08.Dez.2012 - Dominique Dreyfus - ESPECIAL PARA O ESTADO.
Luiz Gonzaga completaria 100 anos na próxima quinta-feir |
Mas eu nunca consegui. Para
mim, era Seu Luiz mesmo, um homem jocoso, cheio de graça, mas sempre com
elegância. Lembrando o dia em que calçou sapato pela primeira vez, ele
comentava: “Ah! Eu me senti um lorde.” É era, ainda que desse broncas
homéricas e irracionais a torto e à direita. Nem sempre o Rei do Baião
era justo.
Me obrigo a não esquecer esse aspecto de sua personalidade,
mas prefiro lembrar dos ecos de sua voz pela casa quando ria ou cantava.
A Veraneio, dirigida por Seu Maia (Deus me livre de andar num carro
dirigido por Luiz Gonzaga, rei do baião e dos acidentes rodoviários),
lhe inspirava–ou não seria a paisagem da caatinga? – aboios nostálgicos.
O
aboio é sempre nostálgico. Luiz Gonzaga também era nostálgico. Habitado
por uma infinita tristeza, por um sentimento de solidão. Talvez fosse
índole. Talvez os acasos da vida lhe arquitetassem sofrimentos. A fama
suscita inveja.
Gonzaga sofreu da inveja dos outros até o fim da vida.
Porém, antes do sucesso, houve a infância de menino negro e pobre num
mundo dominado por brancos ricos. Luiz Gonzaga é um dos grandes ícones
do Brasil, mas ao acompanhá-lo em Exu, percebi quanto, frente aos
poderosos, ele não conseguia se desfazer por completo da atitude do
filho de morador que fora quando criança. Criança educada para ser
submissa.
Com 17
anos, se alistou. Passou dez no Exército, dez obedecendo cegamente. Por
ele, teria sido soldado a vida toda: “Eu sempre gostei de disciplina,
de autoridade”. Santana, sua mãe, era fera na questão da disciplina e da
autoridade. Já o pai, Januário, era mais sonhador. Tocava o pé de bode
ou oito baixos, (enfim, aquilo que na cidade chamam de sanfona) nos
forrós do sertão.
Luiz
Gonzaga gostava de autoridade, mas na hora de se tornar gente, puxou ao
pai. Começou a namorar a sanfona antes de usar calça. E quando a música
se tornou o eixo da vida dele, sua maior felicidade foi andar pelo País
dando shows. Não aqueles astronômicos, com enxurradas de luz, de som,
de efeitos técnicos, de ingressos vendidos.
Apenas um espaço onde pousar
com o trio com que definira a música nordestina – sanfona, triângulo,
zabumba – para quem quisesse escutar, dançar, se divertir. Gonzaga era
imensamente generoso e nada organizado. Gostava de disciplina, mas era
sumamente indisciplinado. Vai entender o homem, verdadeiro amontoado de
contradições.
Por
isso passou tanto tempo sem conseguir se entender com Gonzaguinha. O
filho, militando contra a ditadura, perseguido pelo Dops, submetido à
incessante censura; o pai defendendo a ditadura, negando a tortura,
amigão dos militares. Semianalfabeto, Gonzaga respeitava o poder e
admirava o saber, convencido de que se alguém chega a esse nível de
responsabilidade, é porque tem algum valor. Não era uma questão de
ideologia.
Gonzaga não tinha ideologia, tinha candura.
Nem
por isso vamos desculpar lhe a indulgência para com a ditadura. Mas
vale lembrar o repertório e a ação dele. Gonzaga, apontando logo na
primeira parceria com Humberto Teixeira, Asa Branca,
o problema da seca e da miséria. E mais tarde, com Zé Dantas,
retratando o Nordeste ignorado pelo resto do País, denunciando
injustiças, pedindo pelo povo.
Não foram os parceiros letrados que
levaram Gonzaga nesse caminho, foi Gonzaga que procurou parceiros
capazes de acompanhá-lo pelo caminho que ele imaginara. Com seu olhar
aguçado sobre a vida, era um visionário: entrou na vida artística com um
objetivo.
Em
geral, o objetivo do artista é se projetar. O de Luiz Gonzaga era
projetar o Nordeste. Foi o que ele fez. Ajudou o Nordeste a ser
conhecido e a música nordestina a desabrochar. E quem tivesse talento –
Luiz Gonzaga sabia discernir quem – podia contar com seu apoio.
“Acho que dei umas 200 sanfonas a jovens iniciantes.” Deu também conselhos,
ensino, chance de subir no palco, casa e comida.
Contudo,
o mestre sempre deixou bem claro que não tinha inventado nada: a música
nordestina já existia antes dele. “Eu apenas dei uma vestimenta.”
Figurinista de alto nível! Que levou a matutinha acanhada do sertão para
desfilar nos palanques das cidades grandes… E abriu espaço para que,
depois dele, outros costureiros a vestissem também.
Será
que haveria Dominguinhos, Alceu Valença, Geraldo Azevedo, Gilberto Gil,
Caetano Veloso, Fagner, Tom Zé, Geraldo Vandré, Chico Science, Lenine,
Silvério Pessoa e Siba sem Luiz Gonzaga? Claro que sim, haveria, mas
talvez não fossem exatamente como são.
DOMINIQUE DREYFUS É AUTORA DA BIOGRAFIA VIDA DE VIAJANTE: A SAGA DE LUIZ GONZAGA
Luiz Gonzaga do Nascimento[Nota 1] (Exu, 13 de dezembro de 1912 — Recife, 2 de agosto de 1989) foi um compositor popular brasileiro, conhecido como o Rei do Baião.[2]
Foi uma das mais completas, importantes e inventivas figuras da música popular brasileira. Cantando acompanhado de sua sanfona, zabumba e triângulo, levou a alegria das festas juninas e dos forrós pé-de-serra, bem como a pobreza, as tristezas e as injustiças de sua árida terra, o sertão nordestino, para o resto do país, numa época em que a maioria das pessoas desconhecia o baião, o xote e o xaxado.
Admirado por grandes músicos, como Dorival Caymmi, Gilberto Gil, Raul Seixas, Caetano Veloso, entre outros, o genial instrumentista e sofisticado inventor de melodia e harmonias,[3] ganhou notoriedade com as antológicas canções "Baião" (1946), "Asa Branca" (1947), "Siridó" (1948), "Juazeiro" (1948), "Qui Nem Jiló" (1949) e "Baião de Dois" (1950).[2]
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Luiz_Gonzaga
SE VOCE QUIZER MAIS DETALHES SOBRE ESTA MATÉRIA ACESSE O LINK ABAIXO:
http://maranauta.blogspot.com.br/2012/12/luiz-gonzaga-e-cem-homenagem-de-clara.html
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