Quando adolescente, já perguntava aos meus imberbes botões por que o
Brasil, país de imigração campana, calabresa e siciliana, entre outras,
não conhecia o fenômeno mafioso. Desde logo, formulei uma tese sem
qualquer pretensão científica, mas convincente na opinião dos botões.
Não temos uma Cosa Nostra no Brasil porque eméritos mafiosos estiveram e
estão no poder, líderes em atividades diversas -teoricamente legais, em
condições de agir às claras e a salvo dos riscos corridos, e sofridos,
por Al Capone ou Totò Riina.
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Capone e Riina, e muitos outros do mesmo porte, acabaram na cadeia,
aqui os equivalentes viveram e vivem à larga, ou estão soltos, quando
não são nome de ruas e praças. Não faltam exemplos -recentes nas -áreas
mais diversas, a começar pela política, a qual, a rigor, está em todas
porque por trás de tudo. Algo espantoso se deu por ocasião do
Panamericano do Rio. Previu-se um orçamento de 400 milhões, gastaram-se
dez vezes mais para realizar obras hoje inúteis e entregues ao descaso.
Serviços de todo gênero foram encomendados aos familiares e amigos dos
organizadores da tertúlia monumental, a despeito dos nítidos conflitos
de interesse. Que aconteceu com os responsáveis por tanto descalabro?
É do conhecimento do mundo mineral que quem mandou
no Panamericano mandará nas Olimpíadas de 2016. Também é, quanto ao
futebol, que a Fifa é um antro mafioso desde os tempos de João Havelange
e que Joseph Blatter e Ricardo Teixeira são seus profetas. Desde a
posse de Dilma- Rousseff na Presidência da República-, -CartaCapital
permite-se chamar a atenção do governo para as péssimas consequências
de um Mundial de Futebol desastrado, exposto ao risco do desmando, e
várias vezes voltamos à carga no mesmo sentido.
Não nos precipitamos a endossar agora as suspeitas levantadas em
relação ao ministro do Esporte, Orlando Silva, mesmo porque
apressadamente veiculadas por Veja. CartaCapital jamais deixou de defender o princípio in dubio pro reo
e enxerga na reportagem da semanal da Editora Abril insinuações e
conjecturas em lugar de provas. Para variar. Certo é, contudo, que um
ministro do Esporte chamado a lidar com Ricardo Teixeira e Joseph
Blatter deve necessariamente situar-se acima de qualquer suspeita.
A presidenta, tão determinada no combate à corrupção, obviamente
-sabe disso e saberá precaver-se, a bem do -País e do seu governo. CartaCapital insiste, de todo modo, em suas preocupações diante da clara presença no gramado e fora dele da máfia do futebol mundial.
Cabe encarar a questão também de outro ângulo, a partir da análise do
singular destino da esquerda nativa. Refiro-me neste exato instante ao
PCdoB, nascido da costela do Partidão em nome de uma fidelidade
ideológica e moral que os discípulos de Luiz Carlos Prestes teriam
traído.
Outro aspecto da história brasileira que amiúde me levou a
convocar os botões diz respeito à efetiva e duradoura existência de uma
esquerda brasileira.
Desabrido, Lula já me disse, em entrevista publicada em CartaCapital
há seis anos, “você sabe que eu nunca fui de esquerda”. Resta ver o que
significa hoje ser de esquerda. Para mim claro está, ao menos, que é de
esquerda quem se empenha, clara e honestamente pela igualdade, e sem
medir esforços, para a redenção dos herdeiros da senzala. Parece-me que
alguns passos neste rumo o ex-presidente deu.
Confirma-os, e com objetivos maiores, Dilma Rousseff
ao definir o projeto de acabar com a miséria. Inevitável, entretanto,
observar que um sem-número de políticos está a cuidar é da sua própria
riqueza, e entre eles, pasmem, não faltam os ex-comunistas do B. Orlando
Silva desde os começos de sua atuação ministerial é alvo de inúmeras
denúncias de corrupção encaminhada pelas sendas do dinheiro das ONGs, a
envolverem não somente o próprio, mas também seu partido. Era de se
esperar? Desfecho inescapável de um enredo movido a ganância acima e
além de crenças e princípios? O PCdoB já teve, entre outras razões de
orgulho, a lisura e a coerência dos seus filiados. No poder, é mais um
que se porta como os demais.
http://www.cartacapital.com.br/politica/a-mafia-no-poder
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