domingo, 23 de outubro de 2016

O PT precisa se reinventar, urgentemente.

Levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima

Por: Antonio Carlos Granado, Antonio Lassance, Geraldo Accioly, Jefferson Goulart, José Machado e Ronaldo Coutinho Garcia.
Precisamos falar sobre o PT
O partido que enfrentou a ditadura, que contribuiu para a redemocratização do país, que batalhou incansavelmente pela consagração de inúmeros direitos sociais, que garantiu a mais drástica e acelerada redução da desigualdade já vista em nossa história, esse partido está na lona. Caiu, em parte, pela perseguição implacável a que foi submetido, em função de golpes desferidos contra muitas de suas lideranças mais destacadas, contra sua organização e contra sua militância. Mas despencou, em grande medida, pelo peso de muitos de seus erros, por ter baixado a guarda em alguns dos atributos que faziam parte de sua própria identidade e da lógica de sua diferença.
As eleições de 2016 são o desfecho de uma ofensiva da direita que tem, como um de seus alvos prioritários, trucidar um instrumento essencial de luta da classe trabalhadora, da democracia e da inclusão social. É nítido e claro que o PT não está sendo investigado. Está sendo cassado. A absurda diferença de tratamento entre o que acontece com algumas lideranças do PT, porque são do PT, e o que não acontece em relação a políticos de outros partidos demonstra que, mais uma vez, como em outras tantas circunstâncias históricas, sob o discurso do combate à corrupção, o que se pavimenta é um combate sem tréguas à esquerda como um todo para a entrega do país ao que há de mais retrógrado e mais corrupto.
A derrota acachapante da esquerda nas eleições de 2016 – salvo raras e muito honrosas exceções – mostra bem o tipo de país que está sendo costurado meticulosamente pelas forças da coalizão golpista.
O partido precisa se reinventar, urgentemente
Para o bem e para o mal, uma parte do PT já não existe mais. Foi dizimada pelo escândalo do Mensalão, pela Lava Jato, pela debandada de prefeitos e parlamentares, pelo golpe parlamentar que destituiu a presidenta eleita e, agora, pelas eleições municipais. 
É preciso um novo PT, urgentemente, ou não restará PT algum. Ao lado da defesa intransigente do Estado democrático de Direito, é preciso fazer uma autocrítica pública como primeiro passo para recuperar a autoridade moral e a credibilidade política de um partido que foi fundado sob os signos da igualdade e da renovação dos costumes políticos. 
É preciso, imediatamente, renovar a direção partidária, e renová-la sob novas bases. Além de eleger um novo presidente e diretório, o PT precisa reconstruir seu programa, redefinir sua organização e revigorar suas práticas. O PT precisa se reinventar com a mesma radicalidade com que um dia ousou disputar os rumos do país sob o impulso dos trabalhadores e excluídos.
Atualizar o programa democrático e popular
O PT precisa reatar sua vocação de partido dos trabalhadores, dos assalariados, dos que estão fora do mercado de trabalho, dos pequenos e médios agricultores e empresários; dos sem-terra; dos jovens; dos que lutam por moradia, dos que batalham pela afirmação de sua identidade, dos que querem exercer livremente sua orientação sexual, dos que lutam por dignidade e por direitos de cidadania. O programa do partido deve ser fundamentalmente orientado aos trabalhadores, excluídos e oprimidos, com uma orientação inequivocamente democrática, humanista, igualitária, libertária.
O PT não é mais, nem que quisesse, o partido capaz de firmar o pacto social entre as elites e o povo. A começar porque a elite deste país não quer pacto. Não quer pagar a conta, senão transferi-la justamente para os mais pobres e a classe média, que são os que sustentam o Estado brasileiro e as isenções fiscais e benesses de que os mais ricos desfrutam. A ponte para o futuro de uma parte expressiva da elite brasileira é um “green card” nos Estados Unidos e uma conta nas Ilhas Cayman.
O desenvolvimento de um país é diretamente proporcional à qualidade de sua democracia. Por sua vez, democracia significa o quanto a representação e a atuação do Estado atendem aos interesses da maioria e a uma pluralidade de pessoas e opiniões com voz e vez nos processos de decisão política. 
Um programa democrático e popular se distingue por propor mecanismos claros de alargamento da democracia e de fortalecimento da capacidade de atuação do Estado. Distingue-se também pelo combate sem tréguas aos grupos políticos e econômicos predatórios que, recorrentemente, dominam o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, e que engendram instituições perversas, que proporcionam ganhos restritos a uma ínfima parcela da sociedade, impondo custos sociais elevados à esmagadora maioria do povo brasileiro.
Redefinir o modelo de partido
Transparência, prestação de contas e democracia participativa
Convenhamos, o partido que defende a transparência, a prestação de contas e a democracia participativa não é transparente, não presta contas a seus militantes e deixou sua democracia participativa em algum lugar do passado. O PT trocou seus antigos espaços de participação, seu debate formativo e sua discussão programática por Processos de Eleição Direta (PEDs), pela prioridade eleitoral e por alianças com a política tradicional.
O PT precisa prestar contas; realizar seu próprio orçamento participativo; estabelecer regras claras de contratação de funcionários e de empresas prestadoras de serviço, mediante chamadas públicas; expor seu planejamento e planos de trabalho a audiências públicas com participação presencial e pela internet. Precisa criar sua ouvidoria, que consta do estatuto, mas jamais saiu do papel.
O PT deve se abrir e se expor mais do que nunca para que não restem dúvidas sobre seus métodos, seus critérios, suas decisões, seus recursos, sua capacidade de escutar sua militância e seus simpatizantes e de estar profundamente enraizado na sociedade civil.
Política por vocação
O PT deve se afirmar como um partido em que se faz política por vocação, e não por profissão. Os eleitos devem se comportar como servidores públicos conscientes de seu papel e de suas responsabilidades republicanas. Devem se mostrar sujeitos ao escrutínio não apenas da máquina partidária, mas de seus eleitores e das organizações populares. Devem abrir suas contas, expor suas agendas e saber demarcar nitidamente a fronteira entre o público e o privado.
O PT, definitivamente, não é lugar para políticos tradicionais. Política não é carreira e político não é profissão. Não é? Bem, não deveria ser, pelo menos no PT. Se algo está errado, precisa mudar.
O PT deve abolir os PEDs, voltar a ser um partido de encontros, congressos e, agora, de redes sociais
O PT deve ser um partido conhecido e reconhecido por discussões de base e eleição de delegados e representantes por bairros e por coletivos temáticos ou identitários (trabalhadores de diferentes categorias e estratos, juventude, cultura, esporte, mulheres, LGBT, rurais, deficientes, transportes, educação, saúde, assistência, governança e gestão públicas, meio ambiente, moradia, segurança pública, igualdade racial), com limites e controles rígidos para evitar sua burocratização e as práticas próprias da política tradicional.
As direções partidárias devem ser expressão de uma militância e de um debate sobre políticas públicas, e não da aferição de quem consegue arregimentar e transportar o maior número de filiados. As novas direções devem expressar o pluralismo de nossa sociedade e o debate que por lá fervilha. Um partido incapaz de se nutrir da energia social acaba inevitavelmente apartado da sociedade civil e de suas lutas.
Deve-se igualmente criar novos mecanismos de participação e consulta que facilitem a interação virtual e a intervenção nas redes sociais. O PT precisa ser um partido com freios, contrapesos e  controle social.
Oposição firme e consistente ao governo Temer e reconfiguração da política de alianças
A sociedade deu um recado claro em 2016: está insatisfeita com os partidos, rechaça a política tradicional e quer o PT na oposição. O arco de alianças do PT deve ser firmado, de forma clara, com a orientação de conformar uma frente de oposição ao governo Temer, que se oponha ao entreguismo, ao reacionarismo e faça a defesa dos trabalhadores, dos excluídos e dos interesses nacionais.
O PT deveria, terminantemente, rechaçar coligações eleitorais e composições em governos com os partidos que apoiaram o golpe e que integram a base oficial ou eventual do governo Temer. Embora os partidos políticos não sejam monolíticos e possuam clivagens políticas e regionais importantes – veja-se os casos dos senadores Roberto Requião, do PMDB, e Lídice da Mata, PSB, assim como de parlamentares federais da Rede, que perfilaram contra o golpe –, é fundamental que o PT contribua para o debate político delimitando claramente seu campo político-ideológico e programático de esquerda.
Diálogos e mesmo acordos em uma ampla frente social e parlamentar em defesa de direitos sociais, que hoje estão ameaçados, são essenciais, mas não se confundem com o arco de alianças eleitorais e de prioridade na interlocução sobre um programa para o país. Esta prioridade deve estar na relação do PT com o PCdoB, o PDT e com o PSOL. No caso do PDT, pelo menos enquanto ainda restar ali algum brizolismo – ou seja, nacionalismo, trabalhismo e defesa do serviço público. No caso do PSOL, mesmo que ainda haja reticências, plenamente compreensíveis, de uma aproximação com o PT, é preciso tomar a iniciativa do gesto pelo reatamento de laços.
As grandes batalhas perdidas no Congresso e no Judiciário foram, antes, perdidas nas ruas. O desgaste do partido é crítico, mas a decepção generalizada com a política enquanto instrumento de mudança social é grave. Retomar a confiança social na política e na democracia requer persuasão, interlocução com amplos setores da sociedade e um longo trabalho de base. 
O cerne dessa tarefa implica em consolidar a Frente Brasil Popular e estreitar o diálogo com as novas frentes de luta que surgem pelo país, com grande vitalidade, como o Povo Sem Medo e o Levante da Juventude. Lá se forjam ideias, estratégias de luta e uma nova geração de militantes sociais que deve tomar conta das ruas e desaguar com maior força na política nacional. 
Ao PT e aos demais partidos de esquerda cabe não apenas torcer para que isso aconteça, mas orientar-se programática e organizativamente nesse sentido. Movimentos sociais fortes e organizações e partidos políticos fortes não são incompatíveis; antes, são um imperativo da democracia.
Em suma, o PT precisa assimilar que, doravante, a luta política requer a conformação de uma frente ampla que congregue partidos políticos, organizações e movimentos da sociedade civil e inclusive cidadãos em torno de bandeiras democráticas e sociais.
Um projeto estratégico para o Brasil
Para além de um reordenamento organizativo e de uma reorientação política, para completar o desafio de se reinventar, o PT precisa investir decisivamente na reformulação de um projeto estratégico para o Brasil. A experiência de governo com medidas desenvolvimentistas e as políticas públicas de inclusão social conformaram um patrimônio valioso, mas rigorosamente insuficiente em um cenário econômico de primazia e internacionalização do capital financeiro, de dependência do boom das commodities, de declínio mundial do Estado do bem-estar e de diminuição do emprego como forma de integração social.
Um partido vocacionado para o poder não pode ignorar agenda tão complexa, que ainda abarca as mutações do sistema político, o peso e o lugar de instituições como o Ministério Público e o Judiciário, o papel da mídia e das novas ferramentas de informação e comunicação, a importância da ciência e da tecnologia, da pesquisa e desenvolvimento, do pensamento estratégico e de segurança nacional, da preservação e manejo de recursos naturais estratégicos, dentre outros. Um partido vocacionado para o poder precisa se dispor a compreender as transformações em curso para oferecer sua interpretação, suas ideias e seu programa para o país.
Desafio dessa envergadura remete à necessidade de reunir o melhor da intelligentsia nacional e internacional e dialogar com muitas outras instituições e segmentos que se debruçam sobre essa agenda na perspectiva de disputar intelectualmente os rumos do país. Uma das principais lições a aprender da crise pela qual passamos é que passou o tempo de responder a dilemas estratégicos com respostas táticas de curto prazo.
Fortalecer os laços com os movimentos, organizações, partidos e governos progressistas de outros países
A troca de experiências, as estratégias comuns de atuação e a conformação de um programa internacional de lutas em temas como a taxação internacional de transações financeiras, o combate aos paraísos fiscais, a reforma das organizações multilaterais, a internacionalização dos direitos básicos dos trabalhadores, a universalização das políticas de distribuição de renda, a solidariedade às vítimas de desrespeito aos direitos humanos devem voltar a ser uma agenda de trabalho prioritária do PT. Não existe saída nacional sem articulação global das lutas sociais com a reforma das instituições governamentais e econômicas.
A uma direita transnacional e antinacional se deve contrapor uma atuação internacional com pautas unificadas e ação combinada, sobretudo no campo programático, formativo e da comunicação.
Agora é a hora, ou “PT, saudações”
O PT vive um momento crucial. Boa parte das mudanças necessárias são certamente viáveis justamente porque a própria conjuntura se encarregou de torná-las não apenas as melhores, mas, em alguns casos, as únicas opções possíveis.
O PT beijou a lona, desceu ao chão. Antes que uma parte ainda mais expressiva de seus simpatizantes e de sua militância lhe deseje “PT, saudações”, é hora de se colocar de pé, levantar a poeira e voltar a caminhar de cabeça erguida. Mas este não é um exercício que demande apenas vontade política. Exige resgatar o caráter civilizatório de seu ideário e a ousadia e a dignidade que marcaram historicamente a trajetória das esquerdas.

Sete teses sobre o desmonte da Previdência.



Por Ceci Juruá, no site Carta Maior. 

Matérias copiada do Blog do Miro.

1- A partir de 1998, foi desmontada a integração financeira entre Previdência e Seguridade Social.

Ao longo dos governos tucanos, na década de 1990 e seguinte, Executivo e Legislativo promoveram medidas sucessivas de desmonte da Seguridade Social, através de Emendas Constitucionais e de leis complementares.

A EC N. 20 introduziu modificações na previdência social em dezembro de 1998, organizando-a sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória. Determinou o valor máximo de R$ 1.200,00 para os benefícios do regime geral, reajustável para fins de preservação do valor real. 

Autorizou a constituição de um fundo integrado por bens, direitos e ativos de qualquer natureza para, em adição à receita própria arrecadada, garantir os recursos necessários ao pagamento dos benefícios do Regime Geral.

A LRF - Lei de Responsabilidade fiscal criou, em maio de 2000, o FUNDO DO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL (FRGPS), destinando-lhe apenas as contribuições de patrões e de empregados calculadas sobre a folha de salários e outros rendimentos do trabalho.

2- Na sequência a Previdência Social foi fragmentada em ilhas e arquipélagos previdenciários.

Uma primeira grande ilha foi construída separando-se os assalariados do setor produtivo privado dos servidores do setor público estatal através do Fundo do Regime Geral. Depois, em novembro de 1998, a Lei 9.717 autorizou a formação de regimes próprios de previdência social para os servidores públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, dos militares dos Estados e do Distrito Federal.

Em 2001, através de duas Leis Complementares, de números 108 e 109, foi criada a previdência complementar, também designada como previdência privada, da qual fazem parte os fundos de pensão, imenso arquipélago formado por entidades fechadas e abertas.

3- No Regime Geral de Previdência Social (RGPS), ao final de 2012 os beneficiários representavam pouco mais de 20% da população ativa na economia brasileira.

O anuário de 2013 da Previdência Social informou os percentuais de distribuição dos benefícios pagos pelo RGPS: 35%, aposentadorias por idade; 19%, obtidas por tempo de contribuição; 26%, pensões por morte; os restantes 20% eram decorrentes de aposentadorias por invalidez e outros benefícios (salário-maternidade e auxílios diversos). 

Assim, em 2012 apenas 9,2 milhões de segurados eram aposentados por idade, cerca de 5 milhões estavam aposentados por tempo de contribuição, outros 7,3 milhões recebiam pensão por morte do cônjuge.

Cabe então observar que é pequena a parcela de trabalhadores incluídos no RGPS como aposentados por idade ou por tempo de contribuição, e os pensionistas. Apenas 21,5 milhões de uma população ativa próxima dos 100 milhões naquele ano de 2012. Os “mais bem pagos” haviam sido aposentados por tempo de contribuição, absorviam 30% da despesa do RGPS e constituíam 19% da população beneficiária (mas sujeitos ao teto fixado, R$ 4.663 no ano de 2015).

Pessoas maiores de 65 anos, com deficiência e/ou não passíveis de inclusão no Regime Geral, obtiveram o chamado beneficio de prestação continuada, de caráter assistencial. É uma população restrita, pouco superior a 4 milhões de pessoas.

4- Com fonte única de financiamento das aposentadorias e pensões do setor privado da economia, foi rompido o modelo universal de financiamento tripartite inaugurado na Era Vargas e consolidado pelos regimes militares.

O modelo tripartite consistia em obter recursos de três fontes: as contribuições do trabalhador, deduzidas do próprio salário, as contribuições do patronato, calculadas sobre os rendimentos pagos aos trabalhadores, e a parcela socializada, devida pelo Governo e financiada por tributos.

Descomprometido assim de financiar pensões e aposentadorias de trabalhadores do setor privado, o Governo pôde ir ampliando a dívida pública e comprometer-se com o tal de “superávit primário” a partir do final de 1998, modelo que recebeu o aval do FMI-Fundo Monetário Internacional. 

Logo, a base da cálculo das contribuições mensais ao INSS passaram a ser da competência do Mercado, local de troca de uma certa quantidade de trabalho por remuneração monetária. Em consequência, a arrecadação do Regime Geral de Previdência Social passou a depender das oscilações, e dos humores, do deus Mercado!

Logicamente o Regime Geral passaria a operar com déficits em tempos de recessão, desemprego e arrocho salarial. Abriu-se ao mesmo tempo a oportunidade – política – para nova onda de privatizações, pois a LRF determinara que os déficits do FRGPS deveriam ser cobertos por alienação de bens, direitos e outros ativos (do Estado)!

Não fosse isso o bastante, dois meses antes da LRF, dita Lei de Responsabilidade Fiscal, o Governo fez aprovar Emenda Constitucional desvinculando 20% das receitas da União, incluídas as contribuições sociais, de suas finalidades constitucionais. Surgia ali a DRU, vista então como recurso provisório para aliviar o caixa do Tesouro. No atual Governo já foi aprovada dupla ampliação da DRU: não mais 20 mas 30% das receitas tributárias da União, e sua extensão às esferas regionais, Estados e Municipios.

5. Nas sendas e picadas abertas pelos poderes Legislativo e Executivo, os senhores do Mercado puderam dispor sobre os recursos destinados ao Regime Geral de Previdência Social.

Não foram apenas a DRU e os fundos que a antecederam que desviaram recursos de contribuições sociais para a dívida pública. Houve também desonerações fiscais, que reduziram as contribuições calculadas sobre a folha de salários, utilizando como argumento a crise econômica mundial/local e a necessidade de reduzir os custos empresariais para defender o nível de emprego.

Houve também o SIMPLES, o SIMPLES FEDERAL, o SIMPLES NACIONAL, o SUPER SIMPLES, denominações que sinalizam um regime tributário diferenciado para empresas individuais, micros e pequenas empresas. Sua ocorrência vem de 1996, e desde então há ampliações sucessivas do universo empresarial beneficiado.

No governo Lula, foi a Lei Complementar 123/2006 que deu os últimos retoques ao Super Simples, autorizando recolher mensalmente, através de documento único, vários impostos (IRPJ, IPI, ICMS e ISS) e contribuições sociais (CSLL, COFINS, PIS, e INSS). Esta lei sendo complementar e, portanto, reguladora de cláusula constitucional, significou desviar recursos do Sistema de Seguridade Social, recursos que deveriam ser apropriados como receita do Ministério de Previdência e Assistência Social passaram a ser recolhidos para o Ministério da Fazenda.

Consolidava-se assim a imagem amplamente vendida pela mídia comercial para a opinião pública, de existência de um déficit gigantesco na Seguridade Social. O debate sobre Seguridade e Previdência assemelha-se desde então a uma “Torre de Babel”. Acabou o diálogo, cada um passando a defender a tese que lhe era conveniente.

6. O debate sobre o déficit previdenciário é inócuo e irrelevante, frente às inconstitucionalidades do processo de desmonte da Previdência Social.

É irrelevante porque trata de um Sistema de Seguridade Social já destruído, de uma Previdência Social dispersa em ilhas e arquipélagos. Inócuo porque desconhece o caminho percorrido pelos recursos destinados à Seguridade e à Previdência Social através de decisões quase monocráticas, e certamente oligárquicas, de deputados e de senadores. 

Em um Parlamento que desde 1997 passara a receber generosas contribuições dos senhores de um Mercado em franca desnacionalização.

É difícil entender a ausência de reflexão sobre as inconstitucionalidades passíveis de verificação ao longo do período. Seu desfecho foi o golpe parlamentar de agosto de 2016, como resultado do acúmulo de forças dos poderes Legislativo e Judiciário durante três décadas.

Como exemplo não único, porém o maior, destaca-se a vigência até nossos dias, do artigo 167 da Constituição da República.

Artigo 167. São vedados:

XI – a utilização dos recursos provenientes das contribuições sociais de que trata o art.195, I.a, e II, para a realização de despesas distintas do pagamento de benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201.

Consultando o portal do Planalto, verificamos que a vedação estabelecida no artigo 167 refere-se a: i) contribuições do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício; ii) contribuições do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o artigo 201.

No caput do artigo 201 pode-se ler: a previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a ... (seguem-se vários incisos e parágrafos sobre condições de filiação ao Regime Geral e a qualificação dos benefícios distribuído).

Fica a pergunta: São compatíveis as cláusulas constitucionais ainda vigentes com as medidas até agora tomadas desviando recursos do INSS para o Ministério da Fazenda, sendo estes recursos provenientes das contribuições sociais de patrões e empregados sobre folha de salários e demais rendimentos do trabalho?

7. O desmonte da Previdência Social pode implicar a desagregação do Estado e da própria Nação, o Brasil!

Há poucos estudos sobre a relação entre a formação da Previdência Social brasileira e a construção da Nação e do Estado no Brasil. Mas eles existem, foram redigidos nas Academias e Universidades de nosso país, foram lidos e analisados até a década de 1990.

A Previdência Social foi o suporte institucional da construção nacional, representou o elo central de coesão entre os diferentes espaços sociais graças ao modelo tripartite de financiamento solidário, transferiu poder financeiro das multinacionais para os sindicatos de trabalhadores, alimentou o setor empresarial com recursos destinados à formação técnica de trabalhadores.

Produto da mente brilhante do maior estadista do Brasil, e de sua equipe formada por pessoas de ideologias distintas mas unidas pelo amor à Pátria, a Previdência Social não foi destruída pelos governos militares, ao contrário – foi ampliada! Em seguida reunida a um sistema mais amplo de Seguridade Social, escrito com bravura por todos que lutaram pela volta da democracia plena e por eleições diretas. 

São estas Seguridade e Previdência Social, capítulo nobre da Constituição Cidadã de 1988, primeira Carta e Pacto Social rascunhados democraticamente, nas ruas, por movimentos sociais que reuniram trabalhadores e classes médias, que vêm sendo destruídas sistematicamente no Poder Legislativo sem qualquer reação pública dos nobres integrantes do Poder Judiciário.

Se não houver interrupção desta trajetória perversa, serão multiplicados os déficits reais e imaginários tanto na Seguridade quanto nas ilhas e arquipélagos da Previdência Social. Este parece ser um dos objetivos da PEC 241, de limitação por 20 anos do gasto público social. A ela deverá seguir-se outra PEC, de Reforma da Previdência, já anunciada.

Poderá haver então a guerra de todos contra cada um, e de cada um contra todos. Na luta humana e desumana pela sobrevivência material. Estarão assim recompensados os esforços das Altas Finanças Internacionais visando a mercantilização total e a fragmentação da sociedade brasileira e do espaço territorial que nos abriga.

É este o futuro que sonhamos?

* Teses construídas com base em estudo realizado sobre O desafio da Previdência Social. Rio de Janeiro, outubro de 2016.

** Ceci Juruá é economista e doutora em políticas públicas, tendo sido professora universitária na área de Finanças Públicas, conselheira do CORECON-RJ por dois triênios e vice-presidente da Federação Nacional dos Economistas. Atualmente é membro do Conselho Consultivo da CNTU.

Postado por Altamiro Borges. E republicado por Xico Barros.


sábado, 22 de outubro de 2016

Rússia denuncia que a coalizão liderada pelos Estados Unidos bombardeou um cortejo fúnebre no Iraque, em Daquq. Causando dezenas de mortes.

Pelo menos 20 mortos e 45 feridos em ataque aéreo da coalizão liderada pelos EUA na cidade iraquiana de Daquq

O Ministério da Defesa russo disse neste sábado (22) que a coalizão liderada pelos Estados Unidos bombardeou um cortejo fúnebre na cidade iraquiana de Daquq, perto de Kirkuk, matando dezenas de civis.


O grupo terrorista Daesh (Estado Islâmico), suposto alvo dos ataques aéreos da coalizão, não está operando na região, segundo informou a pasta.

O porta-voz do Ministério da Defesa russo qualificou os ataques aéreos da coalizão em áreas residenciais como "crimes de guerra".

"Temos repetidamente observado que tais ataques mortais em áreas residenciais, que têm todos os sinais de crimes de guerra, tornaram-se quase uma rotina diária para a aviação da coalizão internacional", disse Konashenkov.

"Em 21 de outubro, os meios de reconhecimento russos detectaram ataques aéreos de dois aviões na cidade de Daquq, localizada perto de Kirkuk, onde não há nenhum militante do Daesh presente, de acordo com os nossos dados", disse o major-general Igor Konashenkov.

"De acordo com relatos de testemunhas, uma procissão de luto foi considerada pela aviação da coalizão como sendo um grupo de militantes. Dezenas de civis iraquianos, incluindo mulheres e crianças, morreram", disse o porta-voz.

O Ministério da Defesa russo reiterou ainda que está monitorando a operação para retomar Mossul, acrescentando que a coalizão liderada pelos EUA realizou 22 missões aéreas e lançou 19 ataques durante as últimas 24 horas.

O incidente em Daquq na sexta-feira supostamente deixou cerca de 20 mortos e 45 feridos.

Link: https://br.sputniknews.com/oriente_medio_africa/201610226613840-eua-bombardeio-cortejo-funebre/

Câmara de São Luís presta homenagem a veteranos da FEB em sessão solene.

 
Câmara de São Luís presta homenagem a veteranos da FEB em sessão solene.
A Câmara Municipal de São Luís (CMSL) homenageou nessa quarta-feira (19) os veteranos da Força Expedicionária Brasileira (FEB), em cerimônia realizada no Plenário Simão Estácio da Silveira. A sugestão foi do vereador Ivaldo Rodrigues (PDT) que destacou a atuação dos “valentes soldados da FEB, na Segunda Guerra Mundial, na Itália contra o Nazismo e Fascismo há 72 anos precisamente, colocando suas vidas a disposição da nação.

Conforme o vereador, os veteranos brasileiros romperam barreiras teoricamente imperscrutáveis e contribuíram “com o fim daquele perigo que ameaçava a humanidade.

— Esses brasileiros romperam barreiras teoricamente imperscrutáveis e nos enchem de orgulho, servindo de exemplo para várias gerações, por suas bravuras e patriotismo, contribuindo “com o fim daquele perigo que ameaçava a humanidade. Temos que batalhar o tempo todo para que exista paz entre os homens e os países — declarou reforçando que, naquela época, a Força Expedicionária Brasileira conquistou 20 vitórias.

HISTÓRIA VIVA
Para o presidente da Associação Regional da Federação Expedicionária Brasileira, o veterano Anselmo Alves, de 94 anos, declarou se sentir honrado por participar desse momento histórico, que para ele significa reviver uma nova etapa de sua vida.

— Estou me sentindo honrado por participar desse momento histórico, que para mim significa reviver uma nova etapa de sua vida. A homenagem é um resgate da história e da memória da participação da Força na Segunda Guerra Mundial. “Foi um conflito sangrento, com mais de 50 milhões de vítimas, onde o Brasil teve a honra de participar, no sentido de libertar os povos — assinalou o ex-combatente afirmando, inclusive, que o Brasil foi o único país Sul Americano a enviar tropas para a Itália e os homens que receberam essa homenagem são exemplos de história viva.

Durante sessão solene, dezoito ex-combatentes receberam as homenagens, e um deles foi o seu Luís Alves que já participou de todos os encontros nacionais.

— Isso é muito importante para nós e pro Brasil. O Brasil sabe que tem uma raça muito boa, homens de verdade, de coragem tá, que sabe lutar, sabe vencer e eu tenho orgulho de ser um deles — disse.

OS HOMENAGEADOS
A solenidade contou com a participação de autoridades e familiares dos homenageados. Na ocasião, Ivaldo Rodrigues entregou a maior honraria Medalha Simão Estácio da Silveira e Título de Cidadão de São Luís, em homenagem aos veteranos que participaram da cerimonia, entre eles: veterano Anselmo Alves, veterano Gilberto Teixeira de Araújo, veterano Benedito Bernardo do Nascimento, veterano Simão Pereira, veterano Israel Rosenthal, veterano Oudinot Wiladino, veterano Lot Eugenio Coser, veterano Nestor Alves dos Santos, veterano Luís Alves de Sousa, veterano Rigoberto Souza e veterano José Bernardino Coelho.

Texto: Anielle Granjeiro.

Nota de avaliação da regulamentação da Lei de Acesso à Informação para o Poder Judiciário.

Nota de avaliação da regulamentação da Lei de Acesso à Informação para o Poder Judiciário. Rede pela Transparência e Participação Social (RETPS) - Janeiro de 2015.
No dia 1º de dezembro de 2015 foi aprovado, pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o texto de regulamentação da Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011) para o Poder Judiciário. O texto aprovado foi publicado oficialmente pela Resolução nº 215, em 16 de dezembro do ano passado, assinado pelo ministro Ricardo Lewandowski. Essa resolução confirma a obrigatoriedade de todos os órgãos do judiciário brasileiro a disponibilizarem informações públicas e a criarem sistemas para que a população possa ter acesso à informação, entre outros procedimentos.
A Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011, conhecida como LAI), regulamenta o direito, previsto na Constituição Federal, de qualquer pessoa solicitar e receber dos órgãos e entidades públicos, de todos os entes e poderes, informações públicas por eles produzidas ou custodiadas.
Até o momento, a LAI não havia sido regulamentada pelo Judiciário. Através desta nota técnica, a RETPS destaca alguns pontos dentre os 44 artigos do documento.
Como aspectos positivos, salientamos que no artigo 6º da Resolução, que trata dos sítios eletrônicos do Poder Judiciário, fica garantida a obrigatoriedade de publicar periodicamente as “finalidades e objetivos institucionais e estratégicos, metas, indicadores e resultados alcançados pelo órgão”. Desta forma, os órgãos que integram o Poder Judiciário deverão ser transparentes também no tocante as suas funções institucionais e no resultado do trabalho, garantindo a transparência em seu sentido mais amplo.
Outro ponto positivo está presente no art.22 a resolução, que prevê a “Publicidade das Sessões de julgamento”, e determina a divulgação ao vivo pela internet, além de estabelecer prazos para a divulgação dos áudios e das pautas e atas das sessões, o que fortalece a transparecia nos processos judiciais. Essa publicidade, já é uma exigência prevista nos artigos 5º, LX e 93, IX, da Constituição, por força da Emenda Constitucional 45 de 2004.
Contudo, são poucos pontos positivos a ressaltar. O art.6º, que aborda a transparência ativa por meio dos sítios eletrônicos, apresenta uma grande contradição e incoerência, que nos remete a um erro legislativo. O citado artigo estabelece que, para ter acesso às informações sobre remuneração de servidores, é necessária a identificação do usuário (nome completo e um documento de indentificação). A transparência ativa significa livre acesso na internet sem a necessidade de solicitação, ou seja, a norma equivocadamente subverteu a lógica do que preconiza a LAI: o principio da máxima divulgação.
Quando analisamos os dispositivos referentes a transparência passiva, encontrarmos erros igualmente graves. Ainda que o artigo 8 assegure o acesso a parte não sigilosa de documentos, quando não autorizado o acesso integral, os artigos seguintes apresentam obstáculos a implementação da cultura de transparência.
O art.11, por exemplo, determina como deverá ser a estrutura dos formulários de pedido de informação. Segundo o artigo, os formulários deverão conter “campo para a identificação do solicitante, com nome completo, número de identidade e do CPF e endereço físico ou eletrônico, se pessoa física, ou razão social, dados cadastrais e endereço físico ou eletrônico, se pessoa jurídica, além de especificação da informação requerida”.
A exigência de mais de um documento de identificação pode ser considerada uma violação ao art. 10 da LAI, que preconiza que os órgãos públicos não podem requisitar dados que inviabilizem o pedido de informação. A identificação do requerente é um das questões mais complexas na aplicação da LAI, uma vez que já foram registrados casos de retaliação e tratamentos inadequados de dados pessoais. Uma vez que a identificação é obrigatória, um documento já seria mais que suficiente para esse fim, como é a prática na maioria dos órgãos e na regulamentação do executivo federal.
Outro obstáculo é observado no artigo 12, com a ampliação do leque de situações em que os pedidos de informação poderão não ser atendidos. Segundo este artigo “não será atendido os pedidos: insuficientemente claros e sem delimitação temporal, desproporcionais, desarrazoados, que exijam trabalho adicional de análise, que contemplem períodos e que foi descartada e informações protegidas”. Essa situações ultrapassam o previsto na LAI, estabelecendo condicionantes restritivas ao direito de acesso e até mesmo desnecessárias.
O art.18, por sua vez, modifica o sentido dado pela Lei de Acesso à Informação às motivações de recurso. Enquanto no art.15 da LAI se interpõe um recurso pelas razões da negativa de acesso, no art. 18 da resolução do CNJ pretende restringir os pedidos de recursos aos casos em que não se apresente ou se “fornece” as razões da negativa de acesso.
Ainda analisando os aspectos negativos da resolução, o artigo 25 estabelece um rol de documentos em que há restrição de acesso independente de classificação mas amplo que a própria LAI, impedindo acesso à “legislações específicas” e documentos preparatórios. Não está suficientemente claro que quando a decisão é tomada, o acesso aos documentos preparatórios já não é sigiloso, o que nos remete a outro erro legislativo.
Para completar, consideramos que o artigo 27º da resolução do CNJ – que regulamenta o funcionamento da catalogação de documentos tidos como sigilosos – também contraria a LAI. O artigo coloca a divulgação da lista de documentos sigilosos com referência futura e, diferentemente da Lei de Acesso à Informação, não determina o registro do assunto da informação tipificada como sigilosa, mas sim apenas de um número de identificação do documento. Isso dificulta o controle social, pois o código de identificação não permite saber o assunto da informação sigilosa, ocultando uma informação básica.
Por fim, reiteramos que a LAI definiu o CNJ como órgão responsável pela sua regulamentação no âmbito do Judiciário. Portanto, era natural e coerente que as as solicitações de informação em grau de recurso fossem enviadas ao CNJ. No entanto, o artigo 18º, § 4º, estabelece como instância máxima para recurso a presidência do tribunal. Apenas em relação à desclassificação e reavaliação de informação sigilosa é que haverá a possibilidade de se recorrer da decisão do presidente do tribunal no plenário do CNJ.
Era desejável que a espera de quase quatro anos pela regulamentação da LAI pelo Judiciário pudesse representar um avanço ao direito de acesso à informação. No entanto, a norma representa um retrocesso ao processo de abertura das informações da Justiça, iniciadas em 2009 com a publicação da Resolução do CNJ 102 e da Resolução 151, de 2012, quando a publicação nominal de salários de magistrados e servidores passou a ser obrigatória após a publicação da LAI.
A regulamentação diverge das próprias decisões judiciais do STF e do STJ proferidas em prol da abertura de informações salariais, entre outras decisões fávoraveis a transparência e ao direito à informação. A resolução traz indignação e uma nova frustração em relação as funções e atuação do sistema judiciário. A resolução remete portanto a velha lógica do faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço.
Link original desta matéria: http://retps.org.br/?p=518

Doenças raras: MPF defende atuação coletiva para resolver acesso aos medicamentos.

Mais de 13 milhões de pessoas têm diagnóstico de doença rara no Brasil.
Doenças raras: MPF defende atuação coletiva para resolver acesso aos medicamentos
Foto: Antônio Augusto/ Secom/ PGR
A judicialização de demandas individuais não é um caminho eficiente e isonômico para garantir o tratamento de doenças raras pela rede pública. Esse foi o posicionamento defendido pelo Ministério Público Federal (MPF) em audiência pública realizada na Câmara dos Deputados, nessa quinta-feira, 20 de outubro, sobre as dificuldades no acesso ao tratamento e a judicialização sob a ótica do paciente. Segundo a Procuradora da República em São Paulo Lisiane Braecher, substituta do Procurador Regional dos Direitos do Cidadão de São Paulo e integrante do Grupo de Trabalho de Saúde da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, o MPF tem priorizado o diálogo com gestores de saúde, buscando-se uma atuação coletiva e extrajudicial.
Estimativa da Associação de Pacientes Portadores de Doenças Raras – Casa Hunter aponta, por exemplo, que um paciente que recebe o medicamento sem recorrer ao Judiciário custa ao Estado cerca de R$ 2,5 mil mensais, enquanto aquele que só tem acesso ao tratamento por vias judiciais custa aproximadamente R$ 10 mil aos cofres públicos. O Ministério da Saúde gasta cerca de R$ 1,7 bilhões por ano com judicialização.
A Procuradora da República afirmou que já há no Ministério Público Federal o entendimento bastante sedimentado de que a atuação deve ser coletiva, por meio de ações que busquem a incorporação do medicamento à lista do Sistema Único de Saúde (SUS), não sem antes se esgotar a atuação extrajudicial. “Sabemos que quem pode dar a melhor resposta é o gestor, que tem melhores condições de dizer como o serviço precisa ser organizado e como o protocolo precisa ser feito", argumentou.
A Procuradora reconheceu que houve avanços na política de incorporação, mas que ainda são insuficientes, pois há medicamentos que, apesar da estarem registrados há muitos anos e da intensa judicialização, ainda não foram submetidos à avaliação para sua incorporação. Ressaltou, ainda, que não há clareza dos critérios usados para a escolha das tecnologias que são avaliadas e mesmo sobre os critérios de incorporação.
Segundo dados apresentados na audiência pública pela Casa Hunter, há três motivos para a judicialização de medicamentos no Brasil: produtos com registro e já incluídos no Sistema Único de Saúde, mas que mesmo assim não são fornecidos pelo gestor; produtos sem registro e não incluídos no SUS; e produtos com registro e ainda não incluídos no SUS.
“Quando um pai ou uma mãe recebe a notícia de que seu filho tem uma doença rara e é informado pelo médico que há esperança de tratamento com algum medicamento, seja ele disponível no Brasil ou não, eles só pensam em como conseguir esse produto”, explicou o representante da Associação de Pacientes Portadores de Doenças Raras, Antoine Daher.
Atualmente, 19 projetos de lei sobre o tema "doenças raras" tramitam no Congresso Nacional. As propostas dispõem sobre fornecimento de medicamentos, tratamento, apoio à família, isenção de impostos, entre outra questões. Na avaliação da Procuradora, no entanto, é preciso mais que alterações legislativas: “Não se muda a realidade apenas com a aprovação de uma lei ou com uma decisão judicial. A criação e o funcionamento de centros especializados para o tratamento de doenças raras dependem de políticas públicas para incentivar, por exemplo, o interesse pela pesquisa e a formação de mais profissionais especializados em doenças raras, que atualmente ficam restritos a grandes centros urbanos”, acrescentou.

Estados Unidos está em busca de um bode expiatório para a crise Síria.

por Thierry Meyssan.

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Alemanha, França, Rússia e Ucrânia em Berlim tentaram desbloquear os conflitos que ocorrem na Ucrânia e na Síria. No entanto, do ponto de vista russo, estes blocos só existem porque o objetivo da América do norte  não é a defesa da democracia que tanto é proclamado por Washington, mas para prevenir o desenvolvimento da Rússia e da China fechando suas "rotas da seda". 

Por ter superioridade já evidente em termos de guerra convencional, Moscou fez todo o possível para conectar o Médio Oriente com a Europa Oriental. E Moscou consedeu a extensão da trégua na Síria em troca da suspensão do bloqueio na aplicação dos acordos de Minsk. Enquanto isso, Washington está tentando transferir sua própria culpa para qualquer um dos seus aliados. Por não ter mais a cumplicidade da Turquia, a CIA agora se volta para a Arábia Saudita.

O Conflito dos Estados Unidos, contra a Rússia e a China é em duas frentes: por um lado, Washington procura um bode expiatório para torná-lo responsável para a guerra contra a Síria, enquanto Moscou que já ligou a questão síria com a questão do yemen - tema que deve-se acrescentar a questão da Ucrânia.

Washington procura um bode expiatório.

Para sair dessa situação com a testa alta, os EUA têm de atribuir a responsabilidade por seus crimes a qualquer um dos seus aliados. E joga com 3 possibilidades: impingir a culpa sobre a Turquia, a Arábia Saudita ou os dois juntos. A Turquia está presente na Síria e na Ucrânia, mas não no Iêmen; enquanto a Arábia Saudita está presente na Síria e Iêmen, mas não na Ucrânia.

Turquia

Vamos agora verificar o que realmente aconteceu na Turquia no último dia 15 de julho, diante de novas informações, e que estas informações nos obriga a rever o nosso julgamento inicial.

Em primeiro lugar, era óbvio que colocar o endereço das hordas jihadistas nas mãos da Turquia após o ataque que levou o jogo para o príncipe saudita Bandar ben Sultan não poderia trazer nada além de problemas. Na verdade, Bandar era um intermediário obediente, mas Erdogan seguiu a sua própria estratégia, que visa criar um 17° Império Turco-Mongol, o que o levaria a usar os jihadistas em diferentes missões, como previsto, em Washington.

Além disso, os Estados Unidos não poderia deixar de punir o Presidente Turco Erdogan por ter se aproximado tanto da Rússia em termos econômicos, apesar de a Turquia ser um membro do ativo da OTAN.

Finalmente, com a crise em torno do poder mundial, o presidente turco, Erdogan se tornou um bode expiatório ideal para sair da crise síria.

Do ponto de vista norte-americano, o problema não é a Turquia, indispensável como aliado regional, nem o MIT (os serviços secretos turcos) Fidan Hakan, que organizou o movimento jihadista mundial, mas Recep Taryip Erdogan.

Portanto, o National Endowment for Democracy (NED) tentou primeiro, em agosto de 2013, para realizar uma revolução colorida organizando manifestações em Istambul Gezi Park. Essa operação falhou ou Washington mudou de idéia.

Foi então que decidiu derrubar o AKP islâmico através das urnas. A CIA organizou uma transformação no HDP em um verdadeiro partido das minorias e preparou tanto uma aliança entre o CHP formação política turca e socialista. O HDP adotou um programa de defesa muito aberto as minorias étnicas (curdos) e minorias sociais (feministas e homossexuais) e incluiu o tema ecológico. 

O CHP foi reorganizado, tanto para disfarçar o fato de que os alevitas [1] foram sobre-representados dentro do partido como para promover a candidatura do ex-presidente do Supremo Tribunal. Mas, embora o AKP tenha perdido as eleições em Julho de 2004, não foi possível realizar a aliança entre o CHP e o HDP. Por isso, tivemos de fazer novas eleições legislativas em novembro de 2014, eleições que Recep Tayyip Erdogan "manipulou" descaradamente.

Washington, em seguida, decidiu prosseguir com a eliminação física de Erdogan. 

Entre novembro de 2014 e julho 2016 houve três tentativas de assassinato contra Erdogan. Ao contrário do que foi dito, a operação de 15 de Julho, 2016, não era uma tentativa de golpe, mas uma operação para limpar apenas o presidente turco

A CIA tinha usado industriais e os laços militares turcos e nos Estados Unidos para recrutar dentro da força aérea turca uma pequena equipe que seria responsável pela remoção do presidente durante suas férias. 

Mas essa equipe foi traída por vários oficiais islâmicos (os últimos constituem quase 25% das forças armadas turcas) e o presidente foi avisado uma hora antes da chegada do comando que iria "acabar" com ele. 

Erdogan foi transferido para Istambul, sob a proteção de Militares Fieis a seu regime. Conscientes das consequências previsíveis de um eventual fracasso, os conspiradores começaram um golpe sem preparação prévia e numa altura em que ainda havia um intenso movimento de pessoas em Istambul. 

É claro, que falhou. O objetivo da repressão subsequente não só foi a deter os autores da tentativa de assassinato, nem os militares que se juntaram ao golpe de Estado improvisado, mas sim a todos os pró-americanos: em primeiro lugar, o kemalista laico e, em seguida, seguidores islâmicos de Fethullah Gulen. No total, mais de 70.000 pessoas foram colocadas sob investigação e ainda teve de libertar prisioneiros comuns, para poderem aprisionarem os pró-americanos.

A megalomania do presidente Erdogan e sua ostentação no Palacio Blanco, a manipulação das eleições e a repressão desencadeada contra qualquer um que não está totalmente de acordo com ele, o torna o bode expiatório ideal para os erros cometidos na Síria. No entanto, o fato de que conseguiu sobreviver a uma revolução, e a quatro tentativas de assassinatos, sugere que não seja possível tirá-lo fora do jogo tão rapidamente

Arábia Saudita

Para os Estados Unidos, a Arábia Saudita é tão indispensável como a Turquia, por 3 razões: em primeiro lugar, por causa de suas reservas de petróleo, volume e qualidade excepcional embora o que interessa a Washington já não é consumir este óleo, mas apenas controlar suas janelas; pelos grandes volumes de dinheiro que lida com o reino (mas seus lucros sofreram uma queda de 70%) e o financiamento das operações secretas de forma não controlada pelo Congresso dos EUA; e, finalmente, pelo seu controle sobre as fontes de jihadismo. De fato, desde 1962, com a criação da Liga Mundial islâmica, os fundos de Riad, em nome da CIA, a Irmandade Muçulmana e da Irmandade de Naqchbandis, as duas irmandades de onde vêm todos os "jihadistas" do mundo.

Mas a natureza anacrônica da Arábia Saudita, um país que é propriedade privada de uma família de príncipes que não tem nada a ver com a liberdade comumente reconhecida de expressão e os princípios de liberdade religiosa, exige mudanças radicais.

Como resultado, a CIA organizou em janeiro de 2015, a sucessão do rei Abdullah. A noite da morte do soberano, a maioria foi incapaz de ser afastado de seus cargos e o País foi totalmente reorganizado na sequência de um plano anterior. Neste momento, o poder é dividido entre três clãs principais: Rei Salman (e seu filho amado príncipe Mohamed), o filho do príncipe Nayef (o outro príncipe Mohamed) e filho do falecido rei (príncipe Mutaib, comandante da Guarda nacional).

Na prática, o rei Salman, com 81 anos permite que o seu filho, o príncipe Mohamed de 31 anos, de a dinâmica governamental do País. E este príncipe saudita Mohamed aumentou a interferência na Síria, em seguida, travou uma guerra contra o Iêmen. Internamente, ele iniciou um programa abrangente de reformas econômicas e de caráter social enquadrado na chamada "Visão 2030".

Mas os resultados são imediatos. O reino saudita está mergulhado na Síria e no Iêmen e a última guerra está custando ainda mais caro do que o esperado devido às incursões dos houthis em território saudita e conseguiram infligir derrotas ao exército de Riyadh. 

Em termos econômicos, as reservas de petróleo estão chegando ao fim e a derrota no Iêmen impede os sauditas de explorarem o que tem sido chamado de "Part Four Empty", que é a região que inclui parte dos dois países. É verdade que a queda dos preços do petróleo permitiu a Arábia Saudita eliminar alguns dos seus concorrentes, mas também esgotou o tesouro do reino, que agora é forçado a recorrer a empréstimos nos mercados internacionais.

A Arábia Saudita nunca foi tão poderosa e ao mesmo tempo tão frágil. A repressão política atingiu o seu apogeu com a decapitação do líder da oposição, Sheikh Al-Nimr. A rebelião vai além da minoria xiita e se estende até as províncias sunitas a oeste. 

A nível internacional, a coalizão árabe é certamente impressionante, mas faz água por toda parte desde que o Egito se retirou dela. A abordagem pública da Arábia Saudita para Israel contra o Irã chocou o mundo árabe e muçulmano. Ao invés de ser uma parceria, a aproximação entre Riad e Tel Aviv mostra o pânico que engolfa a família real, objeto hoje de ódio de todos.

O governo de Washington, Vê que é hora de escolher os itens que seriam apropriados, salvar a Arábia Saudita e livrar-se dos outros? A lógica simples indicaria um retorno à distribuição prévia de poder entre o clã dos Sudairis mas sem o príncipe Mohamed ben Salman, que já demonstrou a sua incapacidade de aliar-se a tribo do falecido rei Abdallah.

Washington na questão saudita, acredita que com a morte do rei Salman, seu filho Mohamed será removido do poder, passando o governo para as mãos de outro príncipe Mohamed (filho de Nayef), enquanto o príncipe Mutaib permaneceria na presente posição à frente da Guarda Nacional.

Na Arábia Saudita, como na Turquia e outros países aliados com os Estados Unidos, a CIA tenta manter as coisas como elas são. E é limitada a organizar a tabela abaixo das tentativas de mudanças de liderança, mas não tocar nas estruturas. A natureza puramente cosmética dessas mudanças facilita o seu trabalho é mantendo-a nas sombras.

Moscou tenta negociar junto do Oriente Médio e da Ucrânia

A Rússia conseguiu estabelecer uma ligação entre os campos de batalha da Síria e do Iêmen. Sua presença militar no Levante é público por um ano, mas também está presente durante 3 meses, tão não oficialmente no Iêmen, que está ativamente envolvido na luta. Ao negociar o cessar-fogo simultaneamente em Aleppo e outro cessar-fogo no Iêmen.

A Rússia forçou os Estados Unidos a ligar os dois teatros de operações. Nestes dois países, as forças russas mostram sua superioridade em termos de guerra convencional contra os aliados de Washington, evitando o confronto direto com o Pentágono. Com essa finta, Moscou evitou ter de se envolver no Iraque, apesar de seu vínculo histórico nesse país terceiro.

No entanto, a disputa entre os "Big Two" foi principalmente no corte das duas rotas da seda, primeiro para a Síria e, em seguida, na Ucrânia. Naturalmente, Moscou é por ligar as duas questões em suas negociações com Washington. Isto é muito lógico, especialmente considerando que a própria CIA criou uma ligação entre os dois campos de batalha em toda a Turquia.

Ao viajar para Berlim em 19 de outubro, o presidente russo, Vladimir Putin, e o chanceler Sergei Lavrov tinham intenções de convencerem a Alemanha e a França, sem a presença dos Estados Unidos, para ligar estas questões. Então, eles estenderam a trégua na Síria em troca da suspensão do bloqueio dos acordos de Minsk pela Ucrânia, um negócio que não deixará de irritar Washington, que fará tudo ao seu alcance para sabotá-la.

Claro, Berlim e Londres no final acabam fazendo fila atrás de seu "mestre otaniano". Mas, do ponto de vista de Moscou aceitar procrastinar um conflito, e um otimo negocio tanto na Ucrânia como na Transnístria, por exemplo. Além disso, todos afetando a unidade da OTAN sobre o fim da supremacia americana.

Thierry Meyssan

[1] A religião Alevi é a versão turca do Alawism sírio.