sábado, 1 de julho de 2017

O supremo (stf) e a (não) demarcação de terras indígenas...


Erika Yamada e Valéria Burity – Justificando.
Na última semana (22/06), a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Carmen Lúcia, recebeu uma delegação de mulheres e crianças Guarani-Kaiowá que descreveram o quadro de fome e insegurança alimentar, racismo e violências que se impõem aos indígenas frente à falta de demarcação de suas terras. A ministra afirmou que o Judiciário está cada vez mais atento à realidade dos Povos Indígenas relacionada à falta de demarcação de suas terras e garantiu ajuda nos problemas que dependam de decisão jurídica. Mas o que o STF pode de fato fazer?
Em meio à crise política do país e no atual contexto de ruptura democrática, entender o papel e do poder do STF é fundamental. Há alguns anos, temas centrais do Legislativo e do Executivo são deslocados por diferentes motivos para a Suprema Corte, que, ao julgar, muitas vezes termina por legislar, ou afirmar e redefinir políticas públicas no Brasil. No campo dos direitos humanos, alguns avanços podem ser assinalados especialmente no que se refere ao reconhecimento pelo STF de direitos de caráter individual.[1] No entanto, há pelo menos uma década a corte não avança e ainda faz retroceder o reconhecimento de direitos étnicos coletivos, como os direitos territoriais indígenas e quilombolas.
Em 2010, foram identificadas mais de 150 ações sobre demarcação de terras indígenas pendentes de decisão no STF.
O Supremo também foi responsável pela concessão de uma série de medidas liminares que passaram a impedir o acesso de Povos Indígenas a territórios devidamente identificados e demarcados nos termos da Constituição Federal.[2] A sinalização de esforços do Executivo – desde pelo menos 2012 – e do Legislativo – com a tramitação da PEC 215/00 e com a instalação da CPI sobre a Funai e o Incra – visando paralisar ou acabar com a demarcação de terras indígenas acirraram conflitos e contribuíram para a escalada de assassinatos, tal como documentado todos os anos no Mato Grosso do Sul. Essa pressão política e social chega apenas parcialmente ao Judiciário. A morosidade no STF, por exemplo, só reforçou a estratégia de “judicialização” contra os processos de demarcações de terras indígenas precarizando ainda mais o direito dos indígenas. A judicialização transformou-se então em justificativa confortável do Estado para a negação do direito à terra dos Povos Indígenas.
O direito à terra é considerado um direito humano fundamental de caráter coletivo dos Povos Indígenas porque a vida, o bem estar, as tradições, o futuro das comunidades e até mesmo as línguas indígenas dependem da relação que essas populações mantêm com seus territórios e recursos naturais.
No entanto, apesar de formalmente protegido, esse direito não tem sido implementado pelo Estado brasileiro e o STF tem sua parcela de responsabilidade. Por exemplo, ao não julgar o mérito das ações e manter os indígenas fora de suas terras, a corte contribuiu e contribui para a consumação de situações de fato (ex. ocupação não indígena com violenta degradação ambiental) que, de acordo com sua própria jurisprudência, seriam consideradas demandas improcedentes ou inconstitucionais.
Enquanto isso, cada vez mais impedidos de acessar seus territórios para cultivar suas roças de subsistência, caçar, pescar, praticar plenamente seus rituais, Povos Indígenas vão assistindo à derradeira derrubada de suas matas e degradação de seu ambiente juntamente com a morte de lideranças. Em resistência, muitos mantiveram-se em ocupações de ínfimas parcelas de seus territórios para reivindicar seus direitos. Contra isso também, cresceram as judicializações e, durante o julgamento do caso da terra indígena Raposa Serra do Sol/RR, uma nova âncora de conforto para a negação de direitos é apresentada: a tese do marco temporal.
A tese do marco temporal tem sido usada pela 2ª turma do STF e, basicamente, impõe a data da Constituição Federal (05/10/1988) como uma data limite para a constituição de um direito que, em sua natureza, é originário, ou seja, não depende de um ato ou fato constituinte.  Esse entendimento diverge do que diz, expressamente, o artigo 231 da Carta Magna e de tudo o que as constituições, anteriores a de 1988, previram sobre os direitos territoriais indígenas, desde 1934. Num processo de involução inconstitucional, de acordo com a tese, para alguns ministros do STF, o direito à terra só não se perderia se, ao tempo da promulgação da Constituição, os povos e grupos indígenas não estivessem em seu território tradicional devido a “renitente esbulho” praticado por não índios.
O conceito que vem sendo dado a “renitente esbulho” completa o marco de perversidade, pois para caracterização desse instituto seria necessário que, em outubro de 1988, os povos originários estivessem pleiteando a posse da terra no Poder Judiciário, ou ainda, estivessem sofrendo violência física direta contra a ocupação. A tese do marco temporal não abarca, portanto, milhares de casos ocorridos em um período de ditadura militar em que os Povos Indígenas já haviam sido expulsos e não haviam ajuizado ações por inúmeros motivos, entre eles, a dificuldade de acesso à justiça que até hoje os afeta. Por exemplo, essas mesmas decisões do STF que aplicam o marco temporal são proferidas em processos que não contam com a participação das comunidades indígenas cujas terras tem seu reconhecimento anulado.
Vale registrar que o relatório da Comissão Nacional da Verdade comprovou inúmeras violações de direitos sofridas por esses povos durante a ditadura e em outros períodos. Ou seja, a tese do marco temporal diverge de toda lógica inserida na Constituição  e, em especial, do artigo 51 dos Atos de Disposições Constitucionais Transitórias, que evidencia a intenção da Constituinte de não legitimar arbitrariedades do período ditatorial. De acordo com esse dispositivo, deveriam ser “revistos pelo Congresso Nacional, através de Comissão mista, nos três anos a contar da data da promulgação da Constituição, todas as doações, vendas e concessões de terras públicas com área superior a três mil hectares, realizadas no período de 1º de janeiro de 1962 a 31 de dezembro de 1987”.
Apesar de ser apenas um entendimento minoritário do STF, a tese do marco temporal vem alterando de fato a vida dos Povos Indígenas por exemplo das terras Limão Verde, Guyraroká, e, mais recentemente Buriti, todas no Mato Grosso do Sul. A tese do marco temporal, que deveria ser aplicada apenas no caso da Terra Indígena Raposa Serra do Sol abriu precedentes no STF que já estão sendo replicados por outros juízes para fundamentar a expulsão dos indígenas de suas terras.
Num efeito bola de neve, diante do aumento da judicialização, o STF passou a ser demandado para analisar em caráter de urgência ordens de despejo ou reintegrações de posse que colocam as comunidades indígenas em risco ainda mais grave. Nesses casos, sempre de maneira precária porque apenas sob a forma de suspensão de liminar, o STF tem conseguido garantir a manutenção das comunidades indígenas em parcelas ínfimas de seus territórios reivindicados.
De março de 2016 a maio de 2017, subiram de 13 para 17 suspensões de liminares concedidas pelo STF favoráveis aos Povos Indígenas, mas não suficientes para a garantia de seus direitos humanos e constitucionais.
Para os Povos Indígenas, a terra é a base para o gozo de uma multiplicidade de direitos humanos, como, por exemplo, o direito humano à alimentação e nutrição adequadas. Além da disputa judicial, as últimas décadas foram marcadas pelo acelerado agravamento nas condições de sobrevivência dos Povos Indígenas no Brasil. Em 2005, por exemplo, a morte por desnutrição de mais de 20 crianças em apenas duas aldeias (Bororó e Jaguapiru), no Mato Grosso do Sul, chamou a atenção da imprensa nacional e colocou a exigência  de medidas do Estado brasileiro para reverter este quadro, especialmente no que se refere à garantia de territórios e acesso a recursos naturais necessários à sobrevivência física e cultural dos Guarani e Kaiowá. Em 2010, sem avançar com a demarcação das terras indígenas pelo governo federal, a Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) confirmou o alarmante índice de 32,11 mortes de crianças menores de 1 ano de idade para cada 1000 nascimentos nas aldeias indígenas do município de Dourados (MS), sendo que a média nacional era de 19 mortes para cada 1000 nascimentos.
Em 2016, um estudo da Fian Brasil demonstrou a disparidade do direito humano à alimentação e à nutrição entre a média nacional (4,8% em 2013) e a do povo indígena Guarani e Kaiowá (28% em 2013). Além disso, 100% dos domicílios desse povo indígena pesquisados apresentaram algum grau de insegurança alimentar e nutricional contra a média de 22,6% para a população brasileira em geral. O estudo confirma que, além da situação de confinamento, as inseguranças jurídicas em processos que se arrastam no tempo para a definição jurídica do direito à terra dos Povos Indígenas e a violência impune praticada contra lideranças e comunidades indígenas comprometem ainda mais a soberania alimentar desses povos no Mato Grosso do Sul.
De acordo com o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), a inação do Estado brasileiro com relação às mortes e violências contra indígenas, bem como com relação à falta de demarcação de terras indígenas, insere o caso dos Guarani e Kaiowá como um caso de atenção para prevenção de situações de genocídio, conforme indicadores da ONU para tal. Com similar preocupação, o Parlamento Europeu aprovou resolução sobre a situação do Povo Guarani e Kaiowá e, considerando, entre outros elementos “que estão em curso algumas iniciativas para a reforma, interpretação e aplicação da Constituição Federal do Brasil e que estas eventuais alterações podem pôr em risco os direitos dos indígenas reconhecidos pela Constituição Federal do Brasil”, apelou às autoridades brasileiras para que desenvolvam um plano de trabalho visando dar prioridade à conclusão da demarcação de todos os territórios reivindicados pelos Guarani-Kaiowá e criar as condições técnicas operacionais para o efeito, tendo em conta que muitos dos assassinatos se devem a represálias no contexto da reocupação de terras ancestrais. Porém, além disso, sem um justo e efetivo posicionamento do STF, não haverá medida do Executivo que resolva essa agravada situação.
A relatora especial da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas, Victoria Tauli Corpuz, após sua visita ao Brasil, em março de 2016, afirmou que “a concentração de poder econômico e político nas mãos de um pequeno segmento da sociedade brasileira contribui, historicamente, para a exploração de terras e recursos dos povos indígenas, sem consideração com seus direitos ou bem-estar. Durante sua visita, ela repetidamente ouviu relatos de que ganhos políticos e econômicos individuais têm contribuído para o racismo institucional, para a violação de direitos dos povos indígenas e para os conflitos.”[5]
Resta saber se, nesse contexto, o STF conseguirá sair de sua tradicional zona de conforto para fazer valer os direitos constitucionais dos Povos Indígenas, abordando o mérito das questões sem legislar ou modificar a Constituição Federal. Afinal, a aplicação da tese do marco temporal pela corte adianta os efeitos da proposta de emenda constitucional (PEC 215), antes mesmo dela ser aprovada, e fecha os olhos do Judiciário para o fato de que: impedir que os Povos Indígenas vivam em suas terras é impedir a existência de suas culturas e coletividades. Isso tudo, em benefício de quem?
*Erika Yamada é Relatora de Direitos Humanos e Povos Indígenas da Plataforma Dhesca e Perita no Mecanismo de Peritos da ONU sobre Direitos dos Povos Indígenas. Valéria Burity é Secretária Geral da FIAN Brasil, advogada, trabalha com o tema de Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas desde 2002.

[1] Por exemplo com relação aos direitos identitários de pessoas transgênero, reconhecimento de alguns direitos LGBT, descriminalização do aborto, e à definição de quotas raciais para ingressar no serviço público e na universidade.
[2] YAMADA, E. Quem ganha com conflitos não resolvidos? in Povos Indígenas no Brasil:2006-2010, Instituto Socioambiental, 2011, p.61
Foto: José Cruz/Agência Brasil

Temer prepara entrega de reserva gigante de ouro na Amazônia.



É da maior gravidade a notícia publicada hoje, pelo Valor, de que o Governo Michel Temer se prepara para conceder à iniciativa privada – leia-se, ao capital estrangeiro uma imensa área da Amazônia rica em ouro onde a mineração está proibida há mais de 30 anos.  Diz o jornal que uma portaria publicada na edição de sexta-feira do Diário Oficial da União, o Ministério das Minas e Energia abriu caminho para a extinção da Reserva Nacional de Cobre e Associados (Renca) criada em 1984, ainda na ditadura militar”.
A portaria, diz que “que a extinção da RENCA viabilizará o acesso ao potencial mineral existente na Região e estimulará o desenvolvimento econômico dos Estados envolvidos”, mas, na prática, abre caminho para a devastação de 46 mil quilômetros quadrados de floresta.
Para que você tenha ideia do que isso representa, é quase que a soma de todo o território dos estados de Sergipe e Alagoas, somados.
A área, situada em parte do Pará e em parte no Amapá é praticamente toda coberta de mata e habitada por indígenas.
Relatórios dos anos 80 relataram, além da existência de ouro em grande escala, também importantes reservas de titânio e de fosfato.
O próprio vendilhão da pátria que foi indicado por um deputado do PMDB (com campanha financiada pelas mineradoras) para dirigir o Departamento Nacional de Produção Mineral, Vitor Bicca, diz que as proporções da área em recursos auríferos  são semelhantes às de Carajás.
Passamos anos discutindo o alagamento de 516 km² para que a usina de Belo Monte produzisse energia para toda a coletividade. Agora, ninguém dá uma linha para a potencial destruição de uma área 82 vezes maior para produzir riqueza para algumas grandes empresas.
Tudo vai indo assim, na surdina.
Negócio da China é o Brasil do golpe.

Entreguismo na Amazônia: “o jogo mudou”, diz vendedor de minérios.


POR  · 18/04/2017.
Clube de Engenharia aprofunda aquilo que foi registrado aqui: é imenso o potencial da área que o Governo Temer está liberando para mineradoras privadas na Reserva Nacional de Cobre e Associados, conhecida pela sigla Renca, uma área imensa na Amazônia, quase equivalente às áreas de Sergipe e Alagoas, somados. Uma reserva onde, exceto em pequenas áreas anteriores ao seu estabelecimento como reserva, a exploração privada está proibida desde 1984.
E o governo militar assim o fez porque havia um conflito entre a Vale do Rio Doce, então estatal, e a British Petroleum , que estava requerendo o direito de prospecção em diversas de suas áreas.
Embora os levantamentos não sejam ainda os mais precisos – hoje, por detecção espacial, certamente os estrangeiros têm dados melhores que os nossos – os potenciais são, diz a geóloga do Serviço Geológico do Brasil (CPRM), Maria Glícia da Nóbrega Coutinho, diretora de Atividades Institucionais do Clube de Engenharia, semelhantes ao de Carajás.
Ouro em destaque, ocorrem também titânio, fosfatos, estanho, tungstênio, tântalo e terras raras, um conjunto de elementos estratégicos, cujo controle mundial, com 2/3 das reservas, está nas mãos dos chineses.
O texto traz ainda, a imperdível declaração do diretor da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais indicado por Michel Temer, Eduardo Ledsham, oriundo do período de Roger Agnelli na Vale e, depois de uma polpuda indenização, foi dirigir a empresa de miieração do próprio Agnelli, em sociedade com André esteves (Banco BTG Pactual).
O jogo mudou no Brasil“, disse ele a empresários do exterior, participantes do Mines & Money, uma feira do setor mineral. Isso, de acordo com ele, significa que ” o governo se afastou de uma tendência intervencionista para incentivar o empreendedorismo e a atração de investimentos estrangeiros”.
Como se vê, não foi apenas no petróleo que o entreguismo voltou com força total.
Os roedores da Terra, que extraem riqueza e deixam devastação afiam suas presas.

sexta-feira, 30 de junho de 2017

Lula conversa com a Rádio Difusora do Acre - A voz das Selvas.


O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva conversou nesta quinta-feira (29) com a Rádio Difusora do Acre e falou sobre a aprovação da reforma trabalhista pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal. Para ele, o governo federal está responsabilizando os brasileiros pela falta de presença, de investimentos e de credibilidade da União.
“É muito grave em função da crise econômica se tentar jogar a responsabilidade nas costas dos trabalhadores. O que eles fizeram ontem na CCJ do Senado foi tentar transferir para os trabalhadores a crise que existe por falta de credibilidade do governo. Estão jogando fora uma conquista que garante direitos mínimos aos trabalhadores brasileiros. Digo que isso não é uma reforma, é uma demolição”, disse Lula.

A maneira de fazer o Brasil voltar a crescer, de acordo com o ex-presidente, é tornar o estado indutor da economia e fazer com que os empresários voltem a confiar no Brasil. “De 2003 a 2014 conseguimos fazer a economia crescer e distribuir renda, cuidar do povo brasileiro com o carinho e respeito que o povo merece. […] O BNDES precisa voltar a ser banco público”.
Questionado sobre as eleições de 2018, Lula disse: “se eu voltar vou provar para a elite brasileira mais uma vez que um metalúrgico saber governar melhor do que eles. Governar não, cuidar melhor dos brasileiros”.
Durante a entrevista, Lula foi questionado sobre a denúncia de Michel Temer feita pela Procuradoria-Geral da República ee que chegou nesta quinta-feira (29) à Câmara.
“Se a procuradoria denuncia o Temer, tem que ter provas materiais. Quando falo isso, é porque cansei de ser achincalhado sem ninguém apresentar uma prova. Isso desde 82, quando fundei o PT. Há uma divergência entre o presidente e a procuradoria sobre as provas materiais. Se ele (Temer) tiver culpa, tem que ser julgado. Se a procuradoria não tem provas, tem que passar pelo crivo do Conselho Nacional de Justiça e outras instâncias”.
Quanto ao “caso triplex”, Lula disse que a falta de provas e materialidade no processo só reforça o único objetivo dos procuradores da Lava Jato: torna-lo inelegível.
“No fundo, esse processo contra mim é a tentativa de me tornar inelegível para as eleições de 2018. Alguém vai ter que me pedir desculpa em algum momento. A Lava Jato tem que respeitar o estado democrático de direito”.
Fundo da Amazônia
Lula lamentou o corte de R$ 200 milhões pela Noruega em repasses para o Fundo da Amazônia anunciado pessoalmente ao presidente golpista Temer em uma viagem desastrosa feita neste mês à Europa.

“Quando fomos a Copenhague pela primeira vez, em 2009, aprovamos no Congresso uma lei na qual até 2020 iríamos reduzir o desmatamento. Dilma seguiu à risca e diminuiu. Agora, assistimos o discurso de que podem invadir a Amazônia, que vão vender terras para estrangeiros e há um descuido com o desmatamento. Quando eles anunciam o corte, é porque não estão creditando no Brasil. Eles sabem que o governo é resultado de um golpe”, declarou.
O ex-presidente citou como exemplo o estado do Acre, atualmente governado pelo petista Tião Viana, que, mesmo tendo alcançado um crescimento de 18% no PIB, conseguiu diminuir o desmatamento em 64%.
“Perdemos tudo por irresponsabilidade de um bando de golpistas, inclusive com a participação de senadores e deputados do Acre. Participe do processo eleitoral e se ganhar governa, o que não da é dar um golpe e tirar uma presidenta legitimamente eleita para colocar uma pessoa que não teve nenhum voto. A verdade é essa, eles plantaram vento e estão colhendo tempestade”.
Assista aos dois trechos da entrevista de Lula à Rádio Difusora do Acre:
Da Redação da Agência PT de Notícias.

quinta-feira, 29 de junho de 2017

Temer nomeia Raquel Dodge como procuradora-geral e sabota sucessor de Janot.

Dodge é a indicada por Temer
Dodge é a indicada por Temer  (REUTERS).

Pela primeira vez desde 2003, presidente ignora primeiro nome da lista, que era Nicolao Dino.

presidente da República, Michel Temer, ignorou o tradicional compromisso de nomear o candidato mais votado na eleição interna do Ministério Público Federal(MPF) e indicou Raquel Dodge como a nova procuradora-geral da República na noite desta quarta-feira. 
Essa foi a primeira vez desde 2003 que o presidente da República desrespeita essa tradição. Na prática, a indicação permite a Temer escolher quem pode investigá-lo depois do término do mandato do atual procurador-geral, Rodrigo Janot, em 17 de setembro. Com o anúncio da indicação, o presidente manda o recado de que Janot está já no final do seu mandato como um intento de tirar força da denúncia que o procurador-geral apresentou contra ele por corrupção passiva na última segunda-feira.
Dodge foi a segunda candidata mais votada da categoria, com 587 dos 1.108 votos de procuradores. O candidato mais votado tinha sido Nicolao Dino, que recebeu 621 votos e era considerado o sucessor de Janot. 

quarta-feira, 28 de junho de 2017

Racismo em Cuiabá - MT. Turista negra é espancada e chamada de macaca por empresário e médica.

racismo turista negra cuiabá

“Macaca, escrava! Tá achando ruim ser chamada de negra? É o que você é”. Um empresário e a sua esposa, que é médica, foram denunciados por racismo e agressão após espancarem uma turista negra em uma boate de Cuiabá-MT. A vítima levou um soco do homem e foi arrastada pela mulher.

Um empresário e a sua esposa, que é médica, foram denunciados pelos crimes de racismo e agressão corporal após espancarem uma turista negra em uma bate de Cuiabá (MT).

O crime aconteceu em uma casa sertaneja há 10 dias, mas estava sendo mantido em sigilo e só agora foi revelado após uma postagem na internet.
O estabelecimento é frequentado por pessoas de classe média e alta na cidade. Funcionários do local também foram alvo de xingamentos racistas.
Os agressores gozam de prestígio na cidade. A turista registrou um boletim de ocorrência na Polícia Civil. O caso, no entanto, foi tratado apenas como agressão.
Uma amiga da turista publicou, com a autorização da vítima, um relato sobre as agressões (leia abaixo). Ela conta que a turista estava no estabelecimento quando notou que, em uma mesa, uma mulher a chamava de “macaca”.
As provocações continuaram até que amigos da mulher, que também estavam na outra mesa, possivelmente constrangidos, pediram desculpas pelo insultos.
No entanto, pouco tempo depois, ao sair do banheiro, a turista foi agredida com um soco no rosto pelo empresário, marido da mulher. Caída no chão após a violência do golpe, ela ainda foi arrastada pelos cabelos pela médica. Os funcionários da boate confirmaram a versão.
“Um dos seguranças foi agredido com um soco e teve o crânio fraturado. Eles diziam que não gostavam de negro, que não queriam ser tocados por nenhum de nós”, relatou um segurança.
O empresário ainda tentou entregar dinheiro ao funcionário agredido, alegando que “negro gosta de ganhar dinheiro”.
Após as agressões, os envolvidos na confusão foram encaminhados para a delegacia. De acordo com o segurança, os policiais que atenderam a ocorrência não estavam preparados. “Eles foram negligentes. Ouvi que eles não queriam registrar a ocorrência como injúria racial”, disse um deles.
Pragmatismo Político entrou em contato com a Polícia Civil de Cuiabá para tentar conseguir os nomes dos agressores, mas até o fechamento desta publicação não obtivemos resposta.
Confira a íntegra do relato publicado pela amiga da vítima nas redes sociais:
Com autorização de minha colega de trabalho, Juliana Souza, publico as fotos e conto, resumidamente, a história destes hematomas no rosto dela:
Feliz da vida ela foi passar o feriado prolongado na casa de parentes em Cuiabá-MT. Na sexta, 17/06, foi com os primos se divertir em um “pub” da cidade. Em uma mesa, um pouco distante da sua, percebeu um casal, e notou que a mulher a chamava de macaca, o que era perfeitamente perceptível pelo movimento labial…Juliana é negra…Continuou na sua, embora não gostando nada daquela provocação absurda, gratuita, que persistia …Chegou ao ponto de alguém da mesa deles ir até Juliana pedir desculpas…
Em dado momento quando ela foi ao banheiro, ao retornar, foi atacada pelo namorado da moça, com um soco no rosto! Já no chão, surpreendida com a agressão repentina, sentiu-se arrastada pelos cabelos e viu que era a moça que o fazia, enquanto gritava: “VOCÊ NÃO TEM QUE ESTAR AQUI, SUA MACACA, ESCRAVA, VAI PRA SENZALA! TÁ ACHANDO RUIM SER CHAMADA DE NEGRA?! É O QUE VOCÊ É, E TEM QUE PASSAR CHAPINHA NO CABELO!!!”…
Os seguranças interviram, e também negros, foram chamados de macacos e agredidos pelo rapaz(grandalhão e muito forte). Um deles precisou levar pontos na testa…A policia foi chamada, levou o rapaz preso, no CAMBURÃO, a moça nao foi levada, por conta da parcialidade de um dos policiais…(Ele gritou que pagaria propina e não ficaria preso)
Juliana fez exame de corpo de delito, abriu um BO e contratou advogado…Tudo registrado, agora é esperar por justiça, que, se vier, não apagará a agressão que sofreu na sua dignidade, na sua HUMANIDADE, na sua alma…
O “rapaz”, pagou fiança, em torno de oito mil reais, e foi solto 19/06…
Nem Juliana, nem os primos entenderam a razão de tanta violência…Era visível o quanto o casal estava alterado, não se sabe se por ingestão de alguma bebida ou drogas…Nada justifica!

Eis os personagens desta triste, revoltante e vergonhosa história:
– A VÍTIMA – Juliana – Pedagoga – Pos Graduação em Psicopedagogia -Excelente profissional – Professora da Rede Pública.
– O AGRESSOR – O “rapaz” – Empresário Rico.
-A AGRESSORA – A “moça” – Médica pediatra e professora em uma universidade de Cuiabá.

segunda-feira, 26 de junho de 2017

Florestan Fernandes: A crise da cultura e o liberalismo*.

Posted: 22 Jun 2017 06:44 PM PDT

Florestan Fernandes

O tema do momento é a crise de cultura no ocidente. Artigos, ensaios e profundas análises sociológicas têm sido escritos sôbre os aspectos e as graves consequências da mudança; poucos autores, entretanto, viveram tão de perto o drama da transição como Karl Mannheim, que conheceu na Alemanha totalitária o rebento espúrio do liberalismo e viu pessoalmente na Inglaterra e nos Estados Unidos outro lado do desenvolvimento da sociedade liberal-democrática. Por isso tem especial interêsse para nós um de seus ensaios (“As Causas da Crise Contemporânea da Cultura”, in Libertad y Planificación”), em que analisa a crise da cultura nas sociedades liberais-democráticas, partindo de dados fornecidos pela sociologia.

Há uma estreita dependência entre sociedade e cultura, entre estrutura social e vida intelectual (Mannheim toma o termo neste sentido restrito), de modo que qualquer modificação ou transformação sofrida pela primeira, reflete-se nas esferas da segunda. Ora, a sociedade liberal-democrática do ocidente está em crise; ela passou ou está passando de seu estado de sociedade liberal-democrática de minorias para o de massas. Em consequência, os fatores sociais que agiram nessa transformação vão também agir sôbre a vida intelectual: a produção e a utilização (consumo, diz Mannheim) da cultura e as relações entre o autor e o público, que dependem estreitamente de certas condições sociais se transformam à medida que aquelas condições se modificam. Por isso, a vida intelectual também está ameaçada pelos dois princípios, mutuamente antagônicos, o liberal “laissez- faire” e a regulamentação, que lutam no campo econômico. Êle se arrisca a todos os perigos que decorrem do funcionamento sem nenhuma direção das sociedades democráticas de massas, que se tornam mais graves e agudos quando as formas liberais são substituidas por formas ditatoriais de regulamentação.

Numa sociedade democrática, sabemo-lo, a cultura depende de “normas peculiares de uma ordem social não regulamentada”. Há apenas um mínimo de organização artificial, aparecendo essas sociedades, à primeira vista, como “um conjunto casual e inarticulado”. Uma análise mais profunda, todavia, mostra que mesmo nas esferas não econômicas há processos similares ao da livre-concorrência, com um ajustamento automático entre a classe que produz e a que assimila a cultura, através de atividades inorganizadas e privadas.

Uma análise da cultura, encarada sob este ponto de vista, deve começar, está claro, por aquêles que criam a cultura, isto é, os intelectuais e por sua posição dentro da sociedade, considerada como um todo. Verificamos, então, que os intelectuais se constituem, na sociedade liberal-democrática da minoria em “élites” reduzidas, cuja missão essencial consiste não só em criar a cultura, mas em lhe dar uma forma, um significado social e institucional. Elas estimulam o desenvolvimento do conhecimento objetivo e as tendências à introspecção, à contemplação e à reflexão. Quando estas “élites” são destruídas ou encontram obstáculos à sua organização, as condições sociais necessárias ao aparecimento da cultura e sua manutenção desaparecem. 

A crise contemporânea da cultura se explica justamente a partir dos obstáculos aparecidos na seleção das “élites” criadoras em consequência da transição da sociedade liberal-democrática de minorias para a de massas: “a crise da cultura na sociedade liberal-democrática é devida em primeiro lugar ao fato de que os processos sociais que antes favoreciam o desenvolvimento das minorias seletas criadoras, agora produzem o efeito contrário, isto é, chegam a ser obstáculo à formação das “elites”, porque seções mais amplas da população, ainda que se achem em condições sociais desfavoráveis, tomam uma parte ativa nas atividades culturais” (pgs. 78-79). Aí se apresentam os processos de “democratização negativa”, de “seleção negativa”, etc., que resultam da democratização da cultura, a qual deu amplas oportunidades para um número muito grande de indivíduos que procuraram se orientar preferencialmente, para esses grupos seletos e criadores.

À medida que esse fenômeno se firma, vemos a história dramática da sociedade democrática do ocidente repercutir no desenvolvimento de sua vida intelectual. As minorias seletas aumentam em número, devido ao crescente afluxo de indivíduos, e perdem grande parte de seu poder, tendendo a exercer cada vez menos suas funções e suas influências diretoras. Paralelamente, o público organizado que se punha entre o autor e a minoria como intermediário, desaparece, ficando o autor sujeito, bruscamente, à influência direta das massas, que aumenta de importância. Este público _ um público _ massa, desintegrado, reunindo-se em função de estímulos sensoriais – não influe no autor como aquele outro que, selecionado em grupos estáveis, tinha determinados gostos e tipos de reação. E assim, uma excessiva democratização da cultura e a consequente ascensão de indivíduos e grupos que não estão educacionalmente preparados para ocupar aquelas funções intelectuais, faz com que seus valores predominem e haja uma consequente queda no nivel cultural médio.

Esses processos sociais, porém, apresentam dois aspectos distintos: na primeira fase de transição os resultados sempre foram favoráveis e positivos (por exemplo: indivíduos provenientes de outras classes sociais levavam às “élites” novos interesses e pontos de vista, ampliando seu horizonte cultural; serviam de intermediários entre aquelas minorias e a maioria, reajustando a cultura à sociedade, etc.). Mas, o mecanismo liberalista não permite parar aí o processo _ êle ampliou-se demasiadamente e sem orientação, ganhando continuamente em massa e perdendo em qualidade.

Dessas facilidades de aquisição da cultura resultou uma proletarização da “inteligentsia”, aparecendo no mercado de trabalho intelectual mais oferta do que procura. O significado desta proletarização seria a perda do valor social das profissões liberais e consequente atribuição de menor importância a essas atividades por parte da opinião pública. Diminuido o valor do intelectual, é lógico que também diminuísse o valor do produto de seu trabalho _ a cultura.

Isto não aconteceu imediatamente após a passagem da sociedade aristocrática para a liberal-democrática porque esta, em seu primeiro período, apareceu sob a forma de minorias seletas (a riqueza era condição indispensável para a vida intelectual). Mas, passou-se para a sociedade de massas e com a democratização da cultura aparecem aspectos novos nos processos de formação e de seleção das “élites” que, apresentando inicialmente ótimos resultados culturais, acabaram por levar às suas consequências negativas inevitáveis.

Restam duas perguntas, que Mannheim procura resolver: por que só agora a cultura adquiriu seu caráter de massas e não quando apareceu o proletariado? Por que a decadência cultural se tornou visível só quando a democratização da cultura afetou as classes não proletárias? A mentalidade de uma classe, diz Mannheim, depende de sua situação frente à produção econômica. Por isso o proletariado, que deve a sua existência ao progresso da industrialização e à racionalização técnica, procura desenvolver a sociedade de massas nesse sentido. 

A classe que ficou com o poder, nas sociedades liberais-democráticas de massa pertence à burguesia _ aos seus mais baixos estatus: pequenos funcionários, homens de negócios pouco importantes, pequenos lavradores e comerciantes, etc. Ora, o invento técnico, a racionalização, a produção em grande escala são seus inimigos naturais e por êles são combatidos incondicionalmente, com a finalidade de impedir o aparecimento das grandes fábricas, das grandes emprêsas, etc.; mas, nada se pode alterar numa das esferas da sociedade sem alterar as demais esferas sociais, e qualquer tentativa de regressão social e econômica a uma éra precapitalista precisa ser acompanhada de uma modificação da mentalidade existente também para formas precapitalistas. 

Essa classe média procurará resolver o impasse agindo artificialmente sôbre a racionalização técnica, esforçando-se por atenuar a industrialização, a organização em grande escala e impedir a proletarização crescente nas sociedades democráticas de massa. Isso não se efetua por si mesmo, automaticamente, mas só pela interferência da fôrça ou de um plano: o desenvolvimento da sociedade liberal-democrática desorganizada culmina na ditadura, implicando todos aquêles inconvenientes da substituição de formas livres por outras impostas artificialmente.

É claro que essa é uma etapa do desenvolvimento social das sociedades modernas que sem dúvida, vencendo a crise, acabarão por modelar seus elementos em formas culturais estáveis. Contudo _ e a crítica de Mannheim é contra isto _ aplicamos atualmente os processos de seleção a suas correlatas instituições de um modo inadequado, já que não visamos mais a seleção limitada de intectuais. 

Este e outros defeitos de funcionamento da sociedade liberal-democrática podem levar ao naufrágio da civilização; mas, a ditadura, de forma alguma pode ser oposta a estas tendências negativas do liberalismo, porque ela mesma “nasce da atuação negativa das fôrças da democracia de massas, e não é mais que uma tentativa violenta para estabilizar uma etapa do desenvolvimento da sociedade liberal que por sua natureza era transitória”.

* Publicado na Folha da Manhã, quinta-feira, 16 de março de 1944.  Neste texto foi mantida a grafia original. Especial para a “Folha da Manhã”. Publicado originalmente no site da Folha de São Paulo.