Embora seja foco de atenção da imprensa da Colômbia há 
mais de uma semana, a suposta prática da "roleta sexual", na qual jovens
 participariam de jogos eróticos envolvendo relações grupais, ainda é 
algo sobre o que pouco se sabe com certeza. 
De acordo com o tom da cobertura sobre o assunto no 
país, a "roleta" teria se tornado moda entre jovens de várias cidades do
 país, a ponto de ter alarmado as autoridades. 
A maneira como o tema vem
 sendo tratado, no entanto, provavelmente diz mais a respeito aos 
temores da sociedade e à dinâmica dos meios de comunicação do que sobre 
os jovens colombianos.
Os relatos indicam que as regras do jogo incluem seguidas penetrações e colocam à prova a resistência dos homens.
A história teve início, sem dúvida, com um depoimento 
que parece ter sido tomado como verdade, sem questionamentos: o de uma 
menina de 14 anos que afirma ter engravidado após jogar a "roleta 
sexual". "Não pensei que poderia engravidar, porque não era muito tempo,
 era só um jogo", teria dito a menor ao ADN, um jornal gratuito que 
circula em Medellín.
No mesmo artigo, o jornal também divulgou declarações de
 uma funcionária da Secretaria de Saúde reconhecendo que, nos relatos de
 jovens grávidas, cada vez mais se fala de "relações sexuais grupais, 
que em sua maioria são indiscriminadas e sem a devida proteção".
A partir daí o assunto saiu de controle, porque os meios
 de comunicação colombianos não parecem interessados em determinar se o 
que está em questão são casos isolados ou uma prática generalizada, nem 
se este comportamento de risco sempre é de fato uma "roleta sexual".
Declarações
Na busca por depoimentos que confirmem a popularidade do jogo, a imprensa também começou a oferecer como prova o que não passa de boato.
Uma emissora local, por exemplo, não hesitou em 
apresentar como testemunha da prática a tia de uma jovem "que confessou 
ter participado na chamada roleta sexual", mesmo que na entrevista, 
repleta de inconsistências, a tia admita que a sobrinha não tenha 
confessado e reconheça que "as meninas não falam" - o que, no entanto, 
não a impede de oferecer inúmeros detalhes sobre o jogo em questão.
E para dar ainda mais solidez às afirmações, a maioria 
dos meios de comunicação também reproduziram declarações da diretora 
encarregada do Instituto Colombiano do Bem-Estar Familiar (ICBF), que 
dão a entender que a instituição confirmou gestações produzidas pela 
prática da "roleta", "inclusive em Bogotá e Cali".  
A diretora encarregada do ICBF se chama Adriana 
González. E toda a imprensa, inclusive de fora da Colômbia, a 
identificou como Adriana Monsalve, o que sugere que as declarações 
vieram de uma mesma fonte. Questionada pela BBC Mundo, González explicou que o que o
 ICBF pôde comprovar é que havia jovens que diziam terem escutado falar 
sobre o jogo, e isso em um bairro de Bogotá. Em outras palavras, o que 
se pôde confirmar era a existência do boato.
Lenda urbana?
Para Carlos Mario Ramírez, vice-secretário de Saúde, Inclusão Social e Família de Medelín, cidade onde se originou a história, quase tudo o que se tem dito e escrito sobre o assunto até agora está baseado em rumores sem confirmação.
Segundo ele, o ADN "divulgou o caso e disse que a 
Secretaria de Saúde o havia confirmado. Mas nós verificamos e nunca 
houve uma declaração (da secretaria)". Ramírez diz que a ideia de que a 
"roleta sexual" estaria gerando um aumento no número de gestações de 
adolescentes na cidade também é contrariada pelas últimas estatísticas à
 disposição.
Obviamente, tudo isso não significa que o jogo não seja 
praticado por alguns jovens colombianos. Mas, como disse à BBC Mundo o 
especialista mexicano Francisco Cortázar, muitas "lendas urbanas" também
 têm algo de verdade. E esta não é a única característica deste tipo de 
relatos que parece se aplicar às histórias sobre a "roleta sexual".
"Em geral, as lendas urbanas costumam ser relatadas como
 se tivessem ocorrido com alguém próximo", disse Cortázar, professor de 
Estudos Sócio-Urbanos da Universidade de Guadalajara. "E 
fundamentalmente são histórias moralistas. Funcionam como histórias 
exemplares de que é o que pode acontecer se a pessoa não se comportar de
 forma adequada; transmitem medos, temores, fantasias, anseios, tabus."
"Mas ainda que a sexualidade seja um tema de preocupação
 legítima, também ocorrem muitos exageros, muitas fantasias. E muitos 
dos comportamentos que acreditamos que os jovens têm não são tão 
disseminados. Pode ser que existam em alguns casos, que são 
irrelevantes. Mas ter conhecimento de apenas um é suficiente para 
desatar um temor generalizado na sociedade", explica Cortázar.
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