Amaury Ribeiro Jr. |
Publicado por luisnassif, sab, 10/12/2011 - 10:55
Autor: Luis Nassif
Fui ontem à coletiva do repórter Amaury Ribeiro Jr, sobre o livro que lançou.
Minha curiosidade maior era avaliar seu conhecimento dos mecanismos do
mercado financeiro e das estruturas de lavagem de dinheiro.
Amaury tem um jeito de delegado de polícia, fala alto, joga as ideias de
uma forma meio atrapalhada – embora o livro seja surpreendentemente
claro para a complexidade do tema. Mas conhece profundamente o assunto.
Na CPI dos Precatórios – que antecedeu a CPI do Banestado - passei um
mês levando tiro de alguns colegas de Brasília ao desnudar as operações
de esquenta-esfria dinheiro e a estratégia adotada por Paulo Maluf. Foi o
primeiro episódio jornalístico a desvendar o submundo das relações
políticas, mercado financeiro, crime organizado.
No começo entendi os tiros como ciumeira de colegas pela invasão do seu
território por jornalista de fora. Depois, me dei conta que havia um
esquema Maluf coordenando o espírito de manada, no qual embarcaram
colegas sem conhecimento mais aprofundado do tema.
Minhas colunas estão no livro “O jornalismo dos anos 90”, mostrando como
funcionavam as empresas offshore, o sistema de doleiros no Brasil, as
operações esquenta-esfria na BMF e na Bovespa, as jogadas com títulos
estaduais.
Repassei parte desse conhecimento ao meu amigo Walter Maierovitch,
quando começou a estudar esse imbricamento mercado-crimes financeiros e,
depois, na cerimônia de lançamento do Sisbin (Sistema Brasileiro de
Inteligência).
Mesmo assim, persistiu a dicotomia na cobertura: jornalistas de mercado
não entravam em temas policiais e jornalistas policiais não conheciam
temas financeiros. E a Polícia Federal e o Ministério Público ainda
tateavam esse caminho.
Aos poucos avançou-se nessa direção. A Sisbin significou um avanço
extraordinário na luta contra o crime organizado. E, no jornalismo,
Amaury Ribeiro Jr acabou sendo a melhor combinação de jornalismo
policial com conhecimento de mercado.
Quem o ouve falar, meio guturalmente, não percebe, de imediato, sua
argúcia e enorme conhecimento. Além de ter se tornado um especialista
nas manobras em paraísos fiscais, nos esquemas de esquentamento de
dinheiro, tem um enorme discernimento para entender as características
de cada personagem envolvido na trama.
Mapeou um conjunto de personagens que atuam juntos desde os anos 90,
girando em torno do poder e da influência de José Serra: Riolli,
Preciado, Ricardo Sergio, Verônica Serra, seu marido Alexandre Burgeois.
É uma ação continuada.
Entendeu bem como se montou o álibi Verônica Serra, uma mocinha
estreante em Internet, naquele fim dos anos 90, com baixíssimo
conhecimento sobre tendências, modelos de negócios, de repente
transformada, por matérias plantadas, na mais bem sucedida executiva da
Internet nacional.
Criou-se um personagem com toque de Midas, em um terreno onde os valores
são intangíveis (a Internet) para justificar seu processo de
enriquecimento.
Mas todo o dinheiro que produzia vinha do exterior, de
empresas offshore. Talvez o leitor leigo não entenda direito o significado desses esquemas
offshore em paraísos fiscais. São utilizados para internalizar dinheiro
de quem não quer que a origem seja rastreada. Nos anos 90, a grande
década da corrupção corporativa, foram utilizados tanto por grandes
corporações – como Citigroup, IBM – para operações de corrupção na
América Latina (achando que com as offshores seriam blindadas em seus
países), como por políticos para receber propinas, traficantes para
esquentar recursos ilícitos.
Ou seja, não há NENHUMA probabilidade de que o dinheiro que entrou pelas
contas de Verônica provenha de fontes legítimas, formalizadas, de
negócios legais.
Ao mesmo tempo, Amaury mostra como esse tipo de atuação de Serra o levou
a enveredar por terrenos muito mais pesados, os esquemas de
arapongagem, os esquemas na Internet (o livro não chega a abordar), os
assassinatos de reputação de adversários ou meros críticos. É um modo de
operação bastante tipificado na literatura criminal.
No fundo, o grande pacto de 2005 com a mídia visou dois objetivos para
Serra: um, que não alcançou, o de se tornar presidente da República; o
outro, que conseguiu, a blindagem.
O comprometimento da velha mídia com ele foi tão amplo, orgânico, que
ela acabou se enredando na própria armadilha. Não pode repercutir as
denúncias de corrupção contra Serra porque afetaria sua própria
credibilidade junto ao universo restrito de leitores que lêem jornais,
mas não chegam ainda à Internet.
Ao juntar todas as peças do quebra-cabeças e acrescentar documentos
relevantes, Amaury escancara a história recente do país. Fica claro
porque os jornais embarcaram de cabeça na defesa de Daniel Dantas,
Gilmar Mendes e outros personagens que os indispuseram com seus próprios
leitores. (Só não ficou claro porque o PT aceitou transformar a CPI do
Banestado em pizza. Quais os nomes petistas que estavam envolvidos nas
operações?)
E agora? Como justificar o enorme estardalhaço em torno do avião alugado
do Lupi (independentemente dos demais vícios do personagem) e esconder o
enriquecimento pessoal de um bi-candidato à presidência da República?
Mesmo não havendo repercussão na velha mídia, o estrago está feito.
Serra será gradativamente largado ao mar, como carga indesejada, aliás
da mesma forma que está ocorrendo com os jornalistas que fizeram parte
do seu esquema.
A CPI dos Precatórios
No PDF, o livro “O jornalismo dos anos 90”. A partir da página 147,
minhas colunas sobre a CPI dos Precatórios, onde já se revelava todo o
imenso esquema do crime organizado no país, os doleiros, a operação em
Foz do Iguaçu, as concessões do Banco Central etc.
A ironia da história é que, em determinado momento, consegui convencer o
banqueiro Fábio Nahoum – testa de ferro do Maluf – a passar informações
ao relator da CPI, senador Roberto Requião. Como testemunhas do
encontro, a repórter Mônica Bérgamo – que teve um comportamento
impecável quando Requião e alguns colegas de Brasília tentaram
desqualificar minhas revelações – e o então senador José Serra.
Não podia imaginar que um dos esquemas que operava na região era do próprio Serra.
Matéria copiada: http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/a-reportagem-investigativa-da-decada
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