Por Nathalia Foditsch.
Quando
se fala em consolidação da democracia no Brasil, nenhum fator teve
tanto impacto quanto os avanços em tecnologia da informação neste início
de século XXI.
Seja em função do aumento da liberdade de expressão por
meio de blogs, redes sociais, ou sítios eletrônicos, seja pela
maior facilidade de acesso a informações públicas, por meio do
surgimento de novas plataformas de participação popular, ou ainda pela
entrega de serviços públicos eletrônicos. O uso de novas tecnologias
como instrumentos de cidadania é uma tendência irreversível, aproximando
cada vez mais a socidedade de seus governantes.
O
Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) publicou recentemente os
resultados da pesquisa “TIC Domicílios e Empresas 2010” sobre o Uso das
Tecnologias de Informação e Comunicação no Brasil.
De acordo com a pesquisa em sua sexta edição, 41% da população
brasileira era usuária de Internet, sendo que 27% dos domicílios tem
acesso a Internet.
Ainda de acordo com a pesquisa, em 2010, 26% da
população da área urbana com 16 anos ou mais fez uso de pelo menos um
serviço de governo eletrônico nos doze meses que antecederam a pesquisa.
A pesquisa apresentou ainda os principais motivos que inibem um uso
mais intenso dos serviços públicos na rede e revelou que, por questões
culturais, 46% dos brasileiros ainda preferem o atendimento presencial
nas agências de governo.
Governo
Eletrônico, por sua vez, é o nome dados às iniciativas governamentais
que utilizam tecnologias de informação e comunicação para democratizar o
acesso à informação, promover discussões e dinamizar a prestação de
serviços públicos. O Brasil conta com uma política de Governo
Eletrônico, coordenada pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e
Gestão, e que possui três áreas fundamentais: serviços ao cidadão,
melhoria da sua própria gestão interna, e integração com parceiros e
fornecedores.
O
Projeto de Lei Complementar 41/2010, aprovado no Senado no mês passado e
sancionado pela Presidenta Dilma Rouseff na última sexta-feira, dia 18,
representa um avanço para o Brasil no que diz respeito à concretização
de marcos relacionada ao acesso às informações públicas e também ao
governo eletrônico.
A nova Lei regulamenta o direito de acesso às informações mantidas por órgãos públicos, garantido pela Contituição Federal[1],e entrará em vigor decorridos 180 dias da sua publicação oficial[i]. De acordo com a Presidenta: “O que era lei de sigilo se torna lei de acesso à informação”[2]. Depois de um longo e árduo caminho, o Brasil agora conta oficialmente com uma Lei de Acesso à Informação!( Veja artigo sobre o tema publicado em 5 de outubro).
A
Lei prevê a adoção do princípio da publicidade máxima em função do qual
a publicidade de informações públicas é preceito geral e o sigilo,
exceção. Por isso, agora mais do que nunca, os governos serão obrigados a
disponibilizar informações sobre as quais têm controle, pois deverão
tornar acessíveis informações de interesse público e também responder
aos pedidos de informação.
Ferramentas tecnológicas e a Internet serão
grandes aliadas na implementação da nova realidade, pois grandes
quantidades de informação serão disponibilizadas em sítios eletrônicos
oficiais e em diferentes formatos.
Além
disso, a participação popular deverá aumentar por meio das
contribuições às audiências e consultas públicas via Internet. Ademais,
os órgãos públicos deverão criar serviços de informações ao cidadão.
Para solicitar o acesso a informações ou documentos públicos, o
requerente precisará apenas se identificar e especificar a informação
requerida, não sendo necessário justificar o pedido. A solicitação
deverá ser atendida imediatamente ou em vinte dias, prorrogáveis por
mais dez dias. A Controladoria-Geral da União (CGU) será responsável
pelos recursos a pedidos de informação denegados.
Joseph
E. Stiglitz, Prêmio Nobel da economia em 2001, mostrou empiricamente
que a assimetria da informação entre os atores faz com que os mercados
sejam imperfeitos. Assim, mesmo que as informações sejam acessíveis a
todos, se as condições de processar, interpretar e utilizar as
informações não sejam as mesmas para todos, surge o que na economia é
chamada de falha de mercado.
Assimetria de informação não é apenas não
ter o acesso à informação, mas não conseguir manuseá-la, usá-la,
compará-la. No caso da Lei de Acesso à Informação, estamos falando de
informações sob o controle da Administração Pública e não de atores
privados, mas o princípio é o mesmo: existirá assimetria enquanto as
informações não estiverem acessíveis.
O Plano de Ação do Governo Brasileiro Parceria para Governo Aberto (Open Government Partnership
– OGP), também sob coordenação pela CGU, estabeleceu diretrizes que
pretendem institucionalizar a promoção da transparência alinhadas com as
melhores práticas e padrões internacionais. Entre os vários
compromissos previstos pelo plano estão a reestruturação do Portal da Transparência,
por meio do qual é possível fazer consultas sobre valores gastos e
recebidos pelo Governo Federal, bem como a criação da estrutura e
definição do processo para armazenagem de dados em banco de dados único
que “integrará os dados do portal e das páginas de transparência pública
e possibilitará o trabalho com grandes volumes de dados de maneira mais
dinâmica e integrada”.
A Infraestrutura Nacional de Dados Abertos (INDA) é outra importante iniciativa que visa a disseminar e compartilhar os dados
e informações públicas no modelo de dados abertos, e que segue o
disposto nos padrões de interoperabilidade de governo eletrônico (e-PING). Nos Estados Unidos, o data.gov permite até a criação de aplicativos e inovações pelos usuários, por meio da utilização dos dados disponibilizados. Já o data.gov.uk
desenvolveu uma série de programas que permitem que a população
controle desde a qualidade de água até os índices de criminalidade de
diversas áreas do Reino Unido.
Outra forma de aumento da participação democrática por meio da Internet dá-se pelos processos de consultas públicas, o chamado “e-rulemaking”, que já é uma realidade no Brasil. As consultas públicas pela internet foram usadas tanto na reforma da Lei de Direitos Autorais, quanto na elaboração do marco civil da Internet. A Camara dos Deputados lancou a versão beta do e-Democracia,
um portal de interação da Câmara dos Deputados com o objetivo de
promover e incentivar a participação da sociedade no processo de
elaboração de leis.
Nos
Estados Unidos, além de consultas públicas pela Internet para a
elaboração de normas pelas agências federais, existem interessantes
iniciativas do governo, dentre as quais destaca-se o Peer to Patent,
que também está sendo também implementado no Reino Unido. Trata-se de
iniciativa do Escritório de Marcas e Patentes dos Estados Unidos (USPTO)
que tem como objetivo aprovar patentes de forma mais eficiente e evitar
litígios desnecessários por meio da abertura do processo de exame de
patentes para a participação pública. O mecanismo permite ao público
suprir o USPTO com informações relevantes para avaliação dos pedidos de
patente pendentes.
Como
podemos perceber, a tecnologia parece aproximar cada vez mais o
“kratos” do “demos”, reduzindo a distância entre poder e povo de uma
forma que os atenienses jamais poderiam imaginar.
Assim como também não
poderiam prever a invenção do Ônibus Hacker,
idealizado pelos membros da Transparência Hacker com o objetivo de
percorrer municípios brasileiros, promovendo os dados governamentais
abertos, a coleta de assinaturas para proposição de leis de iniciativa
popular e a utilização da tecnologia de forma criativa para fins de
interesse da sociedade. Vale a pena conferir!
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