quinta-feira, 3 de maio de 2012

O bom combate

O velho Brizola, numa reunião de campanha eleitoral, em 1989, na casa de Chico Buarque, quando lhe perguntaram o que faria ao chegar ao poder, disse naquele estilo desconcertante que o marcava:

- Vou consultar os poetas!

Creio que ali, como em tantas outras vezes, ele fazia uma síntese do que era dar a um desejo, um sentimento, um amor, a uma crença, a  forma trabalhosa e burilada de um trabalho, de algo que exige ferramentas, habilidades e suor, sem prescindir jamais do sonho.

A política, para os que crêem nela como forma de materializar o desejo humano, é igualmente assim.

Requer trabalho, esforço, arrependimento, exige riscos e rabiscos para que vá tomando sua forma.

Frequentemente está aquém dos sentimentos imensos que se busca expressar.

Mas está sempre muito, muito além da simples e bruta enunciação de intenções.

Porque – viva o poeta! – há distância entre intenção e gesto.

O gesto político está para a vontade de mudar como o verso está para o sentimento.

É o que conduz, de forma harmônica e inteligível, a mudança, aquilo que a torna compreensível, o que a permite ser sentida, desejada: é o que a simboliza e concretiza.

Fizemos aqui, ao longo de quase três anos, o combate no chão raso.

Sempre em movimento, sempre temerário, sempre arriscado e, sobretudo, sempre abandeirado dos melhores sonhos de liberdade, justiça e progresso para o Brasil.

E que bom combate, esse!

Dele sai-se, às vezes, em farrapos e com muitos arranhões, mas com os olhos brilhantes e apaixonados.

É do conhecimento de todos que Brizola Neto assume, nesta quinta-feira, o cargo de Ministro do Trabalho.

O combate agora é em outro plano, já não é o raso. É complexo,  tem  outras tarefas, e ele explicará tudo aqui no blog, amanhã, antes da posse.

São novas formas para o mesmo desejo de mudança, novos versos para os mesmos sentimentos.

É a sua sina, com o peso e a responsabilidade do sobrenome que carrega com orgulho e dignidade.

Esse colaborador do guri que vi se transformar em um homem maduro, de caráter forte e temperamento suave, segue com ele, para carregar a mochila de experiências e aprendizados que recolhi todos os dias dos mais de 20 anos que caminhei  ao lado de seu avô.

Não é o que queria, mas é o meu dever. E do dever não se foge.

Interromper o Tijolaço é doloroso, mas necessário.

A função pública que ele assume não permitirá que o blog, mesmo escrito apenas por mim – como já vem sendo feito há tempos – evite que sobre ela respinguem os reflexos de um espaço que foi e sempre será o blog do Brizola Neto.

Quem leu destes dois úiltoimos dias  sabe que é a ele que se atribui o que aqui se disse, mesmo quando escrevo e assino os posts. Não se passou o primeiro dia sem que se revelasse a fúria e o despeito com que vêem um Brizola, mesmo apenas o neto, sendo parte de um Governo popular e trabalhista.

Porque, mais do que ele pessoalmente possa representar, o simbolismo dessa unidade incomoda aos que temem que o passado e o presente se unam para parir o futuro.

Ele, portanto, está correto, porque agora é sobre o Governo a quem servirá como Ministro que repercutirá o que se fizer aqui.

Mas, na medida em que puder e em outros espaços, este índio velho aqui vai seguir fazendo mais do mesmo que fez a vida inteira.

Teimosia ou ideologia, pouco importa, quem nasce com lado, com lado deve viver, cumprindo a profecia do anjo torto de Drummond.

E enquanto durar a vida, lutar o bom combate, onde a palavra é arma dos sentimentos. E lembrando os versos de Rafael Alberti, em seu “Poetas Andaluzes”:

Cante alto, ouvireis que outros ouvidos ouvem
 
Olhe para o alto, vereis que outros olhos olham

Pulse alto, sabereis que outro sangue pulsa
 
Não és mais fundo o poeta encarcerado em seu porão
 
Seu canto ascende ao mais  profundo, quando se eleva no ar

E já é o canto de todos os homens.

Fonte: http://www.tijolaco.com/ 

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