por Mike Whitney
tradução de NirucewKS063
09 de janeiro de 2016 "Information Clearing House" - "Counterpunch" – Aqui está o seu teste diário de política externa:
Pergunta 1 – Quantos governos os Estados Unidos derrubaram ou tentaram derrubar desde o final da Segunda Guerra Mundial?
Pergunta 2 – Quantos desses governos tinham armas nucleares?
Resposta: 0
Sei… então é claro que a Coreia do Norte precisa de armas nucleares para impedir uma agressão dos Estados Unidos, é ou não é?
Kim Jong Un |
Sim. Não. Sim, armas nucleares são uma boa forma de contenção, mas não, não é por isso que a Coreia do Norte detonou uma bomba de hidrogênio na última terça. A razão que levou a Coréia do Norte a fazer o teste detonando a bomba foi forçar a administração Obama a sentar e prestar atenção. É disso que se trata! O líder supremo da Coreia do Norte, Kim Jong Un, quer porque quer que os Estados Unidos entendam que terão que pagar um preço alto por evitar conversações. Ou seja: Kim está tentando forçar Obama a sentar à mesa de negociações.
Infelizmente Washington parece estar sofrendo de uma surdez total. Veem o Norte como uma ameaça à segurança regional e decidiram que a melhor medicina é a tradicional: sanções em cima de sanções e isolamento completo. A administração Obama acha que tem todo o assunto sobre controle absoluto e que não precisam de nenhuma flexibilidade fedorenta ou assumir compromisso, portanto preferem usar o cacete em vez da cenoura. Na realidade, Obama se recusa a abrir negociações bilaterais com o Norte a não ser que este concorde de antemão em abandonar totalmente seu programa de armas nucleares e permitir que inspetores de armas examinem todas as suas instalações nucleares. Para a Coreia do Norte, isso é o fim das negociações antes do começo. Para eles, seu programa de armas nucleares é o “ás na manga”, sua única chance de acabar com a persistente hostilidade dos Estados Unidos.
Primeira bomba H detonada pelos EUA |
Agora, se separarmos o incidente “bomba de hidrogênio” de um período mais longo da narrativa histórica, indo até a Guerra da Coreia, é possível misturar e embaralhar os fatos de tal maneira que fará com que a Coreia do Norte pareça “o bandido malvado”. Pois então. Simplesmente não é assim. De fato, a razão pela qual o mundo inteiro está face a face com tais problemas atualmente é o aventureirismo dos Estados Unidos no passado. É... da mesma forma que o Daesh (ISIS/ISIL/Estado Islâmico) surgiu das brasas da guerra do Iraque, a proliferação nuclear da Coreia do Norte é um resultado direto das políticas fracassadas dos Estados Unidos nos anos 50s.
Não houve um acordo final para o fim do envolvimento dos Estados Unidos na Guerra da Coreia. Isso significa que a guerra nunca terminou e continua até agora. Foi assinado o acordo de armistício em 27 de julho de 1953, dando fim às hostilidades, mas um “acordo final de paz” nunca foi feito e o resultado é que as nações permanecem divididas até agora. Estas questões continuam sem solução porque os Estados Unidos ainda tem 15 bases militares na Coreia do Sul, com 28.000 tropas de combate e artilharia e mísseis em quantidade suficiente para transformar o país inteiro em pedaços. A presença dos Estados Unidos nessa proporção é a razão efetiva que impede a reunificação do país e a resolução final da guerra, pois os Estados Unidos exigem que seja feita nos termos impostos por Washington. Resultado: a guerra continua a se arrastar, mesmo quando os canhões estão calados, graças em grande parte à ocupação militar da Coréia do Sul exercida pelos Estados Unidos.
Distopia |
Muito bem. Como poderá o Norte normalizar suas relações com os Estados Unidos se Washington não quer conversar com seus dirigentes, e ao mesmo tempo insiste que o Norte abandone seu programa de armas nucleares, que é a única fonte de influência que o Norte possui? Talvez eles possam dar uma reviravolta, ir ao encontro das exigências de Washington e estender uma folha de oliveira na esperança que as relações possam gradualmente melhorar. Mas como pode acontecer isso, se afinal de contas, o que Washington declaradamente quer é a mudança de regime para que possa instalar no país um fantoche dos Estados Unidos que ajudará na criação de mais um pesadelo capitalista permanente (capitalist dystopia, no original – NT) em favor de seus amigos empresários? Isso é ou não é exatamente o que Washington sempre faz?Não é um compromisso. É suicídio.
E tem mais uma coisa: a liderança em Piongiang sabe muito bem com quem estão lidando e esta é a razão pela qual adotaram a linha dura. Sabem muito bem que Washington jamais responderá à fraqueza, mas apenas à força. Portanto, não podem nem devem abandonar seus projetos de armas nucleares. É a sua única esperança. Ou os Estados Unidos baixam a bola e fazem algumas concessões ou o impasse continuará. São os dois únicos resultados possíveis para a equação.
É bom notar que, ainda antes das guerras (mas podem chamar de massacres e banhos de sangue) travadas em décadas em El Salvador, Síria, Iraque, Líbia, Nicarágua, Vietnã e um extenso catálogo de atrocidades, houve a Guerra da Coreia. Os (norte)americanos podem ter varrido para debaixo do tapete, mas os coreanos, tanto do norte quanto do sul lembram-se muito bem o que aconteceu e também como tudo terminou. Vamos colocar aqui um pequeno lembrete para mostrar porque, depois de 63 anos, os norte-coreanos ainda são justificadamente desconfiados com os Estados Unidos, através de um excerto de um artigo intitulado: “os (norte)americanos esqueceram do que fizeram na Coreia do Norte”, no site Vox World:
Projéteis de artilharia usados durante a Guerra da Coreia |
“No início dos anos 50s, durante a Guerra da Coreia, os Estados Unidos despejaram mais bombas contra a Coréia do Norte que durante toda a Segunda Guerra Mundial no teatro do Pacífico. O bombardeio em tapete, que incluiu 32.000 toneladas de napalm, alvejou principalmente os civis, bem como alvos militares, devastando o país muito além do ponto necessário para lutar uma guerra. Cidades inteiras foram destruídas, com milhares de civis inocentes sendo mortos, e a maioria deixada sem casas e com fome...”
De acordo com o jornalista Blaine Harden, dos Estados Unidos…
“Por um período de três anos ou mais, nós matamos – o que? – cerca de 20% da população do país”, disse o general da Força Aérea Curtis LeMay, chefe do Comando Estratégico Aéreo durante a Guerra da Coreia em declaração ao Gabinete para a História da Força Aérea em 1984. Dean Rusk, apoiador da Guerra e mais tarde Secretário de Estado, disse que os Estados Unidos bombardearam “tudo o que se movia na Coréia do Norte, não deixando tijolo sobre tijolo”. Depois de arrasar os alvos urbanos, os bombardeios dos Estados Unidos destruíram hidroelétricas e barragens de irrigação, inundando e destruindo as colheitas, em um estágio final da guerra...
Você pode ter uma visão tanto das consequências humanitárias quanto políticas através da leitura de um telegrama dramático enviado pelo Ministro das Relações Exteriores da Coreia do Norte às Nações Unidas... em janeiro de 1951:
“No dia 03 de janeiro, às 10h30 uma armada de 82 Fortalezas Voadoras despejou sua carga de morte sobre a cidade de Piongiang... Centenas de toneladas de bombas, combinadas com compostos incendiários foram despejados simultaneamente sobre a cidade, causando incêndios devastadores. Os bárbaros transatlânticos bombardearam a cidade com bombas de fragmentação de efeito retardado que explodiram durante todo o dia, impedindo a população de deixar suas casas em busca de socorro nas ruas. A cidade inteira ardeu em chamas durante dois dias. No segundo dia, 7.812 casas de civis haviam queimado até o alicerce. Os (norte)americanos estavam bem cientes de que não haviam alvos militares deixados em Piongiang...
O número de habitantes de Piongiang que foi morto pelas bombas e estilhaços, queimados vivos e sufocado pela fumaça é incalculável... Cerca de 50.000 habitantes permanecem na cidade que antes da guerra tinha uma população de 500.000 habitantes...”
Sentiu o drama? Quando se tornou claro que os Estados Unidos não iam ganhar a guerra, eles decidiram ensinar “aos malditos comunistas” uma lição que eles jamais esqueceriam. Reduziram o país inteiro a ruínas, condenando a população a décadas de fome e pobreza. É assim que Washington luta suas guerras: “Matem todos e deixem Deus resolver o resto”.
É por isso que o Norte constrói bombas nucleares e não faz concessões: porque a aposta de Washington é a seguinte: ou vitória ou aniquilação.
Então o que a Coreia do Norte quer dos Estados Unidos?
O Norte quer o que sempre quis. Que os Estados Unidos cessem suas operações para a mudança de regime, honre suas obrigações relativas ao quadro do acordo de 1994, e assine um pacto de não agressão. É tudo o que eles querem. Que se acabe com a intimidação sem fim, sermões e interferências. É pedir muito? Vejam como Jimmy Carter colocou o assunto em um editorial para o Washington Post, em 24 de novembro de 2010:
“Piongiang nos enviou uma mensagem consistente que, durante eventuais conversações com os Estados Unidos, estariam prontos a concluir um acordo para acabar com seus programas de armas nucleares, colocando-os sob inspeção da IAEA e também para concluir um tratado para substituir o cessar fogo “temporário” de 1953. Nós deveríamos considerar uma resposta para essas ofertas. A alternativa a lamentar é a continuação pela Coréia do Norte de todas as ações que eles julguem adequadas para a defesa daquilo que eles afirmam mais temer: um ataque militar apoiado pelos Estados Unidos, bem como esforços consistentes para a mudança de regime político.” (Mensagem consistente da Coréia do Norte aos EUA” – presidente Jimmy Carter, Washington Post).
Está preto no branco. Os Estados Unidos, caso queiram podem colocar um fim no conflito hoje mesmo, apenas cumprindo suas obrigações sob os termos do acordo assinado e concordando em não agredir a Coreia do Norte no futuro. O caminho do desarmamento nuclear nunca foi fácil, mas as chances de que Obama tome este caminho são mínimas.
Mike Whitney - é um escritor e jornalista norte-americano que dirige sua própria empresa de paisagismo em Snohomish (área de Seattle), WA, EUA. Trabalha regulamente como articulista freelance, há tempos. Em 2006 recebeu o premio Project Censored por um reportagem investigativa sobre a Operation FALCON, um massiva, silenciosa e criminosa operação articulada pela administração Bush (filho) que visava concentrar mais poder na presidência dos EUA. Escreve regularmente em Counterpunch e vários outros sites. É co-autor do livro Hopeless: Barack Obama and the Politics of Illusion (AK Press) o qual também está disponível em Kindle edition. Recebe e-mails por: fergiewhitney@msn.com.
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