Nos últimos anos, a grande imprensa
brasileira, apesar do seu enorme poder de persuasão, tem perdido paulatinamente
o monopólio de moldar a opinião pública nacional.
O advento das redes sociais e a
“mídia independente” têm proporcionado visões alternativas de determinados
acontecimentos, o que vem a contribuir como contraponto ao status quo.
Nesse sentido, o exemplo da chamada
“Mídia Ninja”, que transmitiu ao vivo pela internet alguns flagrantes de abusos
policiais nas recentes manifestações populares (contrariando a “versão oficial”
dos fatos), é emblemático.
Entretanto, em relação às questões
internacionais, em que o ponto de vista alternativo ao pensamento hegemônico é
menos eficaz e abrangente, ainda é a grande imprensa (principalmente a maior
emissora de TV do país) que determina o pensamento de grande parte dos
brasileiros.
Sendo assim, a ideologia imperialista
da mídia estadunidense, fielmente difundida pelos seus congêneres tupiniquins,
é praticamente a única fonte de informações que chega à esmagadora maioria da
população.
Desse modo, estereótipos como o
“muçulmano terrorista e fanático religioso”, o “ditador cubano” e o “caudilho
sul-americano”, exaustivamente repetidos como mantras pelos meios de
comunicação, são aceitos sem maiores questionamentos.
Todavia, as atrocidades cometidas
pelo Estado de Israel contra o povo palestino, a espionagem realizada pelo
governo de Washington e a violação dos direitos humanos na Colômbia são
estrategicamente negligenciados, ou, na melhor das hipóteses, abordados
superficialmente.
Dois pesos, duas medidas - Vejamos alguns exemplos recentes. Neste ano
faleceram dois influentes nomes do xadrez geopolítico global, Hugo Chávez e
Margaret Thatcher, respectivamente nos meses de março e abril. Porém, as
coberturas midiáticas de ambos os acontecimentos foram altamente tendenciosas.
Chávez, articulador de políticas
sociais que melhoraram as condições de vida dos venezuelanos mais pobres e
responsável por aumentar os laços de solidariedade entre os povos do Sul,
sempre foi tachado de “caudilho” e apontado como líder que ameaçava a estabilidade
política mundial.
Já a “dama de ferro”, que executou
inúmeras políticas neoliberais maléficas às classes trabalhadoras, é retratada
pela imprensa hegemônica como exemplo de sobriedade e aclamada como grande
personalidade do século passado.
Não obstante, a mesma mídia que faz
questão de enfatizar uma suposta retaliação realizada pelo governo cubano à
blogueira Yoani Sánchez, se cala em relação às perseguições de Washington a
Bradley Manning, Julian Assange e Edward Snowden.
A propósito,
enquanto Yoani saiu livremente de Cuba e viajou pelo mundo, Manning está preso nos Estados
Unidos, Assange cumpre prisão domiciliar na embaixada do Equador em Londres e Snowden não pode deixar a Rússia, onde está
exilado, sob o risco de ser morto pelo governo estadunidense.
Em outros termos, de acordo com o
pensamento dominante, apontar violações de direitos humanos realizadas pelo
regime castrista é um ato de heroísmo. Em contrapartida, denunciar as políticas
de espionagem dos Estados Unidos é caracterizado como ação criminosa.
Dois pesos, duas medidas.
Democratização dos meios de comunicação.
Para a grande imprensa brasileira,
governos eleitos pelo voto popular, mas contrários aos interesses
estadunidenses, são qualificados como antidemocráticos; já ditaduras e monarquias
apoiadas pelas grandes potências não são questionadas.
Assim, as deposições de Manuel
Zelaya e Fernando Lugo foram consideradas constitucionais e o golpe
militar que ocorreu em julho no Egito (tacitamente apoiado pela Casa Branca) é
justificado sob o pretexto de combater o “radicalismo islâmico” da Irmandade
Muçulmana.
Aliás, compactuar com ações
contrárias a governos democraticamente eleitos não é novidade para a mídia
hegemônica brasileira. Um dia após o fatídico golpe militar de 1964, o jornal O
Globo apresentava um editorial que exaltava os bravos militares que
“salvaram a democracia, a lei e a ordem no Brasil”. Desse modo, não
é por acaso que o acrônimo PIG – partido da imprensa golpista – é bastante
utilizado pelas forças progressistas de nosso país.
Em suma, não se trata de pleitear uma
imprensa que tenha essa ou aquela tendência ideológica, mas questionar o fato de a grande mídia brasileira apresentar
quase sempre uma visão unidimensional da realidade.
Salvo raríssimas exceções, somente
determinado ponto de vista tem espaço nas maiores emissoras de televisão e nos
principais jornais e revistas do país. Opiniões divergentes ao status
quo são peremptoriamente ignoradas.
Diante dessa realidade, é preciso que
os diferentes setores sociais possam ter a oportunidade de defender os seus
valores políticos em igualdade de condições. Portanto, uma sociedade
realmente livre passa, inexoravelmente, pela completa democratização dos meios
de comunicação de massa.
Nota sobre o autor: Francisco Fernandes Ladeira é especialista em Ciências Humanas, Brasil: Estado e Sociedade pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e professor de Geografia em Barbacena - MG. www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/_ed760_noticiario_internacional_e_manipulacao_midiatica