Roosevelt Pinheiro/ABr. |
A prisão do bicheiro Carlos Augusto de Almeida Ramos, o Carlinhos Cachoeira,
aconteceu quase um ano depois de ter sido planejada.
Apesar disso, o
atraso de 11 meses entre o esperado e o realizado permitiu que fossem
incluídas mais provas de caráter financeiro, como extratos bancários,
cheques e declarações de imposto de renda, para fortalecer a denúncia.
Em março, 81 pessoas foram denunciadas pelo Ministério Público Federal
em Goiás. Cachoeira e seus principais operadores estão presos até hoje.
O atraso aconteceu por conta de uma discussão jurídica iniciada na
cidade goiana de Valparaíso, no entorno do Distrito Federal. Desde o
início, houve um grande cuidado dos policiais, procuradores e juízes
responsáveis pelas investigações e pelo processo quanto ao envolvimento
que se constatou de políticos e outras autoridades com foro
privilegiado. Os autos mostram que esses políticos e autoridades não
estavam especialmente envolvidos com o foco inicial da investigação, que
era a exploração ilegal de jogos de azar por parte da quadrilha de
Cachoeira.
Seu envolvimento supostamente acontecia em outros atos, como
fraudes em licitações e tráfico de influência. Já em 2007, os
responsáveis pela investigação esbarraram pela primeira vez em
políticos, na Operação Vegas. O cuidado que se tomou foi separar todos
os grampos e demais constatações que envolviam autoridades com foro
privilegiado do inquérito principal, e não se aprofundar sobre eles,
para não haver risco de invalidação das provas.
Tais informações seriam
remetidas ao procurador-geral da República para o envio aos foros
adequados. Como de fato se fez: Roberto Gurgel tinha conhecimento, por
exemplo, das informações sobre o senador Demóstenes Torres (sem
partido-GO) desde 2009.
A intenção inicial dos delegados da Polícia Federal era que a
Operação Monte Carlo fosse deflagrada no dia 23 de março de 2011. Em 16
de março do ano passado, a PF pediu a prisão de Cachoeira, de seus
principais operadores – Lenine Araújo, José Olímpio Queiroga, Idalberto
Matias de Araújo (o araponga conhecido como Dadá) e Gleyb Ferreira – e
de policiais que recebiam propinas para garantir a “segurança” da
jogatina na região do entorno de Brasília em vez de fechar os pontos de
máquinas caça-níqueis.
Os autos do processo mostram que o juiz José Augusto de Melo Silva,
da 1ª Vara Criminal de Valparaíso, cidade goiana próxima do Distirto
Federal, se preparava para decretar a prisão da quadrilha, mas teve que
recuar a contragosto. “A corrupção tomou conta de quase toda a força
pública policial na cidade de Valparaíso, não sendo demais se dizer que
grande parte dos policiais ali lotados fazem parte de uma força policial
particular”, escreveu o juiz, em despacho, naquela ocasião.
Anular investigação. Apesar disso, o magistrado, que acompanhava a investigação desde 2010, teve que remeter todos os autos para a Justiça Federal de Goiânia, fazendo o caso quase começar do zero. Por quê? Por que o Ministério Público da cidade fez um parecer sobre o pedido de prisão da PF no qual diz que o caso não deveria correr na cidade pelo simples fato de haver grampos telefônicos que mostravam a participação de um policial rodoviário federal no esquema.
Para os procuradores, isso fazia com que o
caso tivesse de ser remetido para a Justiça Federal. José de Melo Silva
discordou, mas, mesmo assim, fez o que os procuradores queriam. O juiz
temeu que, caso não seguisse a orientação dos procuradores, no futuro os
advogados de Cachoeira usassem o parecer para anular toda a
investigação policial.
“Após a manifestação ministerial, a defesa dos investigados poderá
arguir nulidade na manutenção do feito perante este juízo, (…) jogando
por terra todo o trabalho realizado até agora”, lamentou o juiz.
Temor. O parecer do Ministério Público que atrasou a prisão de Cachoeira foi
assinado por quatro promotores do Grupo de Combate ao Crime Organizado.
Eles assumiram o caso depois que duas promotoras que cuidavam do
inquérito em Valparaíso, Marivânia Feres e Claudine Abranches, se
declararam suspeitas para atuar na investigação por razões de “foro
íntimo”. Os grampos da Operação Monte Carlo mostram que a quadrilha de
Cachoeira temia a atuação de Marivânia exatamente porque ela trabalhava
na repressão aos jogos de azar na região. Não se sabe quais seriam os
motivos particulares que levaram a procuradora a deixar o caso.
Num dos áudios, Lenine Araújo, o “braço direito do bicheiro” contata
um servidor do fórum cooptado pela organização criminosa para saber
quando seriam as férias da promotora, porque acreditava que, na sua
ausência, ficariam facilitadas as atividades de Cachoeira. A reportagem
entrou em contato com Marivânia para esclarecer o caso, mas ela disse
que não diria nada além do que está nos autos.
Queixas. Num primeiro momento, o atraso nas prisões provocou indignação do
delegado Matheus Rodrigues, que presidia a investigação. Em ofício ao
juiz da 11ª Vara Federal, Paulo Augusto Moreira Lima, ele ressaltou sua
“preocupação de que as organizações criminosas se beneficiem de
entendimentos jurídicos minoritários (ou quase inexistentes)”. O
delegado reclamou ainda da situação do juiz da Vara de Valparaíso, que,
no seu entender, poderia ficar exposto em função do atraso. Segundo o
delegado, o juiz José Augusto trabalhava por “horas a fio” sem ajuda de
seus funcionários de cartório, já que havia funcionários corrompidos até
ao lado dele. “Não podemos deixar de comentar acerca da enorme
frustração de um magistrado estadual que, depois de trabalhar horas a
fio (…) [viu] questionadas todas as suas decisões”, protestou Matheus
Rodrigues.
Definido, porém, o atraso no final da operação, em 22 de março, em
meio às queixas, o delegado pediu ao juiz Paulo Lima para suspender o
pedido de prisão e fazer mais grampos nos investigados, além de
monitorar também as conversas dos delegados da PF e agentes da Polícia
Rodoviária Federal envolvidos.
Mas os procuradores da República em Goiás, Daniel Salgado, Léa Batista e Marcelo Ribeiro, entenderam ser preciso aumentar o conjunto de dados bancários da quadrilha. Incluíram ali a necessidade de quebrar o sigilo bancário e fiscal dos parentes e dos laranjas de Cachoeira, como sua ex-mulher Andréa Aprígio, e seu ex-cunhado Adriano Aprígio.
Os atrasos provocados pela discussão jurídica, no entanto, acabaram
ao final beneficiando o aprofundamento da investigação. Depois de
receber alguns dados bancários e fiscais, a polícia pediu mais
informações em agosto sobre outros investigados, solicitação autorizada
pela 11ª Vara Federal.
Tudo sobre o caso e a CPI do Cachoeira
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FONTE:http://congressoemfoco.uol.com.br/noticias/manchetes-anteriores/prisao-de-carlinhos-cachoeira-atrasou-um-ano/
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