Rio Poty Hotel, em São Luís (MA), sobre a prorrogação antecipada da concessão da Estrada de Ferro Carajás (EFC) – administrada pela Vale.
A atuação da Procuradoria da República no Estado do Maranhão é fruto de uma ação coordenada no âmbito da Câmara do Consumidor e Ordem Econômica do MPF (3ªCCR), que acompanha, desde o ano passado, a política de governo no sentido de prorrogar antecipadamente concessões no setor ferroviário. A recomendação nº 13/2018 foi elaborada a partir dos fatos presenciados pelo MPF na primeira sessão da audiência pública, em que diversos problemas foram identificados, tais como: o atraso de, aproximadamente, 45 minutos, que causou a saída de muitos inscritos para a hora do almoço antes que lhes fosse dada a palavra e o tamanho do auditório onde foi realizada a audiência – que não possuía espaço físico suficiente para abrigar todos os interessados em participar.
A recomendação de realização de nova audiência pública partiu da necessidade de ampliar o debate e aprimorar os estudos realizados no processo de prorrogação da concessão. Além disso, com a prorrogação do prazo para envio de contribuições escritas sobre a renovação da concessão ferroviária, mais pessoas puderam ter suas dúvidas respondidas.
Representantes do MPF estavam presentes e, ao final, fizeram considerações quanto às ações nacionais e locais do Ministério Público Federal em relação ao processo de prorrogação antecipada das concessões de estradas de ferro.
Assessoria de Comunicação - Procuradoria da República no Maranhão - Tel.: (98) 3213-7161 - E-mail: prma-ascom@mpf.mp.br - Twitter:@MPF_MA.



segunda-feira, 15 de outubro de 2018

Maranhão. Mineradora deve paralisar atividades por causar impacto à comunidade quilombola.

Foto mostra o momento de uma explosão, com a poeira subindo.
Imagem: iStock #PraCegoVer: explosão de rochas em pedreira

Justiça reconheceu riscos em razão da utilização de explosivos para as rochas. 

O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) manteve a decisão de paralisar as atividades da empresa Impar Serviços de Mineração no município de Rosário (MA), por causar transtornos e oferecer riscos à Comunidade Quilombola de Miranda. 

No trâmite da ação proposta pelo Ministério Público Federal, a empresa admitiu que não apresentou estudo de impacto ambiental e o respectivo relatório, que deveriam ter sido submetidos à aprovação do órgão estadual competente e do Ibama para extração de minério na região, conforme exige a legislação.

O desembargador Hilton Queiroz, relator do caso, explicou que o estudo de impacto ambiental e o respectivo relatório se prestam a diagnosticar situações, antever riscos e indicar medidas de mitigação ou de compensação. "Tem um conteúdo substancial e uma finalidade protetiva, a qual não foi observada no caso concreto", disse. Ele também observou que "os empreendimentos de mineração e beneficiamento ocasionam riscos à incolumidade pública, consoante vistoria realizada pela Defesa Civil, em razão da utilização de explosivos para as rochas, inclusive em período noturno”.

Durante o processo, o MPF demonstrou que a empresa ofende direitos da comunidade quilombola, que não foi sequer ouvida quando do processo de licenciamento ambiental. "Esse fato, por si só, demonstra que a atividade empresarial não observou a necessidade de consulta livre, prévia e informada", diz o procurador regional da República Felício Pontes Jr.

Segundo ele, a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Decreto Legislativo nº 143/2002 e promulgada pelo decreto nº 5051/2004, garantiu a participação dos povos e comunidades tradicionais em ação que visa a proteger os seus direitos. Além disso, o documento exige dos órgãos governamentais o respeito aos valores culturais do habitat ocupado pelas comunidades tradicionais. "Não se pode justificar qualquer obra desenvolvimentista ao arrepio da legislação", defende o procurador.

A Justiça Federal do Maranhão já tinha deferido parcialmente a antecipação de tutela pedida pelo MPF para suspender a eficácia das licenças ambientais concedidas aos empreendimentos e para determinar a imediata paralisação das atividades minerárias na região, inclusive a de pesquisa mineral.

Segundo a decisão que foi questionada pela empresa junto ao TRF1, a prova produzida demonstra a existência de grande impacto ambiental negativo resultante dos empreendimentos, já que a exploração de minério é acompanhada de abertura de grandes crateras, supressão de vegetação e utilização de enormes quantidades de explosivos (12 mil kg por mês) próximos, inclusive, de local ancestralmente ocupado por comunidade quilombola.

A incompatibilidade entre o exercício de tal atividade econômica e a manutenção do modo de vida da comunidade quilombola foi reconhecida, inclusive, pela Secretaria Estadual (Sema) e pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

Agravo de Instrumento nº 0038568-32.2014.4.01.0000/MA
Assessoria de Comunicação - Procuradoria Regional da República da 1ª Região - (61) 3317-4583/ 4862 - www.mpf.mp.br/regiao1 - Twitter: @MPF_PRR1.


Moinhos de Vento ou Reflexões sobre a Eleição de 7 de outubro de 2018.

Moinhos de Vento ou Reflexões sobre a Eleição de 7 de outubro de 2018. 29696.jpeg

Os jornais, impressos e virtuais, noticiaram como manchete, na segunda-feira, após as eleições de 7 de outubro, a vitória da direita: "onda de direita", "virada à direita". Teria efetivamente ocorrido?
por Pedro Augusto Pinho
"Os fatos históricos estão sujeitos a uma dupla ordem de especulação e de conhecimento: em primeiro lugar podem ser vistos e estudados como um fato, que se verificou em condições de tempo e de espaço determinadas. Partindo desse ponto de vista, o conhecimento que obtemos é descritivo, e nele se compreende não só a identificação e caracterização do fato, como o estudo de seus antecedentes, das influências externas ou internas que agiram sobre ele e sobre seu protagonista. A segunda ordem de conhecimento a que me refiro é o conhecimento simbólico: um fato histórico ao se projetar no tempo adquire um sentido.... Depois de iluminar o mundo real, tornando-se inteligível, um incessante intercâmbio se inicia, pois irradia sobre a existência a sua força persuasiva, e recebe da consciência humana novos matizes de compreensão" (San Tiago Dantas, D.Quixote um apólogo da alma ocidental, 1947).
Os jornais, impressos e virtuais, noticiaram como manchete, na segunda-feira, após as eleições de 7 de outubro, a vitória da direita: "onda de direita", "virada à direita". Teria efetivamente ocorrido?
Confronto dos dados com as interpretações
Tomemos para análise o mais importante órgão representativo da democracia brasileira, o Congresso Nacional.
Considerando como de centro-esquerda, esquerda ou extrema-esquerda os parlamentares do PT, PSB, PDT, PSOL, PCdoB, PPL, Rede, PMN e PV, temos, na atual legislatura, 129 deputados federais. Teremos 142, em 2019.
No entanto, quer para esta conta quanto aquela para os partidos à direita, não é o raciocínio, a lógica política e ideológica que prevalecem. São as emoções e as questões pessoais que movem os parlamentares, seres humanos. Vejamos, por exemplo, Marina Silva. Seu posicionamento político a colocaria à esquerda, mas seu ódio a Lula e a Dilma, que ela considera usurpadora de seu direito de candidata do PT à eleição em 2010, supera a lógica partidária.
Também questões municipais, estaduais, rixas de família levam a estes partidos de esquerda - como os de direita - políticos que não comungam com seus posicionamentos programáticos.
Nos partidos de direita, o que se observou foi a migração do centro-direita e da direita para a extrema-direita. PSDB sai de 49 para 29 deputados federais; o DEM de 43 para 27, o PP de 40 para 36 e o PR de 38 para 33 parlamentares.
O Congresso Brasileiro sempre foi majoritariamente de direita, em suas diversas expressões. A esquerda sempre foi minoria, oposição. Os avanços sociais foram obtidos por acordos e sujeições a interesses menores. Os avanços nacionalistas a governos fortes, autoritários ou ditatoriais, deixando esta qualificação aos sentimentos dos leitores.
Em sua coluna, Fatos&Comentários, no jornal Monitor Mercantil de 08/10/18, o percuciente Marcos de Oliveira escreve: "Candidatos a governador parecem síndicos de massa falida, longe da questão nacional. Presidenciáveis são pressionados a revelar quantos policiais vão contratar ou quantas creches construir. Nada sobre a direção do Estado brasileiro, um projeto de país ou forma de unir a nação".
Brasil é slogan, não um país em busca da Soberania
Desde que a banca, como designo o sistema financeiro internacional, assumiu o poder e mesmo antes, quando destronava o capitalismo industrial, o desmantelamento dos Estados Nacionais vem sendo um de seus objetivos. E dos mais incisivos.
Nesta e em outras ações, a banca busca colocar questões que não evidenciem seus objetivos, desconcertem os opositores, ganhem adeptos e iludam a todos. Dentre estas estão as questões que denomino transversais, pois são comuns a todas as sociedades, representam um momento da construção civilizatória.
Para a banca a morte das baleias, o envenenamento por agrotóxicos da alimentação infantil, o femininocídio são questões irrelevantes. Importa transferir para as finanças os ganhos dos lucros industriais, as receitas das locações e maiores parcelas dos salários. E promover permanentemente a concentração de renda.
Nesta eleição de 2018 a banca colocou duas questões: a corrupção e a violência.
Ambas começaram bem antes, para que fosse construído um cenário que colocasse o Partido dos Trabalhadores (PT) no foco da culpa, da criminalização. Tiveram início com a primavera de 2013 (recordar as primaveras que destruíram os países árabes do norte da África e do Oriente Médio, escapando os aliados Arábia Saudita, Kuwait, Catar) e com a Lava Jato (lembrar as "Lava Jato" no Equador, na Argentina, no Peru, na África do Sul e na Guiné Equatorial).
Bastam estes exemplos para ver que nada há de nacional brasileiro, mas a articulada e internacional investida contra governos e países que não se submeteram à banca. Vejam-se também os políticos favoráveis ao Brexit e a posições nacionalistas na Europa. Como diz o competente jornalista Beto Almeida, "desconheço teorias conspiratórias, mas sempre encontrei práticas conspiratórias".
Corrupção
A corrupção é velha e conhecida imputação, no Brasil e no mundo, a políticos e partidos que lutam pela maioria desfavorecida, que se insurgem contra os poderes dominantes. Assim foi com Getúlio Vargas, com Juscelino Kubitschek, com João Goulart, com Lula. Só escaparam Médici e Geisel pois, além da política nacionalista e não dirigida diretamente aos pobres, seriam carimbados como torturadores e assassinos.
A colonizada elite brasileira, escravista e rentista, aproveitou, com apoio do juridicismo ianque, para criminalizar o partido que a vinha derrotando em eleições sucessivas para o executivo nacional.
Criou-se, então, o mito da corrupção petista embora a maioria dos políticos envolvidos em casos de corrupção fossem do PP, do PSD, do PSDB e do DEM. E, embora seja impossível haver corrupção sem que haja envolvimento dos bancos, nenhum foi sequer citado nas investigações. Um estranho e misterioso fenômeno que movimenta milhões de reais, de dólares, no Brasil e no exterior, à margem da participação dos bancos!
O uso político da corrupção já deveria ser do conhecimento de todos se houvesse um mínimo de racionalidade ou um pouco menos de emotividade no acompanhamento dos fatos e personagens políticos.
Violência
Há violência nos tráficos de droga, de armas, da inominável mercantilização de pessoas e órgão humanos. E a banca fatura todos estes e muitos outros crimes execráveis.
Para que não seja uma afirmação vã, recorro-me dos dados do FMI. Na década 1990/2000, a primeira em que a banca controlou as finanças então desreguladas, a economia cresceu 1,5 vezes, malgrado a recessão industrial. Compare-se com os 2,1 dos anos 1980 a 2000. Não é difícil concluir que a banca absorveu enormes quantidade de valores ilicitamente obtidos e acumulados em  ações contra a humanidade.
Com sua amoralidade, a banca alia-se à esquerda e à direita, aos crimes e às religiões. É um fator desestabilizador das sociedades.
No Brasil a violência tem origem antiga, na escravização e morte de índios, na importação de africanos para o trabalho escravo e mesmo na forma como se deu a "libertação dos escravos", lançados à própria sorte.
A violência se insere na questão nacional. Na construção de um país que dê garantias aos direitos, às pessoas e às instituições e patrimônios. Vivemos, principalmente com o golpe de 2016, uma demolição, um desmonte das instituições criadas pela Constituição de 1988.
Pode-se afirmar que se vive, atualmente, mais do que em qualquer outra época, inclusive dos regimes autoritários, com a insegurança jurídica no Brasil.
Não é questão de distribuição de armas - que fará, de uma fechada no trânsito, um homicídio - nem da violência policial, conhecida por negros e pobres, e os que de tão pobres viram negros.
É, antes de tudo, uma questão nacional, da reestruturação do Estado, em moldes brasileiros, com as culturas e soluções nacionais, com os recursos por todos entendidos e capazes de serem aplicados, que dê ao povo, de todas as raças e economias, segurança e confiança no Estado.
Próximos Passos
Tenho para mim que qualquer resultado deste próximo segundo turno causará enorme decepção aos brasileiros.
Nos limites nacionais por Congresso e Assembleias eleitos em clima de ódio e desforra, excluindo as vozes da ponderação e do acordo, e sem projeto para o País. Será tomado por um novo centrão, ávido de mostrar poder e de enriquecer num sistema institucional carcomido.
Na área internacional pela crise que tornará as de 1929 e de 2008 "marolinhas".
Examinem os analistas que estão vendo a construção desta crise desde 2010, como os franceses signatários do "Manifeste des Économistes Atterrés" e os economistas do Fundo Monetário Internacional (FMI). Este organismo acaba de divulgar que a dívida global bateu, em setembro de 2018, novo recorde - US$ 182 trilhões - 60% maior do que a de 2007.
Em abril de 2016, escrevi "Haverá crise em 2016?", onde após discorrer sobre as crises da Era da Banca, previa que esta próxima teria na Europa seu epicentro. Em análises anteriores, supus que o "think tank" da banca temia que esta crise, pelas dimensões e alcance nas principais moedas do ocidente - euro, libra inglesa, franco suíço e dólar estadunidense - mais do que um tsunami financeiro e econômico causasse prejuízo à civilização ocidental. Ou seja, o fluxo civilizatório, após mais de seis séculos, mudaria o sentido de ocidente para oriente para oriente-ocidente.
A presença econômica e cultural, que já se observa, será mais forte, mais intensa e, provavelmente, como anteviu Monteiro Lobato, em "O Presidente Negro", trocaremos o "american way of life" por um "asian mood".
Que importância terá esta crise para nossa Pátria?
Defesa Nacional
Desde o fim dos governos militares, em especial com os do PSDB, o Brasil abandonou qualquer estratégia de construção de país soberano. Salvo algumas ações dos governos de Lula e Dilma, as Forças Armadas foram alijadas do projeto de desenvolvimento nacional. Grave erro. Os Estados Unidos da América (EUA), no período de predominância do capitalismo industrial, desenvolveram o complexo industrial-militar, que sobrevive em algumas áreas.
Mas fortaleceu, com o domínio da banca, a mais importante tecnologia deste século: da informação.
Esta tecnologia, com início antes da II Grande Guerra, é indispensável não apenas na área das transferências de valores monetários, como na segurança nacional e dos centros urbanos e zonas rurais, com os drones, por exemplo.
O Presidente Geisel tentou dar independência tecnológica ao País com investimentos públicos e incentivos à iniciativa privada. Cobra e Itautec são exemplos que foram demolidos pela onda neoliberal que destruiu boa parte de nossos investimentos em tecnologia e engenharia.
A ausência de um projeto de soberania, de reconstrução nacional por todos os candidatos, como já mencionamos, inclusive nestes que disputam agora a Presidência, encontrará um País desarmado diante da crise e da eventual, mas não pequena, alteração nos padrões de relacionamentos internacionais.
Sem vocação de Cassandra, receoso da Pátria em que viverão meus netos e minha filha, que busco sensibilizar os novos eleitos para se debruçarem sobre as questões nacionais, deixando os fake fatos da banca de lado.
Pedro Augusto Pinho, avô, administrador aposentado.

Brasil: Carta aberta do sociólogo Manuel Castells aos intelectuais do mundo.

Amigos intelectuais comprometidos com a democracia:

O Brasil está em perigo. E, com o Brasil, o mundo. Porque após a eleição de Trump, a tomada do poder por um Governo neofascista na Itália e a ascensão do neonazismo na Europa, o Brasil pode eleger um presidente fascista, defensor da ditadura militar, misógino, sexista, racista e xenófobo, que obteve 46% dos votos válidos no primeiro turno das eleições presidenciais. Não importa quem seja seu oponente. Fernando Haddad, a única alternativa possível, é um acadêmico respeitável e moderado, candidato do PT, um partido hoje desprestigiado por ter participado da corrupção generalizada do sistema político brasileiro.



Mas a questão não é o PT, e sim uma presidência de um Bolsonaro capaz de dizer a uma deputada, em público, que “não merecia ser estuprada por ele”. Ou que o problema da ditadura não foi tortura, e sim que não tenha matado mais em vez de torturar. Em tal situação, nenhum intelectual, nenhum democrata, nenhuma pessoa responsável no mundo em que vivemos pode permanecer indiferente. Não represento ninguém além de mim mesmo. Não apoio nenhum partido. Simplesmente acredito que seja um caso de defesa da humanidade, porque se o Brasil, o país decisivo da América Latina, cair nas mãos deste desprezível e perigoso personagem e dos poderes fáticos que o apoiam, os irmãos Koch entre outros, teremos nos precipitado ainda mais na desintegração da ordem moral e social do planeta a qual estamos presenciando.

Por isso escrevo a todos vocês, àqueles que conheço e aos que gostaria de conhecer. Não para que subscrevam esta carta como se fosse um manifesto aos ditames dos políticos. E sim para pedir que cada um torne pública e, em termos pessoais, sua petição para uma participação ativa no segundo turno das eleições presidenciais em 28 de outubro, e nosso apoio contra o voto em Bolsonaro, argumentando, segundo a opinião de cada um, e divulgando sua carta por meio de seus canais pessoais, redes sociais, meios de comunicação, contatos políticos, qualquer formato que transmita nosso protesto contra a eleição do fascismo no Brasil. Muitos de nós temos contatos no Brasil, ou temos contatos que têm contatos. Contatemo-los. Uma mensagem por WhatsApp é suficiente ou uma chamada telefônica pessoal.

Não precisamos de uma hashtag. Somos pessoas, milhares, potencialmente falando para milhões, no mundo e no Brasil. E, como ao longo de nossa vida adquirimos, com nossa luta e integridade, uma certa autoridade moral, vamos utilizá-la neste momento antes que seja tarde demais. Farei isso, já estou fazendo. E simplesmente rogo para que cada um faça o que puder.



Muito obrigado a Mídia Ninja 
Fonte: https://elpais.com/elpais/2018/10/10/opinion/1539160088_843725.html
Data de publicação do artigo original: 10/10/2018
URL deste artigo: http://www.tlaxcala-int.org/article.asp?reference=24301 

sábado, 13 de outubro de 2018

Eleições 2018. O plano econômico de Jair Bolsonaro, por Alexandre Andrada [*].

Ler o programa de governo de Jair Bolsonaro, intitulado O Caminho da Prosperidade , é aventurar-se pela cabeça do candidato e de sua equipe. E esse é o lado ruim.

Assusta que um candidato apresente um projeto tão pífio para uma campanha presidencial. Assusta que esse candidato seja o atual líder nas pesquisas de opinião [NR] . Bolsonaro é uma ameaça não só para nossa democracia, mas também para nosso desenvolvimento econômico e para os nossos frágeis avanços sociais.

Vamos ao que interessa: a economia. O documento começa afirmando que a área será liderada por duas instituições: o Banco Central e o Ministério da Economia. Esse último seria resultado da junção dos ministérios da Fazenda, do Planejamento e da Indústria & Comércio, além da Secretaria Executiva do Programa de Parcerias de Investimentos. As instituições financeiras federais, diz o documento, também estarão subordinadas ao novo Ministério.

Não é uma novidade. O Brasil já teve um Ministério da Economia resultante da junção dessas mesmas pastas. A ideia de Bolsonaro nada mais é que um plágio do que foi feito por Fernando Collor de Mello durante seu breve governo (1990-1992). A ideia, tanto lá em 1990 quanto hoje em 2018, é de sinalizar para o público que o governo é sério, austero, evita o desperdício.

O resultado prático, porém, pode ser negativo.

Assim como Collor entregou poderes excessivos para uma economista sem qualquer experiência na alta burocracia federal (no caso, Zélia Cardoso de Melo), Bolsonaro promete fazer algo similar, dotando Paulo Guedes de superpoderes. Responsável pelo Plano Collor, Zélia confiscou o dinheiro da poupança e da conta corrente dos brasileiros, provocando uma grave crise econômica. E falhou no combate à hiperinflação. 


Paulo Guedes é confiável e capaz de gerenciar tão amplo espectro da administração pública? É provável que não.

Pérsio Arida, principal economista da equipe do tucano Geraldo Alckmin, usualmente diplomático, recentementeclassificou Guedes como "mitômano" e afirmou: "Ele nunca produziu um artigo de relevo. Nunca dedicou um minuto à vida pública, não faz ideia das dificuldades".

Arida, goste-se ou não de suas ideias, é um acadêmico de peso e foi um dos elaboradores intelectuais do que viria a ser o Plano Real. Também ocupou diversos cargos na burocracia federal, chegando à presidência do Banco Central e do BNDES.

Os outros economistas por trás dos principais candidatos também têm experiência prática: Mauro Benevides, coordenador do projeto econômico de Ciro Gomes, além de acadêmico, tem mais de 20 anos de experiência como Secretário de Fazenda no Ceará. Na campanha está outro professor da Universidade Federal do Ceará, Flávio Ataliba, reconhecidamente um grande estudioso da questão previdenciária no país. Marina Silva conta com a colaboração de nomes como André Lara Resende e Ricardo Paes de Barros , dois pesos-pesados da teoria e da política econômica nacional há décadas.

Fernando Haddad (PT) tem na sua retaguarda gente como Nelson Barbosa , cuja experiência como ministro do Planejamento e da Fazenda são importantes, além de ter começado a manter conversas com economistas de alto nível e críticos de seu partido, como Samuel Pessoa e Marcos Lisboa (que ocupou cargo de relevo no Ministério da Fazenda na gestão Palocci).

O superministro de Bolsonaro, Paulo Guedes, por outro lado, ainda que seja portador de um vistoso título de PhD pela Universidade de Chicago, jamais desempenhou uma função de relevo na burocracia federal. Pior ainda, sequer dedicou tempo e recursos para a elaboração de um plano – isto é, de um conjunto claro e factível de medidas – para sanear a economia brasileira.

Paulo Guedes, pelo visto, tem consciência de seu despreparo para tal função. Talvez por isso mesmo tenha fugidodo debate com os economistas das demais candidaturas, realizado recentemente pela TV Cultura.

Quando tenta ir além de chavões pavorosos e sem significado algum – como "o liberalismo reduz a inflação" –, o resultado é sofrível e risível.

A campanha de Bolsonaro fala, por exemplo, em zerar o déficit primário – o prejuízo nas contas públicas – em 2019 e gerar um superávit no ano seguinte. Ou seja: Em 2017, o déficit primário foi de R$ 124 bilhões. Para 2018, a previsão é que ele chegue a quase R$ 150 bilhões. Isso é muito preocupante.

Como Paulo Guedes fará isso é uma gigantesca incógnita. A única pista é quando ele diz: "Esse processo de redução de dívida será reforçado com a realização de ativos públicos." Em outras palavras, venda de estatais e privatizações.

Essa é uma afirmação que faz transparecer todo o despreparo da equipe de econômica de Bolsonaro.

Qualquer cidadão brasileiro alfabetizado sabe que, após quase 40 anos de debates em torno da necessidade de privatizações no Brasil (algo que data pelo menos desde o governo Sarney), em apenas um ano de mandato (supondo que ele seja democrático) não é possível privatizar sequer o cafezinho servido nas repartições. Que dirá uma estoque de ativos capaz de gerar caixa da ordem de R$ 150 bilhões. Para se ter uma ideia,; a venda de 80% da Embraer , em julho, rendeu apenas 10% desse valor – R$ 15 bilhões.

Trata-se de uma mistura assustadora de inocência e ignorância.

Mas o plano é ainda mais ousado. Fala-se em "reduzir em 20% o volume da dívida por meio de privatizações, concessões, venda de propriedades imobiliárias da União e devolução de recursos em instituições financeiras oficiais que hoje são utilizados sem um benefício claro à população brasileira."

Pois bem: a dívida pública brasileira é de R$ 3,7 trilhões. Os 20% descritos pelo plano equivalem a R$ 740 bilhões de reais – o dobro do valor da Petrobrás , que costuma ocupar o posto de maior empresa do Brasil, para se ter uma ideia.

Não há possibilidade de se fazer um ajuste de R$ 150 bilhões no espaço de um ano através da venda de ativos da União. Então, como último e mais óbvio recurso, só caberá ao governo Bolsonaro (toc toc toc na madeira) reduzir gastos.

Se assim o fizer, provavelmente produzirá a maior recessão de nossa história.

Em uma economia mal saída da recessão como a nossa, um ajuste fiscal tão abrupto e de tal magnitude, implicaria numa derrubada ainda maior nos níveis de consumo e investimentos, públicos e privados, componentes fundamentais do PIB.

O impacto para os mais pobres 

Em relação à questão tributária, o programa de Guedes-Bolsonaro fala em "simplificação e unificação de tributos federais eliminando distorções e aumentando a eficiência da arrecadação". Um dos membros da equipe econômica de Bolsonaro é o economista Adolfo Sachsida, importante e respeitado pesquisador do IPEA.

Em seu blog pessoal , em agosto de 2017, Sachsida defendeu uma proposta para lá de exótica para a questão dos impostos. Afirma ser favorável a um sistema tributário no qual todos os indivíduos, desde Amoêdo com seus quase R$ 500 milhões, passando por qualquer Dona Maria que ganha um salário mínimo, paguem uma mesma quantia fixa. O valor desse imposto fixo seria de R$ 1,2 mil por mês. Trata-se de uma insanidade tributária completa. Na contramão inclusive do que pregavam liberais com juízo, como Adam Smith, que, em tese, estariam ligados a este novo momento de Bolsonaro. Mas, no caso do candidato, a máscara de liberal é recente e feita sob medida para agradar o "mercado".

Outro famoso economista da equipe de Bolsonaro é Marcos Cintra.

Colunista da Folha de S.Paulo durante décadas, gastou muita tinta em defesa da implementação de um imposto único no Brasil. Sua ideia é criar um tributo tal qual a antiga CPMF, incidente sobre movimentação financeira, com alíquota de 2,81%. O próprio Paulo Guedes falou sobre esse novo imposto nesta semana .

Além dos problemas microeconômicos gerados por esse tipo de imposto, como o estímulo ao uso de dinheiro vivo para fugir da tributação e sua incidência "em cascata" (isto é, incide sobre várias etapas na circulação de um produto), ele também cria uma nova penalização para os mais pobres, que acabam pagando a mesma taxa do que a parcela mais rica da população.

Não é justo, nem moral, que os cidadãos paguem todos uma mesma alíquota de imposto. Imagine que o governo fixe um imposto único de 10% sobre os rendimentos de todos os cidadãos.

No caso de uma pessoa que ganha um salário mínimo – de R$ 1.000, para simplificar a conta – isso significa entregar R$ 100 todos os meses ao governo. Dinheiro que fará falta para comprar um botijão de gás, comprar um quilo de carne, uma roupa nova e outras necessidades básicas.

Agora imagine a pessoa que ganha R$ 10 mil por mês. Nesse caso, os R$ 1.000 entregues ao governo, ainda que façam falta, não comprometerão a subsistência do indivíduo como no primeiro caso. Essa pessoa já pagou aluguel, já se alimentou, já se vestiu de modo satisfatório com os R$ 9 mil que lhe restam.

O plano da equipe econômica de Bolsonaro fala ainda na criação de um imposto de renda negativo. Essa ideia, tal qual a implementação de um imposto fixo como proposto por Sachsida, é curiosidade presente apenas nas páginas dos manuais de Economia. Nenhum país do mundo jamais implementou tais medidas.

Bolsonaro ainda propõe a criação de uma carteira de trabalho "verde e amarela", alternativa à carteira azul tradicional. Nessa nova carteira, cuja aderência seria voluntária, "o contrato individual prevalece sobre a CLT". O documento alerta que seriam preservados os "direitos constitucionais" – ressalva de pouco valor, já que o general Mourão, vice da chapa, parece andar flertando com a ideia de escrever uma nova Constituição .

No atual ambiente de alto desemprego, o poder de barganha dos trabalhadores fica severamente reduzido. Por isso, temos razões para acreditar que antes de ser a escolha do empregado, tal carteira será um imposição dos patrões, notadamente para aqueles trabalhadores mais pobres, menos qualificados e mais vulneráveis.

Ainda que haja muita informalidade no Brasil e que existam argumentos em favor da modernização da legislação trabalhista, é bom lembrar que o motor fundamental da criação de novos empregos não é a facilidade de contratar e demitir, mas sim o estado geral da economia. A menor taxa de desemprego registrada na região metropolitana de São Paulo desde 1994, foi registrada em dezembro de 2011, quando chegou a 6,9%. Em junho deste ano, o valor registrado foi de 14,20%. 


São muitas as propostas estranhas ou inviáveis de Bolsonaro para a área econômica. Não se pode sequer chamar o documento de plano de governo, ou coisa que o valha. Trata-se de um apanhado de generalidades, de citações superficiais de documentos de terceiros, sem uma gota de suor ou esforço próprio de sua equipe. 

Os "formuladores" (permitam a liberdade poética) do plano podem afirmar que nossas interpretações estão equivocadas, que eles queriam dizer outra coisa. É possível. O problema é que as propostas são tão rasas, tão supérfluas, tão mal elaboradas, desacompanhadas de quaisquer explicações ou números, que só podemos imaginar que se trata de um trabalho feito às pressas, sem qualquer preocupação com a seriedade da tarefa de governar o Brasil.

Causa surpresa que o "mercado" brasileiro, após o fracasso da candidatura de Alckmin (PSDB) e Meirelles (MDB), tenha abraçado Bolsonaro como um candidato sério, viável e preferível às demais alternativas. De novo: um governo Bolsonaro implica em um risco grave para nossas instituições políticas e econômicas. Isso fica evidente para qualquer analista que se preste a estudar seus atos, palavras e propostas. Não por acaso, a revistaThe Economist , que nem o mais tresloucado apoiador de Bolsonaro ousaria classificar como "esquerdista", "petista" ou "bolivariana", o classificou como "uma ameaça", afirmando que ele seria "um presidente desastroso".

Oxalá que o Brasil não embarque nesse pesadelo. 

 20/Setembro/2018


[NR] Este artigo é anterior às eleições de 7 de Outubro. 

[*] Licenciado em economia pela Universidade Federal de Pernambuco, mestre em economia política pela PUC-SP e doutorado em economia pela USP. É professor do Departamento de Economia da UnB desde 2012,   alexandreandrada@gmail.com 


Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

sexta-feira, 12 de outubro de 2018

Plantador de soja e condenado pela Justiça de Buriti por cometer crime ambiental.

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Pé de Pequi.

Vara Única da Comarca de Buriti/ma

PROCESSO Nº: 209-88.2014.8.10.0077 (2122014)

AÇÃO : CIVIL PÚBLICA


RÉUS: ESTADO DO MARANHÃOJORGE NELSON PRESSI, SLC EMPREENDIMENTOS E AGRICULTURA LTDA .

ADVOGADO: DR. RAIMUNDO ELCIO AGUIAR DE SOUSA OAB/MA 6.162 e DR. ALEXANDRE CESAR DEL GROSSI OAB/MS 9916-B

FINALIDADE : INTIMAÇÃO dos advogados DR. RAIMUNDO ELCIO AGUIAR DE SOUSA OAB/MA 6.162 e DR. ALEXANDRE CESAR DEL GROSSI OAB/MS 9916-B, para tomarem conhecimento do inteiro teor da Sentença dos autos supracitados.

Buriti/MA, 1 de agosto de 2018.

Tayllo Vieira Monteles
Secretário Judicial
Matric. 174029

Processo nº. 209-88.2014.8.10.0077 (2122014).

SENTENÇA

RELATÓRIO.

Trata-se de AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO MARAHÃO contra o ESTADO DO MARANHÃO, JORGE NELSON PRESSI e SLC EMPREENDIMENTOS E AGRICULTURA LTDA.

Segundo a inicial, arrimada em procedimento administrativo instaurado no âmbito do MPF, "(...) o primeiro requerido obteve junto à autarquia federal já citada uma autorização de desmatamento para uso alternativo nº. 2100.5.2004.00203, datada de 22/12/2004, na qual foi autorizado o desmatamento da área de 957,390 há, sendo que a área total do imóvel, aferida pelo próprio IBAMA, foi de 981,098 há, vale dizer, foi autorizado o desmatamento do equivalente a 97% da área integral da Fazenda Travessão, desprezando-se quase que a integralidade da área destinada á reserva legal, sendo, aliás, estipulada no mesmo documento referenciado como sendo de 0,000 hectares, ou seja, nenhuma".

Consigna, ainda, que nos autos do Procedimento Administrativo nº. 006/04, a SEMA-MA, forneceu ao demandado Licença de Instalação nº. 100/2004, para projeto agropecuário com aproveitamento do material lenhoso para carvoejamento.

Conforme exposto na peça inaugural, o imóvel onde efetuado o desmatamento está matriculado no cartório de registro de imóveis da comarca de Buriti, sob nº. 46/2002, do Livro nº. B-11, e era coberto por vegetação nativa diversificada, com predominância típica dos cerrados.

Sustenta, após demonstrar a legitimidade ativa do MP, a imprescritibilidade do dano ambiental etc, que o desmatamento ilegalmente autorizado foi permeado de uma série de graves irregularidades, porque "o modus operandi constatado na supressão de vegetação da Fazenda Faveira contraria até mesmo a licença fornecida pelo IBAMA, uma vez que em seu item '3' observa que fica proibido o corte/exploração de aroeira e pequi, conforme portarias 83-N de 26/09/1991 e 113/1995".

Demonstra que a espécie pequi é protegida do corte pela Portaria IBAMA nº. 113/1995, conforme previsto no art. 16. Assevera que existe obrigação legal de manter a reserva legal e obrigação de recuperá-la.

Por fim, apresenta o laudo técnico nº. 10/2011, no qual são especificadas as áreas devastadas e a necessidade de um plano de recuperação.

Requer o MP, ao final, a condenação dos requeridos a restaurar integralmente, em prazo razoável, as condições primitivas de vegetação, solo e demais propriedades naturais, sob pena de multa, chegando-se, o mais próximo possível do status quo ante, sobretudo pela restauração da vegetação de pequis; restauração da reserva legal, em sua integralidade, com todas as espécies nativas que foram ilegalmente derrubadas; que os demandados apresentem, no prazo de noventa dias, projeto de recuperação da área degradada, visando recuperar os danos ambientais, o qual deverá ser apresentado à Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Recursos Naturais do Estado do Maranhão e a esse juízo, e executado no prazo de seis meses, sob pena de multa diária de R$ 5.000,00; indenização por danos ambientais pretéritos, consistente naquilo que foi perdido em termos ambientais, até que o meio se restaure ao estado anterior, a serem averiguados em perícia judicial, para que se faça a apuração econômica de toda a extensão dos danos e sua conversão em pecúnia.

Documentos que instruíram a inicial (fls. 02/179). 

A inicial encontra-se instruída com cópia integral do inquérito civil. 

Determinada a citação (fl. 183).

Contestação apresentada pelo requerido JORGE NELSON PRESSI (fls. 193/203). Sustenta que realizou o desmatamento com as licenças ambientais expedidas pelo IBAMA E SEMA, além de ter observado a reserva legal do imóvel. Quanto a este último aspecto, demonstrou que a reserva legal foi materializada na Fazenda São Tomé, no Município de Brejo, conforme comprovado nos autos. Relativamente à derrubada de pequis, negou a autoria.

Contestação apresentada pela SLC INVESTIMENTOS AGRÍCOLAS LTDA (fls. 229/251). Alegou inépcia, sustentou ilegitimidade passiva, falta de interesse processual, prescrição. No mérito, pugnou pela improcedência do pedido. Juntou documentos.

Contestação apresentada pelo Estado do Maranhão às fls. 393/404, com argüição de ilegitimidade e necessidade de chamamento ao feito do IBAMA.

Manifestação do MP pela improcedência das preliminares arguidas pela SLC INVESTIMENTOS AGRÍCOLAS, salvo a ilegitimidade, com consequente prosseguimento do feito (fls. 410/413).

Petição apresentada SLC INVESTIMENTOS AGRÍCOLAS (fls. 417/419).

Decisão de fls. 421 rejeitou o chamamento do IBAMA à lide, além das demais preliminares, determinando a exclusão da requerida SLC INVESTIMENTOS AGRÍCOLAS do feito.

Manifestação do MP pela ausência de provas a produzir (fl. 425).

Embargados de declaração apresentados pela SLC INVESTIMENTOS AGRÍCOLAS (fls. 427/429).

Manifestação do requerido JORGE NELSON PRESSI às fls. 433/435. Não requereu dilação probatória. Sustentou ocorrência de prescrição.

Ausência de pedido de produção de provas pelo Estado do Maranhão (fl. 443).
Manifestação do MP quanto aos embargos de declaração (fls. 448/450).
Decisão de fls. 451, com rejeição dos embargos de declaração.

É o relatório. Fundamento e decido.

FUNDAMENTAÇÃO.
Desnecessária a produção de outras provas, pois há nos autos elementos suficientes ao julgamento do feito, nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil.

De plano, examino a preliminar de prescrição sustentada pelo réu JORGE NELSON PRESSI para rejeitá-la, tendo em vista que a imprescritibilidade de danos ambientais é consagrada pela doutrina e jurisprudência majoritárias. Segundo precedentes do STJ, pela natureza do bem jurídico envolvido, a reparação civil ambiental assume grande amplitude, com profundas implicações na espécie de responsabilidade do poluidor. Assim sendo, além de objetiva, na forma do art. 14 da Lei 6938/81, estaria sob o manto da imprescritibilidade, por se tratar de direito inerente à vida, de caráter fundamental e essencial à afirmação dos povos. Neste sentido, inclusive o Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.421.163-SP.
Rejeito, pois, a ocorrência de prescrição.

No mérito, necessário consignar as alterações trazidas pela Lei 12.651/12, em que pese anotar que a aplicação do princípio da vedação do retrocesso ambiental e do direito subjetivo difuso adquirido são teses que a despeito de sua forte fundamentação não tem força normativa que possa afastar o novo Código Florestal, pois se por um lado tem-se que o ambiente deve ser protegido, por outro é indispensável a sua exploração de forma condizente para a própria sobrevivência humana. As normas do novo diploma legal se atêm a esta realidade, não havendo, portanto, que se falar em inconstitucionalidade por tais alegações.

Ademais, em tese, a proteção ambiental foi compatibilizada com outros direitos fundamentais, como a propriedade, a livre iniciativa, determinando que o proprietário conserve a reserva legal e a área de preservação permanente sem que haja restrições excessivas no exercício do direito de propriedade, permitindo a continuidade das atividades desenvolvidas.

Sobre esse aspecto, aliás, vale ressaltar que, na via concentrada, pende de julgamento três Ações Diretas de Inconstitucionalidade com pedidos liminares (ADIs nºs. 4901, 4902 e 4903) ajuizadas pela Procuradoria Geral da República perante o Excelso Supremo Tribunal Federal, nas quais já são questionados dispositivos do novo Código Florestal brasileiro (Lei nº 12.651/2012) relacionados às áreas de preservação permanente, à redução da reserva legal e também à anistia para quem promove degradação ambiental.

Por conseguinte, as obrigações a serem exigidas do réu deverão seguir as diretrizes do novo Código Florestal (Lei nº 12.651/12), considerado de aplicação imediata pelos tribunais pátrios.

Neste sentido:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL– PRETENSÃO DE RECONHECIMENTO DE INCONSTITUCIONALIDADE DE DISPOSITIVOS LEGAIS CONTIDOS NA LEI Nº 12.651/2012 – IMPERTINÊNCIA – REGRAS AUTOAPLICÁVEIS – AJUIZAMENTO DA AÇÃO SOB ALEGAÇÃO DE DANO AMBIENTAL EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE – DESCONSIDERAÇÃO À LUZ DO ART. 62 DO NOVO CÓDIGO FLORESTAL (LEI Nº 12.651/2012)– SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA CONFIRMADA POR SEUS FUNDAMENTOS – RECURSO NÃO PROVIDO.
I- Deve ser reconhecida a impertinência da alegação quanto à inconstitucionalidade de dispositivos do novo Código Florestal vigente (Lei nº 12.651/2012, com redação dada pela Lei nº 12.272/2012), tornando-se descabido, assim, o controle difuso pretendido.

II- Impertinente o pleito voltado à condenação do réu em reparar os danos ambientais ocasionados em área de preservação permanente, vez que o imóvel de sua propriedade, em verdade, não está situado em área ambientalmente protegida, pois a nova legislação ambiental – Lei nº 12.651/2012, com redação dada pela Lei nº 12.727/2012–, alterou os limites geográficos das áreas de preservação permanente localizadas no entorno de reservatórios artificiais de água, conforme determina o art. 62 da sobredita lei. Recurso não provido. (TJSP; Apelação 0026743-14.2013.8.26.0577; Relator (a): Paulo Ayrosa; Órgão Julgador: 2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente; Foro de São José dos Campos - 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 22/02/2018; Data de Registro: 24/02/2018). RECURSO DE APELAÇÃO EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MEIO AMBIENTE. INSTITUIÇÃO E DEMARCAÇÃO DE RESERVA LEGAL.
1. INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI Nº 12.651/12. CÓDIGO FLORESTAL. As C. Câmaras Reservadas ao Meio Ambiente tem entendido pela constitucionalidade e determinado a aplicação do código.
2. COMPENSAÇÃO COM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. Possibilidade de compensação de área de preservação permanente – APP para instituição de reserva legal, hipótese expressamente prevista no Novo Código Florestal - Lei nº 12.651/12. Propriedade rural que não possuía área de reserva legal. 3. Sentença de parcial procedência mantida. Recurso desprovido. (TJSP; Apelação 1000912-66.2016.8.26.0083; Relator (a): Marcelo Berthe; Órgão Julgador: 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente; Foro de Aguaí - Vara Única; Data do Julgamento: 08/02/2018; Data de Registro: 20/02/2018).

Superada a questão, verifico ainda que a decisão saneadora foi omissa em relação ao pleito de ilegitimidade passiva apresentado pelo Estado do Maranhão na contestação, o que também não pode ser acolhido.

Isso porque, descabe excluir o Estado do Maranhão da lide, exatamente porque é de sua alçada acompanhar e fiscalizar o dano ambiental apurado nestes autos.

Em que pese legitimado, não há nexo causal imputável entre o dano causado pelo outro réu e a conduta do Estado do Maranhão, sendo que a responsabilização do entre público não pode ser presumida, ainda que o dano ambiental seja objetivamente auferido. Portanto, quanto à matéria de fundo, os pedidos são procedentes tão somente em relação ao réu JORGE NELSON PRESSI.

Como estampado no relatório desta sentença, o MPMA ajuizou a Ação Civil Pública Ambiental em decorrência dos fatos apurados em Inquérito Civil, que demonstram que o réu JORGE NELSON PRESSI é proprietário rural do imóvel Fazenda Travessão, Lote 129, zona rural desta Comarca.

A ação tem por objeto a reconstituição ambiental de área indevidamente explorada pelo requerido, com aquiescência do ESTADO DO MARANHÃO, bem como restauração da reserva legal, sobretudo com a restauração de pequis indevidamente suprimidos.

Quanto à obrigação de manter reserva legal, observo que o requerido JORGE NELSON PRESSI descumpriu a exigência, em que pese tenha sustentado o contrário, não tendo apresentado prova cabal de regularização da situação, nos termos do art. 66 do Código Florestal.

Realmente, a criação da Reserva legal tem o objetivo de garantir a preservação da biodiversidade local, conter o desmatamento e incentivar as recuperações principalmente nas propriedades que já se encontravam totalmente exploradas, com pequena diminuição da capacidade produtiva.

A inobservância da regra ambiental, por si só, já corresponde a uma lesão ao meio ambiente.

Registre-se e reitere-se que, com a promulgação do Código Florestal - Lei 12.651, em 25 de maio de 2012, com as alterações da Lei 12.727/12, a composição da lide deve se fazer com a aplicação da legislação nova, à vista do disposto no artigo 493 do Código de Processo Civil.

E ainda que menos rigorosa, a legislação atual não modifica a interpretação pretoriana a respeito do tema, embasada no pilar central do ordenamento específico, isto é, o art. 225 da Constituição Federal.

Prevista já no primeiro Código Florestal de 1934, a Reserva legalé obrigatória e a Lei 12.651/12, em seu artigo 12, determina que "Todo imóvel rural deve manter área com cobertura de vegetação nativa, a título de Reserva legal, sem prejuízo da aplicação das normas sobre as Áreas de Preservação Permanente, observados os seguintes percentuais mínimos em relação à área do imóvel", e o inciso II prevê 20% (vinte por cento) para situações como a presente.

Como se vê, a instituição da área de reserva legal também é exigência do novo Código Florestal, "que declara bens de interesse comum as florestas e demais formas de vegetação reconhecidas de utilidade para as terras que revestem, impõe limitações ao exercício do respectivo direito de propriedade (artigo 2º) e fixa como de reserva legal a área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, delimitada nos termos do artigo 12, com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa" (artigo 3º, III).

Essa área de reserva legal, de pelo menos 20% (vinte por cento) da área total da propriedade (artigo 12, II), pode ser utilizada sob regime de manejo florestal sustentável (artigo 20), e sua localização deve ser aprovada pelo órgão ambiental estadual integrante do Sisnama ou instituição por ele habilitada, no caso a SEMA, vinculada ao Estado do Maranhão.

Neste sentido, cito precedente recente do TJSP:
II- A instituição de 20% de área de reserva legal, exigência da então Lei nº 4.771/65, também é feita pela Lei nº 12.651/2012 que a revogou, mas agora com a instituição de novas regras, sendo, portanto, plenamente autorizado o cômputo da área de APP na reserva legal, desde que preenchidos os requisitos do art. 15 da aludida lei. Ademais, a área de reserva legal pode ser utilizada sob regime de manejo florestal sustentável, conforme preceitua o art. 20 da atual lei, sendo que sua localização deve ser aprovada pelo órgão ambiental competente e, quanto à regularização, esta poderá se dar na forma de recomposição, permissão de regeneração natural ou compensação (art. 66), atentando-se para os novos prazos concedidos para a recuperação e realização da reserva legal (arts. 29 e seguintes do Novo Código Florestal). (TJSP; Apelação 0003457-45.2014.8.26.0456; Relator (a): Paulo Ayrosa; Órgão Julgador: 2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente; Foro de Pirapozinho - 1ª Vara Judicial; Data do Julgamento: 22/02/2018; Data de Registro: 24/02/2018).

Assim, por ser uma obrigação propter rem, cabe ao proprietário cumprir a obrigação de averbar a reserva legaldo seu imóvel.

Note-se que a reserva legal possui caráter preventivo (objetivo de evitar possíveis danos ambientais), sendo certo que ela deve ser averbada à margem do registro do imóvel também nos casos em que não há evidência de degradação florestal.

Neste sentido é pacífica a jurisprudência do C. STJ, conforme se vê do seguinte julgado da lavra do Ministro Benedito Gonçalves, cuja ementa segue transcrita:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DANOAMBIENTAL. REPARAÇÃOINTEGRAL DOS DANOS. NATUREZA PROPTER REM. CUMULAÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER, DE NÃO FAZER E DE INDENIZAR. POSSIBILIDADE. 1. A jurisprudência do STJ está firmada no sentido de que a necessidade de reparaçãointegral da lesão causada ao meio ambiente permite a cumulação de obrigações de fazer, de não fazer e de indenizar, que têm natureza propter rem. Precedentes: REsp 1.178.294/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, j. 10/8/2010; REsp 1.115.555/MG, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, j. 15/2/2011; AgRg no REsp 1170532/MG, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, j. 24/8/2010; REsp 605.323/MG, Rel. para acórdão Ministro Teori Albino Zavascki, j. 18/8/2005, entre outros. 2. Agravo regimental não provido"(AgRg no REsp 1.254.935/SC, 1ª Turma, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, j. 20/03/2014, DJe 28/03/2014).

Quanto à ausência de reserva legal e aos danos causados, o laudo técnico nº. 10/2011 (fls. 139/141), elaborado unilateralmente por servidor da Procuradoria da República do Estado do Maranhãodemonstra integralmente a sua existência, além de relacionar as medidas necessárias para reparaçãoda área degradada.

Apesar de ter sido elaborado por uma das partes, trata-se de laudo elaborado por servidor público, com natureza de ato administrativo, sendo ônus do réu esvaziar a presunção de veracidade existente. Neste ponto, foi apresentado questionamento genérico em sede de contestação, que se revelou insuficiente, especialmente pela ausência de pedido de produção de prova por parte do requerido.

Portanto, configurado o dano, deve o proprietário restaurar a área degradada, conforme determina o Novo Código Florestal, nos seguintes termos:
Art. 17. A Reserva Legal deve ser conservada com cobertura de vegetação nativa pelo proprietário do imóvel rural, possuidor ou ocupante a qualquer título, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado.
§ 1 Admite-se a exploração econômica da Reserva Legal mediante manejo sustentável, previamente aprovado pelo órgão competente do Sisnama, de acordo com as modalidades previstas no art. 20.
§ 2 Para fins de manejo de Reserva Legal na pequena propriedade ou posse rural familiar, os órgãos integrantes do Sisnama deverão estabelecer procedimentos simplificados de elaboração, análise e aprovação de tais planos de manejo.
§ 3 É obrigatória a suspensão imediata das atividades em área de Reserva Legal desmatada irregularmente após 22 de julho de 2008.
§ 4 Sem prejuízo das sanções administrativas, cíveis e penais cabíveis, deverá ser iniciado, nas áreas de que trata o § 3 deste artigo, o processo de recomposição da Reserva Legal em até 2 (dois) anos contados a partir da data da publicação desta Lei, devendo tal processo ser concluído nos prazos estabelecidos pelo Programa de Regularização Ambiental - PRA, de que trata o art. 59.
Art. 18. A área de Reserva Legal deverá ser registrada no órgão ambiental competente por meio de inscrição no CAR de que trata o art. 29, sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a qualquer título, ou de desmembramento, com as exceções previstas nesta Lei.
§ 1 A inscrição da Reserva Legal no CAR será feita mediante a apresentação de planta e memorial descritivo, contendo a indicação das coordenadas geográficas com pelo menos um ponto de amarração, conforme ato do Chefe do Poder Executivo.
§ 2 Na posse, a área de Reserva Legal é assegurada por termo de compromisso firmado pelo possuidor com o órgão competente do Sisnama, com força de título executivo extrajudicial, que explicite, no mínimo, a localização da área de Reserva Legal e as obrigações assumidas pelo possuidor por força do previsto nesta Lei.
§ 3 A transferência da posse implica a sub-rogação das obrigações assumidas no termo de compromisso de que trata o § 2 .
§ 4 O registro da Reserva Legal no CAR desobriga a averbação no Cartório de Registro de Imóveis, sendo que, no período entre a data da publicação desta Lei e o registro no CAR, o proprietário ou possuidor rural que desejar fazer a averbação terá direito à gratuidade deste ato.

Ademais, de acordo com o art. 3º, IV, da Lei 6.398/1981, entende-se como"poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental".

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que"O art. VII, da Lei nº 6.938/81 prevê expressamente o dever do poluidor ou predador de recuperar e/ou indenizar os danos causados, além de possibilitar o reconhecimento da responsabilidade, repise-se, objetiva, do poluidor em indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente ou aos terceiros afetados por sua atividade, como dito, independentemente da existência de culpa, consoante se infere do art. 14§ 1º, da citada lei"(REsp 578.797/RS, 1ª Turma, Rel. Ministro Luiz Fux, j. 05/08/2004, DJ 20/09/2004, p. 196).

Nessa linha também é o que preconiza a legislação constitucional e infraconstitucional, como se vê de uma leitura sistemática do art. 225§ 3º, da Constituição Federal com o art. VIII, da Lei 6.938/1981, que estabelece como princípio da Política Nacional do Meio Ambiente a"recuperação de áreas degradadas", e os arts. 4º, VI e VII e 14, § 1º, da mesma lei.

Por sua vez, o art. 4º dispõe que a Política Nacional do Meio Ambiente visará:" VI - à preservação e restauração dos recursos ambientais com vistas à sua utilização racional e disponibilidade permanente, concorrendo para a manutenção do equilíbrio ecológico propício à vida "; e" VII - à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados ".
No mesmo sentido, o art. 14 estabelece que:"Art. 14. Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores: § 1º. Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade".

Neste sentido, cito precedentes do TJSP:
RECURSO DE APELAÇÃO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – INSTITUIÇÃO DE ÁREA DE RESERVA LEGAL CUMULADA COM OBRIGAÇÕES CONSISTENTES EM RECOMPOSIÇÃO AMBIENTAL DA RESPECTIVA ÁREA RESERVADA. (...) 
1. As partes apelaram da r. sentença pela qual o D. Magistrado em ação civil pública julgou parcialmente procedentes os pedidos da ação ajuizada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, para condenar os requeridos, proprietários do imóvel rural denominado 'Fazenda Santa Clara', com cadastro no INCRA n. 635.197.579.661-1, matrícula n. 11.199, do 1º Cartório de Registro de Imóveis de São José dos Campos, a instituir reserva legal de 20% da área do imóvel objeto dos autos, com realização de todas as medidas devidas, apresentação de projeto, demarcação, inscrição no CAR e recomposição da cobertura vegetal, sob pena de multa diária de dez mil reais (limitada ao valor de cem mil reais), cumulativa para cada item descumprido e destinada ao Fundo Municipal do Meio Ambiente ou ao Fundo Estadual de Reparação de Interesses Difusos Lesados, no caso de inexistência do primeiro.
2. Admissível é o cômputo na área de reserva legal das áreas de preservação permanente do imóvel. Aplicabilidade do art. 15 do novo Código Florestal. Jurisprudência pacífica deste E. Tribunal.
3. Art. 17 da Lei n. 12.651/12 dispõe que compete ao proprietário da área a conservação da reserva com cobertura de vegetação nativa, vicejando, portanto, a pretensão ministerial de condenar os requeridos à obrigação de regenerar e de recompor a cobertura vegetal original, pois devidamente demonstrado nos autos a omissão dos acionados em tomar as medidas necessárias para a delimitação da área de reserva florestal legal, de acordo com a legislação em vigor. Mantença, in totum, da r. sentença. Recursos desprovidos. (TJSP; Apelação 0006609-97.2012.8.26.0577; Relator (a): Nogueira Diefenthaler; Órgão Julgador: 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente; Foro de São José dos Campos - 4ª Vara Cível; Data do Julgamento: 14/12/2017; Data de Registro: 16/01/2018).

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. Supressão de vegetação e construção em área de preservação permanente protetora de curso d'água e de nascente. Procedência dos pedidos. Cerceamento de defesa não evidenciado. Aplicação correta do art. 330, inc. I, do Código de Processo Civil. Impossibilidade jurídica do pedido afastada. Mérito. Intervenção ilícita demonstrada pelo conjunto probatório. Proteção das faixas de preservação permanente, situadas em zonas rurais ou urbanas, nos termos do art.  da Lei n. 12.651/2012. Responsabilidade ambiental de natureza objetiva (art. 14§ 1º, da Lei n. 6.938/1981) e propter rem (art. 2º, § 2º, da aludida Lei Florestal). Função ecológica e obrigatoriedade indiscutíveis (...)" (Apelação 0007690-31.2010.8.26.0099, 2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente, Rel. Des. Paulo Alcides, j. 05/06/2014).

Em suma, independentemente das dimensões do imóvel rural, permanece a obrigação do réu de reparar os danos e recompor a área de reserva legal.

Com relação à obrigatoriedade de se registrar a reserva legal perante o Cartório de registro de Imóveis, antes da implementação do Cadastro Ambiental Rural, pelo Decreto Federal nº 8.235, de 05 de maio de 2014, a jurisprudência majoritária entendia permanecer a obrigação de averbação da área de reserva legal junto à matrícula do imóvel, porque, a exigência legal anterior já devida ter sido cumprida.

Noutros termos, o registro da reserva legal já tinha que constar da matrícula do imóvel, caracterizando estado de mora de quem não o fizera, em face da lei anterior, e mesmo que a Lei nº 12.651/2012 tenha instituído nova obrigação e novo formato de registro, isto não eliminava o cumprimento da lei anterior. Todavia, com a criação do CAR e o estabelecimento de procedimentos a serem adotados para a inscrição, registro, análise e demonstração das informações ambientais sobre os imóveis rurais, pela Instrução Normativa nº 2 do Ministério do Meio Ambiente, de 06 de maio de 2014, deve-se afastar a obrigação da averbação, conforme dispõe o art. 18, § 4º, do Novo Código Florestal.

Assim sendo, o réu JORGE NELSON PRESSI não deve mais proceder à averbação na matrícula do imóvel, mas sim à inscrição do imóvel junto ao CAR, nos termos do art. 29§ 3º, da Lei 12.651/2012, que dispõe que "a inscrição no CAR será obrigatória para todas as propriedades e posses rurais, devendo ser requerida no prazo de 1 (um) ano contado da sua implantação, prorrogável, uma única vez, por igual período por ato do Chefe do Poder Executivo".

Sobre o tema, colaciono recente precedente da jurisprudência:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RESERVA LEGAL E APP. As obrigações quanto à reserva florestal legal e área de preservação permanente tem respaldo no artigo 7º, §§ e artigo 12, inciso II, da Lei nº 12.651/2012. Obrigação propter rem. Responsabilidade objetiva. A inscrição do imóvel no CAR é providência meramente declaratória e não comprova a adequação ambiental. Cabível a total aplicação da Lei nº 12.651/2012, não configurada inconstitucionalidade. Permitida a aplicação do artigo 15 do Código Florestal sempre que presentes os requisitos. O prazo e a forma de recomposição serão definidos pela autoridade ambiental. Inviável a incidência dos prazos da Lei Estadual 15.684/2015, não comprovada a formalização e homologação de Termo de Compromisso do PRA. A inscrição do imóvel no CAR afasta a necessidade de registro da reserva legal no cartório de registro de imóveis. Mantida a multa diária de mil reais. DÁ-SE PARCIAL PROVIMENTO aos apelos."(Apelação nº 0005778-98.2009.8.26.0627, Relator (a): Ruy Alberto Leme Cavalheiro; Comarca: Teodoro Sampaio; Órgão julgador: 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente; Data do julgamento: 23/03/2017; Data de registro: 29/03/2017).

No tocante à forma de recomposição, devem ser observadas as recomendações expressamente consignadas no laudo técnico de fls. 139/141.

Da mesma forma, necessária a recomposição da espécie pequi, cuja inexistência na área do imóvel objeto dos autos revela sua supressão indevida.

3. DISPOSITIVO.
Ante o exposto, ACOLHO EM PARTE os pedidos contidos na petição inicial para:

a) rejeitar a preliminar de prescrição;

b) julgar improcedente o pedido em face do ESTADO DO MARANHÃO, nos termos do art. 487I, do CPC ;

c) condenar JORGE NELSON PRESSI ao cumprimento das disposições seguintes:

i) Promover a instituição, medição, descrição e demarcação da reserva florestal legal no percentual de, no mínimo, 20% (vinte por cento) da área da Fazenda Travessão, a ser aprovada pela autoridade ambiental competente, entre as mais aptas a cumprir sua função ecológica, excluídas do percentual as área de preservação permanente;

ii) Ao cumprimento da obrigação de reconstituir a área desmatada irregularmente, com cortes de espécies protegidas, especialmente pequis, devendo ser iniciada a execução de projeto de recuperação de área degradada no prazo de 60 dias e comprovado nestes autos o cumprimento no prazo de 08 meses;

iii) Fixo o prazo de cento e vinte (120) dias para que o réu apresente ao órgão ambiental competente projeto de demarcação da área de reserva legal, e de sessenta (60) dias para comprovação da respectiva inscrição do imóvel junto ao CAR, nos termos do artigo 29§ 3º da Lei 12.651/2012;

iv) condeno o réu ao pagamento de indenização por danos ambientais pretéritos, até que haja recuperação do meio ambiente degradado, cujo valor será liquidado por arbitramento, nos termos do CPC.

Para a eventualidade do inadimplemento das obrigações impostas, fixo, para cada dia de atraso no cumprimento das prestações, multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais), limitada a R$200.000,00 (duzentos mil reais), corrigida no momento do pagamento, devendo ser recolhida ao Fundo Estadual de Reparação dos Interesses Difusos e Coletivos.

Condeno, ainda, o réu ao pagamento das custas e despesas processuais, ficando isento de honorários advocatícios, por ser o Ministério Público o autor da ação.

Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se.

Buriti, 20 de julho de 2018.

Juiz de Direito.