Vergonha - 50 anos após Luther King, Fortaleza imita Little Rock.
Em 1957, na cidade Little Rock, em Arkansas, nove
estudantes negros tiveram que ser escoltados por tropas do exército para
assistir aulas numa escola para brancos, depois que os Estados Unidos
eliminaram todas as leis que ainda permitiam a segregação racial; seis
anos depois, em Washington, Marthin Luther King Jr. pronunciou seu
discurso histórico, em Washington, quando disse "eu tenho um sonho"; na
última-segunda-feira, em Fortaleza, médicos como o cubano Juan Delgado
foram hostilizados aos gritos de "escravos, escravos" e algumas de suas
colegas foram comparadas a empregadas domésticas; quando o Brasil se
tornará uma nação digna, onde todos sejam iguais?
28 de Agosto de 2013 às 10:34.
247 - Há exatos
50 anos, no dia 28 de agosto de 1963, Martin Luther King Jr., o maior
ativista na luta pelos direitos em todos os tempos, fez seu mais célebre
discurso, no Lincoln Memorial, em Washington.
A frase "I have a dream"
("eu tenho um sonho") para sempre ecoará como uma obra-prima da retórica
política. "Eu tenho um sonho
que minhas quatro pequenas crianças vão um dia viver em uma nação onde
elas não serão julgadas pela cor da pele, mas pelo conteúdo de seu
caráter. Eu tenho um sonho hoje!", disse Luther King Jr., na data
histórica (confira a íntegra do discurso).
Seis anos antes, na cidade de Little
Rock, no Arkansas, um estado marcado pelo racismo e pelo passado
escravocrata, o presidente Dwight Eisenhower enviou tropas militares
para garantir a segurança de nove estudantes negras que haviam sido
admitidas em uma escola para brancos.
Naquele ano, em 1957, os Estados
Unidos haviam abolido todas as leis que ainda permitiam a segregação
racial e os estudantes protegidos por militares ficaram conhecidos como
"os nove de Little Rock" (leia mais aqui).
Mesmo escoltados, no entanto,
estudantes negros eram hostilizados por brancos que combatiam as
políticas de igualdade e ação afirmativa, como numa foto que ainda paira
como uma mancha na história dos Estados Unidos.
Cinquenta anos depois do histórico
discurso de Martin Luther King Jr., a cena indigna de Little Rock foi
repetida em Fortaleza, capital do Ceará, quando uma turba de médicos
tomados por um instante de selvageria armou um corredor polonês contra
médicos cubanos e passou a gritar "escravos, escravos" (assista ao vídeo impressionante).
Postada no 247, a imagem do cubano
Juan Delgado sendo hostilizado por duas médicas brasileiras, captada
pelo fotógrafo Jarbas Oliveira, registra, com precisão, o espírito de um
tempo.
Um tempo mesquinho, egoísta, em que doutores brasileiros, que se
negam a atender brasileiros em regiões remotas, hostilizam quem se
dispõe a fazer esse trabalho.
Uma obra-prima que, certamente, dará ao
fotógrafo os prêmios mais importantes de sua atividade neste ano. E que,
de tão marcante, já foi compartilhada por mais de 200 mil pessoas no
Facebook – um marco na internet brasileira.
Dos mais de 2 mil comentários postados na matéria de ontem (saiba mais aqui),
mais de 90% demonstraram indignação e vergonha alheia com a atitude dos
médicos cearenses.
Alguns questionaram o fato de o 247 ter descrito na
matéria que Juan Delgado é um médico negro. Simples. Ser chamado de
"escravo" é uma ofensa para qualquer ser humano. Mas uma ofensa que
repercute ainda mais na alma de pessoas cujos ancestrais foram
efetivamente escravizados.
Ao comentar as agressões, o próprio
Delgado se disse impressionado com a manifestação e disse ser um homem
livre, que veio ao Brasil para ajudar – segundo ele, para ser "escravo
da saúde e dos doentes" (leia mais aqui).
Exemplos de preconceito, no entanto, se espalharam pela internet, como
no Facebook da jornalista Micheline Borges, que disse que médicas
cubanas se parecem com "domésticas" (leia aqui).
No Brasil, ainda não apareceu um
Martin Luther King Jr. capaz de dizer uma frase simples e poderosa.
Simplesmente "eu tenho um sonho". Um sonho banhado por igualdade e
tolerância.
Assista, abaixo, ao discurso de Luther King Jr., que completa 50 anos hoje:
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