Com a prisão de oficiais comprometidos e serenidade ante as provocações
o plano da CIA gorou por hora
A Venezuela viveu nesta terça-feira, 16 de abril, o dia mais tenso de
sua vida constitucional desde o frustrado golpe de abril de 2002. Até as quatro
da tarde, estava em marcha um plano golpista que foi temporariamente abortado
pela maturidade política da militância chavista e pela firme demonstração de
autoridade do presidente Nicolás Maduro, com o apoio dos vários escalões das
Forças Armadas Nacionais Bolivarianos.
Desde segunda-feira, quando o chefe oposicionista de direita
Henrique Capriles Radonski, derrotado nas
eleições presidenciais de domingo, ordenou protestos violentos contra a proclamação de
Maduro como vencedor das eleições, com o apoio de mercenários para-militares em
pelo menos 15 estados do país, sua expectativa era de criar uma situação semelhante
a de 13 anos atrás, que redundou na deposição por dois dias do presidente Hugo
Chávez.
A agitação de rua levaria a uma sedição militar sob a
liderança de dois generais e nove oficiais da Guarda Nacional, que operariam a
partir do Comando de Apoio Aéreo de La Carlota.
No entanto, uma rápida ação da
Direção de Inteligência Militar deteve os potenciais sublevados ainda na noite
de domingo, no mesmo momento em que Capriles Radonski declarava que não
reconhecia o resultado anunciado pelo Conselho Nacional Eleitoral e ordenava as
ações violentas de segunda-feira.
No plano internacional, o golpe teve o apoio ostensivo do
governo norte-americano, que ainda não formalizou o reconhecimento da vitória
de Maduro, e da Espanha, que lançou suspeitas sobre o pleito.
Na manhã de
terça-feira, enquanto a militância orgânica do Partido Socialista Unido da
Venezuela se preparava para o contra-ataque sob o comando de Jorge Rodrigues,
Maduro deu um ultimato ao governo espanhol e este reconsiderou sua postura.
Durante toda a segunda-feira, as agitações de rua ficaram
por conta dos grupos ligados a Capriles, que apostava num confronto de grandes
proporções com centenas de mortes.
Com a ajuda de para-militares armados, esses
grupos atacaram repartições públicas, tentaram tomar a estação estatal de TV e
forçar uma paralisação das empresas por
ordens dos patrões.
Maduro avisou que poderia radicalizar com a tomada das
empresas por seus trabalhadores. “fábrica parada será fábrica ocupada” – advertiu
a deputada chavista Blanca Eekhout, em emocionante pronunciamento na Assembléia
Nacioal.
Mas as organizações sociais chavistas surpreenderam e não reagiram à
violência espalhada, apesar das sete mortes registradas, 62 feridos e de mais
de mil pessoas atendidas nos hospitais das cidades onde os grupos de direita incendiavam objetos
nas ruas e atacavam inclusive sete Centros de Diagnóstico Integral, onde trabalham
médicos e enfermeiros cubanos dentro de um convênio que já produziu grandes
mudanças positivas nos índices de saúde dos venezuelanos.
Clique na foto e veja imagens da violência na Venezuela |
O pretexto usado era de que havia
propaganda de Maduro nesses centros médicos.
Os sete mortos foram atacados em pontos diferentes do país
quando ainda celebravam a vitória de Maduro.
Alguns foram atingidos por balas disparadas pelos para-militares contratados pelo “Comando Simon Bolívar”, o
comitê eleitoral do candidato da direita.
O relato documentado dos crimes, com os nomes
das vítimas e as condições em que foram executadas, foi apresentado no final da tarde de terça-feira
pelos ministros do Exterior, Elias Jaua, e Comunicação e Informação, Ernesto
Villegas.
A resposta firme
contra a tentativa de golpe
Na Assembléia Nacional, o seu presidente, deputado Diosdado
Cabello, responsabilizou Capriles Radonski pela violência desencadeada. Coronel
da reserva e parceiro de Hugo Chávez desde a insurreição militar de 1992,
Cabello escreveu em sua conta no twitter:
“Capriles fascista, eu vou pessoalmente cuidar para que você pague por
todos os danos que está causando ao nosso país e ao nosso povo ".
Deputada Blanca Eekhout: a resposta |
Com o passar do dia, o líder direitista foi se vendo
isolado, apesar do apoio reiterado do governo norte-americano.
Ele contava com
uma grande marcha hoje à sede do Conselho Nacional Eleitoral, onde fica a
memória de todo o processo eleitoral,
numa movimentação que poderia degenerar na invasão de suas instalações e
destruição dos seus documentos.
Depois de reunir-se com o comando das Forças Armadas, o
presidente Nicolás Maduro anunciou, ao meio dia, a proibição dessa marcha que teria conseqüências
incontroláveis.
O recuo dos golpistas
isolados.
Até as quatro da tarde, Capriles e seu staff se mostravam
dispostos a desafiar a proibição. Mas a
repercussão negativa das ações violentas de segunda-feira, as dúvidas sobre qual atitude tomaria a
militância chavista organizada e a detenção dos 11 oficiais que puxariam o
golpe militar o deixaram confuso.
Às cinco da tarde, convocou uma entrevista coletiva, com a
presença de jornalistas estrangeiros, e anunciou seu recuo, alegando que fora
informado por amigos da inteligência militar que os chavistas infiltrariam
provocadores dentro da marcha.
Não era
bem isso: ele queria transformar o
centro de Caracas numa praça de guerra, más já começava a ver-se ameaçado até
de perder o cargo de governador do Estado de Miranda, diante de acusações documentadas
de incitação à sublevações.
Ao final da coletiva, mudou totalmente seu discurso inicial,
conclamando seus partidários com ênfase a não saírem de casa hoje: “quero dizer aos venezuelanos e ao governo que
todos nós aqui estamos prontos para abrir um diálogo para que esta crise possa
ser resolvida nas próximas horas".
Informado que a recontagem prevista de 54% das urnas havia
sido encerrada sem registrar um único erro, tentou se explicar: “Não se trata de reconhecer ou não os
resultados eleitorais de domingo. Estou simplesmente pedindo a recontagem de
todos os votos”. Acusado pelo Ministério Público de não haver apresentado
nenhum documento que justificasse a incitação à desordem, ele disse que hoje
fará chegar ao CNE petição neste sentido.
A ameaça golpista
ainda persiste
Apesar do anúncio do próprio presidente Nicolás Maduro de
que todos os focos de violência haviam sido neutralizados, com a prisão de mais
de 150 pessoas envolvidas diretamente nos ataques de rua, ainda acho cedo para
dizer que a intentona golpista foi totalmente debelada.
Esta foi a maior operação já comandada pela CIA, através de
algumas ONGs financiadas pelos Estados Unidos, e teve relativo êxito: primeiro,
com a morte do líder Hugo Chávez, à semelhança do que aconteceu com o líder
palestino Yasser Arafat. Depois com a votação do oposicionista, que derramou
muito dinheiro na compra de votos em redutos chavistas, enquanto prometia
manter todos os programas sociais do governo.
Neste caso, houve um deslocamento de 1 milhão
de votos dados em outubro a Chávez para Capriles, o personagem sob medida para
o golpe: 41 anos, bilionário, audacioso,
carismático, celibatário (foi da TFP da Venezuela) é um fanático da direita bem
treinado: já no golpe de 2002, quando era deputado, teve atuação de destaque,
inclusive na invasão à Embaixada de Cuba.
Na liderança dos países exportadores de petróleo, a
Venezuela tem hoje a maior reserva do mundo e adota um programa de diversificação
econômica que tem sido muito interessante para empresas brasileiras e argentinas.
Ao contrário do que imaginava a direita e seus monitores da CIA, Maduro, um
ex-motorista de ônibus, demonstrou nessas últimas 48 horas que vai ser um osso
duro de roer, com a mesma têmpera do coronel Hugo Chávez e uma militância
orgânica maior.
Já dia 19, depois de amanhã, estará prestando juramento como
novo presidente da República Bolivariana da Venezuela. E isso ainda não foi
engolido pelos que conceberam o sofisticado golpe “tecnológico” que tirou a
vida do Comandante Chávez aos 58 anos e
quase trouxe a direita de volta ao poder em Caracas.
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