terça-feira, 8 de março de 2016

Lula e o Terremoto Brasileiro.

Foto - ex-pres. Lula.







O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, alvo da 24ª fase da operação Lava Jato, foi conduzido coercitivamente a prestar depoimento na Polícia Federal, em São Paulo, na manhã da última sexta-feira (4).

Confira o artigo do colunista Pepe Escobar para a agência Sputnik International sobre a operação Lava Jato e o envolvimento do ex-presidente Lula no caso: 
Imagine um dos mais admirados líderes políticos globais na história moderna sendo tirado de seu apartamento às 6 da manhã por agentes da Polícia Federal do Brasil e forçado a ser levado em um carro sem identificação para ser interrogado no aeroporto de São Paulo por quase 4 horas em conexão com um escândalo de corrupção bilionário envolvendo a gigante petroleira estatal Petrobras.
Parece algo produzido por Hollywood. E esta foi exatamente a lógica por trás da elaborada produção.
Os promotores públicos da Operação Lava Jato, que já dura dois anos, mantêm os “elementos de prova” implicando o recebimento de fundos por Lula – no mínimo 1,1 milhão de euros – do esquema de duvidosas propinas envolvendo grandes empresas de construção do Brasil ligadas à Petrobras. Lula pode ter – e a palavra de ordem é ‘pode’ – ter pessoalmente lucrado com o esquema principalmente através de uma fazenda (que ele não possui), um apartamento à beira-mar relativamente modesto, taxas no circuito global de palestras e doações para o seu instituto.
Lula é o último animal político – no nível de Bill Clinton. Ele já telegrafou que estava esperando por tal jogada, enquanto a Lava Jato já tinha prendido dezenas de pessoas suspeitas de desvio de contratos entre as suas empresas e a Petrobras – na ordem de mais de 2 bilhões de dólares – para pagar os políticos do Partido dos Trabalhadores (PT), do qual Lula era o líder.
O nome de Lula veio à tona através de um informante ansioso para chegar a um acordo de delação premiada. A hipótese trabalhada – não há nenhuma prova cabal – é de que Lula, quando presidiu o Barsil entre 2003 e 2010, foi pessoalmente beneficiado pelo esquema de corrupção envolvendo a Petrobras, obtendo favores para ele mesmo, o PT e o Governo. Enquanto isso, a ineficiente Presidenta Dilma Rousseff também está sob um ataque elaborado por um esquema de barganha do líder do Senado.
Lula foi questionado em relação a lavagem de dinheiro, corrupção e suspeita de dissimulação de bens. A blitz hollywoodiana foi ordenada pelo Juiz Federal Sérgio Moro – que sempre insiste ter sido inspirado pelo juiz italiano Antonio di Pietro e a notória operação “Mani Pulite” (Mãos Limpas) dos anos 1990.
E aqui, inevitavelmente, a coisa se complica. 
Cercando os suspeitos usuais da mídia
Moro e a os promotores da Lava Jato justificaram a blitz hollywoodiana insistindo que Lula havia se recusado a ser interrogado. Lula e o PT insistiram veementemente no contrário.
E, no entanto, os investigadores da Lava Jato tinham consistentemente vazado para a mídia tradicional as palavras de efeito: "Nós não podemos apenas morder Lula. Quando chegarmos a ele, vamos engoli-lo." Isto implicaria, no mínimo, uma politização da Justiça, da Polícia Federal e do Ministério Público. E também implicaria que a blitz hollywoodiana pode ter sido apoiada num barril de pólvora. Como a percepção vira realidade no ciclo de notícias frenéticas que não param, a "notícia" – instantaneamente mundial – foi que Lula foi preso porque é corrupto.
No entanto, tudo fica mais curioso quando nós sabemos que o Juiz Moro escreveu um artigo numa revista obscura em 2004 (somente em português, intitulado “Considerações sobre a Operação Mãos Limpas”, revista CEJ, número 26, julho / setembro de 2004), no qual ele claramente exalta a "subversão autoritária da ordem jurídica para atingir alvos específicos" e usando a mídia para intoxicar a atmosfera política.
Tudo isso serve a uma agenda muito específica, é claro. Na Itália, direitistas viram toda a saga da Operação Mãos Limpas como um alcance superjudicial desagradável; a esquerda, por outro lado, foi ao êxtase. O Partido Comunista Italiano surgiu com as mãos limpas. No Brasil, o alvo é a esquerda – enquanto a direita, pelo menos no momento, parece ser composta por anjos cantores de hinos.
O mimado perdedor das eleições presidenciais do Brasil em 2014, Aécio Neves, foi apontado em esquemas de corrupção por três acusadores diferentes – e tudo deu em nada, sem uma investigação mais aprofundada. Mesmo com um outro esquema complexo envolvendo o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso – o notório e vanglorioso ex-desenvolvimentista que virou um executor neoliberal.
O que a Lava Jato já imprimiu com força pelo Brasil foi a percepção de que a corrupção só paga quando o acusado é um nacionalista progressista. Enquanto vassalos do consenso de Washington são sempre anjos – misericordiosamente imunes a processos.
Isso está acontecendo porque Moro e sua equipe estão magistralmente jogando para o uso autodescrito por Moro dos meios de comunicação para intoxicar a atmosfera política – com a opinião pública manipulada em série antes mesmo de alguém ser formalmente acusado de qualquer crime. E, no entanto, Moro e as fontes de seus promotores são em grande parte farsa, trapaceiros astutos e mentirosos em série. Por que confiar em sua palavra? Pois não existem provas cabais, algo que até Moro admite.
E isso nos conduz para um cenário desagradável de um possível sequestro de uma das democracias mais saudáveis do mundo, produzido no Brasil pela mídia, Judiciário e polícia. E que é apoiado por um fato gritante: todo o "projeto" da oposição da direita brasileira se resume a arruinar a economia da 7.ª maior potência econômica global para justificar a destruição de Lula como candidato presidencial em 2018. 
Elite saqueando regras
Nenhuma das opções acima pode ser entendida por uma audiência global sem alguma familiaridade com um clássico brasileiro. A lenda diz que o Brasil não é para principiantes. De fato, esta é uma sociedade extraordinariamente complexa – que essencialmente desce do Jardim do Éden (antes de os portugueses o "descobrirem” em 1500) até a escravidão (que ainda permeia todas as relações sociais), passando por um evento crucial em 1808: a chegada de Dom João VI de Portugal (e imperador do Brasil pelo resto da vida), que fugiu da invasão de Napoleão, levando com ele 20 mil pessoas que planejaram o Estado brasileiro "moderno". "Moderno" é um eufemismo: a história mostra os descendentes destes 20 mil, na verdade, estuprando o cego país ao longo de 208 anos. E alguns nunca foram responsabilizados.
As tradicionais elites brasileiras compõem uma das misturas arrogantes-ignorantes mais nocivas do planeta. “Justiça” e controle policial são usados como arma quando as pesquisas não favorecem suas agendas.
Proprietários da grande mídia brasileira são uma parte intrínseca dessas elites. Muito parecido com o modelo de concentração dos Estados Unidos, apenas quatro famílias controlam o panorama da mídia, acima de tudo o império de mídia Globo, da família Marinho. Eu experienciei de dentro, em detalhes, como eles operam.
O Brasil é corrupto até a medula – desde as elites compradoras até uma grande quantidade de “novas” elites, que incluem o PT. A ganância e a incompetência apresentada por uma série de partidários do PT são aterradoras – um reflexo da falta de quadros de qualidade. A corrupção e o tráfico de influência envolvendo a Petrobras, empresas de construção e os políticos é inegável, mesmo se isso empalidece em comparação com as peripécias do Goldman Sachs ou da Big Oil e/ou da compra/suborno de políticos dos EUA por Koch Brothers / Sheldon Adelson-style.
Se fosse uma cruzada sem obstáculos contra a corrupção – como os promotores da Lava Jato afirmam que é – a oposição da direita/vassalos das velhas elites deveriam ser igualmente expostos na grande mídia. E não teria nada remotamente parecido com a blitz hollywoodiana, com Lula – pintado como um simples delinquente – humilhado na frente de todo o planeta.
Os promotores da Lava Jato estão certos; percepção é realidade. Mas e se tudo dá errado?
Sem consumo, sem investimento, sem crédito
O Brasil não poderia estar em uma situação mais sombria. O PIB caiu 3,8% no ano passado; provavelmente ficará abaixo de 3,5% este ano. O setor industrial caiu 6,2% no ano passado, e o setor de mineração caiu 6,6% no último trimestre. A nação está a caminho de sua pior recessão desde… 1901.
A (incompetente) administração de Rousseff não criou um plano B para a desaceleração chinesa na compra da riqueza mineral/agrícola do Brasil e para a recessão global geral nos preços das commodities.
O Banco Central ainda mantém a sua taxa de juros de referência na gritante marca de 14,25%. O "ajuste fiscal" neoliberal desastroso de Rousseff na verdade aumentou a crise econômica. Hoje, Rousseff "governa" – isto é uma figura de linguagem – para o cartel bancário e os rentistas da dívida pública brasileira. Mais de US$ 120 bilhões em orçamento do Governo evaporam para pagar juros da dívida pública.
A inflação está alta – agora na marca de dois dígitos. O desemprego está em 7,6% – ainda não é tão ruim como em muitos lugares da União Europeia – mas está em crescimento.
Os usuais suspeitos, claro, estão girando sem parar, deleitando-se em como o Brasil se tornou "tóxico" para os investidores globais.
Sim, é desolador. Não há consumo. Nenhum investimento. Nenhum crédito. A única saída seria desbloquear a crise política. Os parasitas da oposição têm apenas uma obsessão; o impeachment da Presidenta Rousseff. Tons de uma boa e velha mudança de regime: para estes vassalos de Wall Street / Império do Caos, uma crise econômica, alimentada por uma crise política, deve por todos os meios derrubar o Governo eleito de um ator-chave dos BRICS.
E então, de repente, fora do campo da esquerda, surge… Lula. O movimento contra ele pela investigação da Lava Jato ainda pode sair pela culatra – para pior. Ele já está no modo de campanha para 2018 – embora não seja um candidato oficial, ainda. Nunca subestime um animal político da estatura dele.
O Brasil não está nas cordas. Se reeleito, e assumindo que ele poderia limpar o PT de uma legião de criminosos, Lula poderia criar uma nova dinâmica. Antes da crise, o capital do Brasil estava se globalizando – via Petrobras, Embraer, BNDES (o banco modelo que inspirou o banco dos BRICS), as empreiteiras. Ao mesmo tempo, podem existir benefícios em quebrar, pelo menos parcialmente, este cartel oligárquico que controla toda a infraestrutura de construção no Brasil; pensem nas empresas chinesas construindo ferrovias de alta velocidade, barragens e portos que o país mal tem.


O próprio Juiz Moro teorizou que a corrupção contamina porque a economia brasileira é muito fechada para o mundo exterior, como a Índia era até recentemente. Mas há uma diferença gritante entre abrir alguns setores da economia brasileira e deixar que interesses estrangeiros vinculados às elites saqueiem a riqueza da nação.
Então, mais uma vez, temos de voltar ao tema recorrente em todos os principais conflitos globais.
 É o petróleo, estúpido         
Para o Império do Caos, o Brasil tem sido uma grande dor de cabeça desde que Lula foi eleito pela primeira vez, em 2002. (Para uma apreciação das complexas relações entre EUA e Brasil, verificar o trabalho indispensável de Moniz Bandeira.)
A prioridade do Império do Caos é evitar o surgimento de potências regionais alimentadas por abundantes recursos naturais, desde o óleo até minerais estratégicos. Brasil se encaixa amplamente na conta. Washington, naturalmente, se sente no direito de "defender" esses recursos. Assim, a necessidade de reprimir não apenas as associações de integração regional, como o Mercosul e a Unasul, mas acima de tudo o alcance global dos BRICS.
A Petrobras costumava ser uma empresa estatal muito eficiente, que virou a única operadora das maiores reservas de petróleo descobertas no século XXI até agora: os depósitos do pré-sal. Antes de se tornar o alvo de um enorme ataque especulativo, judicial e dos meios de comunicação, a Petrobras costumava contabilizar 10% do investimento e 18% do PIB brasileiro.
A Petrobras encontrou os depósitos do pré-sal com base na sua própria investigação e inovação tecnológica aplicada à exploração de petróleo em águas profundas – sem nenhuma interferência externa que seja. A beleza é que não há risco: se você perfurar nesta camada do pré-sal, você é obrigado a encontrar petróleo. Nenhuma empresa no planeta iria abrir mão disso em uma competição.
Mas, ainda assim, um notório parasita direitista da oposição prometeu que a Chevron em 2014 entregaria a maior parte da exploração do pré-sal para a Big Oil. A oposição da direita está ocupada alterando o regime jurídico do pré-sal; ele já foi aprovado no Senado. E Rousseff está mansamente indo nesta direção. Alinhe isto com o fato de que o Governo Dilma não fez absolutamente nada para comprar de volta o estoque da Petrobras – cuja queda vertiginosa foi habilmente projetada pelos usuais suspeitos.
Desmantelando meticulosamente a Petrobras, a Big Oil, eventualmente, lucrando com os depósitos do pré-sal, colocando em xeque a projeção de poder global do Brasil, tudo isso joga muito bem a favor dos interesses do Império do Caos. Geopoliticamente, isso vai muito além da blitz hollywoodiana e a Operação Lava Jato.
Não é coincidência que as três maiores nações BRICS estão simultaneamente sob ataque, em diversos níveis: Rússia, China e Brasil. A estratégia criada pelos mestres do universo que ditam as regras no eixo Wall Street/Beltway é de minar por todos os meios o esforço coletivo dos BRICS em produzir uma alternativa viável para o sistema econômico/financeiro global, que por enquanto é submetido ao capitalismo de cassino. É improvável que Lula, por si só, seja capaz de detê-los.
 As opiniões expressas neste artigo são da exclusiva responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a posição oficial da Sputnik.


segunda-feira, 7 de março de 2016

STF no julgamento da A.C.O. N° 2370 oriunda de Presidente Juscelino/MA, determinou que Cabe ao MPF apurar desvio de verbas federais em município.

O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), reconheceu a atribuição do Ministério Público Federal (MPF) para investigar possíveis irregularidades na aplicação de recursos públicos da União pela Secretaria de Saúde do Município de Presidente Juscelino (MA). A decisão ocorreu nos autos da Ação Cível Originária (ACO) 2370, que discute se o responsável pela investigação seria o MPF ou o Ministério Público do Maranhão (MP-MA).
Segundo o relator, está demonstrado no caso concreto interesse da União que justifica a atuação do MPF, pois agentes públicos municipais podem ser responsabilizados pela malversação de recursos públicos federais destinados a programas de atenção básica à saúde e vinculados ao Sistema Único de Saúde (SUS).
O ministro Roberto Barroso anotou ainda que, nesse mesmo sentido, caso semelhante (PET 5073) que também discutia conflito de atribuição em matéria de irregularidades na aplicação de recursos federais transferidos a municípios concluiu pela competência do MPF.
O relator citou o parecer da Procuradoria Geral da República (PGR) o qual apontou que, tratando-se de recursos do SUS, a incumbência da União não se restringe a repassá-los aos estados e municípios, mas também supervisionar a regular aplicação dessas verbas. “Não se cuida, desse modo, de mera transferência, incondicionada, de recursos federais aos demais entes da federação, mas de repasse de verbas vinculadas ao financiamento de ações e serviços na área de saúde, cuja execução sujeita-se ao controle por órgãos federais”, disse a PGR.
Caso
Auditoria do Departamento Nacional de Auditoria do Sistema Único de Saúde (Denasus) detectou impropriedades na gestão dos programas Saúde da Família, Saúde Bucal e Assistência Farmacêutica Básica em Presidente Juscelino, entre janeiro e agosto de 2010, além de ausência de comprovação de despesas com recursos repassados pelo Fundo Nacional de Saúde (FNS).
O MPF declinou de sua atribuição, por entender que a apuração dos fatos seria mais bem realizada pelo Ministério Público maranhense em razão de sua proximidade com o local dos eventos e por possuir a estrutura física e de pessoal necessária para a realização do procedimento investigatório.
Por outro lado, o MP-MA concluiu pela atribuição do MPF, alegando que a malversação de recursos advindos do SUS, caso comprovada, causaria danos aos cofres da União, o que atrairia a competência da Justiça Federal para a causa.
RP/CR
Processos relacionados
ACO 2370

Ministério Público Federal recomenda ao Conselho Nacional do Meio Ambiente consulta à população sobre licenciamento ambiental

Propostas de alterações normativas estão em discussão no Conama e no Congresso Nacional.
A Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural do Ministério Público Federal encaminhou recomendação ao Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) para que o órgão realize audiências públicas a fim de aprofundar as discussões sobre as mudanças nas resoluções que tratam do licenciamento ambiental. O MPF entende que a consulta pública realizada durante o carnaval não foi de conhecimento da maioria da população brasileira.
Segundo a recomendação, a iminente deliberação por parte do Conama sobre a proposta da Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Meio Ambiente (Abema) para alterar as resoluções nº 01/1986 e nº 237/1987, que regulamentam o licenciamento ambiental, desperta a “necessidade de aprofundamento da discussão, com participação ampla, efetiva e concreta da Sociedade Civil, inclusive por meio de manifestações de entidades de defesa do meio ambiente, que podem enriquecer o debate técnico e político”.
Prazos - O documento ainda questiona a desproporcionalidade dos prazos estabelecidos para desenvolvimento do processo de discussão, que não permitem o debate e a deliberação sobre todos os pontos essenciais da matéria em tempo hábil. “O desequilíbrio de forças no CONAMA entre aqueles que defendem exclusivamente o meio ambiente e os outros (acentuadamente em maior proporção) que labutam em prol de interesses distintos (econômicos, sociais, políticos) impede que as decisões sejam alcançadas de forma equilibrada”, pontua a recomendação.
Licenciamento Ambiental Ameaçado – Os impactos das alterações no licenciamento ambiental, em discussão no Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) e no Congresso Nacional, serão debatidos dia 8 de março, às 9 horas, na Procuradoria Regional da República da 3ª Região. Convocado pelo Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP), o evento pretende ouvir especialistas e representantes da sociedade civil sobre a flexibilização das normas e da legislação que está sendo proposta.
A audiência pública "Licenciamento Ambiental Ameaçado: propostas de alterações normativas no Congresso Nacional e no Conama" tem o objetivo de debater as medidas em curso com o objetivo de alterar o modo como é feito hoje o licenciamento ambiental. No Senado, tramita o Projeto de Lei 654/15, do senador Romero Jucá, sobre o tema. Já na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei 3.729/04 também prevê mudanças. Além disso, existe uma proposta de alteração das Resoluções Conama 01/86 e 237/97, de autoria da Associação Brasileira de Entidades de Meio Ambiente (ABEMA), que agrega os órgãos ambientais dos governos estaduais.
A Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural incentiva a todas as unidades do Ministério Público Federal promovam o debate nos moldes do que será realizado na PRR3. A 4ª CCR entende que é importante a multiplicação, em âmbito nacional, de um movimento de debate sobre o assunto, incluindo a participação dos Ministérios Públicos Estaduais.
Secretaria de Comunicação Social - Procuradoria-Geral da República - (61) 3105-6404/6408 - Twitter: MPF_PGR - facebook.com/MPFederal.

O Oriente Médio nuclearizado!

Enquanto o Ocidente fazia pressão sobre o Irão para que ele abandonasse o seu programa nuclear civil, os Saud compravam a bomba atómica a Israel ou ao Paquistão. Agora, para surpresa geral, o Próximo-Oriente tornou-se zona nuclearizada, dominada por Israel e pela Arábia Saudita.


Em 1979, Israel acabava de afinar a sua bomba atómica, em colaboração com o regime de apartheid sul-africano. O Estado hebreu nunca assinou o Tratado de não-proliferação (TNP) e sempre evitou responder às questões relativas ao seu programa nuclear.
Desde 1980, a Assembleia Geral das Nações Unidas adoptou anualmente, por consensus, uma resolução apelando para fazer do Próximo-Oriente uma zona isenta de todo o armamento nuclear. Esta resolução visava encorajar Israel a renunciar à sua bomba e a prevenir que outros Estados se lancassem numa corrida aos armamentos.
O Irão do Xá dispunha igualmente de um programa nuclear militar, mas, este só de maneira marginal foi prosseguido após a revolução de 1979, devido à guerra imposta pelo Iraque (1980-88). No entanto, só no fim desta é que o aiatola Rouhollah Khomeini se opôs às armas de destruição maciça e, por conseguinte, proibiu o fabrico, a posse e a utilização da arma atómica.
Começaram, então, as negociações para a restituição de 1.180 bilhões de dólares de investimento iraniano no complexo Eurodif de enriquecimento de urânio. No entanto, jamais algo foi resolvido. Assim, aquando da dissolução do Eurodif, em 2010, a República Islâmica ainda detinha 10% do capital. É provável que hoje em dia tenha uma parte da Sociedade de enriquecimento de Tricastin.
De 2003 a 2005, as negociações relativas ao contencioso nuclear são presididas, do lado iraniano, pelo Xeque Hassan Rohani, um religioso próximo dos Presidentes Rafsanjani e Khatami (anteriores-ndT). De passagem, os Europeus exigem que o Irão desmantele os seus programas de ensino de física nuclear, de maneira a ter certeza que ele não possa relançar o seu programa militar.
No entanto, quando Mahmoud Ahmadinejad —um partidário do relançamento da Revolução khomeinista— chega ao poder, ele rejeita o acordo negociado pelo Xeque Rohani e demite-o. Ele relança o ensino da física nuclear e lança um programa de pesquisa visando, nomeadamente, encontrar um processo de produção eléctrica a partir da fusão e não da fissão, como o fazem actualmente os Estados Unidos, a Rússia, a França , a China e o Japão.
Acusando o Presidente Ahmadinejad de «preparar o Apocalipse para apressar o retorno do Mahdi» (sic), Israel lança uma campanha de imprensa internacional para que se isole o Irão. Na realidade, Mahmoud Ahmadinejad não partilha a visão judaica de um mundo malvado que deve ser destruído, depois reconstruido, mas, sim de um amadurecimento progressivo da consciência colectiva até à parúsia, o retorno do Mahdi e dos profetas. Simultaneamente, a Mossad assassina, um a um, numerosos cientistas nucleares iranianos. Por seu lado, os Ocidentais e o Conselho de Segurança das Nações Unidas adoptam sanções cada vez mais duras até isolar totalmente o Irão no plano económico e financeiro.
Em 2013, o Guia da Revolução, o aiatola Ali Khamenei, aceita discutir secretamente com Washington, em Omã. Persuadido que devia aliviar o estrangulamento que sufoca o seu país, ele encara um acordo provisório de dez anos. Na sequência de um acordo preliminar, a candidatura de Ahmadinejad à eleição presidencial não é autorizada e o Xeque Hassan Rohani é eleito. Ele retoma as negociações que tinha deixado em 2005 e aceita as condições dos Ocidentais, entre as quais a interdição de enriquecer o urânio a 20%, o que põe fim às pesquisas sobre a fusão.
Em novembro de 2013, a Arábia Saudita organiza uma cimeira secreta reunindo ao mesmo tempo os membros do Conselho de Cooperação do Golfo e Estados muçulmanos amigos [1]. Na presença de representantes do Secretário-Geral da ONU, o presidente israelita Shimon Peres discursa por vídeo-conferência. Os participantes concluem que o perigo não é a bomba israelita, mas, sim a de que o Irão poderia, um dia, vir a dotar-se. Os Sauditas asseguram aos seus interlocutores que eles tomarão medidas.
A cooperação militar israelo-saudita é nova, mas os dois países agem concertadamente desde 2008, quando Riade financiou a expedição punitiva de Israel «Chumbo Fundido» em Gaza [2].
O Acordo 5+1 só será tornado público pelo meio de 2015. Durante as negociações, a Arábia Saudita multiplica declarações segundo as quais ela se lançará numa corrida aos armamentos se a comunidade internacional não conseguir forçar o Irão a desmantelar o seu programa nuclear [3].
A 6 de Fevereiro de 2015, o Presidente Obama publica a sua nova «Doutrina de Segurança Nacional». Nela ele escreve : «Uma estabilidade a longo prazo [no Médio-Oriente e no Norte da África] requer mais que o uso e a presença de Forças militares norte-americanas. Ela exige parceiros que sejam capazes de se defender por si próprios. É por isso que nós investimos na capacidade de Israel, da Jordânia e dos nossos parceiros do Golfo em desencorajar a agressão, mantendo, ao mesmo tempo, o nosso indefectível compromisso para com a segurança de Israel, nisso incluindo o seu avanço militar qualitativo» [4].
A 25 de Março de 2015, a Arábia Saudita inicia a operação «Tempestade Decisiva» no Iémene, visando repôr no poder o Presidente iemenita derrubado por uma revolução popular. Trata-se, na realidade, de aplicar o acordo secreto israelo-saudita de exploração do campo petrolífero de Rub’al Khali [5].
A 26 de Março de 2015, Adel Al-Jubeir, então embaixador da Arábia Saudita nos Estados Unidos, recusa responder na CNN a uma pergunta sobre o projecto de bomba atómica saudita.
A 30 de Março de 2015, um estado-maior militar, conjunto, é instalado pelos Israelitas na Somalilândia, um Estado não-reconhecido. Participam nele, desde o primeiro dia, a Arábia Saudita, o Egipto, os Emirados Árabes Unidos, a Jordânia, Marrocos e o Sudão, sob comando israelita.
No dia seguinte, 1 de Abril de 2015, a Liga Árabe, aquando da sua cimeira em Sharm el-Sheikh adopta o princípio de uma «Força árabe conjunta» [6]. Oficialmente, trata-se de aplicar o Tratado de Defesa Árabe, de 1950, para lutar contra o terrorismo. De facto, a Liga validou a nova aliança militar árabe sob comando israelita.
Em Maio de 2015, a Força árabe conjunta, sob comando israelita, utiliza uma bomba atómica táctica no Iémene. Poderá ter-se tratado de um ataque visando penetrar um bunker subterrâneo.
A 16 de Julho de 2015, o especialista em Inteligência Duane Clarridge afirma, na Fox Business, que a Arábia Saudita comprou a bomba atómica ao Paquistão.
A 18 de Janeiro de 2016, o secretário de Estado John Kerry afirmava, na CNN, que não se podia comprar e transferir a bomba atómica. Ele advertia, assim, a Arábia Saudita contra uma violação do Tratado de Não-Proliferação.
A 15 de fevereiro de 2016, o analista saudita Dahham Al-’Anzi afirma, no Russia Today, em árabe, que o seu país dispõe da bomba atómica, desde há 2 anos, para proteger os Árabes, e que as grandes potências sabem disso.
As declarações do analista saudita Dahham Al-’Anzi, a 15 de Fevereiro de 2016, no Russia Today —imediatamente traduzidas e difundidas pelo serviço israelita do Memri— tiveram um eco considerável no mundo árabe. No entanto, nenhum responsável político internacional, nem mesmo saudita, as comentou. E a Russia Today retirou-as do seu sítio Internet.
As declarações de Dahham Al-’Anzi —um intelectual próximo do príncipe Mohamed ben Salman— sugerem que ele não falava de uma bomba atómica estratégica (bomba A ou H), mas táctica (bomba N). Com efeito, não se vê como a Arábia Saudita poderia «proteger os Árabes», da «ditadura» na Síria, utilizando para tal uma bomba atómica estratégica. Além disso, tal corresponde ao que já foi observado no Iémene. No entanto, nada pode ser tomado como certo.
É evidentemente pouco provável que a Arábia Saudita tenha fabricado ela própria tal arma, sabendo-se que ela não tem absolutamente nenhuns conhecimentos científicos na matéria. Pelo contrário, é possível que ela a tenha comprado a um Estado não-signatário do TNP, como Israel ou o Paquistão. Se se acreditar em Duane Clarridge, será Islamabade que terá vendido a sua tecnologia, mas, nesse caso, não poderá tratar-se de uma bomba de neutrões.
Quer se tenha tratado de uma bomba tática ou estratégica, tendo a Arábia Saudita assinado o Tratado de Não-Proliferação (TNP) não tinha o direito de a adquirir. Mas, bastaria ao rei Salman declarar ter comprado esta arma em nome próprio para não ser comprometido pelo Tratado. Sabe-se, com efeito, que o Estado da Arábia Saudita é propriedade privada do rei e que o seu orçamento é apenas uma parte da arca Real. Veríamos então uma privatização de armas nucleares; um cenário até aqui impensável. Tal evolução deve ser levada muito a sério.
Em última análise, tudo deixa crer que os Sauditas agiram no quadro da política norte-americana, mas que eles a ultrapassaram violando assim o TNP. Ao fazê-lo, eles lançaram as bases de um Próximo-Oriente nuclearizado, no qual o Irão não poderá jogar o papel que o Xeque Rohani ambicionava achar, o de «gendarme regional» por conta dos seus amigos anglo-saxões.
Tradução - Alva.


[1] “O presidente de Israel falou perante o Conselho de Segurança do Golfo em fins de novembro”, Tradução Alva, Rede Voltaire, 8 de Dezembro de 2013.

[2] “A guerra israelense é financiada pela Arábia Saudita”, Thierry Meyssan, Tradução Fernanda Correia de Oliveira, Rede Voltaire, 14 de Janeiro de 2009.

[3] “Prospect of deal with Iran pushes Saudi Arabia and Israel into an unlikely alliance” («Possibilidade de acordo com o Irão leva a Árabia Saudita e Israel para uma impensável aliança»- ndT), Kim Sengupta, The Independent, March 30, 2015

[4] “Obama rearma”, Thierry Meyssan, Tradução Alva, Rede Voltaire, 9 de Fevereiro de 2015.

[5] “Os projectos secretos de Israel e da Arábia Saudita”, Thierry Meyssan, Tradução Alva, Rede Voltaire, 22 de Junho de 2015.

[6] “A Força «árabe» de Defesa comum”, Thierry Meyssan, Tradução Alva,Rede Voltaire, 20 de Abril de 2015.

Eleições 2016 - PRE-MG recomenda atenção aos prazos de filiação nas eleições deste ano.

Mudanças introduzidas pela Emenda Constitucional 91 e pela mini-reforma eleitoral não podem contrariar o que dispõem os estatutos partidários
A Procuradoria Regional Eleitoral em Minas Gerais (PRE-MG) recomendou aos promotores eleitorais em atuação nas 351 zonas eleitorais do estado especial atenção às mudanças de partido político - desfiliações e novas filiações - que ocorrerem até o próximo dia 2 de abril.

O objetivo é evitar a ocorrência de situações que configurem infidelidade partidária, seja por desobediência a normas eleitorais, seja por violação ao que dispõem os estatutos partidários.

No último dia 18 de fevereiro, o Congresso Nacional promulgou a Emenda Constitucional nº 91, com o único objetivo de permitir aos detentores de mandato eletivo mudarem de partido por até 30 dias contados da data de sua promulgação.

Esse prazo, chamado de "janela partidária", favoreceu todos os políticos que não desejam mais permanecer nos partidos pelos quais foram eleitos e querem migrar para outra agremiação sem a necessidade de apresentar as causas de justificação exigidas pela Lei 9.096/95.

"A nova emenda foi editada para favorecer situações específicas, configurando um incentivo vergonhoso ao troca-troca partidário", afirma o procurador regional eleitoral Patrick Salgado Martins.

Ele lembra que a Lei 13.165, promulgada em setembro do ano passado, ao modificar o artigo que trata das regras de filiação partidária (artigo 22-A da Lei 9.096/95), também havia criado uma "janela partidária", permitindo a mudança de partido nos 30 dias que antecedem o prazo de filiação exigido em lei para concorrer às eleições, ao término do mandato vigente.

Outra mudança introduzida pela mini-reforma eleitoral foi a redução do prazo legal mínimo de filiação: anteriormente, os candidatos deveriam estar filiados há pelo menos um ano para poderem se candidatar; agora, esse prazo foi reduzido pela metade (seis meses).

"De todo modo, os estatutos de cada partido político também prevêem prazos mínimos de filiação para que seus integrantes possam concorrer a cargos eletivos. E essas regras têm obrigatoriamente de ser observadas, devendo mesmo preponderar sobre as demais", explica o procurador eleitoral.

Por isso, a PRE-MG recomendou aos promotores eleitorais o acompanhamento, junto aos cartórios eleitorais, de todas as mudanças partidárias que ocorrerem até a data limite de 2 de abril, conferindo-se no estatuto das agremiações políticas o prazo mínimo exigido.

Se o estatuto, ou mesmo a PEC 91 e a Lei dos Partidos Políticos (Lei 9.096/95), forem desrespeitados, a filiação será irregular, devendo ser impugnado o posterior registro de candidatura.

Assessoria de Comunicação Social - Ministério Público Federal em Minas Gerais - Tel.: (31) 2123.9008 / 9010 - No twitter: mpf_mg.




Jornalismo de soluções para a crise no transporte urbano. Coletivo Blumenau.

Por Evandro de Assis em 27/02/2016 na edição 891.
Facebook - Coletivo Blumenau.
Nota da Redação – O Observatório da Imprensa acompanhará o desenvolvimento da experiência do Coletivo Blumenau por meio de uma série de textos produzidos por membros do grupo e que visam compartilhar experiências  com jornalistas e amadores interessados na busca de soluções para problemas comunitários.
Douglas Henrique trabalha numa cooperativa de crédito. Domina planilhas de Excel, tem intimidade com ferramentas tecnológicas e é entusiasta do transporte coletivo. Ana Paula Dahlke é estudante do primeiro ano de Jornalismo, adora conversar e comunica-se com facilidade em texto e fotografia. Usa ônibus com frequência. Bruno Goulart acorda cedo diariamente para sentar na cadeira de cobrador de um coletivo urbano. Participa de grupos que reúnem colegas de trabalho no WhatsApp e Facebook.
Nenhum destes personagens é jornalista profissional, o que não os impediu de emprestar habilidades e conhecimentos à cobertura de uma crise sem precedentes no sistema de transporte público de Blumenau (SC), no início de 2016.
Os três serviram de fontes ao compartilhar com jornalistas o que sabiam sobre o assunto. Atuaram como jornalistas amadores, porque produziram e publicaram imagens, textos e até gráficos estatísticos que auxiliaram a população a compreender aspectos da história. Ao mesmo tempo comportaram-se como público, já que consumiram informações fornecidas por outras pessoas, profissionais ou não.
Esta condição híbrida, em que um mesmo sujeito desloca-se entre os diversos papéis do ecossistema jornalístico, marca a experiência do Coletivo Blumenau, iniciativa independente em jornalismo colaborativo criada por três editores incomodados com a cobertura da imprensa sobre a crise dos ônibus na cidade. Experimento que cresceu, fugiu ao controle dos criadores e agora engatinha rumo ao projeto de se tornar uma startup jornalística viável.
Como tudo começou
A concessionária que explorava o serviço de ônibus urbanos em Blumenau, chamada Consórcio Siga, entrou em colapso em dezembro de 2015, quando não pagou salários a motoristas e cobradores e teve 25 veículos apreendidos como garantia de dívidas. Uma sucessão de greves e negociações culminou no decreto de caducidade do contrato por parte da prefeitura em janeiro, o que obrigou Blumenau a trocar uma frota de 240 ônibus em poucos dias. Na transição do serviço para a paulista Viação Piracicabana, contratada emergencialmente, a população ficou oito dias sem transporte, período em que dezenas de milhares de pessoas tiveram de locomover-se por conta própria.
O quadro de exceção exigia esforço extra das equipes de jornalismo que atuam na região de Blumenau, mas o que se viu foi uma cobertura dependente de informações oficiais e desconectada das ruas. As dificuldades econômicas não pouparam a imprensa local, que sofre violenta redução das receitas com publicidade – cenário que combina a desindustrialização do setor jornalístico, estrutural e global, com a recessão brasileira dos últimos anos.
Num quadro assim, equipes naturalmente escassas estavam ainda mais enfraquecidas no momento em que os ônibus sumiram das ruas, e o impacto pôde ser percebido na superficialidade do noticiário.
Quando o grupo Coletivo Blumenau foi criado no Facebook, na sexta-feira 29 de janeiro, o assunto esfriara na imprensa. Vácuo que serviu de deixa para a inovação. Curioso é que três jornalistas de impresso tenham se encarregado da tentativa no ambiente digital: Clóvis Reis é colunista do Jornal de Santa Catarina, do Grupo RBS, e professor da Universidade Regional de Blumenau (Furb). Edgar Gonçalves Jr. chefiou até setembro de 2015 a redação do Diário Catarinense, também da RBS, e hoje atua como consultor. Evandro de Assis foi editor-chefe do Jornal de Santa Catarina até agosto de 2015.
A experiência nasce convidando os blumenauenses a relatar o início da atuação da nova empresa de ônibus: segunda-feira, 1o de fevereiro. No método proposto, aos jornalistas envolvidos cabe selecionar as informações relevantes publicadas no grupo, editá-las e transformá-las em conteúdo acabado ao fim do dia. Após filtro, edição e eventual apuração extra, o material passa à página do Coletivo na rede social. Ou seja: os colaboradores interagem livremente na ferramenta “grupo” do Facebook, enquanto suas contribuições alimentam conteúdo produzido por jornalistas na modalidade “página”. Desta forma, diferencia-se o material que passou pela curadoria de profissionais.
Desde o princípio a ideia era abordar diversos assuntos, e não apenas os ônibus, mas o tamanho da crise, entre outros fatores que contaremos mais adiante, nos desviaram da proposta.
Dois mil integrantes
Perto de completar um mês, o Coletivo Blumenau reúne quase 2 mil integrantes. Ônibus estragados, lotados e atrasados continuam sendo assunto entre os colaboradores, mas as postagens na página produzidas pelos jornalistas rarearam. Optou-se por um recuo na frequência e no volume de conteúdo produzido para investir energias na concepção de uma proposta mais complexa, que possibilite maior nível de interação com as pessoas e melhor curadoria de conteúdo.
A experiência no Facebook continua, mas a proposta agora é usá-la como laboratório para algo mais completo, talvez na forma de aplicativo ou outro produto tecnológico que aproxime jornalistas e público. Os próximos passos da experiência vêm aí e seguirão sendo compartilhados em textos como esse. Esperamos que a exposição de erros e acertos abra caminho para novos contatos, ideias externas e, principalmente, sirva de inspiração para outros experimentos Brasil afora.
Se o Coletivo Blumenau se tornará uma alternativa viável de jornalismo local, é impossível prever. Mas quem sabe ao menos o caminho trilhado, e relatado em público, possa ajudar jornalistas de mais cidades a desbravar as potencialidades que a tecnologia oferece para se aprimorar o jornalismo.
Das percepções que compartilharemos a partir de hoje, a mais importante é esta: se há crise no jornalismo, esqueceram de avisar as pessoas lá fora.
Transparência e didatismo
Apesar do parco planejamento, uma decisão intuitiva se mostrou acertada: desde o primeiro dia as postagens direcionadas aos colaboradores prezam pela transparência e pelo didatismo. A palavra “experiência” é repetida à exaustão, admitindo ao público a estratégia da tentativa e erro diante de desafios inéditos para jornalistas habituados à conversa vertical dos meios tradicionais. No Coletivo, a comunicação jornalista-público se dá horizontalmente, em pé de igualdade.
A linguagem informal procura reforçar características de uma conversa, e não de um discurso a ser engolido. Frases curtas, vocabulário que remete à oralidade e pitadas de bom humor, mas sem a afetação de quem usa as redes sociais para caçar cliques.
Logo no primeiro dia os resultados alcançados deram pistas de que seria possível engajar a comunidade na cobertura jornalística colaborativa. Duzentas pessoas entraram no grupo, mais de 100 fotografias e vídeos foram postados e fatos ignorados pela população vieram à tona pelo olhar de colaboradores. Que jornal, rádio ou TV teria condições de espalhar 200 repórteres para registrar o que acontecia nos ônibus, terminais e ruas de Blumenau?
Tal capilaridade proporcionou informações inéditas e com agilidade. Soube-se por meio do Coletivo Blumenau que os ônibus postos em circulação pela Viação Piracicabana tinham, de maneira geral, más condições de manutenção. Portas e elevadores quebrados, sujeira e veículos enguiçados surgiram em fotos e vídeos.
Relatos de passageiros espremidos em ônibus pequenos demais se multiplicaram, enquanto usuários indignados reclamavam do não cumprimento de horários (mesmo que a tabela fosse reduzida devido à condição emergencial do sistema). A riqueza do conteúdo compartilhado chamou a atenção da imprensa tradicional, que passou a replicar imagens e relatos postados no Coletivo.
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Evandro de Assis é jornalista, pós-graduado em Direção Editorial pela ESPM-SP e mestrando em Jornalismo pela UFSC.