Na Capital Federal a movimentação no Poder Legislativo já começou. A
partir desta terça-feira, 6, os trabalhos no Congresso Nacional devem
ser retomados, depois do recesso parlamentar de meio de ano.
Entre a
quase uma centena de proposições que afetam a vida dos povos indígenas
está o Projeto de Lei Complementar (PLP) 227/2012, última novidade da
bancada ruralista.
Porém, o PLP 227 é inconstitucional e atenta contra a Convenção 169
da Organização Internacional do Trabalho (OIT). A conclusão é de parecer
jurídico – leia na íntegra aqui -
elaborado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), que contou com a
colaboração de uma rede de advogados com vivência profissional
relacionada ao Artigo 231 – “Dos Índios” – da Constituição Federal.
O
que diz o PLP 227?
O PLP 227, já com Comissão Especial formada, pretende criar lei
complementar ao artigo 231 apontando as exceções ao direito de uso
exclusivo dos indígenas das terras tradicionais, em caso de relevante
interesse público da União.
Dentre as tais exceções está a exploração
dos territórios indígenas pela rede do agronegócio, empresas de
mineração, além da construção de empreendimentos ligados aos interesses
das esferas de governo – federal, estadual e municipal.
“A questão relacionada à constitucionalidade desta perspectiva
normativa relaciona-se ao mérito da proposição que consiste em
reconhecer como “atos de relevante interesse público da União”, todos e
quaisquer projetos de infra-estrutura e atividades produtivas
particulares e públicas, as concessões de terras públicas de faixa de
fronteira, os campos de treinamento militares e demais alienações de
terras indígenas, “para fins de demarcação de Terras Indígenas”, afirma
trecho do parecer, atestando a inconstitucionalidade.
Conforme o documento, empreendimentos ligados a prefeituras e
governos estaduais, exploração de riquezas realizadas por empresas
privadas e o uso do solo por grupos ligados ao setor do agronegócio não
podem ser considerados de interesse público da União, na medida em que
não são atos da União.
Além disso, o texto ressalta que os deputados
constituintes “fixaram sólido e rígido arcabouço jurídico-constitucional
no sentido de não admitir quaisquer atos que impliquem restrições à
posse permanente e ao usufruto exclusivo dos índios”.
Para os advogados que elaboraram o parecer, as terras indígenas são,
conforme o direito originário dos índios, inalienáveis, que já tem
destino definido – a posse dos povos indígenas – e não podem ser
negociadas; indisponíveis, ou seja, as terras não podem ser
disponibilizadas para outras funções, sendo que os direitos dos índios
sobre elas são imprescritíveis: podem passar mil anos e tais direitos
não perdem a validade.
“Ao considerar inúmeras atividades econômicas não indígenas e a
possibilidade do controle de território indígena por particulares,
empresas privadas ou mesmo por Municípios ou Estados Federados, a
proposição legislativa desconsidera que o texto refere-se tão somente
aos “atos de relevante interesse público da União”.
O texto proposto
desconsidera o inciso XI do art. 20 da CF/88 que define as terras
indígenas como bens da União, e todo o art. 231, principalmente
relacionado ao direito originário dos índios, o usufruto exclusivo e que
as terras indígenas são inalienáveis e indisponíveis, cujos direitos
são imprescritíveis”, diz o parecer.
Convenção 169 desrespeitada
Ratificada pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva em 2004, a
Convenção 169 da OIT é outro ponto abordado pelo parecer. “O direito a
consulta deve ocorrer também diante de medidas legislativas que afetem
os povos indígenas.
Além da inconstitucionalidade, o PLP 227 desrespeita
essa convenção, que a partir da hora que o país torna-se signatário
passa a ter efeito como lei”, explica o assessor Jurídico do Cimi,
Adelar Cupsinski. A medida, portanto, atua em consonância com a
Constituição Federal.
“A Convenção 169 da OIT não limita quais os temas que os povos
indígenas devem ser consultados como, por exemplo, a exploração de
recursos minerais em terras indígenas ou os atos de relevante interesse
público da União.
Ao contrário, afirma que sempre que medidas
legislativas ou administrativas possam afetá-los diretamente esses
grupos étnicos devem ser consultados.
Trata-se, portanto, de medida que
guarda perfeita consonância com a Constituição da República ao
reconhecer aos índios sua organização social, usos, costumes e tradições
e estabelecer o dever da União Federal em fazer respeitar todos os bens
dos povos indígenas (art. 231, caput)”, diz trecho do parecer.
No entanto, a Convenção 169 amplia a participação dos povos indígenas
na vida do país para além da consulta prévia. De acordo com a línea b
do artigo 6º da convenção, “em todos os níveis decisórios de
instituições eletivas ou órgãos administrativos responsáveis por
políticas e programas que lhes afetem”.
Isso significa, tal como lembram
os advogados no parecer, que o Congresso Nacional precisa, ao menos,
aprovar o Projeto de Lei (PL) 3571/2008, que cria o Conselho Nacional de
Política Indigenista, hoje apenas uma comissão, a CNPI.
“O Congresso
tem o dever de consultar os povos em todas as fases do processo
legislativo. Estamos diante de um projeto (PLP 227) altamente danoso aos
povos indígenas e a democracia”, encerra Cupsinski.
Fonte: Cimi
Link desta matéria: http://amazonia.org.br/2013/08/plp-227-%C3%A9-inconstitucional-e-viola-conven%C3%A7%C3%A3o-169-diz-parecer-jur%C3%ADdico/
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