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Mariela Castro Espín |
Renata Giraldi - Repórter da Agência Brasil
Brasília – Filha do presidente de Cuba, Raúl Castro, e sobrinha de
Fidel, Mariela Castro Espín, de 50 anos, diretora do Centro Nacional de
Educação Sexual do país, faz uma revolução silenciosa na sociedade
cubana combatendo a homofobia e os preconceitos em geral. Na semana
passada, ela esteve no Brasil, onde participou de dois seminários sobre o
tema em Brasília e Porto Alegre. Em entrevista à Agência Brasil Mariela disse que sua estratégia de ação é simples: educação aliada à sensibilidade.
“A nossa principal ênfase é na estratégia educativa. Trabalhamos com
tudo o que toca o coração e a sensibilidade”, disse. Depois de lembrar
que Brasil e México apresentam índices elevados de violência contra
homossexuais e transgêneros, ela destacou que os números brasileiros são
“ainda mais“ preocupantes. “Isso chama a atenção. Essa não é uma
realidade em Cuba”.
Mariela não comentou a polêmica envolvendo a Comissão de Direitos
Humanos da Câmara devido à ação do seu presidente, deputado Pastor Marco
Feliciano (PSC-SP), que defende medidas conservadoras quando o tema é
orientação sexual. Ela mostrou que a campanha pelo fim do preconceito em
Cuba envolve cartazes e spots com os lemas: “Dois iguais
também têm direito a ser casal” e “Reconhecimento dos direitos sexuais
como direitos humanos”. A seguir, os principais trechos da entrevista de
Mariela Castro à Agência Brasil.
Agência Brasil – Como é o trabalho no Centro Nacional de Educação Sexual de Cuba?
Mariela Castro Espín – A nossa principal ênfase é na
estratégia educativa. Trabalhamos com mensagens informativas e que
consideramos fundamentais. Promovemos cursos de formação, na área
jurídica, de educação e de saúde, incentivamos debates e muitas
conversas. Minha mãe [Vilma Espín, que casou com Raúl Castro, atual
presidente cubano] era uma feminista e sempre teve ideias de liberdade e
de direitos igualitários. Ela lutou por isso desde os anos de 1970.
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Mariela Castro Espín |
ABr – A senhora fala muito em educação, então esse é o caminho quando se refere a informar sobre questões sexuais?
Mariela – Sim, sem dúvida. O começo de tudo é a
estratégia da educação. Não vamos impor a hegemonia, por exemplo, não
gosto da ideia do macho-gay ou do macho-heterossexual. Isso é
preconceituoso também. É preciso trabalhar a sociedade para compreender e
conviver bem com as diferentes orientações sexuais que existem. Só as
leis não bastam: a lei sozinha não muda a sociedade. É sob re isso que
trabalhamos, o que inclui também ações de combate à violência contra
mulheres e meninas. A educação é tudo. A mídia também é muito
importante.
ABr – Como lidar com as resistências quando se fala de temas tão delicados e até mesmo polêmicos?
Mariela - A discriminação de qualquer ordem não é
coerente com os princípios da revolução [Revolução Cubana, quando os
irmãos Castro e guerrilheiros, em 1959, assumiram o poder em Cuba
instaurando um governo socialista]. É preciso superar preconceitos.
Trabalhamos com o apoio das igrejas e da sociedade civil, assim como com
várias organizações. A diversidade é uma característica humana.
ABr – Nos últimos anos, o centro que a senhora dirige se preocupa bastante com a questão da homofobia. Por quê?
Mariela – Na universidade, trabalhei inicialmente com
educação sexual para crianças e adolescentes. Mas com o passar do tempo,
fui procurada por homossexuais e transgêneros que pediam ajuda. O tema
me interessou. Mas tudo começou lá atrás quando acompanhava minha mãe
que era uma defensora dos direitos humanos. A preocupação está em
trabalhar pela preservação dos direitos dos homossexuais, o que envolve
principalmente o local de trabalho e a família.
ABr – Parece que a senhora tem sido bem-sucedida nos seus esforços...
Mariela - Trabalhamos com tudo o que toca o coração e a
sensibilidade, isso surte efeitos. As artes, em geral, estão presentes
nas nossas atividades.
ABr – O que a senhora observa de mudanças na sociedade cubana depois do trabalho de educação sexual?
Mariela - Percebo muitas mudanças, não apenas nos
últimos anos, mas de 50 anos para cá. As mudanças de comportamento podem
ser observadas desde a infância, passando juventude e até a vida
adulta.
Os casos de discriminação são tratados basicamente por meio de
medidas administrativas e não na esfera judiciária.
Promovemos a
primeira Jornada contra a Homofobia, em 2008, já fizemos 20 cirurgias
para reversão de sexo [masculino e feminino], há orientações sobre o
combate de aids e cuidados com a saúde masculina, inclusive sobre
potência sexual.
ABr – Nos últimos anos, a senhora tem dado ênfase aos transgêneros. Há uma razão especial?
Mariela – Sim, não tratamos o transgênero como um
doente. É uma pessoa que sofre e que merece ter atenção e receber o
tratamento adequado. No caso dos que querem ser submetidos à cirurgia
para a reversão de sexo, há uma fila de espera. Mas o processo é todo
gratuito. O tratamento envolve o uso de hormônios para a cirurgia, o
acompanhamento da família e a inserção social e laboral.
ABr – No Brasil, o que a senhora observa quanto aos temas de homossexuais e transgêneros?
Mariela – [Infelizmente] o Brasil e o México
apresentam índices elevados de violência contra homossexuais e
transgêneros. No Brasil os números são ainda mais preocupantes. Isso
chama a atenção. Essa não é uma realidade em Cuba. Em Cuba, não
identificamos a violência contra homossexuais e transgêneros. O que
percebemos é que as violações estão relacionadas com questões [de
preconceito no] trabalho e [na] família.
ABr – Observando o futuro, a sensação que a senhora tem é que há ainda muito a fazer?
Mariela – Ah...[Olha para cima como quem para para
pensar] há muito o que fazer ainda. É uma estratégia permanente, temos
de continuar a luta para superar toda forma de discriminação, incluindo a
identidade de gênero. O esforço agora é para aprovar mudanças no Código
de Família tornando legal a união entre pessoas do mesmo sexo.
Em Cuba,
não falamos em casamento porque no país o casamento formal e o informal
são tratados da mesma forma. Se heterossexuais podem se unir como um
casal, por que os homossexuais não têm o mesmo direito? Estamos em um
bom caminho, pois estamos avançando.
Edição: Tereza Barbosa.
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