Governo alemão adia polêmica decisão sobre garantia a Angra 3 |
Novo adiamento da decisão sobre um auxílio financeiro prometido para Angra 3 aumenta incerteza sobre o projeto. Berlim aguarda novos testes na usina nuclear. Ajuda é criticada até na bancada do governo alemão.
O novo adiamento de uma decisão do governo da Alemanha sobre a
liberação de uma garantia à construção de Angra 3 aumenta a incerteza
sobre a participação alemã na usina nuclear brasileira.
Na semana passada, Berlim protelou mais uma vez, por tempo
indeterminado, a confirmação definitiva sobre a chamada garantia Hermes,
no valor
de 1,3 bilhão de euros, prometida em fevereiro de 2010 à francesa Areva
NP (que na época pertencia em parte ao grupo alemão Siemens). O valor
corresponde a quase um terço do custo previsto para o reator, cujas
obras são orçadas em quase 10 bilhões de reais.
A transformação em aval financeiro definitivo foi vinculada pelo
governo alemão ao preenchimento de uma série de pré-requisitos,
observando, sobretudo, aspectos de segurança. A aprovação da garantia já
havia sido adiada diversas vezes e, após o acidente em Fukushima, foi
condicionada ao cumprimento de cláusulas adicionais de segurança.
Parecer deixa questões sem resposta
A decisão era esperada para semana passada, após a avaliação de um
parecer emitido pelo ISTec, instituto especializado em tecnologia de
segurança e contratado pela Areva, e enviado ao governo alemão. O
documento, entretanto, afirma que há muitas perguntas sem resposta e
assinala que um parecer definitivo só seria possível após a realização
de uma série de testes, previstos para serem feitos em diversas etapas,
entre junho deste ano e meados de 2013.
"Até o momento não há uma decisão conclusiva", disse à DW Brasil Stefan
Rouenhoff, porta-voz do Ministério da Economia, que é responsável pela
decisão final. "O relatório conclui que, considerando as lições do
acidente de Fukushima, ainda não há documentos
disponíveis que possibilitem uma avaliação de algumas importantes
questões de segurança", acrescentou, afirmando que o governo alemão só
poderá dar a resposta final quando todas as informações necessárias
estiverem disponíveis.
A decisão alemã foi divulgada poucos dias antes de o governo brasileiro
anunciar que não iniciará a construção de novas usinas nucleares até
2021, limitando-se somente a prosseguir o projeto Angra 3, cujas obras
estão em andamento. O secretário-executivo do Ministério de Minas e
Energia, Márcio Zimmermann, afirmou terça-feira passada que, para os
próximos dez anos, não está prevista nenhuma
nova central além de Angra 3. Ele disse que a determinação está
relacionada com o acidente nuclear de Fukushima, no Japão, o que teria
aumentado a complexidade para construção de usinas nucleares.
Alemães protestam contra financiamento de Angra 3 na visita de Dilma a Hannover, em março |
Estudo alternativo acusa falhas em Angra 3.
Fukushima é também um dos motivos que torna a garantia Hermes para
Angra 3 um assunto controverso na Alemanha e alvo de protestos de
ambientalistas e da oposição, principalmente depois que a própria
chanceler federal Angela Merkel determinou o fechamento de todas as
usinas nucleares alemãs, logo após o acidente no Japão.
"É possível que o governo alemão espere até este verão europeu, quando
todos estarão de férias, para anunciar a liberação do crédito", especula
Regine Richter, especialista em energia da ONG Urgewalt, uma das
organizações ambientalistas mais ativas na crítica à garantia Hermes
para Angra 3. "Mas pode ser também que o governo resolva esperar para
receber as conclusões dos últimos testes, em meados do ano que vem",
acrescenta.
"Não sabemos até onde o governo pretende chegar com essa série de
adiamentos", irrita-se a ambientalista. Um estudo divulgado em março e
encomendado pela Urgewalt, em colaboração com o Greepeace, apontou uma
série de falhas no projeto de Angra 3, considerando-o obsoleto e
arriscado.
As garantias Hermes de exportação são fianças concedidas pelo governo
alemão como forma de incentivar a exportação de bens produzidos pelo
país, uma espécie de seguro destinado a cobrir prejuízos causados por
eventuais faltas
de pagamento por parte dos clientes estrangeiros, especialmente em
países em desenvolvimento. Na prática isso significa que, se o
contratante estrangeiro der um calote, o governo alemão cobre o
prejuízo.
No caso de Angra, o governo alemão alega que o crédito ajudará a manter
diversos postos de trabalho nas filiais alemãs da Areva, que vende
equipamentos para a usina nuclear brasileira.
Críticas de membros da coalizão
A ajuda financeira alemã a Angra 3 é motivo de críticas também dentro
dos próprios membros da coalizão de governo alemão. "Acho possível que o
governo alemão cancele essa garantia", avaliou o deputado Andreas Jung,
da União Democrata Cristã (CDU), partido de Merkel. "Embora eu não
possa falar em nome do governo alemão", ressalvou. Ele faz parte do
grupo de parlamentares da base de apoio ao governo que é contra o
financiamento da usina atômica brasileira por Berlim.
Jung afirma que é incoerente desligar as usinas nucleares alemãs e
ajudar a construir outra no Brasil. "Após o acidente de Fukushima, nosso
partido decidiu desativar as usinas alemãs. Não deveríamos, então,
ajudar no financiamento de projetos de usinas nucleares no exterior",
argumentou.
O deputado liberal Rüdiger Kruse, também membro da bancada
governamental no Bundestag (câmara baixa do Parlamento alemão),
concorda. "Defendo na minha bancada intensamente o ponto de vista de que
não devemos dar mais garantias para a exportação de tecnologia
nuclear", declarou em janeiro, ao ser perguntado sobre o financiamento a
Angra 3.
Autor: Marcio Damasceno
Revisão: Alexandre Schossler
FONTE:http://www.dw.de/dw/article/0,,15952079,00.html
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