sábado, 22 de março de 2014

Noticiário internacional e manipulação midiática - Por Francisco Fernandes Ladeira. Notícias de Ontem.

Nos últimos anos, a grande imprensa brasileira, apesar do seu enorme poder de persuasão, tem perdido paulatinamente o monopólio de moldar a opinião pública nacional.

O advento das redes sociais e a “mídia independente” têm proporcionado visões alternativas de determinados acontecimentos, o que vem a contribuir como contraponto ao status quo.

Nesse sentido, o exemplo da chamada “Mídia Ninja”, que transmitiu ao vivo pela internet alguns flagrantes de abusos policiais nas recentes manifestações populares (contrariando a “versão oficial” dos fatos), é emblemático.

Entretanto, em relação às questões internacionais, em que o ponto de vista alternativo ao pensamento hegemônico é menos eficaz e abrangente, ainda é a grande imprensa (principalmente a maior emissora de TV do país) que determina o pensamento de grande parte dos brasileiros.
Sendo assim, a ideologia imperialista da mídia estadunidense, fielmente difundida pelos seus congêneres tupiniquins, é praticamente a única fonte de informações que chega à esmagadora maioria da população.
Desse modo, estereótipos como o “muçulmano terrorista e fanático religioso”, o “ditador cubano” e o “caudilho sul-americano”, exaustivamente repetidos como mantras pelos meios de comunicação, são aceitos sem maiores questionamentos.
Todavia, as atrocidades cometidas pelo Estado de Israel contra o povo palestino, a espionagem realizada pelo governo de Washington e a violação dos direitos humanos na Colômbia são estrategicamente negligenciados, ou, na melhor das hipóteses, abordados superficialmente.
Dois pesos, duas medidas - Vejamos alguns exemplos recentes. Neste ano faleceram dois influentes nomes do xadrez geopolítico global, Hugo Chávez e Margaret Thatcher, respectivamente nos meses de março e abril. Porém, as coberturas midiáticas de ambos os acontecimentos foram altamente tendenciosas.

Chávez, articulador de políticas sociais que melhoraram as condições de vida dos venezuelanos mais pobres e responsável por aumentar os laços de solidariedade entre os povos do Sul, sempre foi tachado de “caudilho” e apontado como líder que ameaçava a estabilidade política mundial.

Já a “dama de ferro”, que executou inúmeras políticas neoliberais maléficas às classes trabalhadoras, é retratada pela imprensa hegemônica como exemplo de sobriedade e aclamada como grande personalidade do século passado.
Não obstante, a mesma mídia que faz questão de enfatizar uma suposta retaliação realizada pelo governo cubano à blogueira Yoani Sánchez, se cala em relação às perseguições de Washington a Bradley Manning, Julian Assange e Edward Snowden.

A propósito, enquanto Yoani saiu livremente de Cuba e viajou pelo mundo, Manning está preso nos Estados Unidos, Assange cumpre prisão domiciliar na embaixada do Equador em Londres e Snowden não pode deixar a Rússia, onde está exilado, sob o risco de ser morto pelo governo estadunidense. 

Em outros termos, de acordo com o pensamento dominante, apontar violações de direitos humanos realizadas pelo regime castrista é um ato de heroísmo. Em contrapartida, denunciar as políticas de espionagem dos Estados Unidos é caracterizado como ação criminosa.

Dois pesos, duas medidas.

Democratização dos meios de comunicação.

Para a grande imprensa brasileira, governos eleitos pelo voto popular, mas contrários aos interesses estadunidenses, são qualificados como antidemocráticos; já ditaduras e monarquias apoiadas pelas grandes potências não são questionadas.

Assim, as deposições de Manuel Zelaya e Fernando Lugo foram consideradas constitucionais e o golpe militar que ocorreu em julho no Egito (tacitamente apoiado pela Casa Branca) é justificado sob o pretexto de combater o “radicalismo islâmico” da Irmandade Muçulmana.

Aliás, compactuar com ações contrárias a governos democraticamente eleitos não é novidade para a mídia hegemônica brasileira. Um dia após o fatídico golpe militar de 1964, o jornal O Globo apresentava um editorial que exaltava os bravos militares que “salvaram a democracia, a lei e a ordem no Brasil”. Desse modo, não é por acaso que o acrônimo PIG – partido da imprensa golpista – é bastante utilizado pelas forças progressistas de nosso país. 

Em suma, não se trata de pleitear uma imprensa que tenha essa ou aquela tendência ideológica, mas questionar o fato de a grande mídia brasileira apresentar quase sempre uma visão unidimensional da realidade.

Salvo raríssimas exceções, somente determinado ponto de vista tem espaço nas maiores emissoras de televisão e nos principais jornais e revistas do país. Opiniões divergentes ao status quo são peremptoriamente ignoradas.

Diante dessa realidade, é preciso que os diferentes setores sociais possam ter a oportunidade de defender os seus valores políticos em igualdade de condições. Portanto, uma sociedade realmente livre passa, inexoravelmente, pela completa democratização dos meios de comunicação de massa.
Nota sobre o autor: Francisco Fernandes Ladeira é especialista em Ciências Humanas, Brasil: Estado e Sociedade pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e professor de Geografia em Barbacena - MG. www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/_ed760_noticiario_internacional_e_manipulacao_midiatica 

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