Entenda como o FBI usou hackers em sua guerra secreta contra o Brasil. Até a agência de espionagem canadense coletava informações sobre o Ministério das Minas e Energia do Brasil.
Primeiro,  a notícia que fez manchetes em todo o mundo na 
sexta-feira, 15 de novembro. Jeremy Hammond, membro do grupo de hackers 
LulzSec, foi condenado a 10 anos de prisão em Nova Iorque por uma juíza 
americana, por ter acessado ilegalmente os servidores da empresa de 
inteligência privada Strategic Forecasting (Stratfor), em 
dezembro de 2011. Nessa operação, ele alegadamente roubou milhões de 
e-mails, milhares de números de cartões de crédito, e destruiu as 
informações da empresa no processo.
A mídia norte-americana noticiou em detalhes a condenação de Hammond.
 Mas o que foi ignorado pela mídia foi a declaração de Hammond no 
Tribunal de Manhattan de que ele seguia as “instruções de um informante 
do FBI [Federal Bureau of Investigation] para invadir os websites oficiais de vários governos em todo o mundo”.
| Jeremy Hammond (reprodução) | 
Em uma revelação chocante, Hammond disse ao tribunal que um colega 
hacker, conhecido como “Sabu”, deu a ele as listas de websites que eram 
vulneráveis a ataques, incluindo aqueles de muitos países estrangeiros. 
Em sua declaração, Hammond mencionou especificamente o Brasil, o Irã e a
 Turquia antes de a juíza Loretta Preska determinar que ele parasse de 
falar. A juíza havia avisado que nomes dos países envolvidos deveriam 
ser removidos para ficar em segredo.
“Eu invadi vários sites e entreguei várias senhas que permitiram Sabu
 – e por extensão seus contatos do FBI – controlar esses alvos”, disse 
Hammond ao tribunal. Sabu era um dos líderes do grupo de hackers 
LulzSec, afiliado ao grupo Anonymous, mas acabou sendo captado 
pelo FBI para ser um dos seus mais importantes informantes do mundo 
hacker depois de sua prisão em 2011.
Hammon fez uma grande revelação no Tribunal. Ele disse ao mundo que 
foi usado pelo FBI – através de Sabu – como parte de uma espécie de 
exército privado que atacou websites vulneráveis de governos 
estrangeiros. “O governo celebra a minha condenação e a minha prisão, 
com a esperança de que isso vá encerrar o caso. 
Eu assumi a 
responsabilidade sobre as minha ações, e aceitei que sou culpado, mas 
quando o governo vai responder por seus crimes?”, questionou Hammond no 
tribunal, antes de a juíza determinar que se calasse.
A juíza americana não queria que os nomes dos países-alvos da 
operação de hackers fossem revelados no tribunal. Mas Jacob Appelbaum, 
um conhecido pesquisador de segurança cibernética que vive em Berlin, 
divulgou a lista de websites-alvos e da informação disponibilizada no 
servidor do FBI por Sabu. “Essas intrusões ocorreram em janeiro e 
fevereiro de 2012 e afetaram mais de dois mil domínios, incluindo 
numerosos websites de governos estrangeiros no Brasil, na Turquia, na 
Síria, em Porto Rico, na Colômbia, na Nigéria, no Irã, na Eslovênia, na 
Grécia, no Paquistão, e outros…”, diz a declaração de Hammond,  segundo 
Appelbaum em uma série de tuítes na sexta-feira, 15 de novembro.
Isso significa que o FBI tinha como alvo todos esses países, 
incluindo o Brasil, através de um grupo de hackers. É interessante notar
 que o FBI prendeu Sabu em 7 de Junho de 2011, e no dia seguinte, o 
hacker concordou em tornar-se informante da agência americana. Duas 
semanas depois, houve um maciço ataque a websites governamentais 
brasileiros.
Em uma notícia de Mathew Lynley no VentureBeat, um website 
tecnológico, em 22 de Junho de 2011, há a informação de que um 
integrante brasileiro do grupo de hackers LulzSec invadiu vários 
websites governamentais brasileiros como parte de uma campanha maciça de
 ataque de hackers liderada pelo LulzSec. 
A notícia, intitulada “LulzSec
 recruta hackers brasileiros e invade dois websites do governo”, diz que
 tanto o portal da Presidência da República do Brasil quanto o Portal 
Brasil, do governo, estavam fora do ar quando a VentureBeat tentou 
acessá-los. “Ambos os websites foram atacados pelo LulzSecBrazil, um 
sub-grupo do grupo de hackers que fez manchetes recentemente por vários 
ataques a alvos importantes”, diz a notícia.
Com Sabu dentro de uma prisão americana e trabalhando para o FBI como
 informante e usando hackers como Hammond para atacar websites de 
governos estrangeiros, fica claro que invadir websites do governo 
brasileiro era uma missão da agência americana.
Isso não é uma surpresa, após as revelações recentes sobre a Agência 
Nacional de Segurança (NSA)  mostrarem que os americanos transformaram 
em alvo a comunicação pessoal da presidente Dilma Roussef. Mais chocante
 foi a revelação de que a agência de espionagem canadense coletava 
informações sobre o Ministério das Minas e Energia do Brasil.  Antes 
havia sido noticiado – graças aos documentos revelados por Edward 
Snowden  – que os americanos espionaram a Petrobrás também.
Tudo isso  – as notícias sobre as espionagens da NSA e as revelações 
de Hammond no Tribunal – revela um cenário perigoso: já há uma guerra 
cibernética acontecendo no mundo. A guerra foi deslanchada pelos EUA e 
seus parceiros mais próximos com dois objetivos: o primeiro é roubar o 
máximo possível de informações sobre governos, cidadãos e empresas de 
outros países; e segundo, atacar websites de redes de outros governos. 
Enquanto o primeiro objetivo é conquistado sob a fachada de “luta contra
 o terror”, o FBI atira usando como apoio os ombros dos grupos de 
hackers para obter o segundo objetivo.
A Guerra cibernética não declarada é a última – e mais potente – arma
 da geopolítica nesses dias. Como as revelações de Edward Snowden 
mostraram, países de língua inglesa – EUA, Grã-Bretanha, Canadá, 
Austrália e Nova Zelândia – participaram conjuntamente de um grupo de 
espionagem, uma rede chamada “Cinco Olhos”. Seus maiores alvos eram 
países emergentes, como Brasil, Índia, Turquia e México, ou aquelas 
nações que seguem uma política externa independente.
O principal objetivo de toda essa espionagem feita em nome da “luta 
contra o terrorismo” é o desejo dos países “Cinco Olhos” de manter o seu
 controle e domínio sobre os recursos minerais e energéticos para 
continuar com as rédeas da economia global. Isso explica o fato de os 
EUA terem dividido a missão de inteligência sobre a América do Sul com 
os outros países “Cinco Olhos”.
Não é nenhum segredo que as empresas de petróleo britânicas e 
americanas planejam lucrar bilhões de dólares em seus campos de petróleo
 em torno das Ilhas Malvinas. O Brasil apóia a reivindicação argentina 
sobre essas ilhas, desenvolvendo sua própria tecnologia nas plataformas 
de petróleo no mar. Os “Cinco Olhos” querem saber tudo sobre a 
cooperação entre os dois países sul-americanos. Foi por essa razão que o
 Canadá – que encara o Brasil como uma ameaça nos campos de mineração – 
espionou o Ministério das Minas e Energia brasileiro.
O mesmo padrão de invasão cibernética, roubo e espionagem, foi 
repetido pelos “Cinco Olhos” em todo o mundo – da Índia ao Irã, passando
 pela Venezuela e China. Tudo isso com o objetivo de assegurar seus 
interesses financeiros. Mas os ataques do FBI a websites de vários 
governos são uma completa violação à sua soberania. Os americanos gostam
 de culpar os chineses por hackear redes de outros países, mas agora – 
graças a Hammond – sabe-se que o FBI dirige uma guerra secreta e suja 
contra outros países, especialmente aqueles que ousam seguir uma 
política externa e econômica independente.
Nenhum país pode parar esse ataque combinado da NSA, CIA e FBI e seus
 parceiros “Cinco Olhos”. Mas um esforço conjunto dos países emergentes 
pode pelo menos expor esse novo estilo de guerra suja.
Por Shobhan Saxena, correspondente do jornal indiano The Hindu na América do Sul














