Em conversas gravadas com autorização da Justiça, senador goiano
acerta com Cachoeira a interferência em ações do Ministério Público de
Goiás, comandado pelo irmão do parlamentar JÚNIA GAMA.
Interceptações
telefônicas da Polícia Federal apontam que o senador goiano Demóstenes
Torres (sem partido) garantiu ao bicheiro Carlinhos Cachoeira interferir
diretamente em procedimentos internos do Ministério Público (MP) de
Goiás, comandado pelo irmão do parlamentar, o procurador-geral de
Justiça, Benedito Torres, para favorecer o contraventor.
As
conversas, obtidas pelo Correio, mostram ainda a suposta influência da
organização criminosa sobre Alencar José Vital, presidente da Associação
Goiana do Ministério Público (AGMP), e Ronald Bicca, procurador-geral
do Estado. Segundo os investigadores, os três eram acionados pelo
senador para atender interesses de Cachoeira.
Em um dos diálogos, em
16 de maio de 2011, Cachoeira pede a Demóstenes que converse com seu
irmão para que interceda contra a transportadora Garbano, que estaria em
área incômoda para o bicheiro.
"Você falou com seu irmão?", indaga.
Demóstenes responde: "De novo, não, vou encontrar com ele pessoalmente".
O bicheiro reforça sua demanda e o senador sugere resolver a questão
via Ronald Bicca. Cachoeira discorda, exigindo que o senador acione
Benedito Torres: "Tem que ser via Ministério Público, entendeu?".
Demóstenes
concorda e diz que irá conversar com o irmão. "Pode deixar que eu tomo
conta disso. (...) Vou procurar meu irmão agora na hora do almoço, vamos
almoçar juntos e vou falar essa questão com ele." A seguinte resposta
de Cachoeira mostra a suposta influência da organização criminosa sobre o
irmão de Demóstenes: "Manda ele (Benedito Torres) lá designar um
promotor para entrar com uma ação contra isso aí, porque isso aí é parte
do Ministério Público municipal, entendeu". Na noite do mesmo dia,
Demóstenes retorna a Cachoeira, alegando ter acertado com o irmão o
cumprimento da ordem do bicheiro: "Tratei com ele aquelas duas questões,
diz que vai resolver, falou?".
Licitação
Em outra ocasião, o
contraventor ordena que Demóstenes acione Benedito para que receba o
vereador de Goiânia Elias Vaz (PSol), que apresentou uma representação
no MP de Goiás para barrar licitação do Parque Mutirama, na capital
goiana. Demóstenes, como nos episódios anteriores, prontifica-se a pedir
a interferência do irmão: "Vou ligar lá. Te ligo daqui a pouco".
O
presidente da AGMP, Alencar José Vital, é outra autoridade citada nas
conversas. Cachoeira pede que Demóstenes acione Alencar para cuidar de
um processo contra Amilton Batista, presidente da Câmara Municipal de
Anápolis. "O Alencar, que é o promotor que coordena essa turma, ficou de
dar uma resposta", diz Demóstenes. No mesmo diálogo, refere-se a um
processo rejeitado por um ministério sobre a Faculdade Padrão de
Medicina, de um empresário ligado a Cachoeira. Demóstenes afirma que
seria melhor abrir um novo processo e diz que Alencar irá "cuidar
pessoalmente das duas situações". Comenta ainda que até o fim do dia o
presidente da AGMP retornaria a ligação.
A terceira autoridade citada
nas conversas é o procurador-geral do Estado, Ronald Bicca. Cachoeira
ordena ao ex-presidente da Câmara Municipal de Goiânia Wladimir Garcez
que pegue um "parecer favorável" ao delegado Edemundo Dias Filho, também
tesoureiro do PSDB de Goiás, que enfrentava um processo administrativo.
Em outro trecho, Demóstenes relata a Cachoeira que Bicca teria lhe dito
que "não gosta de falar com intermediários": "Ele insinuou que você
manda alguém atrás dele. E quando você quiser as coisas, você chama ele e
fala, ué".
"Vício de origem" - O governador Marconi Perillo
(PSDB) também é citado em uma conversa entre os dois. Demóstenes
pergunta a Cachoeira sobre uma "concessão" que a Assembleia Legislativa
de Goiás irá decidir e diz que será melhor se o governador intermediar:
"Eu acho que o Marconi que precisava mandar, para evitar questionamentos
futuros, você num acha não?". Cachoeira discorda, mas o senador alerta
para o risco de a operação ser contestada por "vício de origem", o que
faz o bicheiro aceitar a sugestão, dando a entender que irá tratar o
assunto diretamente com Marconi: "Eu vou discutir isso com ele, tá?".
Em
nota, a Procuradoria-Geral de Justiça de Goiás afirma que, nos três
casos citados, as decisões do órgão foram "opostas à pretensão
manifestada por Carlos Cachoeira" e que o procurador Benedito Torres
"jamais aceitaria ingerência" e "desconhecia qualquer relacionamento do
senador Demóstenes Torres com as pessoas ou as empresas investigadas na
Operação Monte Carlo".
Ronald Bicca confirmou ter dado parecer
favorável a Edemundo Dias Filho, por tratar-se de caso "corretíssimo e
tranquilo". Ele afirma ser amigo do senador, mas diz nunca ter tratado
de assunto "relacionado a governo com Demóstenes Torres e muito menos
com Cachoeira". Alencar José Vital alega que o fato de o senador ter
usado seu nome foi uma "fanfarronice e irresponsabilidade de Demóstenes
diante de tantas outras coisas que o Brasil está vendo sobre ele".
Perillo não se pronunciou até o fechamento desta edição.
Derrota no Supremo. O
ministro Ricardo Lewandowski negou pedido de liminar em que o senador
Demóstenes Torres pede a suspensão do inquérito que tramita contra ele
no Supremo Tribunal Federal.
Em ação apresentada na última terça-feira, a
defesa do senador queria que o ministro julgasse nulas todas as
gravações feitas pela Polícia Federal. As escutas mostravam conversas
entre Demóstenes e o contraventor Carlinhos Cachoeira, acusado de
comandar um esquema de jogo ilegal. Lewandowski não analisou a questão
da validade das provas no despacho, isso será definido quando a liminar
for julgada em plenário.
Fonte. http://www.exercito.gov.br/web/imprensa/resenha