Por Lincoln Secco, especial para o Viomundo
14.Dez.2012 - “Irene preta / Irene boa / Irene sempre
de bom humor/ Imagino Irene entrando no céu:/ — Licença, meu branco!/ E
São Pedro bonachão:/ — Entra, Irene. Você não precisa pedir licença.”
(Manuel Bandeira).
É de Manuel Bandeira o belo poema “Irene
no Céu”. Os três primeiros versos são sempre ritmados por uma
acentuação das sílabas poéticas que facilmente nos convida a cantar.
Assim, mais que a cor de Irene, também o ritmo parece popular.
Ao mesmo
tempo é visível o distanciamento entre o eu poético e a voz da própria
Irene ao entrar onde, a princípio, não seria convidada. Afinal, Irene
pede licença. Ela não deveria, posto que seja seu o direito de entrar no
céu, já que é boa.
Desde 2003, quando Lula se tornou
presidente, o Partido dos Trabalhadores (PT) aparece na grande imprensa
como uma imensa coleção de escândalos. E desde então uma pergunta tem
incomodado a base social do PT: por que os dirigentes petistas têm tanto
medo? A resposta não é simples e poderia ser reformulada: Por que
alguém que recebe o poder das mãos do povo pede licença para exercê-lo?
Recentemente, a Polícia Federal invadiu o
escritório da Presidente da República para encontrar “provas” contra o
seu antecessor, que é simplesmente o seu maior apoiador. A primeira e
única defesa petista foi a de que agora a PF age como instituição
republicana e independente blá blá blá blá…
Da mesma maneira o STF agiu
como instituição independente… Ora, alguém imaginaria a PF invadindo o
escritório de Fernando Henrique Cardoso quando ele era presidente?
Ante a condenação de José Dirceu, José
Genoino e João Paulo Cunha, o PT não reagiu. Aceitou o julgamento como
legítimo. Ante o receio do confronto com a imprensa, o relator Odair
Cunha buscou refúgio no presidente do PT, Rui Falcão. E este,
escondeu-se em algum lugar.
É certo que há políticos em qualquer
partido que ganham com a queda de seus adversários internos e o PT não é
diferente. Mas nada disso explica um comportamento coletivo de uma
passividade bovina.
A explicação da covardia política não é,
evidentemente, a de que os dirigentes petistas sejam naturalmente
medrosos. Como em todos os partidos existem os covardes, os corruptos,
os que se associam a banqueiros etc. Mas há também os que não se curvam e
lutam.
Que o “oprimido” se ache sem o direito
de ocupar um lugar que não é o seu, é bastante compreensível. O PT
forjou em sua história uma nova elite de sindicalistas, professores de
ensino fundamental, líderes de movimentos sociais e pessoas de classe
média que oportunamente aderiram ao partido.
A ascensão social e
política dessas pessoas não teve correspondência na ideologia, a qual
continua sendo a dos que detêm os meios de produção de mercadorias
materiais e espirituais.
Contudo, por mais que ataquem o PT e
destruam seletivamente suas lideranças, os opositores não conseguem
retomar o governo. E isto acontece porque eles não dispõem de programa
alternativo nenhum. Sem discutir os erros estruturais do Governo Lula, é
visível a melhoria social que ele gerou.
Enquanto durar esta conjuntura, as armas
da oposição serão inúteis e o PT poderá continuar jogando seus
timoneiros ao mar. Há “petistas” que imaginam que é bom que a imprensa
“limpe” o partido. Há os que acreditam que os escândalos apenas maculam a
sua História. Nada mais falso. Não é a história do PT que está em jogo.
É o seu futuro.
Lincoln Secco é Professor de História Contemporânea na USP e autor de “A História do PT” (São Paulo, Ateliê Editorial)
Fonte:http://mariafro.com/
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