quinta-feira, 18 de outubro de 2018

Empresários bancam campanha ilegal contra o PT pelo WhatsApp. Chamem o TSE.

Com contratos de R$ 12 milhões, prática viola a lei por ser doação não declarada

Empresas estão comprando pacotes de disparos em massa de mensagens contra o PT no WhatsApp e preparam uma grande operação na semana anterior ao segundo turno.

A prática é ilegal, pois se trata de doação de campanha por empresas, vedada pela legislação eleitoral, e não declarada.

A Folha apurou que cada contrato chega a R$ 12 milhões e, entre as empresas compradoras, está a Havan. Os contratos são para disparos de centenas de milhões de mensagens.

As empresas apoiando o candidato Jair Bolsonaro (PSL) compram um serviço chamado "disparo em massa", usando a base de usuários do próprio candidato ou bases vendidas por agências de estratégia digital. Isso também é ilegal, pois a legislação eleitoral proíbe compra de base de terceiros, só permitindo o uso das listas de apoiadores do próprio candidato (números cedidos de forma voluntária).

Quando usam bases de terceiros, essas agências oferecem segmentação por região geográfica e, às vezes, por renda. Enviam ao cliente relatórios de entrega contendo data, hora e conteúdo disparado.

Entre as agências prestando esse tipo de serviços estão a Quickmobile, a Yacows, Croc Services e SMS Market.

Os preços variam de R$ 0,08 a R$ 0,12 por disparo de mensagem para a base própria do candidato e de R$ 0,30 a R$ 0,40 quando a base é fornecida pela agência.

As bases de usuários muitas vezes são fornecidas ilegalmente por empresas de cobrança ou por funcionários de empresas telefônicas.

Empresas investigadas pela reportagem afirmaram não poder aceitar pedidos antes do dia 28 de outubro, data da eleição, afirmando ter serviços enormes de disparos de WhatsApp na semana anterior ao segundo turno comprados por empresas privadas.

Questionado se fez disparo em massa, Luciano Hang, dono da Havan, disse que não sabe "o que é isso". "Não temos essa necessidade. Fiz uma 'live' aqui agora. Não está impulsionada e já deu 1,3 milhão de pessoas. Qual é a necessidade de impulsionar? Digamos que eu tenha 2.000 amigos. Mando para meus amigos e viraliza."

Procurado, o sócio da QuickMobile, Peterson Rosa, afirma que a empresa não está atuando na política neste ano e que seu foco é apenas a mídia corporativa. Ele nega ter fechado contrato com empresas para disparo de conteúdo político.

Richard Papadimitriou, da Yacows, afirmou que não iria se manifestar. A SMS Market não respondeu aos pedidos de entrevista.

Na prestação de contas do candidato Jair Bolsonaro (PSL), consta apenas a empresa AM4 Brasil Inteligência Digital, como tendo recebido R$ 115 mil para mídias digitais.

Segundo Marcos Aurélio Carvalho, um dos donos da empresa, a AM4 tem apenas 20 pessoas trabalhando na campanha. "Quem faz a campanha são os milhares de apoiadores voluntários espalhados em todo o Brasil. Os grupos são criados e nutridos organicamente", diz.

Ele afirma que a AM4 mantém apenas grupos de WhatsApp para denúncias de fake news, listas de transmissão e grupos estaduais chamados comitês de conteúdo.

No entanto, a Folha apurou com ex-funcionários e clientes que o serviço da AM4 não se restringe a isso.
Uma das ferramentas usadas pela campanha de Bolsonaro é a geração de números estrangeiros automaticamente por sites como o TextNow.

Funcionários e voluntários dispõem de dezenas de números assim, que usam para administrar grupos ou participar deles. Com códigos de área de outros países, esses administradores escapam dos filtros de spam e das limitações impostas pelo WhatsApp —o máximo de 256 participantes em cada grupo e o repasse automático de uma mesma mensagem para até 20 pessoas ou grupos.

Os mesmos administradores também usam algoritmos que segmentam os membros dos grupos entre apoiadores, detratores e neutros, e, desta maneira, conseguem customizar de forma mais eficiente o tipo de conteúdo que enviam.

Grande parte do conteúdo não é produzida pela campanha —vem de apoiadores.

Os administradores de grupos bolsonaristas também identificam "influenciadores": apoiadores muito ativos, os quais contatam para que criem mais grupos e façam mais ações a favor do candidato. A prática não é ilegal.

Não há indício de que a AM4 tenha fechado contratos para disparo em massa; Carvalho nega que sua empresa faça segmentação de usuários ou ajuste de conteúdo.

As estimativas de pessoas que trabalham no setor sobre o número de grupos de WhatsApp anti-PT são muito vagas —vão de 20 mil a 300 mil— pois é impossível calcular os grupos fechados.

Diogo Rais, professor de direito eleitoral da Universidade Mackenzie, diz que a compra de serviços de disparo de WhatsApp por empresas para favorecer um candidato configura doação não declarada de campanha, o que é vedado.

Ele não comenta casos específicos, mas lembra que dessa forma pode-se incorrer no crime de abuso de poder econômico e, se julgado que a ação influenciou a eleição, levar à cassação da chapa.

EM MG, ROMEU ZEMA CONTRATOU EMPRESA DE IMPULSIONAMENTO

O candidato ao governo de Minas do partido Novo, Romeu Zema, declarou ao Tribunal Superior Eleitoral pagamento de R$ 200 mil à Croc Services por impulsionamento de conteúdos. O diretório estadual do partido em Minas gastou R$ 165 mil com a empresa.

A Folha teve acesso a propostas e trocas de email da empresa com algumas campanhas oferecendo disparos em massa usando base de dados de terceiros, o que é ilegal.

Indagado pela Folha, Pedro Freitas, sócio-diretor da Croc Services, afirmou: "Quem tem de saber da legislação eleitoral é o candidato, não sou eu."

Depois, recuou e disse que não sabia se sua empresa prestara serviço para Zema. Posteriormente, enviou mensagem afirmando que conferiu seus registros e que vendera pacotes de disparo em massa de WhatsApp, mas só a bases do próprio candidato, filiados ao partido e apoiadores de Zema —o que é legal.

Procurada, a campanha afirmou que "contratou serviço de envio de mensagem somente por WhatsApp para envio aos filiados do partido, pessoas cadastradas pelo website e ações de mobilização de apoiadores".

A Folha apurou que eleitores em Minas receberam mensagens em WhatsApp vinculando o voto em Zema ao voto em Jair Bolsonaro dias antes do primeiro turno. Zema, que estava em terceiro nas pesquisas, terminou em primeiro. As informações são da Folha.

Bem-vindos ao G-20 dos Infernos, por Pepe Escobar.


 14/10/2018, Pepe Escobar, Asia Times

“Ê-ê gostosura de fim de mundo...
Deus mesmo, quando vier, que venha armado.
P’ra trás! P’ra trás! Chegou a minha vez!”

A Hora e a Vez de Augusto Matraga, 1965, Brasil, Roberto Santos, diretor)*

Traduzido pelo Coletivo Vila Mandinga

A reunião do G-20 em Buenos Aires, dia 30 de novembro pode pôr fogo no planeta – talvez literalmente. Comecemos pela guerra comercial EUA-China. Washington nem começará a discutir comércio com a China no G-20, se Pequim não comparecer com lista muito detalhada de concessões.

O mundo para os negociadores chineses não é sombrio, de modo algum. É possível alcançar alguma espécie de acordo sobre um terço das exigências dos EUA. Depois se pode conversar sobre mais outro terço. Mas o último terço está absolutamente fora de qualquer discussão – porque já imperativos da segurança nacional da China, como não admitir a abertura do mercado da nuvem de computação doméstica para concorrentes estrangeiros.

Pequim mandou o vice-primeiro-ministro Liu He e o vice-presidente Wang Qishan para supervisionarem todas as negociações com Washington. Todos esses têm diante deles tarefa dificílima: conseguir penetrar o muito limitado espectro de atenção do presidente Donald Trump.

Como se não bastasse, Pequim exige “pessoa de ponta” com autoridade para negociar em nome de Trump – considerando o complexo engarrafamento de mensagens que brigam para sair de Washington.

Agora comparem isso e a mensagem disparada pelo instituto de pesquisa que leva o fabuloso nome de “Pensamento de Xi Jinping sobre o Socialismo com Características Chinesas para uma Nova Era Integrado à Escola do Partido do Comitê Central do Partido Comunista da China (PCC)”: os EUA iniciaram o “atrito comercial” para impedir o avanço de modernização industrial da China.” 

É o pensamento consensual na cúpula.

E o confronto pode ainda piorar. O Vice-presidente Mike Pence acusou a China de “intrometer-se na democracia norte-americana”, de fazer “diplomacia de dívida”, de “manipular a moeda” e de “roubar IPs”. Em Pequim, o ministro de Relações Exteriores descartou a lista toda, como “ridícula.”

Entende-se melhor se se examina com muita atenção o que o ministro de Relações Exteriores Wang Yi disse ao Conselho de Relações Exteriores – o mais diplomaticamente possível: “A China seguirá uma trilha de desenvolvimento diferente das potências históricas”. E a China não buscará a hegemonia.

Do ponto de vista da Estratégia de Segurança Nacional dos EUA, é irrelevante; a China já foi eleita como concorrente feroz e talvez também como ameaça. O presidente Xi Jinping não cederá às demandas comerciais de Washington. Assim sendo, preparem-se para uma não reunião entre Xi e Trump em Buenos Aires.

A ameaça de um primeiro ataque nuclear 

As coisas parecem ainda mais cabeludas no front russo. Apesar de toda a paciência taoísta do ministro de Relações Exteriores Sergey Lavrov, os círculos diplomáticos de Moscou estão exasperados com ameaças sérias que os norte-americanos têm feito – como a ameaça de a Marinha dos EUA implantar um possível bloqueio para restringir o comércio de energia da Rússia. Ou, pior: o ultimatum de que a Rússia interrompa o desenvolvimento de um míssil que, para Washington, violaria o Tratado das Forças Nucleares de Médio Alcance [ing. Intermediate-Range Nuclear Forces (INF) Treaty, ou o Pentágono o destruirá.

Nada poderia ser mais sério – porque é os EUA ameaçando com um primeiro ataque nuclear.

Paralelamente, o presidente executivo da British Petroleum, Bob Dudley disse à conferência Oil & Money em Londres, que qualquer nova sanção dos EUA contra as grandes empresas russas de energia seria desastrosa. “Se houvesse sobre as empresas Rosneft ou Gazprom ou Lukoil sanções semelhantes às que foram impostas à Rusal, os sistemas de energia para a Europa estariam derrubados; é acontecimento extremo” – disse ele.

No front dos BRICS, Rússia e Índia manobraram com habilidade por conta própria e frustraram alguns dos planos estratégicos dos EUA contra os três principais polos da integração da Eurásia: Rússia, China e Irã.

O “Quad” – EUA, Japão, Austrália e Índia – foi concebido para cercar  a China no Indo-Pacífico, além de estreitar a margem de manobra da Rússia. O “Quad” não está na melhor forma imaginável depois que a Índia decidiu comprar sistemas de mísseis russos S-400. Trump jurou vingança.

Além do negócio dos S-400s, empresas russas construirão mais seis reatores nucleares na Índia, ao custo de $20 bilhões cada, ao longo da próxima década. Rosneft assinou acordo para, em dez anos, vender à Índia 10 milhões de toneladas de petróleo por ano. E a Índia continuará a comprar petróleo do Irã, pagando em rúpias.

No front da União Europeia, o caso é a Alemanha. Há poucas ilusões em Berlin sobre o oscilante futuro da União Europeia (UE). A economia alemã centrada na exportação é focada na Ásia. A Alemanha está redobrando esforços para firmar um modelo de estilo asiático – umas poucas grandes empresas que são campeãs nacionais, capazes de super turbinar as exportações. O mercado norte-americano – sob ventos protecionistas – já não passa de segunda possibilidade.

Tóxicos Trópicos 

E há também a tragédia brasileira. O presidente Mauricio Macri arruinou a Argentina com um “choque neoliberal”. O país foi entregue como refém ao FMI.

Cenário possível é um G-20 no qual a Argentina aprenderá a lidar com um fascista na presidência de seu vizinho e principal parceiro comercial, o Brasil.

Ex-paraquedista, Jair Bolsonaro é xenófobo e misógino, mas não é nacionalista. Esse Messias tropical [nome completo é Jair Messias B.] faz continência à bandeira dos EUA, logo no café da manhã. Seu homem para a economia é um Chicago Boy com tendências a vender o país na bacia das almas – para delícia de “investidores” e especialistas em “mercados” de New York e Zurique, até Rio e São Paulo.

Esqueçam assunto de criar empregos ou, sequer, de tentar resolver os imensos problemas sociais do Brasil: desigualdade social feroz, investimentos que faltam para saúde e educação, insegurança urbana. A única “política” de Bolsonaro é armar a população, para uma espécie de Mad Max remix.

Tudo, em governo Bolsonaro, deve seguir a regra sem mercê de um “livre” mercado Hobbesiano. Esqueçam qualquer possibilidade de intervenção moderadora do Estado nas relações complexas entre Capital e Trabalho.

É o ápice de processo complexo iniciado há anos, em think tanks como a Atlas Network, rios de dinheiro e, por último, mas não insignificante, um tsunami de evangélicos/neopentecostais.

Os pilares da carnificina do Brasil são poderosos interesses do agronegócio e da exploração mineral, a mídia-empresa brasileira tóxica, evangélicos, um setor financeiro totalmente rendido a Wall Street, indústria de armas, judiciário, polícia, serviços de inteligência e forças armadas completamente partidarizadas.

As estrelas do show são, claro, o bloco BBB, Boi, Bíblia, Bala – com legiões de representantes no Congresso – tudo ‘fiscalizado’ pelo Deus Mercado.

O neoliberalismo jamais vence eleições no Brasil. Assim, o único modo de fazer as tais ‘reformas’ é mediante uma ação tipo Pinochet-de-segunda-mão. Deve-se esperar agitação social, matança indiscriminada de líderes indígenas e de movimentos pró reforma agrária, arrasadora fartura para a indústria de armas, bancos festejando presentes de Natal todas as semanas, repressão abissal à cultura, desnacionalização absoluta da economia, e trabalhadores e aposentados pagando pelas tais ‘reformas’. Business, como sempre, pode-se dizer.

Os traços fascistas de Bolsonaro não estão sendo normalizadas só pelos poderes em ação no Brasil. O ministro de Relações Exteriores da Argentina Jorge Faurie descreveu-o como político “de centro-direita”.

Pequim e Moscou – por motivos BRICS – e a União Europeia em Bruxelas estão estarrecidos com a queda do Brasil nesse sorvedouro. Rússia e China contavam com um Brasil forte que contribuísse para um mundo multipolar como aconteceu nos governos do presidente Lula, que foi uma das grandes forças que conduzia os BRICS.

Quanto à União Europeia, é difícil engolir governante fascista na chefia de seu principal parceiro econômico na América Latina, coração do Mercosul. Para todo o Sul Global, a implosão do Brasil, um dos líderes do movimento, é tragédia sem remédio.

Façam as contas: Washington em surto de ameaças e sanções. Uma União Europeia fraturada até a medula – denunciando um iliberalismo asiático, ao mesmo tempo em que, em casa, é impotente para resistir à “ascensão dos deploráveis”. Os BRICS em total desmonte, com dois dos estados-membros em conflito grave com Washington, um fora de jogo e outro em cima do muro – dentre os quatro principais. A Casa de Saud em putrefação galopante que se alastra de dentro para fora. O Irã ainda distante, até, da mesa do G-20. Só resta cantar What a Wonderful World.*******


* Epígrafe acrescentada pelos tradutores.


quarta-feira, 17 de outubro de 2018

Maranhão. ANTT atende recomendação em parte do MPF e promove nova audiência pública para discutir concessão de estrada de ferro Carajás.

Foto da audiência pública mostrando a mesa principal e o público presente.
ANTT promoveu a segunda sessão da audiência pública presencial, em São Luís (MA), sobre a prorrogação antecipada da concessão da Estrada de Ferro Carajás.
Representantes do MPF fizeram, ao final, considerações quanto às ações nacionais e locais do órgão em relação à prorrogação antecipada de concessões de estradas de ferro.

Atendendo parcialmente à recomendação nº 13/2018, proposta pelo Ministério Público Federal (MPF) em 10 de outubro, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) promoveu a segunda sessão da audiência pública presencial nº 9/2018, no Rio Poty Hotel, em São Luís (MA), sobre a prorrogação antecipada da concessão da Estrada de Ferro Carajás (EFC) – administrada pela Vale.
A atuação da Procuradoria da República no Estado do Maranhão é fruto de uma ação coordenada no âmbito da Câmara do Consumidor e Ordem Econômica do MPF (3ªCCR), que acompanha, desde o ano passado, a política de governo no sentido de prorrogar antecipadamente concessões no setor ferroviário. A recomendação nº 13/2018 foi elaborada a partir dos fatos presenciados pelo MPF na primeira sessão da audiência pública, em que diversos problemas foram identificados, tais como: o atraso de, aproximadamente, 45 minutos, que causou a saída de muitos inscritos para a hora do almoço antes que lhes fosse dada a palavra e o tamanho do auditório onde foi realizada a audiência – que não possuía espaço físico suficiente para abrigar todos os interessados em participar.
A recomendação de realização de nova audiência pública partiu da necessidade de ampliar o debate e aprimorar os estudos realizados no processo de prorrogação da concessão. Além disso, com a prorrogação do prazo para envio de contribuições escritas sobre a renovação da concessão ferroviária, mais pessoas puderam ter suas dúvidas respondidas.
Representantes do MPF estavam presentes e, ao final, fizeram considerações quanto às ações nacionais e locais do Ministério Público Federal em relação ao processo de prorrogação antecipada das concessões de estradas de ferro.
Assessoria de Comunicação - Procuradoria da República no Maranhão - Tel.: (98) 3213-7161 - E-mail: prma-ascom@mpf.mp.br - Twitter:@MPF_MA.



segunda-feira, 15 de outubro de 2018

Maranhão. Mineradora deve paralisar atividades por causar impacto à comunidade quilombola.

Foto mostra o momento de uma explosão, com a poeira subindo.
Imagem: iStock #PraCegoVer: explosão de rochas em pedreira

Justiça reconheceu riscos em razão da utilização de explosivos para as rochas. 

O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) manteve a decisão de paralisar as atividades da empresa Impar Serviços de Mineração no município de Rosário (MA), por causar transtornos e oferecer riscos à Comunidade Quilombola de Miranda. 

No trâmite da ação proposta pelo Ministério Público Federal, a empresa admitiu que não apresentou estudo de impacto ambiental e o respectivo relatório, que deveriam ter sido submetidos à aprovação do órgão estadual competente e do Ibama para extração de minério na região, conforme exige a legislação.

O desembargador Hilton Queiroz, relator do caso, explicou que o estudo de impacto ambiental e o respectivo relatório se prestam a diagnosticar situações, antever riscos e indicar medidas de mitigação ou de compensação. "Tem um conteúdo substancial e uma finalidade protetiva, a qual não foi observada no caso concreto", disse. Ele também observou que "os empreendimentos de mineração e beneficiamento ocasionam riscos à incolumidade pública, consoante vistoria realizada pela Defesa Civil, em razão da utilização de explosivos para as rochas, inclusive em período noturno”.

Durante o processo, o MPF demonstrou que a empresa ofende direitos da comunidade quilombola, que não foi sequer ouvida quando do processo de licenciamento ambiental. "Esse fato, por si só, demonstra que a atividade empresarial não observou a necessidade de consulta livre, prévia e informada", diz o procurador regional da República Felício Pontes Jr.

Segundo ele, a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Decreto Legislativo nº 143/2002 e promulgada pelo decreto nº 5051/2004, garantiu a participação dos povos e comunidades tradicionais em ação que visa a proteger os seus direitos. Além disso, o documento exige dos órgãos governamentais o respeito aos valores culturais do habitat ocupado pelas comunidades tradicionais. "Não se pode justificar qualquer obra desenvolvimentista ao arrepio da legislação", defende o procurador.

A Justiça Federal do Maranhão já tinha deferido parcialmente a antecipação de tutela pedida pelo MPF para suspender a eficácia das licenças ambientais concedidas aos empreendimentos e para determinar a imediata paralisação das atividades minerárias na região, inclusive a de pesquisa mineral.

Segundo a decisão que foi questionada pela empresa junto ao TRF1, a prova produzida demonstra a existência de grande impacto ambiental negativo resultante dos empreendimentos, já que a exploração de minério é acompanhada de abertura de grandes crateras, supressão de vegetação e utilização de enormes quantidades de explosivos (12 mil kg por mês) próximos, inclusive, de local ancestralmente ocupado por comunidade quilombola.

A incompatibilidade entre o exercício de tal atividade econômica e a manutenção do modo de vida da comunidade quilombola foi reconhecida, inclusive, pela Secretaria Estadual (Sema) e pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

Agravo de Instrumento nº 0038568-32.2014.4.01.0000/MA
Assessoria de Comunicação - Procuradoria Regional da República da 1ª Região - (61) 3317-4583/ 4862 - www.mpf.mp.br/regiao1 - Twitter: @MPF_PRR1.


Moinhos de Vento ou Reflexões sobre a Eleição de 7 de outubro de 2018.

Moinhos de Vento ou Reflexões sobre a Eleição de 7 de outubro de 2018. 29696.jpeg

Os jornais, impressos e virtuais, noticiaram como manchete, na segunda-feira, após as eleições de 7 de outubro, a vitória da direita: "onda de direita", "virada à direita". Teria efetivamente ocorrido?
por Pedro Augusto Pinho
"Os fatos históricos estão sujeitos a uma dupla ordem de especulação e de conhecimento: em primeiro lugar podem ser vistos e estudados como um fato, que se verificou em condições de tempo e de espaço determinadas. Partindo desse ponto de vista, o conhecimento que obtemos é descritivo, e nele se compreende não só a identificação e caracterização do fato, como o estudo de seus antecedentes, das influências externas ou internas que agiram sobre ele e sobre seu protagonista. A segunda ordem de conhecimento a que me refiro é o conhecimento simbólico: um fato histórico ao se projetar no tempo adquire um sentido.... Depois de iluminar o mundo real, tornando-se inteligível, um incessante intercâmbio se inicia, pois irradia sobre a existência a sua força persuasiva, e recebe da consciência humana novos matizes de compreensão" (San Tiago Dantas, D.Quixote um apólogo da alma ocidental, 1947).
Os jornais, impressos e virtuais, noticiaram como manchete, na segunda-feira, após as eleições de 7 de outubro, a vitória da direita: "onda de direita", "virada à direita". Teria efetivamente ocorrido?
Confronto dos dados com as interpretações
Tomemos para análise o mais importante órgão representativo da democracia brasileira, o Congresso Nacional.
Considerando como de centro-esquerda, esquerda ou extrema-esquerda os parlamentares do PT, PSB, PDT, PSOL, PCdoB, PPL, Rede, PMN e PV, temos, na atual legislatura, 129 deputados federais. Teremos 142, em 2019.
No entanto, quer para esta conta quanto aquela para os partidos à direita, não é o raciocínio, a lógica política e ideológica que prevalecem. São as emoções e as questões pessoais que movem os parlamentares, seres humanos. Vejamos, por exemplo, Marina Silva. Seu posicionamento político a colocaria à esquerda, mas seu ódio a Lula e a Dilma, que ela considera usurpadora de seu direito de candidata do PT à eleição em 2010, supera a lógica partidária.
Também questões municipais, estaduais, rixas de família levam a estes partidos de esquerda - como os de direita - políticos que não comungam com seus posicionamentos programáticos.
Nos partidos de direita, o que se observou foi a migração do centro-direita e da direita para a extrema-direita. PSDB sai de 49 para 29 deputados federais; o DEM de 43 para 27, o PP de 40 para 36 e o PR de 38 para 33 parlamentares.
O Congresso Brasileiro sempre foi majoritariamente de direita, em suas diversas expressões. A esquerda sempre foi minoria, oposição. Os avanços sociais foram obtidos por acordos e sujeições a interesses menores. Os avanços nacionalistas a governos fortes, autoritários ou ditatoriais, deixando esta qualificação aos sentimentos dos leitores.
Em sua coluna, Fatos&Comentários, no jornal Monitor Mercantil de 08/10/18, o percuciente Marcos de Oliveira escreve: "Candidatos a governador parecem síndicos de massa falida, longe da questão nacional. Presidenciáveis são pressionados a revelar quantos policiais vão contratar ou quantas creches construir. Nada sobre a direção do Estado brasileiro, um projeto de país ou forma de unir a nação".
Brasil é slogan, não um país em busca da Soberania
Desde que a banca, como designo o sistema financeiro internacional, assumiu o poder e mesmo antes, quando destronava o capitalismo industrial, o desmantelamento dos Estados Nacionais vem sendo um de seus objetivos. E dos mais incisivos.
Nesta e em outras ações, a banca busca colocar questões que não evidenciem seus objetivos, desconcertem os opositores, ganhem adeptos e iludam a todos. Dentre estas estão as questões que denomino transversais, pois são comuns a todas as sociedades, representam um momento da construção civilizatória.
Para a banca a morte das baleias, o envenenamento por agrotóxicos da alimentação infantil, o femininocídio são questões irrelevantes. Importa transferir para as finanças os ganhos dos lucros industriais, as receitas das locações e maiores parcelas dos salários. E promover permanentemente a concentração de renda.
Nesta eleição de 2018 a banca colocou duas questões: a corrupção e a violência.
Ambas começaram bem antes, para que fosse construído um cenário que colocasse o Partido dos Trabalhadores (PT) no foco da culpa, da criminalização. Tiveram início com a primavera de 2013 (recordar as primaveras que destruíram os países árabes do norte da África e do Oriente Médio, escapando os aliados Arábia Saudita, Kuwait, Catar) e com a Lava Jato (lembrar as "Lava Jato" no Equador, na Argentina, no Peru, na África do Sul e na Guiné Equatorial).
Bastam estes exemplos para ver que nada há de nacional brasileiro, mas a articulada e internacional investida contra governos e países que não se submeteram à banca. Vejam-se também os políticos favoráveis ao Brexit e a posições nacionalistas na Europa. Como diz o competente jornalista Beto Almeida, "desconheço teorias conspiratórias, mas sempre encontrei práticas conspiratórias".
Corrupção
A corrupção é velha e conhecida imputação, no Brasil e no mundo, a políticos e partidos que lutam pela maioria desfavorecida, que se insurgem contra os poderes dominantes. Assim foi com Getúlio Vargas, com Juscelino Kubitschek, com João Goulart, com Lula. Só escaparam Médici e Geisel pois, além da política nacionalista e não dirigida diretamente aos pobres, seriam carimbados como torturadores e assassinos.
A colonizada elite brasileira, escravista e rentista, aproveitou, com apoio do juridicismo ianque, para criminalizar o partido que a vinha derrotando em eleições sucessivas para o executivo nacional.
Criou-se, então, o mito da corrupção petista embora a maioria dos políticos envolvidos em casos de corrupção fossem do PP, do PSD, do PSDB e do DEM. E, embora seja impossível haver corrupção sem que haja envolvimento dos bancos, nenhum foi sequer citado nas investigações. Um estranho e misterioso fenômeno que movimenta milhões de reais, de dólares, no Brasil e no exterior, à margem da participação dos bancos!
O uso político da corrupção já deveria ser do conhecimento de todos se houvesse um mínimo de racionalidade ou um pouco menos de emotividade no acompanhamento dos fatos e personagens políticos.
Violência
Há violência nos tráficos de droga, de armas, da inominável mercantilização de pessoas e órgão humanos. E a banca fatura todos estes e muitos outros crimes execráveis.
Para que não seja uma afirmação vã, recorro-me dos dados do FMI. Na década 1990/2000, a primeira em que a banca controlou as finanças então desreguladas, a economia cresceu 1,5 vezes, malgrado a recessão industrial. Compare-se com os 2,1 dos anos 1980 a 2000. Não é difícil concluir que a banca absorveu enormes quantidade de valores ilicitamente obtidos e acumulados em  ações contra a humanidade.
Com sua amoralidade, a banca alia-se à esquerda e à direita, aos crimes e às religiões. É um fator desestabilizador das sociedades.
No Brasil a violência tem origem antiga, na escravização e morte de índios, na importação de africanos para o trabalho escravo e mesmo na forma como se deu a "libertação dos escravos", lançados à própria sorte.
A violência se insere na questão nacional. Na construção de um país que dê garantias aos direitos, às pessoas e às instituições e patrimônios. Vivemos, principalmente com o golpe de 2016, uma demolição, um desmonte das instituições criadas pela Constituição de 1988.
Pode-se afirmar que se vive, atualmente, mais do que em qualquer outra época, inclusive dos regimes autoritários, com a insegurança jurídica no Brasil.
Não é questão de distribuição de armas - que fará, de uma fechada no trânsito, um homicídio - nem da violência policial, conhecida por negros e pobres, e os que de tão pobres viram negros.
É, antes de tudo, uma questão nacional, da reestruturação do Estado, em moldes brasileiros, com as culturas e soluções nacionais, com os recursos por todos entendidos e capazes de serem aplicados, que dê ao povo, de todas as raças e economias, segurança e confiança no Estado.
Próximos Passos
Tenho para mim que qualquer resultado deste próximo segundo turno causará enorme decepção aos brasileiros.
Nos limites nacionais por Congresso e Assembleias eleitos em clima de ódio e desforra, excluindo as vozes da ponderação e do acordo, e sem projeto para o País. Será tomado por um novo centrão, ávido de mostrar poder e de enriquecer num sistema institucional carcomido.
Na área internacional pela crise que tornará as de 1929 e de 2008 "marolinhas".
Examinem os analistas que estão vendo a construção desta crise desde 2010, como os franceses signatários do "Manifeste des Économistes Atterrés" e os economistas do Fundo Monetário Internacional (FMI). Este organismo acaba de divulgar que a dívida global bateu, em setembro de 2018, novo recorde - US$ 182 trilhões - 60% maior do que a de 2007.
Em abril de 2016, escrevi "Haverá crise em 2016?", onde após discorrer sobre as crises da Era da Banca, previa que esta próxima teria na Europa seu epicentro. Em análises anteriores, supus que o "think tank" da banca temia que esta crise, pelas dimensões e alcance nas principais moedas do ocidente - euro, libra inglesa, franco suíço e dólar estadunidense - mais do que um tsunami financeiro e econômico causasse prejuízo à civilização ocidental. Ou seja, o fluxo civilizatório, após mais de seis séculos, mudaria o sentido de ocidente para oriente para oriente-ocidente.
A presença econômica e cultural, que já se observa, será mais forte, mais intensa e, provavelmente, como anteviu Monteiro Lobato, em "O Presidente Negro", trocaremos o "american way of life" por um "asian mood".
Que importância terá esta crise para nossa Pátria?
Defesa Nacional
Desde o fim dos governos militares, em especial com os do PSDB, o Brasil abandonou qualquer estratégia de construção de país soberano. Salvo algumas ações dos governos de Lula e Dilma, as Forças Armadas foram alijadas do projeto de desenvolvimento nacional. Grave erro. Os Estados Unidos da América (EUA), no período de predominância do capitalismo industrial, desenvolveram o complexo industrial-militar, que sobrevive em algumas áreas.
Mas fortaleceu, com o domínio da banca, a mais importante tecnologia deste século: da informação.
Esta tecnologia, com início antes da II Grande Guerra, é indispensável não apenas na área das transferências de valores monetários, como na segurança nacional e dos centros urbanos e zonas rurais, com os drones, por exemplo.
O Presidente Geisel tentou dar independência tecnológica ao País com investimentos públicos e incentivos à iniciativa privada. Cobra e Itautec são exemplos que foram demolidos pela onda neoliberal que destruiu boa parte de nossos investimentos em tecnologia e engenharia.
A ausência de um projeto de soberania, de reconstrução nacional por todos os candidatos, como já mencionamos, inclusive nestes que disputam agora a Presidência, encontrará um País desarmado diante da crise e da eventual, mas não pequena, alteração nos padrões de relacionamentos internacionais.
Sem vocação de Cassandra, receoso da Pátria em que viverão meus netos e minha filha, que busco sensibilizar os novos eleitos para se debruçarem sobre as questões nacionais, deixando os fake fatos da banca de lado.
Pedro Augusto Pinho, avô, administrador aposentado.

Brasil: Carta aberta do sociólogo Manuel Castells aos intelectuais do mundo.

Amigos intelectuais comprometidos com a democracia:

O Brasil está em perigo. E, com o Brasil, o mundo. Porque após a eleição de Trump, a tomada do poder por um Governo neofascista na Itália e a ascensão do neonazismo na Europa, o Brasil pode eleger um presidente fascista, defensor da ditadura militar, misógino, sexista, racista e xenófobo, que obteve 46% dos votos válidos no primeiro turno das eleições presidenciais. Não importa quem seja seu oponente. Fernando Haddad, a única alternativa possível, é um acadêmico respeitável e moderado, candidato do PT, um partido hoje desprestigiado por ter participado da corrupção generalizada do sistema político brasileiro.



Mas a questão não é o PT, e sim uma presidência de um Bolsonaro capaz de dizer a uma deputada, em público, que “não merecia ser estuprada por ele”. Ou que o problema da ditadura não foi tortura, e sim que não tenha matado mais em vez de torturar. Em tal situação, nenhum intelectual, nenhum democrata, nenhuma pessoa responsável no mundo em que vivemos pode permanecer indiferente. Não represento ninguém além de mim mesmo. Não apoio nenhum partido. Simplesmente acredito que seja um caso de defesa da humanidade, porque se o Brasil, o país decisivo da América Latina, cair nas mãos deste desprezível e perigoso personagem e dos poderes fáticos que o apoiam, os irmãos Koch entre outros, teremos nos precipitado ainda mais na desintegração da ordem moral e social do planeta a qual estamos presenciando.

Por isso escrevo a todos vocês, àqueles que conheço e aos que gostaria de conhecer. Não para que subscrevam esta carta como se fosse um manifesto aos ditames dos políticos. E sim para pedir que cada um torne pública e, em termos pessoais, sua petição para uma participação ativa no segundo turno das eleições presidenciais em 28 de outubro, e nosso apoio contra o voto em Bolsonaro, argumentando, segundo a opinião de cada um, e divulgando sua carta por meio de seus canais pessoais, redes sociais, meios de comunicação, contatos políticos, qualquer formato que transmita nosso protesto contra a eleição do fascismo no Brasil. Muitos de nós temos contatos no Brasil, ou temos contatos que têm contatos. Contatemo-los. Uma mensagem por WhatsApp é suficiente ou uma chamada telefônica pessoal.

Não precisamos de uma hashtag. Somos pessoas, milhares, potencialmente falando para milhões, no mundo e no Brasil. E, como ao longo de nossa vida adquirimos, com nossa luta e integridade, uma certa autoridade moral, vamos utilizá-la neste momento antes que seja tarde demais. Farei isso, já estou fazendo. E simplesmente rogo para que cada um faça o que puder.



Muito obrigado a Mídia Ninja 
Fonte: https://elpais.com/elpais/2018/10/10/opinion/1539160088_843725.html
Data de publicação do artigo original: 10/10/2018
URL deste artigo: http://www.tlaxcala-int.org/article.asp?reference=24301 

sábado, 13 de outubro de 2018

Eleições 2018. O plano econômico de Jair Bolsonaro, por Alexandre Andrada [*].

Ler o programa de governo de Jair Bolsonaro, intitulado O Caminho da Prosperidade , é aventurar-se pela cabeça do candidato e de sua equipe. E esse é o lado ruim.

Assusta que um candidato apresente um projeto tão pífio para uma campanha presidencial. Assusta que esse candidato seja o atual líder nas pesquisas de opinião [NR] . Bolsonaro é uma ameaça não só para nossa democracia, mas também para nosso desenvolvimento econômico e para os nossos frágeis avanços sociais.

Vamos ao que interessa: a economia. O documento começa afirmando que a área será liderada por duas instituições: o Banco Central e o Ministério da Economia. Esse último seria resultado da junção dos ministérios da Fazenda, do Planejamento e da Indústria & Comércio, além da Secretaria Executiva do Programa de Parcerias de Investimentos. As instituições financeiras federais, diz o documento, também estarão subordinadas ao novo Ministério.

Não é uma novidade. O Brasil já teve um Ministério da Economia resultante da junção dessas mesmas pastas. A ideia de Bolsonaro nada mais é que um plágio do que foi feito por Fernando Collor de Mello durante seu breve governo (1990-1992). A ideia, tanto lá em 1990 quanto hoje em 2018, é de sinalizar para o público que o governo é sério, austero, evita o desperdício.

O resultado prático, porém, pode ser negativo.

Assim como Collor entregou poderes excessivos para uma economista sem qualquer experiência na alta burocracia federal (no caso, Zélia Cardoso de Melo), Bolsonaro promete fazer algo similar, dotando Paulo Guedes de superpoderes. Responsável pelo Plano Collor, Zélia confiscou o dinheiro da poupança e da conta corrente dos brasileiros, provocando uma grave crise econômica. E falhou no combate à hiperinflação. 


Paulo Guedes é confiável e capaz de gerenciar tão amplo espectro da administração pública? É provável que não.

Pérsio Arida, principal economista da equipe do tucano Geraldo Alckmin, usualmente diplomático, recentementeclassificou Guedes como "mitômano" e afirmou: "Ele nunca produziu um artigo de relevo. Nunca dedicou um minuto à vida pública, não faz ideia das dificuldades".

Arida, goste-se ou não de suas ideias, é um acadêmico de peso e foi um dos elaboradores intelectuais do que viria a ser o Plano Real. Também ocupou diversos cargos na burocracia federal, chegando à presidência do Banco Central e do BNDES.

Os outros economistas por trás dos principais candidatos também têm experiência prática: Mauro Benevides, coordenador do projeto econômico de Ciro Gomes, além de acadêmico, tem mais de 20 anos de experiência como Secretário de Fazenda no Ceará. Na campanha está outro professor da Universidade Federal do Ceará, Flávio Ataliba, reconhecidamente um grande estudioso da questão previdenciária no país. Marina Silva conta com a colaboração de nomes como André Lara Resende e Ricardo Paes de Barros , dois pesos-pesados da teoria e da política econômica nacional há décadas.

Fernando Haddad (PT) tem na sua retaguarda gente como Nelson Barbosa , cuja experiência como ministro do Planejamento e da Fazenda são importantes, além de ter começado a manter conversas com economistas de alto nível e críticos de seu partido, como Samuel Pessoa e Marcos Lisboa (que ocupou cargo de relevo no Ministério da Fazenda na gestão Palocci).

O superministro de Bolsonaro, Paulo Guedes, por outro lado, ainda que seja portador de um vistoso título de PhD pela Universidade de Chicago, jamais desempenhou uma função de relevo na burocracia federal. Pior ainda, sequer dedicou tempo e recursos para a elaboração de um plano – isto é, de um conjunto claro e factível de medidas – para sanear a economia brasileira.

Paulo Guedes, pelo visto, tem consciência de seu despreparo para tal função. Talvez por isso mesmo tenha fugidodo debate com os economistas das demais candidaturas, realizado recentemente pela TV Cultura.

Quando tenta ir além de chavões pavorosos e sem significado algum – como "o liberalismo reduz a inflação" –, o resultado é sofrível e risível.

A campanha de Bolsonaro fala, por exemplo, em zerar o déficit primário – o prejuízo nas contas públicas – em 2019 e gerar um superávit no ano seguinte. Ou seja: Em 2017, o déficit primário foi de R$ 124 bilhões. Para 2018, a previsão é que ele chegue a quase R$ 150 bilhões. Isso é muito preocupante.

Como Paulo Guedes fará isso é uma gigantesca incógnita. A única pista é quando ele diz: "Esse processo de redução de dívida será reforçado com a realização de ativos públicos." Em outras palavras, venda de estatais e privatizações.

Essa é uma afirmação que faz transparecer todo o despreparo da equipe de econômica de Bolsonaro.

Qualquer cidadão brasileiro alfabetizado sabe que, após quase 40 anos de debates em torno da necessidade de privatizações no Brasil (algo que data pelo menos desde o governo Sarney), em apenas um ano de mandato (supondo que ele seja democrático) não é possível privatizar sequer o cafezinho servido nas repartições. Que dirá uma estoque de ativos capaz de gerar caixa da ordem de R$ 150 bilhões. Para se ter uma ideia,; a venda de 80% da Embraer , em julho, rendeu apenas 10% desse valor – R$ 15 bilhões.

Trata-se de uma mistura assustadora de inocência e ignorância.

Mas o plano é ainda mais ousado. Fala-se em "reduzir em 20% o volume da dívida por meio de privatizações, concessões, venda de propriedades imobiliárias da União e devolução de recursos em instituições financeiras oficiais que hoje são utilizados sem um benefício claro à população brasileira."

Pois bem: a dívida pública brasileira é de R$ 3,7 trilhões. Os 20% descritos pelo plano equivalem a R$ 740 bilhões de reais – o dobro do valor da Petrobrás , que costuma ocupar o posto de maior empresa do Brasil, para se ter uma ideia.

Não há possibilidade de se fazer um ajuste de R$ 150 bilhões no espaço de um ano através da venda de ativos da União. Então, como último e mais óbvio recurso, só caberá ao governo Bolsonaro (toc toc toc na madeira) reduzir gastos.

Se assim o fizer, provavelmente produzirá a maior recessão de nossa história.

Em uma economia mal saída da recessão como a nossa, um ajuste fiscal tão abrupto e de tal magnitude, implicaria numa derrubada ainda maior nos níveis de consumo e investimentos, públicos e privados, componentes fundamentais do PIB.

O impacto para os mais pobres 

Em relação à questão tributária, o programa de Guedes-Bolsonaro fala em "simplificação e unificação de tributos federais eliminando distorções e aumentando a eficiência da arrecadação". Um dos membros da equipe econômica de Bolsonaro é o economista Adolfo Sachsida, importante e respeitado pesquisador do IPEA.

Em seu blog pessoal , em agosto de 2017, Sachsida defendeu uma proposta para lá de exótica para a questão dos impostos. Afirma ser favorável a um sistema tributário no qual todos os indivíduos, desde Amoêdo com seus quase R$ 500 milhões, passando por qualquer Dona Maria que ganha um salário mínimo, paguem uma mesma quantia fixa. O valor desse imposto fixo seria de R$ 1,2 mil por mês. Trata-se de uma insanidade tributária completa. Na contramão inclusive do que pregavam liberais com juízo, como Adam Smith, que, em tese, estariam ligados a este novo momento de Bolsonaro. Mas, no caso do candidato, a máscara de liberal é recente e feita sob medida para agradar o "mercado".

Outro famoso economista da equipe de Bolsonaro é Marcos Cintra.

Colunista da Folha de S.Paulo durante décadas, gastou muita tinta em defesa da implementação de um imposto único no Brasil. Sua ideia é criar um tributo tal qual a antiga CPMF, incidente sobre movimentação financeira, com alíquota de 2,81%. O próprio Paulo Guedes falou sobre esse novo imposto nesta semana .

Além dos problemas microeconômicos gerados por esse tipo de imposto, como o estímulo ao uso de dinheiro vivo para fugir da tributação e sua incidência "em cascata" (isto é, incide sobre várias etapas na circulação de um produto), ele também cria uma nova penalização para os mais pobres, que acabam pagando a mesma taxa do que a parcela mais rica da população.

Não é justo, nem moral, que os cidadãos paguem todos uma mesma alíquota de imposto. Imagine que o governo fixe um imposto único de 10% sobre os rendimentos de todos os cidadãos.

No caso de uma pessoa que ganha um salário mínimo – de R$ 1.000, para simplificar a conta – isso significa entregar R$ 100 todos os meses ao governo. Dinheiro que fará falta para comprar um botijão de gás, comprar um quilo de carne, uma roupa nova e outras necessidades básicas.

Agora imagine a pessoa que ganha R$ 10 mil por mês. Nesse caso, os R$ 1.000 entregues ao governo, ainda que façam falta, não comprometerão a subsistência do indivíduo como no primeiro caso. Essa pessoa já pagou aluguel, já se alimentou, já se vestiu de modo satisfatório com os R$ 9 mil que lhe restam.

O plano da equipe econômica de Bolsonaro fala ainda na criação de um imposto de renda negativo. Essa ideia, tal qual a implementação de um imposto fixo como proposto por Sachsida, é curiosidade presente apenas nas páginas dos manuais de Economia. Nenhum país do mundo jamais implementou tais medidas.

Bolsonaro ainda propõe a criação de uma carteira de trabalho "verde e amarela", alternativa à carteira azul tradicional. Nessa nova carteira, cuja aderência seria voluntária, "o contrato individual prevalece sobre a CLT". O documento alerta que seriam preservados os "direitos constitucionais" – ressalva de pouco valor, já que o general Mourão, vice da chapa, parece andar flertando com a ideia de escrever uma nova Constituição .

No atual ambiente de alto desemprego, o poder de barganha dos trabalhadores fica severamente reduzido. Por isso, temos razões para acreditar que antes de ser a escolha do empregado, tal carteira será um imposição dos patrões, notadamente para aqueles trabalhadores mais pobres, menos qualificados e mais vulneráveis.

Ainda que haja muita informalidade no Brasil e que existam argumentos em favor da modernização da legislação trabalhista, é bom lembrar que o motor fundamental da criação de novos empregos não é a facilidade de contratar e demitir, mas sim o estado geral da economia. A menor taxa de desemprego registrada na região metropolitana de São Paulo desde 1994, foi registrada em dezembro de 2011, quando chegou a 6,9%. Em junho deste ano, o valor registrado foi de 14,20%. 


São muitas as propostas estranhas ou inviáveis de Bolsonaro para a área econômica. Não se pode sequer chamar o documento de plano de governo, ou coisa que o valha. Trata-se de um apanhado de generalidades, de citações superficiais de documentos de terceiros, sem uma gota de suor ou esforço próprio de sua equipe. 

Os "formuladores" (permitam a liberdade poética) do plano podem afirmar que nossas interpretações estão equivocadas, que eles queriam dizer outra coisa. É possível. O problema é que as propostas são tão rasas, tão supérfluas, tão mal elaboradas, desacompanhadas de quaisquer explicações ou números, que só podemos imaginar que se trata de um trabalho feito às pressas, sem qualquer preocupação com a seriedade da tarefa de governar o Brasil.

Causa surpresa que o "mercado" brasileiro, após o fracasso da candidatura de Alckmin (PSDB) e Meirelles (MDB), tenha abraçado Bolsonaro como um candidato sério, viável e preferível às demais alternativas. De novo: um governo Bolsonaro implica em um risco grave para nossas instituições políticas e econômicas. Isso fica evidente para qualquer analista que se preste a estudar seus atos, palavras e propostas. Não por acaso, a revistaThe Economist , que nem o mais tresloucado apoiador de Bolsonaro ousaria classificar como "esquerdista", "petista" ou "bolivariana", o classificou como "uma ameaça", afirmando que ele seria "um presidente desastroso".

Oxalá que o Brasil não embarque nesse pesadelo. 

 20/Setembro/2018


[NR] Este artigo é anterior às eleições de 7 de Outubro. 

[*] Licenciado em economia pela Universidade Federal de Pernambuco, mestre em economia política pela PUC-SP e doutorado em economia pela USP. É professor do Departamento de Economia da UnB desde 2012,   alexandreandrada@gmail.com 


Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .