quarta-feira, 10 de outubro de 2018

‘Sou resultado do movimento de luta’, diz 1ª indígena eleita deputada no Brasil.

Joênia Wapichana assume como deputada federal por Roraima em 2019. Foto: Joênia Wapichana/Direitos Reservados/Agência Brasil.
Publicado em: outubro 10, 2018
Alex Rodrigues. Da Agência Brasil.
Os 8.491 eleitores que votaram na candidata a deputada federal por Roraima Joênia Batista de Carvalho elegeram a primeira mulher indígena para a Câmara dos Deputados, desde que esta foi criada, em 1824 – ano em que a primeira Constituição brasileira foi promulgada, sem qualquer menção à existência e aos direitos dos índios brasileiros. Há 31 anos, desde que o cacique xavante Mário Juruna deixou o Congresso Nacional, em 1987, um índio não era eleito deputado federal.
Aos 43 anos, Joênia Wapichana é pioneira da causa indígena e milita desde 1997, quando se tornou a primeira mulher índia a se formar em Direito, na Universidade Federal de Roraima. Em 2008, tornou-se a primeira indígena a falar no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), defendendo a legalidade da homologação dos limites contínuos da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima. Após isso, viajou para os Estados Unidos, onde fez mestrado na Universidade do Arizona.
“Sou o resultado de sonhos e de investimentos de outras lideranças indígenas que planejaram ver a nós, indígenas, conquistar diversos espaços. Do movimento indígena que luta para conquistar espaços”, disse Joênia à Agência Brasil, nesta quarta-feira (11). “Nada para nós foi fácil. Nem alcançar o reconhecimento de nossa terra; nem eu me formar na faculdade de Direito; nem fazer uma defesa no STF e, muito menos, assumir este espaço tão importante e necessário no Congresso. Se sou uma pioneira, é graças aos povos indígenas, ao nosso movimento e aos esforços de cada povo e pessoa que acreditou nisso.”
Ao lutar pela demarcação das terras indígenas e pelo desenvolvimento sustentável destas reservas, Joênia decidiu disputar uma cadeira na Câmara dos Deputados ao constatar a necessidade dos povos indígenas se fazerem representados no Congresso. Filiou-se à Rede Sustentabilidade e fez campanha com pouco mais de R$ 170 mil: do Fundo Partidário, recebeu R$ 150 mil; os outros cerca de R$ 22 mil vieram de apoiadores “índios e, principalmente, não-indígenas” que contribuíram por meio de um site de financiamento coletivo. Ao conceder esta entrevista, por telefone, Joênia estava às voltas com a burocracia da prestação de contas ao Tribunal Regional Eleitoral de Roraima (TRE-RR).
Candidaturas indígenas
A vitória da advogada foi fruto de um movimento em prol do lançamento de candidaturas indígenas comprometidas com propostas de políticas públicas capazes de assegurar os direitos dos índios, como o direito à terra, à gestão sustentável de seus territórios, à saúde, à diferença entre outros. A proposta foi apresentada durante plenária do Acampamento Terra Livre 2018, no fim de abril, em Brasília.
“As candidaturas não são pela busca do prestígio e sim para conseguir igualdade de oportunidades, para decidir sobre as vidas indígenas, para discutir e decidir o que é melhor para o povo”, disse, na ocasião, Sônia Bone Guajajara, que foi candidata à vice-presidência da República pelo PSOL. Após a eleição de Joênia, a Fundação Nacional do Índio (Funai) divulgou uma reportagem em que afirma que o resultado representa uma conquista não só “para os povos originários, mas para todas as mulheres do Brasil”. A representante indígena é uma das 77 mulheres eleitas para a Câmara dos Deputados – número que representa apenas 15% do total de 513 deputados federais com assento no Congresso.
“Estou muito feliz e ciente da responsabilidade. Neste cenário político, é necessário e importante os povos indígenas estarem representados no Congresso Nacional”, afirmou a futura deputada, prometendo atuar para além da defesa dos interesses indígenas. 
“Vou levantar a bandeira dos povos indígenas, mas também a defesa dos direitos coletivos no sentido mais amplo; dos direitos sociais, como educação, saúde, segurança, meio ambiente e cultura”, acrescentou Joênia, destacando a importância de os parlamentares fiscalizarem a aplicação dos recursos públicos pelo Poder Executivo como forma de combate à corrupção e a má-utilização das verbas disponíveis. 
Propostas
Entre os projetos que pretende encampar tão logo assuma, em fevereiro de 2019, Joênia cita o Estatuto dos Povos Indígenas, “engavetado há vários anos”, e propostas que tragam melhorias para as comunidades indígenas, com ênfase em políticas públicas que promovam a autonomia feminina e a sustentabilidade das atividades tradicionais. “Muitas mulheres são as únicas responsáveis por suas famílias. É preciso empoderá-las por meio de políticas públicas que as incluam em projetos de gestão do território indígena e dos recursos naturais disponíveis. Hoje, por exemplo, há poucos programas de incentivo à agricultura indígena, atividade da qual as mulheres indígenas participam diretamente.”
Ao afirmar que recebeu muitos votos de não-índios, a advogada também cita a importância de uma solução que garanta o abastecimento energético para Roraima – único estado não interligado ao sistema nacional e que depende da energia fornecida pela Venezuela – e a reforma política.
“Não vai ser fácil nosso trabalho. Vivemos um momento crítico, em que garantias constitucionais estão em risco. Não só para os povos indígenas, cujo direito de terem suas terras demarcadas e protegidas é descumprido, mas para os direitos sociais em geral. Há uma forte tentativa de emplacar retrocessos e isso afeta a todos os cidadãos”, critica a advogada, ao se posicionar contrariamente ao teto para os investimentos públicos por 20 anos, que condiciona o aumento das despesas do Governo Federal à inflação.
Para a deputada, o fim dos conflitos por terras entre índios e não-índios só será alcançado com a demarcação das áreas reivindicadas cujos estudos antropológicos comprovarem se tratar de terras tradicionais indígenas. “Tem que concluir todos os levantamentos fundiários pendentes; fazer com que as partes compreendam a importância disso; indenizar quem tiver direito a ser indenizado e reafirmar os procedimentos legais demarcatórios, já que coloca-los em dúvida só aumenta a insegurança jurídica, tanto para as comunidades indígenas, como para as comunidades não-indígenas. A demora da conclusão destes processos é o que gera violência”, concluiu Joênia.

A elite brasileira suicida-se, por Ruben Bauer Naveira.


Nós vamos, um dia, amadurecer como povo e realizar nossa potencialidade. 
E vamos então varrer a canalha” (Darcy Ribeiro)
Essa frase curta, “a elite brasileira suicida-se”, contém dois erros.

Primeiro: jamais houve elite neste país. O que temos aqui não passa de uma classe dominante que, por preguiça intelectual, volta e meia é chamada de elite – conceito que, em qualquer país, diz respeito a um extrato social que avoca para si a responsabilidade de traçar o destino da sua nação e fazê-lo cumprir. Nunca houve nada assim no Brasil, lugar em que os horizontes da classe dominante não passam da acumulação predatória e do consumo ostentatório.

Segundo: no curto prazo, a classe dominante não corre risco de morte. Não há então nenhum suicídio iminente. Será, porém, no médio-longo prazo, que a classe dominante brasileira acabará por perceber, da pior maneira possível, que terá sido a sua própria natureza que lhe terá conduzido a seu fim.

Darcy Ribeiro sonhou com um povo que, por tomada de consciência, completava o seu processo de formação. O que ele não podia imaginar era que tal salto seria induzido de forma tão paradoxal, pela inconsequência da própria classe dominante. Mesmo que ainda demore muitos anos, o ponto-de-não-retorno foi ultrapassado, é então questão de tempo.

Antes de mais nada, nenhum país vive sem instituições, e as nossas se inviabilizam a olhos vistos. Instituições que, historicamente, foram construídas segundo os interesses da classe dominante: Charles Darwin, em sua estada no Brasil em 1832, registrou, repugnado, que “não importa a monta das acusações que possam pesar contra um homem de posses, é certo que em pouco tempo ele estará livre”.

Para que servem as instituições?

Ao menos a título formal, instituições existem para servir à sociedade e para edificar o futuro da nação. Como foi dito, no Brasil isso jamais aconteceu (como poderia, se não temos elite?) mas, pelo menos, ainda se guardavam as aparências. Agora, esfrega-se na cara da sociedade que as instituições existem tão somente para servir a si próprias.

Nossas instituições funcionam normalmente. Elas cumprem seus ritos e protocolos, executam seus orçamentos, nelas se tomam decisões e se definem políticas públicas. Mas, perante a sociedade, instituições vivem de veracidade ou, ao menos, de verossimilhança. Instituições até podem servir a si próprias enquanto fingem que servem ao bem comum, mas não podem simplesmente se cansar de fingir e estampar perante a sociedade uma realidade que ela preferiria não conhecer. Desencanto é sem volta.

As instituições brasileiras têm funcionalidade, o que elas não têm é sentido.

Para que se cumpra a antevisão de Darcy, o mais difícil já aconteceu. Graças à insegurança, cegueira, afobamento, inconsequência e ganância sem freios da classe dominante (mais uma vez passando recibo de não ser merecedora de ser vista como elite), o conjunto da sociedade vai se dando conta que essas instituições são imprestáveis, e terão que ser transmutadas.

Falta ainda algo já não tão difícil, na medida em que depende de nós: a unificação da sociedade em torno de um projeto para essa transmutação.

Ora, o atributo número um para tal projeto será sua qualidade de, justamente, unificar a sociedade. Terá que ser este o ponto de partida para a concepção do projeto.

O propósito deste artigo é apresentar três propostas concretas nesse sentido, respectivamente formuladas em torno dos conceitos de Constituinte dos Cidadãos, de Grupos de Diálogo e de Democracia Direta, as quais serão descritas ao final do texto.

A paixão não-correspondida da classe média pela classe dominante
Previsivelmente, a classe dominante lança mão do expediente clássico de dividir para governar. Por via da manipulação, ela atiçou preconceitos latentes da dita classe média, com duplo propósito: jogá-la contra as classes desfavorecidas e contra quem governasse em favor destas; e alinhá-la aos seus interesses, ainda que contrários aos dela própria.

(Nota: este processo se encontra descrito em profundidade no recente livro de Jessé de Souza, A Radiografia do Golpe: Entenda como e porque você foi enganado. Para uma introdução ao argumento de Jessé, ver https://www.facebook.com/souza.jesse225/posts/ 10203070013027649).

Muito simplificadamente, a classe média, desde sempre inconformada com os privilégios dos “de cima” (em especial o privilégio de fazer leis para serem cumpridas por todos, menos eles próprios), privilégios que ela condena da boca para fora mas que intimamente inveja e anseia para si, ficou ainda mais desconfortável a partir do momento em que os “de baixo” passaram também a contar com acesso, por mínimo que fosse, à Terra Prometida (leia-se, aos recursos do Estado). “Todo mundo mama, menos eu!”, foi como ela sentiu.

A classe média é hoje, possivelmente, a mais numerosa no país:

- a classe E são os miseráveis;

- a classe D são os pobres;

- a classe C é a classe média baixa;

- a classe B é a classe “média-média”;

- a classe A é a classe média alta.

Nenhuma dessas é classe dominante.

A classe A não são os ricos. O IBGE denomina “família de classe A” àquela cuja renda familiar seja acima de vinte salários mínimos, quase dezenove mil reais. Consideremos arbitrariamente o dobro disso: uns quarenta mil reais. Por acaso uma família com renda mensal de 40 mil reais possui helicóptero (não precisa ser jatinho)? Possui lancha esportiva (não precisa ser iate) com, claro, atracadouro próprio? Possui carro esportivo importado (um só, não precisa ser uma coleção)? Possui propriedades no exterior? Possui conta bancária no exterior com saldo equivalente a mais de um milhão de reais?

A classificação do IBGE busca, propositadamente, ocultar os ricos, diluindo-os na classe média alta.

Os ricos formam aquela que poderia ser chamada a classe AA. Arbitrariamente, estipulemos que a classe AA seja aquela cuja renda familiar esteja acima de cem mil reais. Isso são menos que 0,1% – zero vírgula um por cento – da população. E esses menos de 0,1% possuem praticamente metade de toda a riqueza nacional: eis a classe dominante.

Já a classe média, composta pelo conjunto das classes A, B e C, é numericamente tão expressiva quanto as classes desfavorecidas (as classes D e E).

De forma direta: sem a classe média, será impensável qualquer projeto para que a sociedade avoque para si as instituições e sua reconcepção.

Ocorre que a classe média não se vê como classe dominada. 

Primeiro, porque ela almeja ascender à classe dominante (como se o poder no Brasil não fosse regido pela lei maior da concentração), e ademais porque ela sempre se prestou a instrumento da classe dominante para a dominação mais ostensiva das classes desfavorecidas. Ela, dominadora dos que lhe estão abaixo, pode não se ver como dominada pelos que lhe estão acima, mas é. Guardadas as devidas proporções, a mesma desconsideração pelas pessoas – a mesma ausência de cidadania – está tanto na opressão exercida contra os “de baixo” pela instituição Polícia Militar nas periferias e favelas quanto naquela exercida contra a classe média por instituições como DETRAN, Receita, INSS, na fiscalização aos pequenos comerciantes etc.

Isso pode até não ser percebido assim. Porém, tudo o que agora se encontra em curso será um trauma e tanto para a classe média:

- a estagnação econômica do país derrubará os níveis de consumo das famílias, prejudicando sobremaneira os micro e pequenos empreendedores;

- o congelamento dos gastos públicos (PEC 55/241) terá impacto não somente sobre a saúde e educação públicas (de que a classe média tenta prescindir), mas degradará também a qualidade dos serviços públicos em áreas que lhe são caras, como mobilidade urbana e segurança;

- a reforma previdenciária desqualificará os melhores empregos (que são os da classe média), pela postergação da aposentadoria;

- a reforma trabalhista (com o virtual fim da CLT) será catastrófica para as classes desfavorecidas. Isso virá reduzir custos para os micro e pequenos empreendedores, contudo reduzirá também o poder geral de compra da população – afora que causará um crescimento da criminalidade;

- a entrega do pré-sal aos estrangeiros prejudicará o desenvolvimento do país, comprometendo a qualidade de vida das próximas gerações.

Já a classe dominante só terá a ganhar com tudo isso:

- o domínio cada vez mais direto sobre as instituições lhe permite fazer valer ao máximo os seus interesses;

- ela vive do rentismo (coisas como emprego, salário ou aposentadoria não lhe dizem respeito), de futuro glorioso agora que o gasto público foi resguardado para o pagamento dos juros da dívida pública;

- será a grande beneficiária da redução geral dos custos do trabalho (mesmo que certos segmentos industriais ainda dependam do mercado consumidor interno);

- seus laços com o Brasil limitam-se à extração de riqueza, a qual ela desfruta no exterior; ela pode assim se manter alheia à degradação das condições de vida no país.

Em adição a tudo isso, virá uma reforma tributária ainda obscura, mas de que não cabe duvidar que aliviará a carga tributária da classe dominante e pesará a mão sobre todas as demais.

A janela de oportunidade do choque de realidade.

Encontra-se assim em curso um processo que empurra a classe média para um choque de realidade, um abalo na sua visão de mundo histórica, pela qual a riqueza é o prêmio dos mais fortes, um lugar ao sol que se conquista na marra, na base do cada um por si (“farinha pouca, meu pirão primeiro”, que no Brasil pode ser lido como “Estado pouco, meu privilégio primeiro”). Visão de mundo que toma por fato natural da vida a dominação dos de baixo pelos de cima, bem como a decorrência disso, a desigualdade.

Aos dominados cabe resignar-se a essa sua condição natural. O pior dos crimes que um dominado pode cometer é afrontar seus dominadores: um escravo que enfrentasse o feitor ou capataz era torturado com os mais atrozes suplícios, e sublevações como as da Cabanagem e de Canudos foram “pacificadas” por genocídio. 

Hoje, das violências que os dominados cometam entre si a sociedade se exime com menosprezo, mas, para a menor violência cometida por um dos “de baixo” contra um dos “de cima”, cadeia não basta: a sociedade considera natural, e até bom, que a cadeia violente, desumanize e brutalize o infeliz mais e mais a cada dia, afinal bandido bom é bandido morto (o que, obviamente, não se aplica quando acontece de o criminoso ser um dos “de cima”). 

Em uma palavra: medo.

Desde 1500, somos uma sociedade em que cada um que se vire para conquistar, e defender, aquilo que for capaz de juntar. Isso não nos constitui como sociedade, no sentido pleno desse termo. Isso instila um sentimento permanente de medo de perder aquilo que se conseguiu juntar. Daí o ódio atávico à esquerda – inclusive por parte dos ex-pobres recém-ascendidos. 

Não importa que governos da esquerda tenham promovido a prosperidade e que o governo que derrubou a esquerda traga a ruína, atenuar a desigualdade seria desmanchar a ordem natural das coisas, inocular caos no mundo. A classe média tende a ver o miserável que recebe Bolsa-família e o pobre que tem acesso a Prouni, Pronatec, Minha Casa Minha Vida como gente que vai querer sempre mais (afinal, não somos todos assim?) e, como nunca houve riqueza bastante para todos (afinal, não foi sempre assim?), ela correria o risco de acabar ficando sem a dela.

Foi para afastar esse “perigo” que a classe média ocupou as ruas vestida de amarelo (não por acaso, a cor que na bandeira simboliza riqueza) e bateu suas panelas na varanda, sem se aperceber que era usada pela classe dominante para, no momento seguinte, ser traída e descartada. Essa, a paga pela sua adesão: foi por ter na classe dominante o seu ideal de vida (“a burguesia quer ficar rica”, cantava o poeta Cazuza) que a classe média sempre tomou ameaças existenciais à classe dominante como ameaças a si própria.

Oxalá esses brasileiros enxerguem que não têm a menor chance de faturar o bônus de “chegar lá” passando a fazer parte do menos de 0,1%, afinal, é matematicamente insano que 50% ou mais [da metade] da população desejem isso. Ficam sem o bônus, mas com o ônus de conviver numa sociedade envenenada, vida afora, em nome dessa sua fantasia. Muito mais gratificante será vivermos todos numa sociedade saudável, alicerçada em instituições verdadeiramente cidadãs (a começar por uma educação e uma justiça que mereçam esses nomes).

O Brasil há de acordar dessa bad trip que já se arrasta por mais de quinhentos anos. Para que possa finalmente sair dela, o que se abre a partir de agora é uma janela de oportunidade inédita na História: esse brutal choque de realidade.

Ter as suas crenças confrontadas pela realidade dos fatos é um processo penoso e doloroso para quem quer que seja. Quanto mais penoso e doloroso venha a ser sentido, mais a ele se reage pela reafirmação da crença disfuncional e pela negação da realidade dos fatos.

A classe média tenderá assim a uma maior segmentação, aqueles mais reflexivos poderão dar conta de reciclar essa mentalidade histórica enquanto que aqueles mais irreflexivos se agarrarão mais e mais às suas “verdades” de sempre (em especial a de que nada deve mudar), facilitando assim sua manipulação pela classe dominante.

Sem o apoio da classe média, a classe dominante será como que uma cabeça sem corpo. Seus braços, suas pernas, são os segmentos da classe média que se dispõem a servi-la. Sem estes, a classe dominante não passa de um gigante de pés de barro.

Por isso se pode dizer que a “elite” (aspas) brasileira comete suicídio: não bastasse estampar a iniquidade dessas instituições que ela, historicamente, impôs ao país, a classe dominante, ao predar a classe média, bota a perder os alicerces que (também historicamente) lhe dão sustentação.

Caminha o Brasil para uma ditadura fascista?

De uma democracia precária, mas minimamente funcional, o Brasil passou a uma democracia de fachada, uma farsa que só perdurará enquanto se mostrar minimamente útil à classe dominante – que aliás jamais teve qualquer vocação democrática; na célebre frase de Sérgio Buarque de Holanda, “a democracia no Brasil sempre foi um lamentável mal-entendido. Uma aristocracia rural e semifeudal importou-a e tratou de acomodá-la, onde fosse possível, aos seus direitos ou privilégios”. Uma pseudodemocracia em estado de “guerra institucional”, com cada instituição agindo como se fosse a única, se permitindo ir contra as demais em prol da sua agenda individual em lugar de compor com elas um todo funcional, aporta mais custos que benefícios, pelo que não terá vida longa.

Em futuro próximo é assim provável uma ditadura como um regime abertamente fascista, e não necessariamente pela via de algum golpe militar à la 1964, posto terem os aparatos policial e judicial se acumpliciado numa simbiose essencialmente antidemocrática: as PMs estaduais há muito desempenham o papel repressor que no passado coube às forças armadas.

Entretanto, uma ditadura fascista tampouco teria vida longa, pois ela dependeria do grau de adesão que conseguisse angariar na classe média, o que não teria sustentação no tempo. Paradoxalmente, a opressão de uma ditadura acabaria por ser mais percebida pela classe média do que pelas classes desfavorecidas, que há muito já padecem, cotidianamente, da repressão pelo Estado.

A ditadura fascista, caso de fato advenha, será uma fase a mais a ser superada. A chave para que ela dure menos (ou nem chegue a ocorrer) reside na construção de uma alternativa para a classe média: um projeto para que o conjunto da sociedade assuma a tarefa de transmutação das instituições.

Forma, em vez de conteúdo.

Foi dito que o atributo primordial de tal projeto é ser unificador da sociedade. Ocorre que nenhum conteúdo político pode ser unificador. Qualquer unificação somente poderá se dar na forma política.

Forma, em vez de conteúdo. Água e azeite, conteúdos diferentes, não se misturam. Isso não impede que, numa receita culinária (forma), participem ingredientes como a água e o azeite (conteúdos), reunidos no propósito mais abrangente da preparação de uma comida.

Ademais, os valores da classe média brasileira estão em geral longe de ser valores de esquerda. Com o que sonha um típico brasileiro da classe C? Com um emprego assalariado digno, respaldado por um sindicato forte (visão da esquerda)? Ou com um mínimo negócio próprio, ainda que na economia informal, que no futuro possa ser passado a um filho (visão pequeno-burguesa)? Por que deveria uma visão ser mais legítima que a outra?

Imperioso e urgente é conceber uma forma de participação política capaz de acolher distintos (e mesmo antagônicos) conteúdos políticos, em prol de um propósito maior que seja unificador de tais conteúdos: levar a sociedade a assumir nossas instituições, para transmutá-las em instituições verdadeiramente cidadãs.

A travessia se fará, de um modo ou de outro. É o destino, como anteviu Darcy. Quanto mais unificada esteja a sociedade menor o custo, em sangue e em dor.

O termo “coxinha” (que neste texto estará sempre grafado entre aspas) tem origem num apelido da periferia paulistana aos soldados da polícia militar (em geral oriundos dessa mesma periferia), para ironizar o fato de que, não obstante todo o poder e opressão que são capazes de exercer, recebem baixos salários, não passando assim de iguais na servidão e na exploração pela classe dominante – pelo que não contam com alternativa melhor do que alimentar-se de frituras de balcão de botequim.

Assim, “coxinha” é aquele que se deixa usar, em nome de interesses no fundo contrários aos seus próprios. Trata-se obviamente de um termo pejorativo, que subentende uma superioridade moral por parte daquele que o usa. Já dizia Carl Gustav Jung que não se pode ajudar ninguém a mudar fazendo-o sentir-se mal. Os “coxinhas” precisam ser resgatados da órbita dos fascistas (que parecem muitos apenas porque fazem muito barulho), não deixados no mesmo saco que estes.

Ficarão de fora a priori da forma política unificadora a ser instaurada apenas aqueles conteúdos políticos que sejam exclusivistas a ponto de negar o direito à existência dos que deles divirjam: ao recusar qualquer projeto da natureza unificadora, eles próprios se autoexcluirão. Trata-se, claro, do fascismo, algo que no fundo não passa de sociopatia, como bem o descreveu Norberto Bobbio: “o fascista fala o tempo todo em corrupção. Ele acusa, insulta e agride, como se fosse puro e honesto. Mas o fascista é apenas um criminoso comum, um sociopata que faz carreira na política. No poder, essa direita não hesita em torturar, estuprar e roubar sua carteira, sua liberdade e seus direitos. Mais do que a corrupção, o fascista pratica a maldade”.

Uma nova utopia para o Brasil (três guias para sairmos do caos).

Milton Santos dizia que “a força da alienação vem dessa fragilidade dos indivíduos, quando conseguem identificar apenas o que os separa e não o que os une”. Há que encorajar os brasileiros, historicamente separados, à identificação daquilo que os una.

Três formas políticas de unificação, para um projeto de refazimento das instituições pela sociedade, encontram-se propostas no livro Uma Nova Utopia para o Brasil: Três guias para sairmos do caos (que pode ser livremente baixado no site www.brasilutopia.com.br):

– Uma Constituinte dos Cidadãos (não dos políticos!), inspirada na constituinte havida na Islândia em 2010-11, para o dia em que sejam retomadas as jornadas de junho de 2013, de modo a que seja a bandeira em comum que nos faltou naquela ocasião;

– Os assim chamados Grupos de Diálogo: uma metodologia a ser praticada localmente por todo o país, para, em um esforço de investigação e elucidação das raízes (que são de fundo cultural) dos conflitos sociais, encarar de frente a miséria da mentalidade brasileira; e

– A implantação da Democracia Direta como um espaço aberto a todos que queiram praticá-la, por meio de um partido político “cavalo de Tróia” que venha a romper com o monopólio do sistema político-partidário.

Muita energia vem sendo dispersada na busca de alguma solução mais imediata, como eleições diretas. Ora, de que servirão eleições diretas, se a classe dominante fará moldar a legislação eleitoral de modo a que vença o seu candidato (sem contar artimanhas como parlamentarismo)? Mesmo em um cenário otimista, em que venha a ganhar algum candidato pró-restauração da democracia, como conseguiria ele ou ela governar, se o chamado presidencialismo de coalização foi liquidado, e se instituições como o judiciário, o ministério público e a polícia estão fora de qualquer controle exterior a elas próprias, e obcecadas em impor ao país as suas agendas?

Não é mais factível uma saída institucional, posto que as instituições já se encontram pervertidas a um ponto irrecuperável. Já passa da hora de substituir essa visão de curto prazo, das soluções superficiais, por uma visão de processo histórico a médio-longo prazo.

A um povo desprovido de elite resta somente o caminho de fazer-se elite de si próprio – como nos indicou Darcy Ribeiro.

Ruben Bauer Naveira é brasileiro e não desiste do seu país; CV Lattes http://lattes.cnpq.br/5119162978665550.

Matéria publicada originalmente em 08.02.2017. 



terça-feira, 9 de outubro de 2018

“Votos limpos, conscientes e honestos”, diz Wellington sobre reeleição.

“Votos limpos, conscientes e honestos”, diz Wellington sobre reeleição

Deputado foi reeleito vencendo a máquina e hostes do próprio partido. Ele também confirmou a consolidação de seu nome na capital ao ter maior votação do que políticos tradicionais.

O deputado estadual Wellington do Curso foi o maior vencedor das eleições para o Assembleia Legislativa do Maranhão. Sem pertencer a qualquer clã político e com uma discreta estrutura de campanha, ele foi reeleito com 24.950 votos para mais quatro anos no Palácio Manuel Beckman após lutar não apenas contra a máquina palaciana, que a todo custo queria lhe apear do mandato, mas contra hostes de seu próprio partido, o PSDB. 

No tucanato maranhense, o predileto era o advogado Guilherme Paz, filho da ainda deputada e candidata derrota a vice-governadora, Graça Paz, e do coordenador de campanha de Roberto Rocha ao Palácio dos Leões, o ex-deputado Clodomir Paz.

Apesar de não ter alcançado uma votação expressiva, Wellington confirmou a consolidação de seu nome em São Luís, onde disputou a prefeitura em 2016 e poderá disputar novamente em 2020, sendo o segundo mais votado pelo eleitorado da capital, com 17.328 votos. 

Wellington, inclusive, mostrou maior robustez eleitoral do que diversos políticos tradicionais e de fortes feudos eleitorais espalhados pela cidade, que também foram eleitos, mas com menos votos que ele junto aos ludovicenses, a exemplo de Helena Duailibe (SD), Edivaldo Holanda (PTC), Neto Evangelista (DEM) e Roberto Costa (MDB).

Nas redes sociais, ele agradeceu o reconhecimento de sua luta no Parlamento estadual, destacando que fez uma campanha limpa, sem os recursos da máquina pública estadual e municipal.

“Tivemos uma campanha limpa, sem dinheiro de secretaria ou de Governo e Prefeitura! O nosso apoio foi de cada trabalhador, professor, militar, estudante, servidor público, concurseiro, pequeno empresário... O nosso apoio foi por parte dos maranhenses! É assim que seguiremos: de forma limpa! O nosso mandato, mais uma vez, foi conquistado com votos limpos, conscientes e honestos”, declarou.


domingo, 7 de outubro de 2018

A Questão Nacional não Entrou na Questão Eleitoral, por Pedro Augusto Pinho.

03/10/2018, Pedro Augusto Pinho (msg distribuída por e-mail, aqui repassada).

Desde o momento que o capitalismo financeiro, que denomino banca, dominou o mundo capitalista, novas prioridades passaram a definir a luta dos povos por suas independências. E, como é óbvio, este novo poder dominante criou novos mitos, novas questões para desviar desta luta seus principais conteúdos, quais sejam as ações nacionais pela soberania e pela cidadania.

Ter colônia de escravos, e no mínimo número necessário para produzir seus lucros, é o objetivo da banca.
Temos, por exemplo, a violência e a corrupção como temas eleitorais, em 2018, enquanto se entregam bens insubstituíveis de propriedade do Brasil aos estrangeiros. Bens naturais, dádivas de um território rico, e bens intelectuais, fruto do esforço e dos investimentos dos brasileiros como a Embraer e a tecnologia de produção de petróleo em águas ultraprofundas.


A banca e suas ações no poder

A banca assumiu o poder em 1990. Pode-se estabelecer data diversa, mas foi naquele ano - após as desregulações financeiras adotadas pelo Reino Unido (Margaret Thatcher) e pelos Estados Unidos da América (EUA) (Ronald Reagan) e tendo fim o socialismo industrial da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) - que a banca pode incorporar em seus ativos toda imensa fortuna dos ilícitos - tráficos de droga, das escravidões humanas, comércio de órgãos humanos, vendas de armas, enfim, dos valores colossais de todos os crimes - uma vez revogadas as regulamentações financeiras que impediam ou criavam dificuldade para suas  inclusões formais nas transações internacionais.

A banca já constituíra os paraísos fiscais mas, com esta liberdade de ação, eles seriam estimulados e fortalecidos. O economista Gabriel Zucmann, em notícia no BBC News, afirma que 55% dos lucros das empresas estadunidenses passa por paraísos fiscais.

Usando dados do Fundo Monetário Internacional (FMI - World Economic Outlook) verificamos que a economia, formalizada, em valores constantes, cresceu 2,1 vezes entre 1980 e 2000, e 1,5 vezes entre 1990 e 2000. Pode-se entender, que este acréscimo no último decênio do século XX foi possível, em boa parte, pela inclusão de valores até então não passíveis de contabilização.

E a banca, especialista em lavagem de dinheiro, passa a constituir fundos financeiros com os quais comprará as grandes empresas internacionais. Meu prezado leitor já sabe que a Unilever, a General Motors, a Exxon, a BP, a Ford, a Colgate-Palmolive, a IBM, e toda multinacional que queira conferir, terá entre seus principais acionistas o Blackrock, o Vanguard, o State Street e outros trilionários fundos de investimentos. E que seus investidores, em significativo montante financeiro, tem origem em paraísos fiscais.

Com a expansão desregulamentadora pelo mundo - por fraudes eleitorais, golpes e compra de congressos/dirigentes - criou-se o mito da globalização, que apenas se aplica às finanças; para tudo mais, serão necessárias permissões, de um passaporte, de uma autorização para constituição de negócio comercial ou industrial ou para construção de estrada etc.

A tomada do Estado pela banca

Como é evidente, para conseguir as desregulações, mantê-las e evitar os custos e constrangimentos de burocracias individualizadas por Estados, assim como ônus tributários redutores dos lucros, a banca passar a tomar os Estados Nacionais ou demoli-los por revoltas provocadas (primaveras árabes).

Fiquemos, tanto quanto possível, no Brasil. Em 1989, por fraude nas informações, os brasileiros votaram em Collor, cujas primeiras medidas, a título de desburocratizar, criar o Estado mínimo e outras baboseiras, congelou as poupanças e investimentos (valeriam menos ao serem descongelados) e abriu o caminho para banca. Em seguida a banca passa ao programa de privatizações, retirando poder do Estado e transferindo para as empresas que seriam ou já estavam sendo compradas pelos fundos financeiros. Com Fernando Cardoso a banca foi o próprio governo, revogando tudo que fora conseguido pelas forças nacionalistas e progressistas na Constituição de 1988. Conseguiu até extinguir os ministérios militares, no embalo da oposição à ditadura.

Neste momento, a banca já construía sua nova ditadura jurídico-midiática, expandindo para parlamentar, pela pressão das mídias e das Lava Jato.

Veja o caro leitor, que não há espaço para amadorismo. A banca chega ao poder com a academia, que lhe proporciona os melhores cérebros para simulações, e com a comunicação de massa, em todos os veículos, inclusive aqueles que influenciarão os novos acadêmicos e a intelectualidade progressista.

Assim como já utilizara a ecologia, na primeira metade do século XX, para combater o capitalismo industrial, a banca incentiva as questões transversais - feminismo, liberdade sexual, uso de drogas, homoafetividade, religiosidades - para desfocar a luta nacionalista e desenvolvimentista.

Para combater os partidos e lideranças contra os projetos da banca, esta usa seu aliado: o judiciário. Em outro tempo, o capitalismo industrial incentivou, a partir da própria nação colonizadora, a junção com os militares: complexo industrial-militar. Foi assim que se construiram, majoritariamente, os golpes no século XX.

Agora se darão pelas Lava Jato, pela luta contra corrupção, o que chega a ser incrivelmente cínico pois a corrupção é, sempre foi, arma da banca.

Equador, Argentina estão sofrendo suas Lava Jato para Presidentes que não se curvaram à banca. Como o judiciário venezuelano não se deixou comprar, a ameaça sobre a Venezuela é a invasão dos EUA com suas colônias vizinhas: Brasil e Colômbia.

Mudando paradigmas de poder

Em sintética referência histórica, a partir da Idade Média europeia, o poder se expressou pela propriedade fundiária e pela propriedade da dívida, sucessivamente. Tanto o mercantilismo, como o impulso colonial estiveram a serviço destes poderes nacionais. O fenômeno industrial é moderno e teve seu empoderamento com o desenvolvimento estadunidense.

O poder da dívida, que se expressa na banca, difere não apenas pelas tecnologias da informação e da comunicação, mas pelas novas demandas da sociedade. Por isso, a banca global, do século XXI, não repete o financismo das oligarquias rurais brasileiras da I República, ou República Velha, secundando o financisamo inglês.

Hoje há, efetivamente, o poder do capital sem pátria, como o qualificava Karl Marx, e até financismos regionalizados, como da República Popular da China (China).

É de suma importância saber retirar as maquiagens e verificar o que representa, efetivamente, o poder nacional e que outros poderes, nosso poder nacional pode, eventualmente, ter como aliado e como opositor.
Com todas ressalvas da análise pessoal, apontaria cinco manifestações de poder atuando no mundo, nesta segunda década do século XXI:

1) a banca, o mais poderoso e com maior atuação, dominando estruturas de Estados e, por óbvio, o sistema financeiro internacional e seus organismos: Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional, Banco Central Europeu (BCE), e a quase a totalidade dos Bancos Centrais, principalmente os que não sejam do Estado Nacional, como o Banco da Inglaterra e o estadunidense (Sistema de Reserva Federal - FED), e os que tenham total autonomia como o Banco do Japão;

2) renascimento industrial dos EUA, surgido com a eleição de Donald Trump, que pretende retomar a condição de árbitro dos negócios internacionais, com acordos preferenciais, perdido para a banca e, na análise estadunidense, também para a China, ao tempo que incentiva, igualmente, seu  complexo industrial-militar. A bem da verdade, este sistema já vem produzindo frutos, aumentou o número de empregados e o valor de salários estadunidenses e, gradualmente, as taxas de juro;

3) desenvolvimentismo russo. Após a queda do comunismo, a Federação Russa (Rússia) foi tomada pela banca e pela marginalidade que vivia no submundo soviético. A chegada de Putin renovou o industrialismo e a pesquisa científica e tecnológica. Hoje a Rússia dispõe de armamentos mais avançados do que os EUA e tem presença marcante nos conflitos em seu entorno. Está lutando em várias frentes, com bloqueios e sanções, mas conseguindo manter apoio interno e desenvolvimento e sua expansão asiática, velha política dos czares;

4) desenvolvimentismo chinês, com financismo à margem da banca. É sempre complexa a análise de um império milenar, que foi a grande potência do século XV, mas não se dedicou à colonização, fora de seus espaços geográficos mais restritos. Ainda hoje, a China se especializa na batalha comercial e, mais recentemente, nos empréstimos internacionais. Mas seu uso da dívida é comercial, tanto para venda de produtos como para garantia de insumos, e não, por enquanto,  da dominação colonial;

5) desenvolvimentismos autônomos. São casos de países de pequena população e expressão internacional, como países nórdicos e a Bolívia, com características diversas. O Brasil tentou e fracassou nos governos do Partido dos Trabalhadores (PT). Mas não é objetivo deste artigo estudar esta questão.

Desde o fim dos governos militares (1967-1985) o Brasil perdeu um projeto nacional de poder.

É até curioso verificar quantas semelhanças encontramos no tenentismo com o Brasil pós-golpe.

Os governos de Collor e Fernando Cardoso conduziram o País para a República Velha, talvez para o Império. Nenhum projeto de nação, destruição das conquistas industriais, tecnológicas, submissão vergonhosa ao interesses coloniais. É preciso ter claro que os interesses da banca e dos EUA se conjugavam no novo modelo colonizador, assimilado pelas elites brasileiras.

Cabe pequena reflexão sobre esta elite.

Darcy Ribeiro, este gênio brasileiros, antropólogo, pedagogo, pensador, afirmava serem nossas elites maldosas e mesquinhas, acrescento ignorantes e covardes. Parodiando Euclides da Cunha, diria que lhe agrada a postura servil, curvada ao estrangeiro, embora invejosa e cruel com os que dela dependam.

Os raros momentos em que parcela desta elite, crítica e nacionalista, buscou um projeto ou o fortalecimento da nação foi-lhe atirada, com injustiça e apoio estrangeiro, a pecha de corrupto. Assim ocorreu com Getúlio Vargas (morreu mais pobre do que nasceu, tendo sido ditador e presidente eleito por quase 20 anos), Juscelino Kubitschek, João Goulart e Lula.

A Era Vargas, que juntou o poder nacional ao reconhecimento dos direitos sociais, tem sido objeto da destruição de todos governantes, representantes desta alienada elite brasileira e, em consequência, de interesses estrangeiros. O período militar também não foi o da expressão desta elite, principalmente no Governo Geisel, mas a opressão do poder e a covardia calaram estas elites.

Quem são seus representantes? Os escravistas, os racistas, os que se envergonham da nacionalidade brasileira e buscam, mesmo remotamente, origens europeias para se justificarem. Os que fraudam impostos e direitos dos outros, Mas, são, principalmente, os ignorantes, como a imensa maioria da denominada classe média, que, sem qualquer capacidade de entender nossa realidade, acusam o pobre, por ser pobre, de prejudicar o país.

Esta elite, só a contragosto ou por interesse político, mora no Brasil.

Reconstruindo um paradigma para o Brasil

Os tenentistas tiveram esta análise e seus movimentos, ainda que desarticulados, nos anos 1920, buscavam a saída pela educação e pela industrialização. O golpe de 2016 buscou retroceder exatamente na industrialização e na educação; a Lava Jato, o corte de gastos são a demonstração, como se fosse necessária, tão evidente é sua ação.

Os partidos políticos do atraso foram, no passado, a União Democrática Nacional (UDN), hoje, o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) e seus parceiros Democratas (DEM) e Partido Progressista (PP). A imensa maioria dos políticos e dos partidos não tem posição nacional, por incrível que possa parecer. São paroquiais: pelas regiões ou propósitos clientelistas. O que não exclui, evidentemente, algumas poucas figuras políticas.

O professor André Martin, da Universidade de São Paulo, em palestra no Congresso, defendeu a ideologia “meridional” para o desenvolvimento nacional. Sem dúvida uma proposta bem fundamentada e interessante.

Mas, entendo que mais importante, neste momento, é desconstruir a pedagogia colonial. Esta está de tal modo entranhada em nossas mentes que, mesmo com quase trinta anos de domínio da banca, ainda há, e não poucos, brasileiros que raciocinam em termos de guerra fria. Ou com receio do comunismo ou com novos “comunismos”, os bolivarianismos.

O professor Martin, com clareza e correção, afirmou que sem uma ideologia nacional não se constrói uma nação. E deve ser generosa, não imperialista. Realmente, os EUA, antes de vender o anticomunismo, construiram o “american way of life” como ideologia conquistadora.

Na construção da cidadania, como venho escrevendo, é parte integrante a construção da consciência, de sua própria existência, da aceitação de seu ser, do respeito aos outros, e, certamente, da consciência nacional brasileira.
A campanha eleitoral revelou, além de toda farsa e fraude que o poder jurídico-midiático nos impôs, um sentimento de reerguimento nacional que pode e deve, no sentido da construção do poder nacional, se dar pelas Forças Armadas.

O fortalecimento das Forças Armadas, como visto pelos tenentes, se efetiva pela educação e pela industrialização. Sem esta importação imbecil da luta contra a corrupção, como ideal brasileiro.

Este não é projeto de um antagonismo, impróprio para nosso momento, mas da reconstrução do Brasil, soberano e cidadão.

Pedro Augusto Pinho, avô, administrador aposentado.


quarta-feira, 3 de outubro de 2018

Tereza Cruvinel analisa os bumbos do antipetismo.