Dias atrás gerou-se uma grande polêmica com a absolvição da deputada federal
Jaqueline Roriz, filha do ex-governador de Brasília Joaquim Roriz.
Apesar dos vídeos mostrando que ela havia recebido propinas em 2006, a
tese da defesa de que ela não era deputada à época e portanto não
poderia ter seu mandato cassado acabou prevalecendo.
Contudo, não irei debater aqui a insólita tese de defesa, e que abre um
precedente perigoso - Fernandinho Beira Mar, por exemplo, não poderia
ser cassado se deputado fosse. Vamos falar sobre a indignação seletiva
da população.
O que mais se viu nas redes sociais e na imprensa foi um sentimento de
"mata e esfola", criticando a corrupção dos políticos e clamando por
reforma ou prisões. Havia um sentimento difuso de revolta e de descrença
na classe política repercutido pela população, pelo menos a que tem
acesso à internet.
Entretanto, leitor: você é corrupto. Eu sou corrupto. Todos somos.
Como escrevi no Twitter de forma insistente durante a semana passada, os
políticos de Brasília não nascem por "geração espontânea" do solo árido
da Capital Federal. Alguém os coloca lá.
E "esse alguém" é semelhante aos políticos, afinal de contas votou nele e
o confiou como seu representante nas esferas de poder político. É o
eleitor, que trabalha, paga seus impostos e especialmente vota. Ei, é
com você mesmo.
O Congresso Nacional nada mais é que um reflexo da sociedade, sendo um
microcosmo das práticas, das virtudes e de seus defeitos. Por mais que
seja cômodo imaginar que é algo apartado da sociedade, não é. Se o
Congresso é formado por picaretas é porque somos picaretas - nós os
colocamos lá.
Sejamos práticos. O cidadão que reclama da deputada não ter sido cassada
por ter recebido propina é o mesmo que paga "uma cervejinha" ao guarda
para não ser multado, ou trapaceia no trabalho para obter uma melhor
posição - ainda que o colega se prejudique. Estamos no mundo do
"jeitinho", da acochambração, do desrespeito à lei.
Portanto, o leitor deve estar ciente que os políticos nada mais são que
um microcosmo da sociedade. É bastante cômodo entendê-los como um mundo
isolado, mas não o é. Se Brasília é corrupta é porque a sociedade é
corrupta. Não reclame: melhore.
Tem outra coisa.
Algo que vemos muito é o cidadão dizer que "não se lembra" em quem votou
para deputado ou senador, ou que votou em alguém que prometeu algum
tipo de vantagem - stricto sensu, corrupção. Ou seja, no momento em que
poderia ter mudado a situação e colocado um grupo melhor o eleitor
prefere votar "em qualquer um", ou naquele com campanha mais midiática,
ou em que lhe prometeu algum tipo de vantagem.
Traduzindo: no momento em que poderia alterar o panorama político, o
eleitor prefere não se envolver na escolha ou aproveitar para auferir
algum tipo de benefício direto ou indireto da situação. Na prática,
compartilha-se o processo anômalo de escolha, acabando-se por "premiar"
aqueles mais abastados ou de maior influência midiática.
Em português claro: se você não se lembra em quem votou, votou por algum
tipo de conveniência ou não acompanha a atuação de seu parlamentar, não
pode reclamar. Tem o político que merece.
Democracia não é para apenas se exercer no momento em que se aperta o
número do candidato e o "confirma". Faz-se necessário exercer o
acompanhamento das atividades dos Poderes Executivo e Legislativo.
Cobrar seu deputado ou senador, observar sua atuação, censurá-lo se o
caso for.
No entanto, prefere-se a solução mais fácil. Vota-se em qualquer um ou
em alguma conveniência e depois esquece-se tudo. Em um momento como este
que narramos basta xingar e protestar. Em português claro? Hipocrisia.
Estamos em um mundo que glorifica o "ser esperto", valoriza o
"jeitinho", glorifica a burla das regras. O comportamento dos políticos é
semelhante, é um espelho da corrupção e dos vícios do dia a dia das
pessoas comuns. Se o deputado é corrupto é porque seu eleitor também o é
- senão não teria votado nele.
Vale lembrar, também, que o sistema político brasileiro impele à
formação de conchavos - ou acordos - para que se possa governar com um
mínimo de estabilidade. Com o excessivo número de partidos acaba se
tornando complicado governar e aprovar os projetos de lei necessários
sem estabelecer acordos.
Voltarei ao tema, mas procurar manter uma coerência nos votos diminui a
necessidade destes acordos - muitas vezes com contrapartidas bastante
duvidosas, para se dizer o menos. Uma reforma política se faz
necessária, mas parece distante de ser aprovada.
Portanto, não reclame de Brasília: seja uma pessoa melhor.
copiado de: http://pedromigao.blogspot.com
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