domingo, 27 de dezembro de 2015

O fundamentalismo de mercado e o jovem fascismo brasileiro.

Luis Fernando Novoa Garzon.

Houve tempo em que a ideia de infinitude parecia libertadora, hoje a incerteza é a própria escala do pavor. Frente à regressividade das crises crônicas do capitalismo e os efeitos de sua internacionalização desregulada, predominam a dúvida e o receio. 

O retorno a si mesmo, a auto-afirmação e a manutenção da ordem a qualquer preço, surgem como se fossem respostas automáticas. O fundamentalismo não é um fenômeno exclusivamente religioso, muito menos um fenômeno vinculado a determinadas confissões religiosas. 

Que o digam as exuberantes demonstrações exuberantes de fascismo social, ou seja, de humilhação, preconceito e escárnio contra os inassimiláveis - que multiplicam-se no Brasil, em manifestações nas ruas, nas redes sociais, nas escolas e nos locais de trabalho.

A resposta pronta ao pânico moral induzido é a “proteção da família” e, por decorrência, da propriedade. A lógica da culpabilização e punição dos estigmatizáveis se propaga por meio de propostas de redução da maioridade penal, de adoção de procedimentos de reorientação de opção sexual, prisão ou internação forçada de usuários de drogas e de criminalização do protesto social.
Contemporizar com tais práticas significa chocar ovos de serpente. É quando a preparação já é o próprio ato em si. 

Quando fazemos de conta que não é conosco, e deixamos por isso mesmo o pisoteamento dos valores civilizatórios mais cruciais, a vil insolência do endinheirado se normaliza em “atitude”. Orgulho escancarado de não possuir qualidades. Zoação ou bulling moral como método de ascensão simbólica e material. Quem se desclassifica serve de gozo e deboche. O mundo é - e sempre foi - cruel, dizem. Ser piegas vai servir de que nessa hora, perguntam.


Um particularismo robustecido vai ganhando contorno entre os “insiders” que cedo entendem o significado de sua inclusão. Exaltação de sua condição vitoriosa superior como resposta à crítica sistêmica. Diferenciação e auto-afirmação realizadas no exaurir de coisas, de culturas e de pessoas. Morais parciais e orientações ambíguas ensinam a autenticidade na direção contrária. 

Sem vergonha de rapinar o outro, de lhe meter as unhas, no peito se preciso for. Orfandade de projetos existenciais é a pior orfandade. Nenhuma memória ou herança cultural é reconhecida. Por isso, as novas gerações das elites privilegiadas vão além da indiferença.

Um exemplo singelo: por que o agronegócio não assume os riscos e danos intrínsecos a seu processo de produção? Deveriam dar o exemplo a partir do mais elementar. Por que não vedar o uso de agrotóxicos, de hormônios e de transgênicos em qualquer tipo de alimento infantil? Vejam como o agronegócio brasileiro, associado às multinacionais, torna atual a bandeira abolicionista da lei do ventre livre. Nossas crianças não podem ficar livres dos venenos que as próprias elites já não mais admitem em seu cardápio “orgânico” e em seu cotidiano “no stress”.

A marca Brasil, nesses termos, convém não só para os serviços de turismo e megaeventos. Mais que um logo, trata-se de uma composição anestésica, irradiando cinicamente sociodiversidade e biodiversidade, enquanto se intensificam processos de expropriação que justamente eliminam esses componentes. Sem que seja necessário olhar para trás ou voltar o rosto para outros horizontes possíveis que não os da capitalização sumária de todos os recursos territoriais, paisagísticos e humanos contidos no país.

O Deputado Federal Jair Bolsonaro e demais seguidores da “bancada da bala” expressam o novo lugar a que foram alçados os jagunços dos grandes grupos econômicos. Basta conferir a posição inarredável de Cunha para entender a extensão da máfia que detém a maioria parlamentar no país. 

São os que explicitam as razões do fundamentalismo de mercado, os demarcadores do que seja constitucional, em outros termos, do que seja constitutivo do expansionismo e segregacionismo das frações dominantes no capitalismo brasileiro. Por isso, expor a fissura entre aparência e essência, expor a farsa da nação centenária e dissimuladamente sabotada, é um dever cotidiano.

Luis Fernando Novoa Garzon é Sociólogo, doutor em planejamento urbano e regional - Contato: l.novoa@uol.com.br

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