quinta-feira, 29 de junho de 2017

Temer nomeia Raquel Dodge como procuradora-geral e sabota sucessor de Janot.

Dodge é a indicada por Temer
Dodge é a indicada por Temer  (REUTERS).

Pela primeira vez desde 2003, presidente ignora primeiro nome da lista, que era Nicolao Dino.

presidente da República, Michel Temer, ignorou o tradicional compromisso de nomear o candidato mais votado na eleição interna do Ministério Público Federal(MPF) e indicou Raquel Dodge como a nova procuradora-geral da República na noite desta quarta-feira. 
Essa foi a primeira vez desde 2003 que o presidente da República desrespeita essa tradição. Na prática, a indicação permite a Temer escolher quem pode investigá-lo depois do término do mandato do atual procurador-geral, Rodrigo Janot, em 17 de setembro. Com o anúncio da indicação, o presidente manda o recado de que Janot está já no final do seu mandato como um intento de tirar força da denúncia que o procurador-geral apresentou contra ele por corrupção passiva na última segunda-feira.
Dodge foi a segunda candidata mais votada da categoria, com 587 dos 1.108 votos de procuradores. O candidato mais votado tinha sido Nicolao Dino, que recebeu 621 votos e era considerado o sucessor de Janot. 

quarta-feira, 28 de junho de 2017

Racismo em Cuiabá - MT. Turista negra é espancada e chamada de macaca por empresário e médica.

racismo turista negra cuiabá

“Macaca, escrava! Tá achando ruim ser chamada de negra? É o que você é”. Um empresário e a sua esposa, que é médica, foram denunciados por racismo e agressão após espancarem uma turista negra em uma boate de Cuiabá-MT. A vítima levou um soco do homem e foi arrastada pela mulher.

Um empresário e a sua esposa, que é médica, foram denunciados pelos crimes de racismo e agressão corporal após espancarem uma turista negra em uma bate de Cuiabá (MT).

O crime aconteceu em uma casa sertaneja há 10 dias, mas estava sendo mantido em sigilo e só agora foi revelado após uma postagem na internet.
O estabelecimento é frequentado por pessoas de classe média e alta na cidade. Funcionários do local também foram alvo de xingamentos racistas.
Os agressores gozam de prestígio na cidade. A turista registrou um boletim de ocorrência na Polícia Civil. O caso, no entanto, foi tratado apenas como agressão.
Uma amiga da turista publicou, com a autorização da vítima, um relato sobre as agressões (leia abaixo). Ela conta que a turista estava no estabelecimento quando notou que, em uma mesa, uma mulher a chamava de “macaca”.
As provocações continuaram até que amigos da mulher, que também estavam na outra mesa, possivelmente constrangidos, pediram desculpas pelo insultos.
No entanto, pouco tempo depois, ao sair do banheiro, a turista foi agredida com um soco no rosto pelo empresário, marido da mulher. Caída no chão após a violência do golpe, ela ainda foi arrastada pelos cabelos pela médica. Os funcionários da boate confirmaram a versão.
“Um dos seguranças foi agredido com um soco e teve o crânio fraturado. Eles diziam que não gostavam de negro, que não queriam ser tocados por nenhum de nós”, relatou um segurança.
O empresário ainda tentou entregar dinheiro ao funcionário agredido, alegando que “negro gosta de ganhar dinheiro”.
Após as agressões, os envolvidos na confusão foram encaminhados para a delegacia. De acordo com o segurança, os policiais que atenderam a ocorrência não estavam preparados. “Eles foram negligentes. Ouvi que eles não queriam registrar a ocorrência como injúria racial”, disse um deles.
Pragmatismo Político entrou em contato com a Polícia Civil de Cuiabá para tentar conseguir os nomes dos agressores, mas até o fechamento desta publicação não obtivemos resposta.
Confira a íntegra do relato publicado pela amiga da vítima nas redes sociais:
Com autorização de minha colega de trabalho, Juliana Souza, publico as fotos e conto, resumidamente, a história destes hematomas no rosto dela:
Feliz da vida ela foi passar o feriado prolongado na casa de parentes em Cuiabá-MT. Na sexta, 17/06, foi com os primos se divertir em um “pub” da cidade. Em uma mesa, um pouco distante da sua, percebeu um casal, e notou que a mulher a chamava de macaca, o que era perfeitamente perceptível pelo movimento labial…Juliana é negra…Continuou na sua, embora não gostando nada daquela provocação absurda, gratuita, que persistia …Chegou ao ponto de alguém da mesa deles ir até Juliana pedir desculpas…
Em dado momento quando ela foi ao banheiro, ao retornar, foi atacada pelo namorado da moça, com um soco no rosto! Já no chão, surpreendida com a agressão repentina, sentiu-se arrastada pelos cabelos e viu que era a moça que o fazia, enquanto gritava: “VOCÊ NÃO TEM QUE ESTAR AQUI, SUA MACACA, ESCRAVA, VAI PRA SENZALA! TÁ ACHANDO RUIM SER CHAMADA DE NEGRA?! É O QUE VOCÊ É, E TEM QUE PASSAR CHAPINHA NO CABELO!!!”…
Os seguranças interviram, e também negros, foram chamados de macacos e agredidos pelo rapaz(grandalhão e muito forte). Um deles precisou levar pontos na testa…A policia foi chamada, levou o rapaz preso, no CAMBURÃO, a moça nao foi levada, por conta da parcialidade de um dos policiais…(Ele gritou que pagaria propina e não ficaria preso)
Juliana fez exame de corpo de delito, abriu um BO e contratou advogado…Tudo registrado, agora é esperar por justiça, que, se vier, não apagará a agressão que sofreu na sua dignidade, na sua HUMANIDADE, na sua alma…
O “rapaz”, pagou fiança, em torno de oito mil reais, e foi solto 19/06…
Nem Juliana, nem os primos entenderam a razão de tanta violência…Era visível o quanto o casal estava alterado, não se sabe se por ingestão de alguma bebida ou drogas…Nada justifica!

Eis os personagens desta triste, revoltante e vergonhosa história:
– A VÍTIMA – Juliana – Pedagoga – Pos Graduação em Psicopedagogia -Excelente profissional – Professora da Rede Pública.
– O AGRESSOR – O “rapaz” – Empresário Rico.
-A AGRESSORA – A “moça” – Médica pediatra e professora em uma universidade de Cuiabá.

segunda-feira, 26 de junho de 2017

Florestan Fernandes: A crise da cultura e o liberalismo*.

Posted: 22 Jun 2017 06:44 PM PDT

Florestan Fernandes

O tema do momento é a crise de cultura no ocidente. Artigos, ensaios e profundas análises sociológicas têm sido escritos sôbre os aspectos e as graves consequências da mudança; poucos autores, entretanto, viveram tão de perto o drama da transição como Karl Mannheim, que conheceu na Alemanha totalitária o rebento espúrio do liberalismo e viu pessoalmente na Inglaterra e nos Estados Unidos outro lado do desenvolvimento da sociedade liberal-democrática. Por isso tem especial interêsse para nós um de seus ensaios (“As Causas da Crise Contemporânea da Cultura”, in Libertad y Planificación”), em que analisa a crise da cultura nas sociedades liberais-democráticas, partindo de dados fornecidos pela sociologia.

Há uma estreita dependência entre sociedade e cultura, entre estrutura social e vida intelectual (Mannheim toma o termo neste sentido restrito), de modo que qualquer modificação ou transformação sofrida pela primeira, reflete-se nas esferas da segunda. Ora, a sociedade liberal-democrática do ocidente está em crise; ela passou ou está passando de seu estado de sociedade liberal-democrática de minorias para o de massas. Em consequência, os fatores sociais que agiram nessa transformação vão também agir sôbre a vida intelectual: a produção e a utilização (consumo, diz Mannheim) da cultura e as relações entre o autor e o público, que dependem estreitamente de certas condições sociais se transformam à medida que aquelas condições se modificam. Por isso, a vida intelectual também está ameaçada pelos dois princípios, mutuamente antagônicos, o liberal “laissez- faire” e a regulamentação, que lutam no campo econômico. Êle se arrisca a todos os perigos que decorrem do funcionamento sem nenhuma direção das sociedades democráticas de massas, que se tornam mais graves e agudos quando as formas liberais são substituidas por formas ditatoriais de regulamentação.

Numa sociedade democrática, sabemo-lo, a cultura depende de “normas peculiares de uma ordem social não regulamentada”. Há apenas um mínimo de organização artificial, aparecendo essas sociedades, à primeira vista, como “um conjunto casual e inarticulado”. Uma análise mais profunda, todavia, mostra que mesmo nas esferas não econômicas há processos similares ao da livre-concorrência, com um ajustamento automático entre a classe que produz e a que assimila a cultura, através de atividades inorganizadas e privadas.

Uma análise da cultura, encarada sob este ponto de vista, deve começar, está claro, por aquêles que criam a cultura, isto é, os intelectuais e por sua posição dentro da sociedade, considerada como um todo. Verificamos, então, que os intelectuais se constituem, na sociedade liberal-democrática da minoria em “élites” reduzidas, cuja missão essencial consiste não só em criar a cultura, mas em lhe dar uma forma, um significado social e institucional. Elas estimulam o desenvolvimento do conhecimento objetivo e as tendências à introspecção, à contemplação e à reflexão. Quando estas “élites” são destruídas ou encontram obstáculos à sua organização, as condições sociais necessárias ao aparecimento da cultura e sua manutenção desaparecem. 

A crise contemporânea da cultura se explica justamente a partir dos obstáculos aparecidos na seleção das “élites” criadoras em consequência da transição da sociedade liberal-democrática de minorias para a de massas: “a crise da cultura na sociedade liberal-democrática é devida em primeiro lugar ao fato de que os processos sociais que antes favoreciam o desenvolvimento das minorias seletas criadoras, agora produzem o efeito contrário, isto é, chegam a ser obstáculo à formação das “elites”, porque seções mais amplas da população, ainda que se achem em condições sociais desfavoráveis, tomam uma parte ativa nas atividades culturais” (pgs. 78-79). Aí se apresentam os processos de “democratização negativa”, de “seleção negativa”, etc., que resultam da democratização da cultura, a qual deu amplas oportunidades para um número muito grande de indivíduos que procuraram se orientar preferencialmente, para esses grupos seletos e criadores.

À medida que esse fenômeno se firma, vemos a história dramática da sociedade democrática do ocidente repercutir no desenvolvimento de sua vida intelectual. As minorias seletas aumentam em número, devido ao crescente afluxo de indivíduos, e perdem grande parte de seu poder, tendendo a exercer cada vez menos suas funções e suas influências diretoras. Paralelamente, o público organizado que se punha entre o autor e a minoria como intermediário, desaparece, ficando o autor sujeito, bruscamente, à influência direta das massas, que aumenta de importância. Este público _ um público _ massa, desintegrado, reunindo-se em função de estímulos sensoriais – não influe no autor como aquele outro que, selecionado em grupos estáveis, tinha determinados gostos e tipos de reação. E assim, uma excessiva democratização da cultura e a consequente ascensão de indivíduos e grupos que não estão educacionalmente preparados para ocupar aquelas funções intelectuais, faz com que seus valores predominem e haja uma consequente queda no nivel cultural médio.

Esses processos sociais, porém, apresentam dois aspectos distintos: na primeira fase de transição os resultados sempre foram favoráveis e positivos (por exemplo: indivíduos provenientes de outras classes sociais levavam às “élites” novos interesses e pontos de vista, ampliando seu horizonte cultural; serviam de intermediários entre aquelas minorias e a maioria, reajustando a cultura à sociedade, etc.). Mas, o mecanismo liberalista não permite parar aí o processo _ êle ampliou-se demasiadamente e sem orientação, ganhando continuamente em massa e perdendo em qualidade.

Dessas facilidades de aquisição da cultura resultou uma proletarização da “inteligentsia”, aparecendo no mercado de trabalho intelectual mais oferta do que procura. O significado desta proletarização seria a perda do valor social das profissões liberais e consequente atribuição de menor importância a essas atividades por parte da opinião pública. Diminuido o valor do intelectual, é lógico que também diminuísse o valor do produto de seu trabalho _ a cultura.

Isto não aconteceu imediatamente após a passagem da sociedade aristocrática para a liberal-democrática porque esta, em seu primeiro período, apareceu sob a forma de minorias seletas (a riqueza era condição indispensável para a vida intelectual). Mas, passou-se para a sociedade de massas e com a democratização da cultura aparecem aspectos novos nos processos de formação e de seleção das “élites” que, apresentando inicialmente ótimos resultados culturais, acabaram por levar às suas consequências negativas inevitáveis.

Restam duas perguntas, que Mannheim procura resolver: por que só agora a cultura adquiriu seu caráter de massas e não quando apareceu o proletariado? Por que a decadência cultural se tornou visível só quando a democratização da cultura afetou as classes não proletárias? A mentalidade de uma classe, diz Mannheim, depende de sua situação frente à produção econômica. Por isso o proletariado, que deve a sua existência ao progresso da industrialização e à racionalização técnica, procura desenvolver a sociedade de massas nesse sentido. 

A classe que ficou com o poder, nas sociedades liberais-democráticas de massa pertence à burguesia _ aos seus mais baixos estatus: pequenos funcionários, homens de negócios pouco importantes, pequenos lavradores e comerciantes, etc. Ora, o invento técnico, a racionalização, a produção em grande escala são seus inimigos naturais e por êles são combatidos incondicionalmente, com a finalidade de impedir o aparecimento das grandes fábricas, das grandes emprêsas, etc.; mas, nada se pode alterar numa das esferas da sociedade sem alterar as demais esferas sociais, e qualquer tentativa de regressão social e econômica a uma éra precapitalista precisa ser acompanhada de uma modificação da mentalidade existente também para formas precapitalistas. 

Essa classe média procurará resolver o impasse agindo artificialmente sôbre a racionalização técnica, esforçando-se por atenuar a industrialização, a organização em grande escala e impedir a proletarização crescente nas sociedades democráticas de massa. Isso não se efetua por si mesmo, automaticamente, mas só pela interferência da fôrça ou de um plano: o desenvolvimento da sociedade liberal-democrática desorganizada culmina na ditadura, implicando todos aquêles inconvenientes da substituição de formas livres por outras impostas artificialmente.

É claro que essa é uma etapa do desenvolvimento social das sociedades modernas que sem dúvida, vencendo a crise, acabarão por modelar seus elementos em formas culturais estáveis. Contudo _ e a crítica de Mannheim é contra isto _ aplicamos atualmente os processos de seleção a suas correlatas instituições de um modo inadequado, já que não visamos mais a seleção limitada de intectuais. 

Este e outros defeitos de funcionamento da sociedade liberal-democrática podem levar ao naufrágio da civilização; mas, a ditadura, de forma alguma pode ser oposta a estas tendências negativas do liberalismo, porque ela mesma “nasce da atuação negativa das fôrças da democracia de massas, e não é mais que uma tentativa violenta para estabilizar uma etapa do desenvolvimento da sociedade liberal que por sua natureza era transitória”.

* Publicado na Folha da Manhã, quinta-feira, 16 de março de 1944.  Neste texto foi mantida a grafia original. Especial para a “Folha da Manhã”. Publicado originalmente no site da Folha de São Paulo.

sexta-feira, 23 de junho de 2017

Ministro do TSE é acusado por mulher de violência doméstica.

O advogado Admar Gonzaga é nomeado o novo ministro do TSE (Divulgação/TSE)
O ministro do TSE, Admar GonzagaDivulgação/TSE

Felipe Pontes - Repórter da Agência Brasil
O ministro Admar Gonzaga, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), foi acusado pela mulher, Élida Souza Matos, de violência doméstica. Ela registrou na madrugada de hoje (23) um boletim de ocorrência na 1ª Delegacia de Polícia de Brasília, quando disse ter sido agredida fisicamente pelo magistrado. 
Policiais que acompanham o caso informaram à Agência Brasil que Élida, é dona de casa e mora com Gonzaga há cerca de 10 anos, tinha um machucado na região do olho e foi encaminhada para o Instituto Médico-Legal (IML) para exames. 
O advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que disse representar o casal, confirmou o registro do boletim de ocorrência, mas que Élida já fez uma retratação, pedindo o arquivamento do caso. Em nota, ele nega que tenha ocorrido agressão física e que houve um desentendimento do casal com "exasperação de ambos os lados".
“Élida já foi à 1ª DP e registrou uma retratação. A ocorrência foi feita no calor dos acontecimentos e ela decidiu que queria apresentar imediatamente a retratação. O ministro Admar inclusive a acompanhou à delegacia”, disse o advogado.
De acordo com o Artigo 16 da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), mesmo que a vítima faça uma retratação, o juiz é a única autoridade competente a admitir a retirada da queixa contra o acusado, o que só pode ser feito após parecer do Ministério Público. Em interpretação ao artigo, o Supremo Tribunal Federal (STF), em uma ação direta de inconstitucionalidade, entendeu que crime de lesão corporal, independentemente da extensão, tem natureza incondicionada, não dependendo de representação da vítima.
Como ministro do TSE tem foro por prerrogativa de função, o caso deverá ser encaminhado ao Supremo. 
Admar Gonzaga foi nomeado para o cargo pelo presidente Michel Temer em março. No início deste mês, ele votou pela absolvição no julgamento em que o PSDB pedia ao TSE a cassação da chapa Dilma-Temer. 

Edição: Carolina Pimentel

domingo, 18 de junho de 2017

Direitos da população quilombola estão em xeque na Justiça Federal.











Direitos da população quilombola estão em xeque na Justiça Federal.

por Laércio Portela
Na próxima quarta-feira (21), o Tribunal Regional Federal da 5a Região, sediado em Recife, julga a constitucionalidade do decreto 4.887/03, que regulamenta a demarcação e titulação das terras dos remanescentes quilombolas no Brasil. A decisão pode afetar a vida de pelo menos 20 mil famílias com processos abertos no Incra nos estados de Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará, áreas de abrangência do TRF 5.
decreto 4.887/03 regulamenta o artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal de 1988 que determina que “aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos.”
Pelo decreto, consideram-se remanescentes dos quilombos, “os grupos étnicos-raciais, segundo critérios de auto-atribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida”. Compete ao Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), por meio do Incra, a identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas pelos remanescentes das comunidades dos quilombos, sem prejuízo da competência concorrente dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
O decreto prevê que “para a medição e demarcação das terras, serão levados em consideração critérios de territorialidade indicados pelos remanescentes das comunidades dos quilombos, sendo facultado à comunidade interessada apresentar as peças técnicas para a instrução procedimental”. Também garante aos remanescentes “a participação em todas as fases do procedimento administrativo, diretamente ou por meio de representantes por eles indicados”.
Comunidade de Acauã
O caso que deu origem ao processo no TRF5 está vinculado à comunidade quilombola de Acauã, localizada no município de Poço Branco, no Rio Grande do Norte. Formada por 60 famílias, a comunidade teve seu território reconhecido oficialmente pelo Estado brasileiro em 2008. Ela ocupa uma área de 338 hectares – muito menor do que o território original reivindicado pelos remanescentes. O reconhecimento garantiu à população acesso a políticas públicas como a construção de casas pelo governo federal e o recebimento de cisternas.
A desapropriação da terra saiu em 2013 e foi questionada na Justiça Federal pelo proprietário Manoel de Freitas, alegando a inconstitucionalidade do decreto 4.887/03. É esse questionamento que será julgado na próxima quarta-feira pelo tribunal federal sediado em Recife.
Na semana passada, o desembargador Edilson Nobre deferiu o pedido de habilitação no processo como amicus curiae de 23 comunidades quilombolas dos estados de Pernambuco e Rio Grande do Norte. A expressão em latim faz referência à participação de terceiros em processos jurídicos, com o objetivo de subsidiar a Corte com informações relevantes sobre a causa a ser julgada.
Além das comunidades, a Comissão Pastoral da Terra (CPT), a Defensoria Pública da União, a Fundação Cultural Palmares e a Associação dos Advogados/as de Trabalhadores Rurais (AATR) também se habilitaram no processo como amicus curiae.
Para Gabriella Santos, assessora jurídica e advogada da CPT, a participação direta das comunidades no processo, como “amigos da corte” é fundamental, por se tratar de uma causa que vai impactar diretamente centenas de comunidades quilombolas existentes no território abrangido pelo TRF 5. “Como amicus curiae, as comunidades quilombolas podem fornecer subsídios que ajudem a instruir o processo, pois os desembargadores estão diante de uma causa de especial relevância e complexidade, inclusive porque nesses casos o instrumento do amicus serve como forma de ampliar e qualificar o contraditório, previsto na Constituição Federal”, analisa.
União quilombola
Jefferson Pereira, quilombola do território Águas do Velho Chico, localizado em Orocó, Pernambuco, chama a atenção para o momento crítico do debate sobre os direitos das comunidades remanescentes. “É muito importante que as comunidades quilombolas se unam em torno de sua grande pauta, que é o território, e que está definitivamente ameaçada por esse julgamento que ocorrerá no TRF 5. Reafirmamos a importância de todos os quilombos do Brasil se unirem, para que os poucos direitos duramente conquistados não sejam suprimidos“.
Para Jefferson, o que está em jogo é parte fundamental da história e da memória de seus ancestrais negros. “Diante de tantas opressões vividas ao longo da nossa história, as comunidades quilombolas sempre se uniram em torno do que mais necessitavam: liberdade, enquanto possibilidade de manutenção de nossas tradições e de nossos direitos. Hoje não será diferente”.
Audiências públicas
Nesta segunda-feira (19), o Ministério Público Federal vai realizer audiência pública às 14h para discutir a constitucionalidade do decreto em sua sede no Recife. Estarão presentes representantes de comunidades quilombolas do estado; o procurador da República, Alfredo Carlos Gonzaga; o pesquisador e professor da Universidade Federal da Paraíba,Eduardo Fernandes; Geraldo Vilar, da Defensoria Pública da União; Priscila Oliveira, procuradora regional Federal; Eliane Recena, procuradora regional da República; e representante do Incra nacional. O conteúdo desta audiência poderá fazer parte dos autos do processo e servir de subsídio para os desembargadores que julgarão o decreto 4.887/03.
O tema também sera discutido na terça-feira (20) em audiência pública na Assembléia Legislativa de Pernambuco, a partir das 9h. A audiência, intitulada de Quilombolas, nenhum direito a menos: a regulamentação fundiária e os direitos dos povos remanescentes dos quilombos,  discutirá, além do decreto, o contexto de violações de direitos, conflitos agrários  a luta pelo território quilombola.
Ataques recorrentes
Esta não é a primeira vez que o decreto que regulamenta a demarcação e titulação de terras dos remanescentes quilombolas é questionada na Justiça. Após a decretação do decreto em 2003, o então Partido da Frente Liberal, antigo PFL e atual DEM, ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF). O julgamento está empatado em 1 a 1, com voto pela inconstitucionalidade proferido pelo ministro Cesar Peluso e outro de constitucionalidade dado pela ministra Rosa Weber. O julgamento aguarda retomada na Corte desde 2015.
Em 2013, O Tribunal Regional Federal da 4a Região declarou a constitucionalidade do decreto por 12 votos a 3, depois de ter sido provocado por fazendeiros do estado do Paraná em caso envolvendo a comunidade quilombola de Paiol de Telha. Agora, os direitos das populações remanescentes dos quilombos estão mais uma vez em xeque.
- Marco Zero Conteúdo, por Laércio Portela.

sábado, 17 de junho de 2017

Operação Serenata de Amor: projeto cobra deputados federais por gastos públicos.

Profissionais e entusiastas da tecnologia participam da Campus Party, em Brasília
|Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Publicado em: 17 de Ana Elisa Santana
O avanço de tecnologias tem transformado a comunicação entre as pessoas, aproximando-as de quem antes tinha um relacionamento mais distanciado, como os agentes públicos. Ao mesmo tempo em que essas relações se estreitam, surgem ferramentas que podem analisar de forma otimizada os dados da Lei de Acesso à Informação (LAI), como o robô Rosie, da Operação Serenata de Amor. Com a iniciativa, deputados federais têm sido mais cobrados em relação aos gastos públicos.
A LAI fornece, desde 2011, uma gama de dados públicos que podem ser analisados por qualquer cidadão. No entanto, o grande volume de informação torna impossível que interessados verifiquem tudo que está disponível. Com a Operação Serenata de Amor foi criada a Rosie, um robô que analisa os gastos públicos da cota para exercício de atividade parlamentar da Câmara dos Deputados. A Casa recebe pedidos de cerca de 1.500 reembolsos por dia, uma média de 22 mil notas por mês. “É impossível para um time humano analisar se os reembolsos são suspeitos ou não. Quando vimos que não tinha pessoas suficientes para fazer isso, enxergamos nossa relevância”, afirma Pedro Vilanova, um dos idealizadores do projeto.
Como funciona
Em setembro de 2016, o grupo idealizador da operação fez uma campanha de financiamento coletivo, quando arrecadou R$ 80 mil para começar o projeto. Até agora, segundo disse Vilanova na Campus Party Brasília, Rosie identificou cerca de 8 mil reembolsos suspeitos. O robô é programado para cruzar dados e rastrear informações com problemas, como notas com CNPJ ou CPF inválidos, pagamentos feitos em locais muito distantes em um curto período de tempo, preços de refeições discrepantes, gastos com bebidas alcoólicas, viagens ao exterior e presença em plenário. “Não dá para um deputado estar votando no plenário e comendo em Salvador ao mesmo tempo”, exemplifica Vilanova.
Ao contrário da análise de dados, que é programada, o processo para denunciar precisa ser manual. Por isso, a equipe da Operação Serenata de Amor fez uma força tarefa e realizou, em uma semana, 629 denúncias. No entanto, não existe nada que, legalmente, obrigue os deputados a devolver o dinheiro, e eles raramente recebem respostas dos parlamentares. Para dar mais visibilidade a esses gastos indevidos, o robô Rosie ganhou uma conta no Twitter, onde são publicadas algumas das denúncias.
O projeto continua sendo apoiado de forma colaborativa, em um financiamento coletivo contínuo. O grupo também divulga relatórios mensais sobre a operação. A iniciativa tem engajado muitas pessoas na internet, afirma Pedro. “Não importa se são só R$ 20 [gastos]. É dinheiro público e as pessoas começaram a falar sobre esses valores e a cobrar, e a gente percebeu que é um projeto de voz política”, acrescenta. Agora, eles querem que mais pessoas participem dessa cobrança, para ampliar o projeto a outros órgãos públicos, chegando inclusive a secretarias e prefeituras municipais. “A lei e a tecnologia funcionam, e não quero que esses dados sumam. Tem muita coisa ainda para ser feita, e a Rosie vai continuar trabalhando”, afirma Vilanova. O robô consegue fazer uma varredura e analisar 1,6 milhão de reembolsos por hora. Confira alguns dados levantados pelo projeto: 
|Imagem e fonte: Agência Brasil

|Imagem e fonte: Agência Brasil
Dados governamentais
No contexto em que cresce a interação entre pessoas e parlamentares, a Câmara dos Deputados criou a plataforma Dados Abertos, que oferece acesso direto aos dados produzidos na casa. O site deu origem à Rede Legislativa de Dados Governamentais Abertos (DGA), que reúne contribuições dadas por cidadãos para melhorar sistemas e processos do governo.
Um dos resultados da DGA é o VoteNaWeb, iniciativa que usa a base de dados dos projetos de Lei apresentados por deputados. Na plataforma, as propostas são descritas com linguagem mais acessível e os cidadãos podem se posicionar sobre o tema. Depois, um mapa mostra a posição dos estados, fazendo um panorama sobre a reação da sociedade em relação à ideia.
Para Rodolfo Vaz, diretor da Coordenação de Soluções de TIC para a Comunicação Social e Transparência da Câmara, com o uso constante desse serviço torna-se possível cruzar dados da votação dos cidadãos com os votos de deputados, e assim cada eleitor pode saber qual parlamentar tem perfil mais alinhado com o dele. “Isso pode, inclusive, mudar o voto do eleitor na próxima eleição”, prevê.
O portal e-Democracia, ainda em fase de testes, tem uma estrutura para essa interação. Parte do site, chamada Wikilegis, possibilita a construção coletiva de projetos de lei, enquanto na seção Expressão os cidadãos podem debater, entre si e com deputados, propostas sobre previdência, economia, relações exteriores, entre outros temas.
|Imagem e fonte: Agência Brasil

Oportunidades.
O portal da Câmara dos Deputados lança hoje, na Campus Party Brasília, uma nova forma para aplicar a Lei 8.666/93, que regulamenta licitações do setor público. O site Desafio lançará concursos em que são apresentadas demandas – tecnológicas ou não – da Casa, e oferecerá prêmios para as melhores soluções apresentadas. Qualquer pessoa poderá participar, individualmente ou em grupo. Um dos primeiros desafios lançados – a criação de uma nova identidade visual para o Portal da Câmara – oferecerá um total de R$ 300 mil para os três primeiros colocados.
A iniciativa, segundo a analista da Câmara Dryade Schlarman, fortalece a democracia à medida que estimula a participação social. “A busca por soluções proporciona maior envolvimento com a população, mais transparência sobre os processos da Câmara dos Deputados e fomento à inovação e implantação de novas ideias”, afirma.
Imagem e fonte: Agência Brasil
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Governo do Estado terá de indenizar mulher presa injustamente em Imperatriz.

A prisão da doméstica, foi uma grande patacoada da Polícia Civil, na época comandada em Imperatriz pelo então Delegado Regional, Francisco de Assis Ramos, um grande equívoco judicial, mais uma grande  injustiça contra uma pessoa pobre,  menos favorecida, mas que  em boa hora chega a um desfecho razoável.

Kelly, a inocente, presa em Imperatriz
O caso foi bastante noticiado na época, inclusive neste blog, quando em março de 2011 a doméstica Kelly Alves Lima foi presa, acusada por um crime que não cometeu e logo em seguida debaixo de muita pressão da sociedade organizada, entidades de Direitos Humanos e da imprensa - em especial a TV Difusora, que fez a sua própria investigação-, a Polícia Civil do Maranhão concluiu que a doméstica Kelly Alves Lima, que se encontrava presa em Imperatriz, na delegacia da Vila Lobão, não era a mesma Kelly acusada de fazer parte da quadrilha que aplicava o golpe conhecido como "Boa noite Cinderela" na cidade de São Paulo.
[Sendo a verdadeira Kelly presa ano em 2010 em Presidente Dutra-MA], fugindo logo depois, sendo dada como foragida até os dias atuaise.

O Advogado da doméstica, o ex-prefeito de João Lisboa, Sálvio Dino, conseguiu provar que se tratava de um caso de homonímia (duas pessoas com o mesmo nome), mas mesmo depois dessa constatação, Kelly ainda padeceu atrás das grades, continuando presa esperando pela burocracia do rito jurídico que dizia que só a Justiça paulista onde a verdadeira Kelly tinha processo pelo mesmo crime é que poderia relaxar a prisão da mulher que estava injustamente presa em Imperatriz. 
Advogado Sálvio Dino.

Para isso, seu advogado, teve que ir à São Paulo, para através de uma petição com documentos comprobatórios solicitar ao juiz da 19 Vara Criminal de São Paulo, a absolvição sumária, ou seja, a revogação da prisão preventiva da doméstica.

Pois bem, agora seis anos depois o Estado do Maranhão vai em tese reparar o seu erro e terá que indenizar Kelly Alves em R$ 40 mil reais por prisão injusta. 

A decisão é dos membros da 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Maranhão (TJ-MA), que – por unanimidade – seguiram o voto do relator do processo, desembargador Lourival Serejo.

A decisão do órgão colegiado reformou sentença de primeira instância nas apelações cíveis interpostas pela vítima e pelo Estado de São Paulo, unidade da federação onde foi ajuizada a ação causadora do dano sofrido pela vítima. A condenação estipulada pelo juiz de base foi fixada em R$ 50 mil, sendo este valor reduzido para R$ 40 mil pela 3ª Câmara Cível do TJ-MA, visando atender os parâmetros da razoabilidade.
A verdadeira Kelly, foragida da cadeia de P. Dutra-MA

Em seu voto, o relator do processo, desembargador Lourival Serejo, ressaltou que os elementos dos autos processuais apontam que, ao dar cumprimento à ordem de prisão, os agentes do sistema de segurança do Estado do Maranhão não cercaram-se dos cuidados e cautelas necessárias quanto à identificação da mulher, não ouvindo as afirmações da vítima de que se tratava de outra pessoa, deflagrando uma prisão indevida e precipitada, sem garantir o direito à defesa e à presunção de inocência.

Serejo afirmou que o dano moral sofrido pela parte está deflagrado pela sua prisão indevida e precipitada, sem mesmo ter sido garantido o direito à defesa e à presunção de inocência. Para o desembargador, ante a gravidade do fato e da exposição da mídia, está configurado o dever de indenizar do Estado.