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Minas Gerais registrou 64 ataques a ônibus espalhados por 37 cidades entre domingo (3/6) e sexta-feira (8/6), tentativas de incêndio em Câmaras Municipais de duas cidades e tiros disparados contra a delegacia de Cruzília. Essa cidade fica 385 km ao sul da capital Belo Horizonte, região que concentrou a maior parte dos crimes. A ofensiva reforça a tese de nacionalização do PCC, apontado pela polícia mineira como mandante dos ataques.
Minas Gerais registrou 64 ataques a ônibus espalhados por 37 cidades entre domingo (3/6) e sexta-feira (8/6), tentativas de incêndio em Câmaras Municipais de duas cidades e tiros disparados contra a delegacia de Cruzília. Essa cidade fica 385 km ao sul da capital Belo Horizonte, região que concentrou a maior parte dos crimes. A ofensiva reforça a tese de nacionalização do PCC, apontado pela polícia mineira como mandante dos ataques.
O MPSP (Ministério Público Estadual de São Paulo) investiga se
as ordens para os ataques partiram dos líderes da facção, presos no interior do
estado. Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, é apontado como o número 1 da
facção, que conta com divisões internas para garantir ações coordenadas como as
ocorridas em MG. A ‘sintonia final’ autoriza os ataques e repassa as
ordens à ‘sintonia dos estados’, formada por chefes locais nas espécies de
‘franquias’ do Comando, segundo o MP.
Os líderes regionais comandam o setor financeiro, responsáveis
pelas rifas e contribuições mensais dos membros, a chamada cebola, e o setor
disciplinar. Para quem investiga a facção, essas ações são uma forma de dominar
o território e seguir o propósito de tornar o PCC a facção criminosa dominante
no país. “Eles estão presentes em todos os estados”, admite um dos responsáveis
pelo combate ao crime.
Um bilhete encontrado nos ataques em Minas Gerais coloca como
justificativa para a ofensiva a “opressão” nos presídios de MG e RN. Um
policial militar foi morto na região metropolitana de Natal, ônibus e caminhões
dos bombeiros foram queimados no estado. A Polícia Civil mineira conta com
auxílio da PF (Polícia Federal) nas investigações. De acordo com apuração da Ponte,
as ações não necessariamente têm motivo específico, mas podem ser “para
prevenir em caso de transferências” dos integrantes.
“Esses ataques representam uma dinâmica que segue se espalhando
pra outros estados. São ordens emitidas de dentro dos presídios para atacar
ônibus, policiais, prédios públicos, dinâmica de presídios comuns em São Paulo
e Rio de Janeiro”, analisa a socióloga Camila Nunes Dias, pesquisadora da
facção e autora do livro “PCC: hegemonia nas prisões e monopólio da
violência”. “O que se pode analisar é um fenômeno de nacionalização
cada vez maior do PCC e, muitas vezes, silenciosamente. Já teve casos em Santa
Catarina, Ceará, Rio Grande do Norte… Dessa vez foi em Minas”, continua.
Gangues x Facção
Uma das razões apontadas por especialistas para entender como o
PCC tem conseguido ‘colonizar’ a criminalidade de outros estados é a dinâmica
do tráfico, por exemplo. Enquanto PCC e CV (Comando Vermelho) concentram com o
objetivo de dominar a operação do tráfico de drogas e armas, em Minas, o crime
é desorganizado. “O crime em Minas é dominado por gangues, sem muita
articulação, tem ações pulverizadas. São grupos pequenos de jovens que se
agrupam em razão da identidade, reconhecimento e identificação. Não têm a mesma
organização de uma facção, nem dimensão ou quantidade de membros”, explica o
sociólogo Victor Neiva, pesquisador do Crisp (Centro de Estudos de
Criminalidade e Segurança Pública) da UFMG (Universidade Federal de Minas
Gerais).
PCC e CV, facções originadas respectivamente em São Paulo e no
Rio de Janeiro, disputam a hegemonia no tráfico de drogas brasileiro. Há
registros de conflitos entre as facções e novos grupos apoiadores nas regiões
norte e nordeste por estarem na rota do tráfico internacional vindo de países
da América do Sul e com destino à Europa, como mostrou reportagem da Ponte sobre
a série de homicídios no estado do Pará.
A outra é o encarceramento em massa. A pesquisadora Camila Nunes
Dias destaca que a proximidade com São Paulo deu força ao crime
organizado na região sul e no triângulo mineiro. “É importante lembrar que
Minas é um dos estados que passou a encarcerar mais na última década, o que tem
tudo a ver com o crescimento das facções no estado. É uma dinâmica também muito
similar a São Paulo: o aumento do encarceramento com maior importância das
facções dentro e fora do sistema prisional”, sustenta.
A população carcerária mineira subiu de 9.975 para 68.354
pessoas de 2006 a 2016, segundo o Infopen,
levantamento feito pelo Ministério da Justiça. O crescimento é de 585%,
enquanto o país registrou aumento de 81% no mesmo período (de 401,2 mil presos
para 726,7 mil). Minas Gerais é o segundo estado brasileiro na lista dos que
mais encarceram, atrás somente de São Paulo, com 240.061 presos, segundo o
Infopen.
O presídio de segurança máxima Nelson Hungria tem dois pavilhões
destinados somente para membros da facção ou quem o estado suspeita de ser
simpatizante, de acordo com estudos do Crisp da UFMG. São aproximadamente 400
presos integrantes ou apoiadores do Comando só nesta cadeia.
O pesquisador do Crisp Victor Neiva explica que os estudos
apontam para a entrada da facção nas prisões do estado por volta de 2006.
Porém, há certa resistência dos criminosos de Minas Gerais em se tornarem
membros. “O PCC determina uma disciplina forte, regras de vivência rígidas.
Alguns dos presos falam que existe o temor da adesão pelo vínculo e o modo de
proceder porque preferem resolver seus problemas de modo individual, sem
autorizações de cima”, explica.
O sistema prisional do estado sofreu alteração a partir de 2003
com a construção de presídios. Anteriormente, os presos ficavam nas carceragens
policiais de delegacias. “A reorganização do sistema é nova, tem 15 anos. Em
2006 foi a primeira vez de termos mais presos nas penitenciárias do que nas
cadeias públicas”, analisa o pesquisador.
Segundo ele, ainda há uma reorganização no sistema prisional
mineiro. “Tivemos poucos concursos para agentes penitenciários e são poucos os
estudos, por isso se conhece pouco. A partir daí, o perfil do preso começa a se
diversificar, o estado começa a aprender a lidar com gangues e facções, e os presos
se reorganizam internamente”, aponta Neiva.
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