24/04/2013 - 11h38 - Nacional.
Heloisa Cristaldo - Enviada Especial da Agência Brasil/EBC.
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Petrolina (PE) – Mesmo com a súplica do sertanejo por chuva, a
estiagem na região do Semiárido não dá trégua. É a pior registrada nos
últimos 50 anos. De acordo com o governo federal, 1.415 municípios
sofrem com a seca, que afeta a vida de quase 22 milhões de brasileiros. A
falta de chuva atinge mais de 90% dos municípios do Semiárido e
ultrapassou a extensão das 1.135 cidades que o compõem.
A Secretaria Nacional de Defesa Civil já decretou situação de
emergência e estado de calamidade pública em 1.046 municípios. A área
mais atingida pela seca, o Semiárido brasileiro, estende-se por oito
estados da Região Nordeste (Alagoas, Bahia, Ceará, Paraíba, Pernambuco,
Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe), além do norte de Minas Gerais,
totalizando uma extensão territorial de mais de 980 quilômetros
quadrados.
O agricultor José Alírio de Macedo, de 61 anos, morador da zona rural
de Petrolina (PE) conta que até o momento choveu apenas 28 milímetros
(mm) na região onde vive.
O período chuvoso no município, que tem início
em dezembro e pode se estender até maio, tem em média 530 mm. Apesar da
estiagem atual, o agricultor cultiva feijão, milho e sorgo para
alimentar seu pequeno rebanho.
“A situação já é feia. Se Deus não tiver compaixão, ninguém vai ficar
com nada. E o período mais crítico ainda não começou, que é de agosto
para a frente. Ano passado não plantei nada por causa da seca. Nunca vi
dois anos diretos sem chuva, como já está acontecendo”.
Com os frequentes problemas causados pela seca, Macedo passou 14 anos
trabalhando em São Paulo. Os seis filhos resistiram e ficaram na
cidade, mas o agricultor e a mulher voltaram para o sertão. “O cidadão
fica velho e quer estar perto das suas origens”.
A gravidade da situação levou o governo federal a investir R$ 32
bilhões nas chamadas obras estruturantes, que garantem o abastecimento
de água de forma definitiva, como barragens, canais, adutoras e estações
elevatórias. Além disso, anunciou no início deste mês mais R$ 9 bilhões
em ações de enfrentamento à estiagem.
A previsão é que cada município atingido pela seca receba uma
retroescavadeira, uma motoniveladora, dois caminhões (um caçamba e um
pipa) e uma pá carregadeira. O governo também vai distribuir 340 mil
toneladas de milho até o fim do mês de maio para serem vendidas aos
produtores a preço subsidiado.
Para o coordenador-geral da organização não governamental Caatinga,
Giovanne Xenofonte, a realidade do Semiárido é atenuada com os programas
de transferência de renda do governo federal, como o Bolsa Família e o
Garantia Safra.
“É tanto que, mesmo sendo a maior seca dos últimos 50 anos, a gente
não está vendo o que tradicionalmente ocorria nas secas passadas: saques
e invasões das famílias na região. Então, esse é o panorama. Se por um
lado a gente tem um ambiente muito mais vulnerável, por outro a gente
tem algumas ações governamentais que amenizam a situação”.
O coordenador cita a crise da economia local como uma das
consequências da estiagem prolongada. Além da alta nos preços dos
alimentos na região devido a queda na produção, os animais que
sobrevivem à estiagem perderam seu valor de mercado e podem ser vendidos
por até metade do preço.
“As famílias agricultoras estão descapitalizadas, elas perderam sua
poupança [o rebanho]. Elas tiveram que vender [esses animais] por causa
da seca e [cobraram] um preço bem abaixo do que normalmente é
comercializado”.
Segundo Xenofonte, isso tudo tem um impacto forte no comércio, porque
estamos numa região eminentemente agrícola. “E quando tem uma seca
dessa, que afeta as famílias agricultoras, todo comércio sente. A gente
nota uma paralisação, uma desaceleração na economia. O que tem mantido
de fato são as rendas dos programas governamentais”, argumenta.
O engenheiro agrônomo e pesquisador da Embrapa Semiárido, Pedro Gama,
destaca que a seca é um fenômeno recorrente e cíclico da região do
Semiárido, mas que o país ainda não está suficientemente preparado para
enfrentar. “A seca, como esse fenômeno de estiagem que é recorrente, é
muito comum . A população sabe [disso], [faz parte do semiárido].
“Mas isso que estamos vivendo, essa estiagem prolongada, é uma crise
climática e ocorre a cada 40, 50 anos. Houveram avanços, mas ainda é
pouco. Precisa de muito investimento em pesquisas, políticas públicas
para que estejamos preparados para enfrentar crise desse tipo”.
Gama também ressalta que as políticas de transferências de renda do
governo federal amenizam os efeitos da seca, mas não impedem de
desencadear outros três impactos: social, de produção e climático.
“O que ocorre com a seca é que ela sempre leva a uma crise de
produção. Ou seja, não se produzem alimentos [suficientes] para a
população e para os animais. A outra [crise] é o problema da segurança
alimentar, que se chama abastecimento de água. Esgotam-se os mananciais e
[isso] passa a ser um grande limitante, não só de produção, como para a
população”.
Segundo Gama, há também a crise social, que aparecia fortemente nas
secas anteriores e provocava os fenômenos migratórios. Ele lembrou que
hoje não se vê isso, porque de alguma forma, os programas de subvenção
social atuam como um amortecedor dos impactos sociais. “De certa forma,
eles protegem essa população pobre dos impactos de uma seca desse tipo”.
Para o pesquisador o aumento do valor dos alimentos, com o
agravamento da seca, gera uma segunda etapa na “crise climática” com a
corrosão do apoio social das políticas de transferência. “Esse impacto
todo pode ser atenuado pela área irrigada, não há crise próxima de uma
fonte de água. Onde existe um dinamismo levado por essa cultura
irrigada, muda totalmente no entorno”, diz.
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