Trabalhei na aplicação do ENEM durante muitos anos. Em uma dessas aplicações, o INEP cometeu um erro e alocou na escola mais candidatos do que ela suportava. Tudo foi resolvido de um dia para o outro, passando os excedentes para uma outra escola. Sem prejuízos.
A aplicação do ENEM é gerida de modo descentralizado. Cada região tem um coordenador responsável, que já tem um plano B, caso uma escola não possa sediar o ENEM, devido a fatores climáticos, por exemplo. Além disso, há muitas escolas que não sediam o ENEM e teriam interesse em fazê-lo porque é pago um valor à escola, pelo aluguel do prédio, e aos servidores que trabalham na aplicação. E que escola ou servidor não precisam de uma verba extra?
Agora me digam, o que interessa mais ao governo: realocar candidatos e resolver o problema de maneira prática ou fazer um estardalhaço na mídia, jogando a opinião pública contra os movimentos estudantis?
Os estudantes que ocupam escolas estão de parabéns pela coragem em enfrentar tantas adversidades para protestar por causas nas quais acreditam. Entre assistir sentados o ápice do desmonte da educação pública e resistir nem que seja para dizer “Oi, estamos aqui e não concordamos com isso”, preferiram a segunda opção. O que é mais importante: estudar aos trancos e barrancos para terminar um ano letivo ou ter a chance de estudar com qualidade e dar seguimento aos estudos com graduação e pós-graduação? O hoje ou o futuro?
E é uma pena que outros setores da sociedade não cultivem essa revolta/resistência. São tantas coisas erradas acumuladas em décadas de (des)governos, independente de partido político, que o certo seria não sobrar um único espaço público não ocupado pela sociedade civil até que mudanças fossem reais e visíveis.
É com orgulho e tristeza, ao mesmo tempo, que afirmo que estes estudantes estão fazendo o que nenhuma organização de professores conseguiu fazer até hoje pela educação. Com toda imaturidade e falta de experiência, próprias da idade, já conseguiram fazer muita gente (re)pensar para que serve uma escola. Sem falar na responsabilidade, no cuidado com o patrimônio da escola – que é deles e de todos – e na autonomia.
Fala-se muito em ilegalidade nas ocupações e há muitas pessoas chocadas com as atitudes dos estudantes, porém a mesma comoção não é observada quando tantos milhões são desviados por agentes públicos das mais variadas ideologias. São jovens estudantes que não concordam com um país corrupto e que penaliza os mais pobres por tudo de ruim que acontece.
Na educação, quase não há resultados a curto prazo. Por isso, acredito que mesmo que poucos danos sejam reduzidos agora, poderemos contar com sujeitos mais ativos no que diz respeito aos problemas do país.
Os ocupantes me representam.
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Rodrigo Klassen Ferreira é Professor do IFSul Câmpus Camaquã, Mestrando em Educação, ex-professor da rede estadual de ensino do RS.
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