sexta-feira, 25 de novembro de 2011

A Vingança dos nerds: como o acesso à informação e à Internet estão revolucionando o exercício da cidadania

Por Nathalia Foditsch.

Quando se fala em consolidação da democracia no Brasil, nenhum fator teve tanto impacto quanto os avanços em tecnologia da informação neste início de século XXI. 

Seja em função do aumento da liberdade de expressão por meio de blogs, redes sociais, ou sítios eletrônicos, seja pela maior facilidade de acesso a informações públicas, por meio do surgimento de novas plataformas de participação popular, ou ainda pela entrega de serviços públicos eletrônicos. O uso de novas tecnologias como instrumentos de cidadania é uma tendência irreversível, aproximando cada vez mais a socidedade de seus governantes.

O Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) publicou recentemente os resultados da pesquisa “TIC Domicílios e Empresas 2010” sobre o Uso das Tecnologias de Informação e Comunicação no Brasil. De acordo com a pesquisa em sua sexta edição, 41% da população brasileira era usuária de Internet, sendo que 27% dos domicílios tem acesso a Internet. 

Ainda de acordo com a pesquisa, em 2010, 26% da população da área urbana com 16 anos ou mais fez uso de pelo menos um serviço de governo eletrônico nos doze meses que antecederam a pesquisa. A pesquisa apresentou ainda os principais motivos que inibem um uso mais intenso dos serviços públicos na rede e revelou que, por questões culturais, 46% dos brasileiros ainda preferem o atendimento presencial nas agências de governo.

Governo Eletrônico, por sua vez, é o nome dados às iniciativas governamentais que utilizam tecnologias de informação e comunicação para democratizar o acesso à informação, promover discussões e dinamizar a prestação de serviços públicos. O Brasil conta com uma política de Governo Eletrônico, coordenada pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, e que possui três áreas fundamentais: serviços ao cidadão, melhoria da sua própria gestão interna, e integração com parceiros e fornecedores. 

O Projeto de Lei Complementar 41/2010, aprovado no Senado no mês passado e sancionado pela Presidenta Dilma Rouseff na última sexta-feira, dia 18, representa um avanço para o Brasil no que diz respeito à concretização de marcos relacionada ao acesso às informações públicas e também ao governo eletrônico.  

A nova Lei regulamenta o direito de acesso às informações mantidas por órgãos públicos, garantido pela Contituição Federal[1],e entrará em vigor decorridos 180 dias da sua publicação oficial[i]. De acordo com a Presidenta: “O que era lei de sigilo se torna lei de acesso à informação”[2]. Depois de um longo e árduo caminho, o Brasil agora conta oficialmente com uma Lei de Acesso à Informação!( Veja artigo sobre o tema publicado em 5 de outubro).

A Lei prevê a adoção do princípio da publicidade máxima em função do qual a publicidade de informações públicas é preceito geral e o sigilo, exceção. Por isso, agora mais do que nunca, os governos serão obrigados a disponibilizar informações sobre as quais têm controle, pois deverão tornar acessíveis informações de interesse público e também responder aos pedidos de informação.

Ferramentas tecnológicas e a Internet serão grandes aliadas na implementação da nova realidade, pois grandes quantidades de informação serão disponibilizadas em sítios eletrônicos oficiais e em diferentes formatos.
Além disso, a participação popular deverá aumentar por meio das contribuições às audiências e consultas públicas via Internet. Ademais, os órgãos públicos deverão criar serviços de informações ao cidadão. 
Para solicitar o acesso a informações ou documentos públicos, o requerente precisará apenas se identificar e especificar a informação requerida, não sendo necessário justificar o pedido. A solicitação deverá ser atendida imediatamente ou em vinte dias, prorrogáveis por mais dez dias. A Controladoria-Geral da União (CGU) será responsável pelos recursos a pedidos de informação denegados.
Joseph E. Stiglitz, Prêmio Nobel da economia em 2001, mostrou empiricamente que a assimetria da informação entre os atores faz com que os mercados sejam imperfeitos. Assim, mesmo que as informações sejam acessíveis a todos, se as condições de processar, interpretar e utilizar as informações não sejam as mesmas para todos, surge o que na economia é chamada de falha de mercado. 

Assimetria de informação não é apenas não ter o acesso à informação, mas não conseguir manuseá-la, usá-la, compará-la. No caso da Lei de Acesso à Informação, estamos falando de informações sob o controle da Administração Pública e não de atores privados, mas o princípio é o mesmo: existirá assimetria enquanto as informações não estiverem acessíveis. 

O Plano de Ação do Governo Brasileiro Parceria para Governo Aberto (Open Government Partnership – OGP), também sob coordenação pela CGU, estabeleceu diretrizes que pretendem institucionalizar a promoção da transparência alinhadas com as melhores práticas e padrões internacionais. Entre os vários compromissos previstos pelo plano estão a reestruturação do Portal da Transparência, por meio do qual é possível fazer consultas sobre valores gastos e recebidos pelo Governo Federal, bem como a criação da estrutura e definição do processo para armazenagem de dados em banco de dados único que “integrará os dados do portal e das páginas de transparência pública e possibilitará o trabalho com grandes volumes de dados de maneira mais dinâmica e integrada”. 

A Infraestrutura Nacional de Dados Abertos (INDA) é outra importante iniciativa que visa a disseminar e compartilhar os dados e informações públicas no modelo de dados abertos, e que segue o disposto nos padrões de interoperabilidade de governo eletrônico (e-PING). Nos Estados Unidos, o data.gov permite até a criação de aplicativos e inovações pelos usuários, por meio da utilização dos dados disponibilizados. Já o data.gov.uk desenvolveu uma série de programas que permitem que a população controle desde a qualidade de água até os índices de criminalidade de diversas áreas do Reino Unido.

Outra forma de aumento da participação democrática por meio da Internet dá-se pelos processos de consultas públicas, o chamado “e-rulemaking”, que já é uma realidade no Brasil. As consultas públicas pela internet foram usadas tanto na reforma da Lei de Direitos Autorais, quanto na elaboração do marco civil da Internet. A Camara dos Deputados lancou a versão beta do e-Democracia, um portal de interação da Câmara dos Deputados com o objetivo de promover e incentivar a participação da sociedade no processo de elaboração de leis.

Nos Estados Unidos, além de consultas públicas pela Internet para a elaboração de normas pelas agências federais, existem interessantes iniciativas do governo, dentre as quais destaca-se o Peer to Patent, que também está sendo também implementado no Reino Unido. Trata-se de iniciativa do Escritório de Marcas e Patentes dos Estados Unidos (USPTO) que tem como objetivo aprovar patentes de forma mais eficiente e evitar litígios desnecessários por meio da abertura do processo de exame de patentes para a participação pública. O mecanismo permite ao público suprir o USPTO com informações relevantes para avaliação dos pedidos de patente pendentes.

Como podemos perceber, a tecnologia parece aproximar cada vez mais o “kratos” do “demos”, reduzindo a distância entre poder e povo de uma forma que os atenienses jamais poderiam imaginar. 

Assim como também não poderiam prever a invenção do Ônibus Hacker, idealizado pelos membros da Transparência Hacker com o objetivo de percorrer municípios brasileiros, promovendo os dados governamentais abertos, a coleta de assinaturas para proposição de leis de iniciativa popular e a utilização da tecnologia de forma criativa para fins de interesse da sociedade. Vale a pena conferir!

[1]Inciso XXXIII do art. 5º, inciso II do § 3º do art. 37 e pelo § 2º do art. 216 da Constituição Federal
[2]Discurso da presidenta Dilma Rousseffna cerimonia de sanção da Lei de Acesso à Informação. 


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