segunda-feira, 11 de setembro de 2017

Funai e MPF apuram suspeita do assassinato de vinte índios isolados no Amazonas.

Alex Rodrigues*.
Repórter da Agência Brasil.
A Fundação Nacional do Índio (Funai), o Ministério Público Federal no Amazonas (MPF/AM) e a Polícia Federal (PF) apuram a suspeita de que índios que vivem isolados no Vale do Javari, no oeste do Amazonas, tenham sido assassinados por um grupo de garimpeiros.
A pedido da Funai, a PF instaurou um inquérito policial e a Procuradoria da República em Tabatinga (AM) passou a acompanhar as investigações.
Em nota, a fundação indigenista diz que a denúncia surgiu em agosto, depois que alguns garimpeiros foram vistos no município de São Paulo de Olivença conversando sobre o suposto massacre.
“Servidores da Funai fizeram o primeiro levantamento e entenderam ser necessário apresentar a denúncia”, explicou a Funai, em nota. Os garimpeiros foram detidos e conduzidos a Tabatinga, onde prestaram depoimento. Ainda de acordo com a fundação, os garimpeiros não confirmaram as mortes e, até o momento, nenhuma prova material foi encontrada, “não sendo possível, portanto, confirmar a veracidade das mortes”.
O MPF confirmou que ainda não há confirmações de mortes, mas que as suspeitas estão sendo apuradas e há novas diligências em curso.
Operação contra o garimpo - Os supostos alvos do ataque habitam a região do Rio Jandiatuba, na Terra Indígena Vale do Javari, próxima à fronteira com o Peru, a cerca de mil quilômetros de Manaus. Na mesma região, foi deflagrada, no fim de agosto, uma operação de combate ao garimpo ilegal que resultou na destruição de quatro dragas (equipamentos utilizados para extração de minério). Mais de um R$ 1 milhão em multas foram aplicadas a seis garimpeiros por crime ambiental.
Realizada pelo MPF, Exército e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), a operação tentava impedir a expansão do garimpo ilegal ao longo do Rio Jandiatuba. Segundo o MPF, a atividade tem avançado sobre o rio, que corta três terras indígenas e é amplamente utilizado por índios isolados, segundo monitoramento da Funai.
“O MPF conduz procedimento administrativo que investiga o garimpo ilegal no Rio Jandiatuba. A instituição vem recebendo denúncias da Funai e dos próprios moradores, por conta da violência que o garimpo gera, da prostituição infantil, das ameaças e até de homicídios”, reforça o MPF, em nota.
Repercussão - O suposto ataque já repercute no Congresso Nacional. Hoje (11) o vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos do Senado, Paulo Paim (PT), relatou o caso e cobrou providências.
“Como vemos, é mais uma denúncia da maior gravidade. Vinte índios, chamados flecheiros, que viviam isolados nessa área da Amazônia e que foram assassinados. E, segundo informações que nos chegaram, corpos foram esquartejados, inclusive. Nós da comissão queremos exigir a apuração dos fatos pelo MPF e pela PF e que o Ministério da Justiça e o Governo Federal se pronunciem”, pediu o senador.
*Colaboraram Bianca Paiva e Graziele Bezerra.
Edição: Luana Lourenço.

Ministério Público confirma massacre em tribo isolada do Amazonas.


A Amazônia acaba de sofrer mais um ataque mortal, violento e covarde. 

Um grupo de índios isolados que vivia numa floresta protegida no Oeste da Amazônia foi massacrado por mineradores ilegais da região. 

Eles estavam numa praia de rio, pescando e caçando, quando foram atacados. 

O governo Temer tentou abafar a notícia porque esse governo não gosta dos brasileiros, mas ama o dinheiro das mineradoras que chegam em malas.

Mas nem todos são covardes...

O Ministério Público Federal está investigando corajosamente esse massacre contra os índios da floresta, inocentes que vivem em harmonia com bichos e plantas.

Queremos que os culpados sejam presos!

Queremos respeito pela floresta e seus seres!

Porque sem floresta, o Brasil não vai ter água para beber.

Porque basta de covardia e impunidade.  #342Amazônia

Fonte: http://amazoniareal.com.br/garimpeiros-mataram-indios-isolados-flecheiros-no-vale-do-javari-confirma-mpf-do-amazonas/

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À agência Amazônia Real, o Ministério Público Federal (MPF) confirmou que mais de 20 indígenas de uma tribo isolada do extremo oeste do estado do Amazonas foram assassinados por garimpeiros ilegais. O assassinato teria acontecido no último mês de agosto.
Conhecidos como “flecheiros”, os índios teriam sido mortos na cidade de São Paulo de Olivença, na fronteira do Brasil com o Peru e a Colômbia.
O massacre vem pouco tempo depois de outro ataque de garimpeiros que matou mais de vinte indígenas isolados da tribo Warikama Djapar, no Vale do Javari – este caso aconteceu em maio.
Em nota, a ONG Survival colocou na conta do governo Temer as recentes mortes de indígenas.
“Caso tais relatos sejam confirmados, o Presidente (Michel) Temer e seu governo possuem uma grande responsabilidade por este ataque genocida. Todas estas tribos deveriam ter tido suas terras devidamente reconhecidas e protegidas há anos – o apoio aberto do governo àqueles que querem violar territórios indígenas é extremamente vergonhoso”, diz o texto.

Amianto: não se permite nem se proíbe.

Telhas de amianto
Algumas das doenças causadas pela exposição à substância podem demorar até 40 anos para se manifesta.
por Victória Damasceno — publicado 11/09/2017.
Decisão do STF deixa dúvidas sobre a continuidade da cadeia produtiva da substância no Brasil, considerada cancerígena pela OMS.
Banido em 75 países, o amianto é considerado uma substância cancerígena pela Organização Mundial da Saúde. Estimativas indicam que mais de 100 mil trabalhadores no mundo morrem por ano pela exposição ao minério e suas fibras. No Brasil, a recomendação internacional contra o uso do minério esbarra na pressão de agentes econômicos. A cadeia do amianto impõe um contato direto com a substância a mais de mil trabalhadores.
Na Justiça, o embate entre a saúde no trabalho e a preservação da cadeia produtiva refletiu na divisão dos ministros do Supremo Tribunal Federal sobre o uso ou não da substância. Uma recente decisão da Corte sobre a regulamentação do amianto ou asbesto do tipo crisotila criou um vácuo jurídico no que diz respeito à constitucionalidade do 2º artigo da Lei Federal 9055/95 que permitia a extração, industrialização, comercialização e distribuição do minério.
Na ocasião, o tribunal julgou improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTI), que visava impugnar a lei de banimento de qualquer tipo de amianto em São Paulo sob o argumento de o Estado ter invadido a competência da União ao legislar sobre a regulamentação.
Em uma votação apertada, por 5 votos a 4, a maioria da Corte também julgou ser inconstitucional a lei federal que regulamenta o uso da substância no Brasil. A maioria não foi suficiente para a invalidação da lei, pois declarações de inconstitucionalidade dependem do voto de seis ministros.
A proibição do Amianto no País, e não apenas em São Paulo, pode ocorrer por outro caminho. Ao passo que validou a constitucionalidade da lei estadual que proíbe o minério, os ministros da Corte declararam incidentalmente a inconstitucionalidade do dispositivo federal que permitia a cadeia produtiva do amianto crisotila no País. A celeuma jurídica deixa, porém, dúvida sobre o futuro do uso do amianto no Brasil.
Contra a lei federal, o ministro Celso de Mello explicou durante seu voto que os usos previstos do amianto ferem diversos dispositivos constitucionais, como a dignidade da pessoa humana, o meio ambiente e a preservação da saúde.
Ao final da sessão, o ministro afirmou que o emprego do amianto “está, sim, vedado, porque o STF excluiu do sistema de direito positivo o artigo da lei federal”. O decano acrescentou ainda que o Tribunal “excluiu do universo jurídico nacional uma regra que permitia, ainda que mediante o uso controlado, o emprego do amianto”.
"Essa decisão vale para o Estado de São Paulo, que preserva a legislação paulista. Mas, ao mesmo tempo, representa um importantíssimo precedente do STF a respeito da mesma matéria que vai ser debatida a respeito da legislação fluminense", concluiu.
A presença de duas leis de regulação, porém, pode gerar um cenário de “anomia”, diz o professor de Direito da Fundação Getúlio Vargas Fernando Leal. Para ele, não está claro se o dispositivo federal possui caráter vinculante e eficácia em relação às demais legislações sobre o mesmo tema. “A lei federal teria como papel central estabelecer as diretrizes gerais para a regulação, fornecendo assim uma moldura dentro da qual os estados poderiam atuar”, afirma.
Mesmo com a decisão, as empresas com instalações nos estados que não possuem a proibição do minério seguem funcionando normalmente. Para o professor, onde não existem leis estaduais para a regulação do amianto há incerteza. No entanto, a Corte não parece estar propensa a aceitar leis que permitam o uso do asbesto.
“O cenário paulista dá espaço para que leis semelhantes tenham sua constitucionalidade aprovada. Mas o fato da declaração em relação a lei federal ser incidental, não me parece suficiente para que o Tribunal permita que as leis estaduais que reproduzam a federal tenham o mesmo parecer incidental”, completa.
Leal ainda considera a possibilidade de outros mecanismos regulatórios que podem dar margem à negociação com a Corte, como a substituição progressiva. Na mesma semana, a alternativa tomou forma com o decreto do prefeito do Rio de Janeiro Marcelo Crivella, que dispõe sobre a substituição progressiva de produtos que contenham o asbesto em sua composição.
Dentre as trinta modalidades do amianto, apenas uma era permitida até então. O amianto do tipo crisotila tem utilidade em quase três mil produtos, desde a construção civil até a indústria automobilística. No Brasil, é usado principalmente na indústria do fibrocimento, como em telhas, placas de revestimento e caixas d’água.
Caixa D'água
Ao passo que utiliza o amianto na confecção de telhas, a Eternit não produz mais caixas d'água à base do minério (Jacopo Werther).
Apesar da grande utilidade, o asbesto já foi banido em 75 países. A decisão da Corte responde à tendência mundial e à recomendação da Organização Mundial da Saúde(OMS) que coloca o minério no principal grupo de substâncias cancerígenas. A estimativa no mundo é que cerca de 125 milhões de trabalhadores estão expostos ao amianto e 107 mil morrem por ano em decorrência de doenças relacionadas à exposição ao minério e suas fibras.
A regulamentação existente na lei federal previa o uso moderado da substância, com “limites de tolerância fixados na legislação” para a preservação da saúde do trabalhador. Por outro lado, o médico pneumologista Hermano Castro, que se dedica ao estudo das doenças causadas pela exposição ao minério, afirma não existir uso seguro do amianto.
O especialista explica que ao tratar substâncias consideradas cancerígenas, qualquer exposição pode gerar alterações que levam ao câncer, independentemente da dose inalada pelos trabalhadores ou usuários. “Existem intensidades diferentes de exposição que podem dar uma certa seguridade em algum ponto da cadeia produtiva, mas o uso seguro seria somente se fosse garantido um nível zero de exposição”, explica.
Castro fala ainda sobre o passivo ambiental que será deixado pela substância devido às décadas de exploração em larga escala que foram realizadas no Brasil. “Será necessário encontrar formas de se desfazer dos produtos que contenham asbesto, o que significa ainda que o risco de adoecimento segue por mais algumas décadas”, concluiu o professor ao explicar que grande parte das doenças provenientes das fibras da substância podem se manifestar anos depois do contato.
Neoplasias malignas das pleura, placas pleurais e pneumoconiose são algumas das sequelas recorrentes aos trabalhadores. Segundo a OMS, a exposição ao amianto, ainda que do tipo crisotila, aumenta o risco de câncer de pulmão, mesotelioma e asbestose, além  de não haver limite seguro para exposição.
Ainda que comprovados os danos causados à saúde do trabalhador e dos usuários, segundo o Ministério do Trabalho, o Brasil ainda conta com 46 empresas que dependem da produção e comercialização da substância.
O principal grupo empregador do ramo é a Eternit, uma companhia de capital aberto que possui seis empresas divididas entre os ramos da mineração e da construção civil. À ela pertence a mineradora Sama, que está entre as três maiores produtoras de crisotila do mundo.
De acordo com dados da Eternit, a cadeia do asbesto gera cerca de 170 mil postos de trabalho no País, “incluindo trabalhadores da mineração, das indústrias do setor de fibrocimento em 17 fábricas de 10 estados brasileiros e rede de distribuição”. Dados do Ministério do Trabalho, porém, rebatem essa informação. No Cadastro de Empresas Regulares de Amianto e Asbesto, as empresas públicas e privadas que produzem, utilizam ou comercializam fibras de amianto somam 7102 trabalhadores, dentre eles 1277 que possuem contato direto com o minério.
O grupo está presente no mercado desde 1940, e possui histórico de condenações milionárias no currículo. Em 2016, empresa foi condenada a pagar mais de R$400 milhões de indenizações por expor trabalhadores ao amianto. O valor devido à filhos e viúvas de trabalhadores mortos, envolvia a fábrica que atuava em Osasco, na Grande São Paulo, uma das maiores do grupo empresarial.

Amianto
As fibras do amianto ou asbesto são reconhecidas pela OMS como cancerígenas (Eurico Zimbre).
A mais recente condenação ocorreu no último dia 18, e diz respeito à mineradora Sama, subsidiária da Eternit, condenada pela Justiça Federal ao pagamento de R$500 milhões para o tratamento de contaminados com amianto.  
A decisão remete à exploração ocorrida na jazida São Félix do Amianto, localizada em Bom Jesus da Serra, entre os anos de 1940 de 1967. Em ação conjunta, o Ministério Público Federal e o Ministério Público do Estado da Bahia alegaram que no encerramento das atividades de extração não foram tomadas medidas satisfatórias para a mitigação dos efeitos do mineral nos habitantes da região, deixando resíduos que contaminaram um número indeterminado de pessoas, além dos trabalhadores da mina.
O procurador Roberto Vieira, do Ministério Público Federal na Bahia, foi um dos responsáveis pelo caso. Vieira explica que na época da exploração na jazida baiana ainda não haviam normas de segurança para o trabalhador, mas que mesmo após a regulamentação ainda existem dejetos do amianto de variados tipos encontrados nas casas e nas estradas da cidade.
De acordo com a Norma Regulatória para Atividades e Explorações Insalubres do Ministério do Trabalho, as empresas com inscrição no Cadastro das Empresas Regulares de Amianto/Asbesto, como a Sama, são responsáveis pela remoção total de resíduos que contenham asbesto, com o objetivo de garantir segurança aos trabalhadores e à população ao limitar o desprendimento da poeira do minério no ar.
“Todas as pessoas que apresentaram moléstias catalogadas na medicina como vinculadas à exposição ao amianto, terão direito à indenização de 150 mil reais, à tratamento de saúde e plano de saúde”, conta.
O procurador explica ainda que a defesa da Sama estava baseada no encerramento das suas atividades em Bom Jesus da Serra em 1970, mas está presente até os dias de hoje. “A empresa ainda possui um funcionário que está lá às vezes, e contribui financeiramente para as campanhas políticas na região.”
A mineradora é a atual responsável pela exploração do amianto na única mina de crisotila em atividade no Brasil, localizada na cidade de Minaçu, interior de Goiás. Até 1997, a Sama tinha a maioria de suas ações pertencentes ao Grupo Brasilit, até então um dos principais produtores do minério no País, e dividia a extração com a Eternit.
Seguindo a tendência de países europeus como a Noruega e a França, pioneiros na regulamentação do amianto e atenta ao indicativo de proibição na União Europeia ao fim dos anos 90, a Brasilit começou um processo de substituição progressiva, abandonando completamente a cadeia produtiva do asbesto em 2002.
A iniciativa se adiantou às possíveis proibições que poderiam acontecer no Brasil. A empresa hoje trabalha com uma alternativa à exploração e transformação do asbesto para a indústria de construção civil, o fio de polipolineno. O fio sintético é um dos principais substitutos do amianto no mundo, e segundo a OMS é classificados como não cancerígenos, além de possuir recomendação da Anvisa.
Mesmo com 15 anos sem o manuseio do mineral em suas fábricas, a Brasilit deixa um legado de trabalhadores que podem ainda apresentar doenças decorrentes à exposição ao amianto. Segundo dados do SUS, doenças como o mesotelioma pode demorar até 50 anos para me manifestar, além de levar o paciente à morte em apenas um ano, por se tratar de um tumor maligno e incurável.
Para Fernanda Giannasi, fundadora da Associação Brasileira de Expostos ao Amianto (Abrea), é “inconcebível” continuar com o uso de um produto que possui tantos malefícios à saúde do trabalhador. “O que se espera agora é a paralisação das atividades que envolvam o amianto no Brasil”, explica ao representar a Abrea.

Nota de repúdio às atuais ações do governo federal contra os direitos das pessoas com deficiência.


Na Abrasco
Associações, coletivos e entidades nacionais abaixo relacionadas vêm a público manifestar repúdio às recentes ações do governo federal que ameaçam os direitos humanos das pessoas com deficiência em todo o país. 
É uma lista infindável de sérios riscos, de ameaças concretas e passamos aqui a destacar aqueles mais graves.
Em 06 de julho de 2015, foi sancionada a Lei Brasileira de Inclusão (LBI), Lei 13.146/2015, também conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência. A LBI, com seus mais de 120 artigos e quase 300 novos dispositivos, avança no processo de implantação da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada pela ONU em 2006. 
Salienta-se que a Convenção tem status de emenda constitucional no Brasil desde 2009 e vem representar um novo capítulo na proteção da dignidade humana das pessoas com deficiência na sociedade brasileira.
A primeira ação do governo provisório de Michel Temer que trouxe sérios impactos para os direitos humanos das pessoas com deficiência foi o estabelecimento do teto dos gastos públicos por 20 anos, com a PEC 55, sancionada em dezembro de 2016. 
Isso significa que as políticas sociais, instrumento primordial para concretizar direitos e equiparar oportunidades às pessoas com deficiência, não terão mais condições de manutenção e expansão por duas décadas. Os avanços legislativos dos últimos anos, portanto, não encontrarão correspondência em condições concretas para se transformar em avanços efetivos na vida da população.
O segundo conjunto de violações aos direitos humanos das pessoas com deficiência é a reforma da Previdência pela PEC 287/2016 e a já aprovada reforma trabalhista, que traz alteração, revogação e limitação de vários direitos dessa população. 
Dentre eles, a limitação da pensão por morte a familiares com deficiência, a restrição e desfiguração da aposentadoria da pessoa com deficiência da Lei Complementar 142 de 2013, a terceirização como um efeito concreto para o não cumprimento das vagas das cotas para pessoas com deficiência nas empresas com mais de 100 trabalhadores, dentre vários outros retrocessos.
Além disso, uma das principais novidades da LBI, que diz respeito à forma de avaliar a deficiência para reconhecer direitos à população, encontra-se ameaçada. Durante muito tempo, a caracterização da deficiência se deu apenas com base em critérios médicos, o que restringia o acesso da população às políticas públicas pela visão estreita do que significava viver em um corpo com limitações. 
A LBI estabeleceu no art. 2º que a avaliação da deficiência precisa, a partir de 2018, ser multiprofissional, interdisciplinar e de forma biopsicossocial, de acordo com a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde da OMS. No entanto, a regulamentação desse dispositivo pode não ser concretizada.
Em 27 de abril de 2016, foi publicado um Decreto Presidencial, criando o Comitê do Cadastro Nacional de Inclusão das Pessoas com Deficiência e do Modelo de Avaliação Unificada da Deficiência. 
Este Comitê interministerial é o responsável por regulamentar o art. 2º da LBI e também o art. 92 sobre o Cadastro-Inclusão, antigos pleitos das pessoas com deficiência conquistados pela LBI. Desde novembro de 2016, o Comitê se reúne mensalmente para elaborar as regulamentações necessárias destes dois dispositivos legais. 
No entanto, nos últimos dois meses, um conjunto de ações articuladas por alguns grupos de profissionais médicos vem pautando suas reivindicações corporativistas e sendo contrários à regulamentação da avaliação multiprofissional da deficiência em cumprimento à LBI e à Convenção.
Um blog ligado à categoria de médicos peritos da Previdência Social, em publicações nos meses de junho e julho, critica o trabalho do Comitê, classificando-o como “ideológico” e “esquerdista”, o que não encontra correspondência na realidade pelo simples fato de o modelo biopsicossocial ser resultado de uma construção coletiva internacional de mais quatro décadas de debate entre especialistas e pessoas com deficiência. 
As reivindicações da categoria médica chegam ao absurdo de até mesmo pedir a exoneração de técnicos servidores públicos federais responsáveis pelo trabalho do Comitê, como do assistente social e doutor Wederson Santos – uma ação truculenta, autoritária e inapropriada que desconsidera o caráter técnico do trabalho e o compromisso dos especialistas nele envolvido, ao mesmo tempo em que ignora o protagonismo das pessoas com deficiência no acompanhamento das políticas públicas.
A avaliação da deficiência não é um ato médico. Os elementos necessários para avaliação, conforme disciplina o art. 2º da Lei 13.146/2015, não têm relação com diagnósticos médicos, e sim com as repercussões verificáveis em diversos domínios da vida, caracterização de barreiras, levando em conta a caracterização da restrição de participação social das pessoas com deficiência por meio de avaliações feitas por profissionais da área da saúde capazes de operacionalizar a CIF, conforme princípios e conceitos da Convenção materializados na LBI.
O mesmo blog de peritos médicos comemora, inclusive, reuniões realizadas na Casa Civil em que supostamente acordos foram firmados pelo governo para pôr fim ao trabalho do Comitê de implantar o modelo biopsicossocial de avaliação da deficiência. 
O blog da perícia médica, atualmente categoria profissional empoderada pelo atual governo, ainda ataca vários profissionais, como os antropólogos, psicopedagogos e vários outros da área da saúde que lidam com a temática da deficiência. 
Ações como estas, sendo acatadas pela atual gestão do governo federal – uma vez que exonerações solicitadas já foram realizadas – criam um clima de revanchismo de corporações profissionais que não é salutar diante da complexa tarefa de mudar paradigmas sobre compreensões da deficiência em diálogo com os princípios da Convenção e da LBI.
Como se não bastasse todos os absurdos autoritários da atual gestão do governo federal, acatando reivindicações da categoria médica que não têm correspondência com a proteção dos direitos humanos das pessoas com deficiência, o novo Decreto 9.122, de 7 de agosto que cria a estrutura do Ministério dos Direitos Humanos, onde encontram-se a Secretaria Nacional de Cidadania, antiga Secretaria de Direitos Humanos e a Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, extinguiu a área de coordenação da política de Saúde Mental. 
Essa coordenação-geral era importantíssima para transversalizar a temática da saúde mental e direitos humanos em todo o governo federal para que as ações governamentais visassem o cuidado e a atenção das pessoas com doenças e transtornos mentais na perspectiva da cidadania. O desrespeito com essa população é evidente no atual governo.
Todas as entidades ligadas às pessoas com deficiência, os movimentos sociais e toda a sociedade precisam debater, acompanhar e se posicionar frente às atuais ações do governo federal, sobretudo, da Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Ministério dos Direitos Humanos. 
A SNDPD precisa levar adiante os trabalhos de regulamentação da LBI, não acatando pleitos corporativistas ou usando da força legítima das nomeações e exonerações do governo para silenciar profissionais e especialistas que podem contribuir com a importante tarefa de fazer avançar o cumprimento do que prevê a Convenção. 
Além disso, os representantes do Comitê do Cadastro-Inclusão e da Avaliação Unificada da Deficiência, bem como o Secretário Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência e a Ministra de Direitos Humanos, precisam se manifestar pública e urgentemente sobre todos estes ataques sofridos pelos direitos das pessoas com deficiência.
Assinam a nota até o momento as seguintes entidades:
    1. Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco)
    2. Coletivo Nacional de Pesquisadores dos Estudos sobre Deficiência (102 pesquisadores brasileiros)
    3. Organização Nacional de Cegos do Brasil (ONCB)
    4. Associação Brasileira de Saúde Mental (Abrasme)
    5. Movimento Orgulho Autista Brasil (MOAB)
    6. Fórum Nacional dos Usuários do Sistema Único de Assistência Social (FNUSUAS)
    7. Federação Nacional das Associações Pestalozzi (Fenapestalozzi)
    8. Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down (FBASD)
    9. Conselho Distrital de Promoção e Defesa de Direitos Humanos
    10. Instituto EcoVida
    11. Rede Brasileira do Movimento de Vida Independente (Rede MVI-Brasil)
    12. Fórum Permanente de Educação Inclusiva
    13. Associação Nacional dos Membros do Ministério Público em Defesa dos Direitos dos Idosos e das Pessoas com Deficiência (AMPID)
    14. Comitê Brasileiro das Organizações Representativas da Pessoa com Deficiência (CRPD)
    15. Associação Brasileira de Surdos Oralizados (ABRASSOBR)
    16. Conselho Federal de Serviço Social (CFESS)
    17. Núcleo de Informação, Políticas Públicas e Inclusão Social da FIOCRUZ (NIPPIS)
    18. Grupo de Pesquisa ‘Deficiência, Direitos e Políticas’ da UnB
    19. Associação de Pais, Amigos e Pessoas com Deficiência de Funcionários do Banco do Brasil e da Comunidade (APABB)
    20. Federação dos Renais e Transplantados do Brasil (FARBRA)
    21. Associação Brasileira para Ação por Direitos das Pessoas com Autismo (ABRAÇA)
    22. Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (CONADE)
    23. Associação de Educação, Cultura, Cidadania, Oportunidade e Solidariedade (Associação ECCOS)
    24. Associação Brasileira de Autismo (ABRA)
    25. Movimento Down
    26. INCLUSIVE – Inclusão e Cidadania (Agência para Promoção da Inclusão)
    27. GADIM – Brasil
    28. Instituto Meta Social
    29. Sindicato dos Fisioterapeutas e Terapeutas Ocupacionais do Estado da Bahia (SINFITO-BA)
    30. Associação Catarinense para Integração do Cego (ACIC)
+ Acesse aqui a publicação original do abaixo-assinado
+ Interessados em assinar este documento devem entrar em contato com anahigm75@gmail.com

domingo, 10 de setembro de 2017

Setembro Amarelo alerta para a prevenção ao suicídio.


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Da ABr - Publicado em: .
Assunto complexo, o suicídio, que espelha fatores biológicos, genéticos, psicológicos, sociais e também culturais, tem sido desvendado, nos últimos quatro anos, pela campanha Setembro Amarelo. Neste ano, como de costume, as atividades de prevenção e sensibilização incluem caminhadas, veiculação de materiais da campanha por figuras públicas que abraçam a causa e a decoração e iluminação de prédios públicos, praças e monumentos com luzes e itens amarelos.
As ações foram iniciadas pela Associação Internacional para Prevenção do Suicídio (Iasp) e trazidas ao Brasil pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), pelo Centro de Valorização da Vida (CVV), referência no atendimento – inclusive remoto – a pessoas em crise, e pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). O Setembro Amarelo caminha junto com a campanha Janeiro Branco, que, em um mês em que as pessoas estão mais propensas a renovações, busca vivificar reflexões sobre saúde mental e valorização da vida.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que ocorram, no Brasil, 12 mil suicídios por ano. No mundo, são mais de 800 mil ocorrências, isto é, uma morte por suicídio a cada 40 segundos, conforme o primeiro relatório mundial sobre o tema, divulgado pela OMS, em 2014.
Em geral, a vontade de acabar com a própria vida é provocada pela falta absoluta de perspectiva e uma enorme sensação de desamparo e angústia. O que não se destaca é que, na maioria dos casos, o radical desejo é gerado por um quadro de transtorno mental tratável, como depressão, transtorno bipolar afetivo, esquizofrenia, quadros psicóticos graves e transtornos de personalidade, como o borderline.
“Somente 3% não têm diagnóstico desses transtornos. Há um alto índice também de histórico de drogas, álcool e outras substâncias”, diz a psicóloga Fabíola Rottili Brandão.
Fabíola esclarece ainda que, embora prevaleçam os casos em que preexiste um distúrbio mental, há situações em que o suicídio pode ser um impulso desencadeado por um infortúnio pontual, mas que, ainda assim, a pessoa já tem um processo de desorganização interior. “Em 10% das ocorrências podemos observar essas questões. Pode ser, sim, um caso de súbita desesperança.”
Para o psiquiatra Régis Barros, fortalecer-se emocional e mentalmente é como o ser humano resiste às decepções e contrariedades, comuns a todas as pessoas. “Viver não é uma tarefa simples. Viver é fabuloso, mas somos sistematicamente testados, colocados à prova, sofremos com as frustrações do viver. A resiliência é importante para construir uma habilidade social para a vida”, diz.
Suporte
Barros defende que a sociedade contemporânea, além da violência, do estresse, da instabilidade econômica e social, vive um momento de competitividade cada vez maior, que favorece o adoecimento mental. “O que se vê são relações muito voláteis, famílias desorganizadas, um mundo social virtual em que o contato e as construções de relações são muito empobrecidas. Há, cada vez mais, jovens que se frustram mais precocemente, uma epidemia dos que se automutilam”, explica.
Por isso, poder contar com uma rede de apoio e, consequentemente, com o acesso ao diálogo é fundamental para que as pessoas com a chamada “ideação suicida” conquistem o equilíbrio e a estabilidade emocional garantidos pelo tratamento de psicoterapia e de medicamentos. Os remédios prescritos por um psiquiatra são essenciais para que o paciente recobre a ordem neuroquímica, e a terapia, por sua vez, auxilia o paciente a saber trabalhar suas emoções.
Há alguns sinais que podem ser identificados por familiares e amigos como sendo de risco, auxiliando no diagnóstico e, portanto, na assistência. Eles devem compreender que a depressão e o suicídio não são uma estratégia infantil da pessoa para chamar a atenção, nem frescura.
Desinteresse pelas atividades que sempre foram prazerosas, sentimento de inutilidade e de culpa, cansaço extremo, irritabilidade, dificuldade de concentração e de tomar decisões e até mesmo falta de higiene com o próprio corpo são comportamentos de alerta. A pessoa tende também a achar que é um fardo para seus amigos e sua família, pode ter baixa qualidade de sono e, ainda, perder ou ganhar peso.
“Há isolamento social, quebra no vínculo familiar, um grande sofrimento psíquico. Mas, às vezes, a pessoa esconde, coloca uma armadura e se esforça para não parecer doente”, complementa Fabíola.
Tanto as pessoas mais próximas como desconhecidos são capazes de acolher e mesmo encaminhar a pessoa suscetível ao tratamento com os profissionais adequados. De acordo com a psicóloga, as unidades de saúde do Sistema Único de Saúde (SUS) carecem de investimento em medicamentos e psicoterapia. “O tratamento de crise precisa ser imediato e nem sempre os dispositivos estão preparados para atender o paciente”, diz Fabíola.
Essa conscientização da família, denominada psicoeducação, evita, inclusive, a repetição de episódios suicidas. “As doenças mentais têm componentes biológicos e não biológicos. Você tem famílias em que o componente é replicado. Mas há uma dificuldade em definir o que é fator ambiental, o que é herança genética, já que temos o mesmo ambiente, com as mesmas questões emocionais, que podem retroalimentar o desejo de se suicidar. O ato de se suicidar não será o ato primário, o primeiro, outros já aconteceram e podem ser evitados”, esclarece Barros.
Colegas de trabalho também podem e devem representar um ponto de socorro. “As empresas não estão preparadas para lidar com essa demanda. Quando tem afastamento do trabalho, existe preconceito. Os empregadores precisam buscar informações e achar formas de acolher. O profissional fica estigmatizado. A gente se dedica tanto ao trabalho e não encontra apoio ali”, pontua Fabíola.

Geopolítica da Água: Água para a Guerra – Água para a Paz.

Água, o grande desafio. “Quando lidamos com o meio ambiente não podemos tratar deste direito fundamental como se fosse um produto empresarial, uma mercadoria, quando contratos e regras são determinados a portas fechadas em reuniões entre pares. Pelo contrário, devem acontecer com o coletivo da sociedade”.

Amyra El Khalili

O Fórum Internacional de Gestão Ambiental (FIGA 2010) – Água, o Grande Desafio, aconteceu em março de 2010, na cidade de Porto Alegre (RS), alguns meses antes do reconhecimento pela ONU da água como direito humano (jul. 2010) e, anos antes do saneamento básico como direito humano em separado do direito à água potável (jan. 2016).  Na conferência de abertura, por mim proferida, procurei esclarecer as diferenças conceituais entre as múltiplas funções da água com a temática da “Geopolítica da Água: Água para a Guerra – Água para a Paz”.
Analisei os conflitos no país e no mundo relacionado à água e sua comoditização, como é o caso da exportação de grãos e carne no Brasil, que implica também na exportação dos recursos naturais empregados nesta atividade, como a água, a energia, o solo, os minerais e a biodiversidade. 

Outro caso a ser pesquisado, é o do uso da água como lastro dos navios quando descarregam mercadorias nos portos e quando os reabastecem com água para retornar ao seu país de origem ocasionando sérios impactos ambientais com a poluição das águas e na biodiversidade. 

Segundo o jornalista Lúcio Flávio Pinto no artigo “As verdades amazônicas e as visagens utilitárias” (O Jornal Pessoal, 2010): 

“Um problema concreto é o do uso da água como lastro pelos navios. Tão concreto que em 2004 a ONU adotou uma Convenção para prevenir a poluição quando os navios bombeiam a água que têm e captam aquela de que precisam. Nessa troca, provocam danos ambientais que podem ser avaliados por dados fornecidos por Antonio Domingues: todos os anos essa operação movimenta 5 bilhões de toneladas (ou de metros cúbicos) de água, que devem causar prejuízos globais de 100 bilhões de dólares (quantificando-se o dano ecológico, que, em geral, não entra no cálculo econômico).

Quanto desse enorme prejuízo é causado no Brasil e, especificamente, na Amazônia? Ninguém sabe. Só do Pará, quarto maior Estado exportador do país, entre 130 milhões e 150 milhões de toneladas de riquezas naturais (predominantemente as minerais) foram levados para outros países no ano passado. Se, apenas para efeito de cálculo, se considera uma média de 50 mil toneladas por navio, só para o escoamento dessa exportação penetram na Bacia Amazônica 3 mil grandes navios (para o padrão da navegação regional) por ano. Ou quase 10 por dia. É um movimento expressivo."

Além do conceito de água como commodity, há também outros três que podem ser confundidos e utilizados por interesses que não os do bem comum.

Água como commodity.
A água enquanto ecossistema (bem comum) não é e nem pode ser considerada uma commodity, no entanto a água enquanto sinônimo de vida no planeta já está sendo negociada há décadas nas bolsas. Não formalmente,  enquanto produto bursátil (para bolsas), como é o caso do petróleo, mas através do agronegócio e da mineração no mercado de balcão (o informal, fora das bolsas) como ocorre com a água mineral e com a extração em poços artesianos sem controle e fiscalização, impactando na qualidade da água do subsolo com contaminações por tratarem a água apenas como um produto mercadológico desconsiderando sua importância socioeconômica.

Quando compramos as garrafas de 500 ml de água mineral no supermercado, o lucro vai para a empresa que a industrializou (engarrafou). Tudo que está na prateleira do supermercado está, de certa maneira, comoditizado, ou seja, padronizado para compra e venda adotando critérios determinados por corporações  e  governos, sem a participação proativa da sociedade. Porém, como a população não conhece os direitos e as regras a serem respeitados, há exploração desenfreada deste bem comum por alguns grupos empresariais com a conivência de governantes em detrimento do interesse coletivo.

Neste contexto, a água como ecossistema não poderia ser comoditizada, já que esta palavra-expressão commodity significa ‘mercadoria padronizada para compra e venda’, para ser negociada com preço estabelecido pelo livre mercado, tendo a sua cotação fixada pelas bolsas de valores como ocorre com o petróleo. Enfim, seria cotada da mesma forma que os preços das commodities minerais (ouro, petróleo, gás) e das commoditiesagropecuárias (soja, milho, boi café, açúcar).

Água como ecossistema.
Imaginem um rio ou uma cachoeira. Não podemos nos apropriar deste rio ou desta cachoeira e negociá-los, vendendo-os ou alugando-os para uma empresa ou um grupo de empresários interessados em explorá-los. Desta forma, não temos o direito de torná-los propriedade de um único empresário ou de um oligopólio, já que é parte de um ecossistema, que é bem difuso, de uso comum do povo. É o que chamamos de “privatização”. O que significa sair das mãos do governo e entregá-los como investimento e lucro para beneficiar financeiramente o setor empresarial.

A água por ser um bem que é parte de um ecossistema, por ser tutelada pela União, bem de uso público, jamais poderia ser privatizada. O fato de haver um ecossistema implica a interligação e interdependência entre todos os seres, os vivos e os inanimados. Pois, quando um ser adoece, gera consequências em variados níveis a todos os outros. Se a água for contaminada, degradada, maltratada, adoecerá os seres humanos e demais seres vivos. Á água pode curar doenças, como também pode matar ao tornar-se veículo de contaminações como são os córregos e rios poluídos, por exemplo. Portanto a sociedade tem direitos sobre a água, mas também deve assumir os “deveres” ao compartilhá-la e dela cuidar. 

Água como direito fundamental.
Os ativistas Ricardo Petrella e Daniele Miterrand empreenderam uma longa e árdua campanha contra a privatização da água, contra o controle do ecossistema pela iniciativa privada, contra a cotização da água, para que este recurso finito e fundamental para a existência dos seres vivos, não venha sofrer a precificação como o petróleo que tem seu valor definido nas bolsas e as ações das empresas que o privatizaram, valoradas no mercado financeiro.

O petróleo é substituível, independentemente de custar caro mudar a matriz energética de fóssil para renovável. Mas a água não é substituível. A água é uma incógnita, um mistério da vida. Pode ser renovável se cuidada e não renovável se degradada. Água: decifre-a ou ela te devora!

A Organização dos Estados Americanos (OEA) estimou em 2000 que, em 30 anos, o barril de água estaria mais caro que o de petróleo, sinalizando de que esse era o objetivo dos bancos multilaterais, como o Banco Mundial, com a precificação da água. São esses bancos os principais financiadores do saneamento básico e de infraestruturas no binômio “água e energia” em países vulneráveis e em desenvolvimento.

Como conhecemos a engrenagem deste sistema “por dentro”, por termos negociado as commodities minerais (ouro e petróleo), as commodities agropecuárias (soja, milho, boi, café) e derivativos (derivado de ativos) , somos convictos de que cotar a água em bolsas de valores seria uma tragédia mundial.

Seguimos durante duas décadas, militando em redes internacionais e nas mais diversas frentes, para que fossem feitas leis e acordos internacionais que determinassem que a água fosse um direito humano e de todos os seres. Temos conclamado em todos os fóruns e na mídia, chamando a sociedade à sua responsabilidade socioambiental.  Assim sendo, a sociedade deve assumir os comitês de bacia hidrográfica; se não existir um em sua cidade, reúnam as lideranças, a sua comunidade, e façam o seu!

Água, direito à vida.
Sendo a água fundamental à vida no planeta e fundamental à própria existência da Terra, desde sempre, defendemos que a água deveria ser um direito constitucional como é o acesso à saúde ou à escola. Toda a população deve ter o direito de acesso, em quantidade e qualidade garantindo a segurança hídrica tanto quanto a segurança alimentar. Portanto, considerando que água é vida, reconhecemos que este direito já está assegurado pela Constituição Brasileira com o princípio da “dignidade da pessoa humana” como observaremos adiante com o fundamento jurídico –econômico do conceito “commodities ambientais”.

Água como commodity ambiental.
Este conceito tem sofrido a distorção por parte de especuladores, dos oportunistas de plantão e outros interessados na privatização deste bem comum, na medida em que tentam disfarçar o uso de commodity convencional que fazem da água. Por exemplo, o caso de uma fábrica de refrigerantes que instala uma fábrica e explora água do Aquífero Guarani, impondo o risco à humanidade de desperdício e contaminação desta água – enquanto que já há inúmeras denúncias devidamente comprovadas por contaminação e degradação em diversas regiões no país.

A água como commodity ambiental, é o insumo para produção de uma mercadoria originária dos recursos naturais em condições sustentáveis, cujas matrizes são: água, energia, biodiversidade, floresta (madeira), minério, reciclagem e redução de emissão de poluentes – na água, no solo e no ar. As matrizes são ecossistemas e/ou processos renováveis e não renováveis. A matéria prima é o fruto originado da matriz que produz a mercadoria .  Uma goiabeira é matriz, não é mercadoria. A matéria prima é a goiaba que produz a mercadoria, o doce de goiaba da mulher produtora de doces da cidade de Campos do Goytacazes (RJ). Campos é conhecida pela sua famosa goiabada cascão, receita ensinada de mãe para filha, pelas mulheres indígenas da etnia Goytacá. O objetivo deste conceito, é incluir o trabalhador e a trabalhadora, o e a extrativista, a mulher e o homem campesino (a), a e o agricultor (a), entre outros e outras, combatendo a discriminação étnica e racial, promovendo a igualdade de gênero, resgatando princípios e valores universais ao compartilhar e cuidar da água como bem comum.

A água como commodity ambiental é a retirada  do rio, por exemplo, que foi usada para irrigar a produção agroecológica, a orgânica, a permacultura, a biodinâmica, a agrobiodiversidade, a produção de subsistência e se “transformou” em produto-mercadoria. A commodity ambiental não é o rio, não é o ecossistema, nem é o bem comum.

A água como commodity ambiental é a água virtual utilizada como insumo para plantar e colher o fruto desta frondosa árvore da vida. Também não é a maçã pecaminosa de Eva seduzida pela serpente, a imagem bíblica onde a “mulher” é apresentada profanando o paraíso. É o fruto do ventre materno que gera a vida, carregado em uma “bolsa de água” por nove meses, e que dará luz a um ser vivo na presente e futura geração.

A água como commodity ambiental é a água benta providencial que nos proporciona o alimento; a que mata a nossa sede por justiça;  a que foi negada ao nordestino, excluído pela seca e pelo descaso político; a que foi brutalmente arrancada das nascentes palestinas e africanas; a que foi cuidada quando retorna no ambiente em forma de prosperidade e de riquezas com valor econômico.

A água como commodity ambiental é a água usada para irrigar as árvores frutíferas das matas ciliares que protegem os rios, represas e nascentes do Cerrado, da Caatinga, da Mata Atlântica, do Pantanal, do Pampa, da Amazônia, enquanto os frutos são alternativas socioeconômicas de ocupação e renda para o sofrido povo ribeirinho, para os povos indígenas, para as populações tradicionais, para os agricultores, para os campesinos, e – por misericórdia em missão de paz, sem excluir – também para os pequenos e médios produtores rurais, os que são “produtores de água”. Sobre este tema esclareço com o artigo “As commodities ambientais e a métrica do carbono”.

A meta neste modelo econômico, o socioambiental, é o desenvolvimento de uma sociedade digna, igualitária, ética, politicamente participativa e integrada. Como por exemplo, o trabalho cooperativo nas áreas indígenas e quilombolas, onde todo o “fruto do trabalho coletivo” é revertido para a comunidade. E quando falamos de bacia hidrográfica, é a água com a gestão hídrica compartilhada proposta pela “cobrança pelo uso da água”, dos que podem e devem pagá-la por que dela se utilizam para produzir bens e serviços; são as indústrias, o comércio e os prestadores de serviços, o agronegócio, entre outros, cujo recurso financeiro deve retornar para a população.  A sociedade tem o dever de fiscalizar, além da gestão ambiental na bacia hidrográfica, a destinação do dinheiro e, sobretudo decidir quando, como e de que forma usá-lo.

Portanto, trata-se de um projeto em construção coletiva para a gestão financeira da coisa e não a coisa que se torna financeira como estão fazendo, ao impor goela abaixo, com o novo Código Florestal e com as leis que vem neste mesmo pacote de produtos e serviços, os instrumentos da “economia verde”, como os créditos de carbono, os créditos de compensação, os pagamentos por serviços ambientais, o REDD*, entre outras pirotecnias financeiras, também confundidas com a legítima proposta “a cobrança pelo uso da água”, discutida por anos nas trincheiras do bom combate, entre tantas outras propostas e iniciativas que nos são tão caras.

O conceito “Commodities Ambientais”
De acordo com o princípio norteador do conceito “commodities ambientais” traçado pelo Conselho Jurídico da Aliança RECOs:

A diretriz traçada pelo conceito do Projeto “Commodities ambientais” encontra respaldo no ordenamento jurídico pátrio, especialmente na Constituição Federal, que define como bens ambientais os que, no plano normativo, são considerados essenciais à sadia qualidade de vida (art. 225 da CF).
 

Os bens ambientais são considerados juridicamente essenciais aos valores diretamente organizados, sob o ponto de vista jurídico, em face da tutela da vida da pessoa humana (o próprio patrimônio genético, a fauna, a flora, os recursos minerais, etc.), como, principalmente, em face da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), verdadeiro fundamento a ser seguido no plano normativo.
 
Nossa Constituição Federal, para garantir os direitos considerados essenciais à dignidade da pessoa humana, destinou e assegurou aos brasileiros e estrangeiros residentes no País, garantindo os direitos à educação, à saúde, ao trabalho, à moradia, ao lazer, à segurança, à previdência social, à proteção à maternidade, à proteção à infância e a assistência aos desamparados como um verdadeiro piso vital mínimo, a ser necessariamente assegurado por nosso Estado Democrático de Direito.
 
Conforme estabelece essa carta, a ordem econômica tem por fim assegurar a brasileiros e estrangeiros residentes no País uma existência digna, conforme princípios explicitamente indicados no art. 170 (incisos I a IX).
 
A defesa do meio ambiente (art. 170, VI), associada à soberania nacional (art. 170, I), assume importante destaque, influenciando evidentemente toda e qualquer atividade econômica.
 
Os princípios que iluminam juridicamente a ordem econômica em nosso país é que o poder público – não só como agente gestor, normativo e regulador da atividade econômica, mas principalmente no sentido de assegurar a efetividade do direito ambiental em face dos recursos ambientais (art. 225, § 1º) – deverá exigir, como regra, “Estudo Prévio de Impacto Ambiental” para a instalação de toda e qualquer obra, ou mesmo atividade, que potencialmente possa causar significativa degradação do meio ambiente – natural, artificial, cultural e do trabalho -, em face daqueles que pretendam licitamente explorar recursos ambientais.
 
O bem ambiental, conforme explica o art. 225 da Constituição, é “de uso comum do povo”, isto é, não é bem de propriedade pública, mas de natureza difusa, razão pela qual ninguém pode adotar medidas que impliquem gozar, dispor, fruir do bem ambiental, destruí-lo ou fazer com ele de forma absolutamente livre tudo aquilo que é da vontade, do desejo da pessoa humana no plano individual ou meta-individual.
 
Ao bem ambiental é somente conferido o direito de uso, garantido o direito das presentes e futuras gerações.
 
A natureza jurídica do bem ambiental como de único e exclusivo uso comum do povo, elaborada pela Constituição de 1988 e vinculada à ordem da econômica, visando assim a atender às relações de consumo, mercantis e a outras importantes relações destinadas à pessoa humana, tem na dignidade da pessoa humana seu mais importante fundamento.

Ressalte-se que a obrigação daqueles que exploram recursos naturais não se esgota na recuperação do meio ambiente natural degradado (art. 225, § 2º, da Constituição Federal), mas decorre também do impacto ocasionado sobre a vida em todas as suas formas, o que levará ao controle do meio ambiente em todas as suas manifestações (natural, cultural, meio ambiente artificial e meio ambiente do trabalho), na forma da lei.“

Estamos convencidos de que é imprescindível mudar o modelo econômico vigente, de que é preciso lançar um olhar holístico, integral da realidade. A soberania das nações está seriamente ameaçada, como é o caso do Brasil, com as reformas legislativas em curso e com o desmantelamento da Constituição Federal, de modo a violentar, vergonhosamente, o Estado Democrático de Direito.
O Brasil precisa seguir o exemplo dos seus vizinhos bolivianos, equatorianos e uruguaios, e lutar pelo direito à água, compreendendo que a água também tem valor econômico porquanto é vida. Mas que a vida de valor inestimável, não tem PREÇO!

Nota:
Em março de 2010, com o tema “Água: o grande desafio”, o primeiro Fórum Internacional de Gestão Ambiental – FIGA fez sua primeira edição, onde buscou promover um franco debate quanto à gestão dos recursos hídricos. O FIGA é realizado anualmente pela ARI – Associação Riograndense de Imprensa com o apoio de diversas entidades e instituições de ensino e pesquisas, na cidade de Porto Alegre, no estado do Rio Grande do Sul e já reuniu, desde sua primeira edição, os maiores especialistas em gestão de recursos hídricos do Brasil e do exterior. http://figambiental.com.br/

*REDD – Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação.

Referências:
EL KHALILI, Amyra. Commodities ambientais: novo modelo econômico para América Latina e o Caribe. Fórum de Direito Urbano e Ambiental – FDUA, Belo Horizonte, ano 12, n. 71, p. 9-22, set./out. 2013.

EL KHALILI, Amyra. As commodities ambientais e a métrica do carbono. Fórum de Direito Urbano e Ambiental – FDUA, Belo Horizonte, ano 16, n. 93, p.26-31, maio./jun. 2017.

EL KHALILI, Amyra. O Rio São Francisco e a “cobrança pelo uso da água”. Jornal Pravda.RU.  Acesso em:  14 ago. 2016. Capturado em: 10 mar. 2017. http://port.pravda.ru/sociedade/cultura/14-08-2016/41543-rio_sao_fransisco-0/

FANTE, Eliege. Fórum Internacional de Gestão Ambiental – Água, o Grande Desafio.EcoAgência de Notícias. Acesso em: 23 mar. 2010. Capturado em: 02 set. 2017. http://www.ecoagencia.com.br/?open=noticias&id=VZlSXRFWWNlUspFVOdVMXJ1aKVVVB1TP

PINTO, Lúcio Flávio. As verdades amazônicas e as visagens utilitárias. Publica o Jornal Pessoal (JP) – Acesso em: 09 out. 2010. Capturado em: 03 set. 2017. http://idlocal.com.br/as-verdades-amazonicas-e-as-visagens-utilitarias?locale=pt-br

ONU reconhece acesso à água potável como direito humano. Acesso em: 29 de jul. 2010. Capturado em: 03 set. 2017. http://www.dn.pt/ globo/interior/onu-reconhece-acesso-a-agua-potavel-como-direito-humano -1629749.html

Assembleia Geral da ONU reconhece saneamento como direito humano distinto do direito à água potável.  https://nacoesunidas.org/ assembleia-geral-da-onu-reconhece-saneamento-como-direito-humano-distinto-do-direito-a-agua-potavel/. Acesso em: 04 jan. 2016. Capturado em: 03 set. 2017.

*Amyra El Khalili é professora de economia socioambiental. É editora das redes Movimento Mulheres pela P@Z! e  Aliança RECOs – Redes de Cooperação Comunitária Sem Fronteiras. É autora do e-book “Commodities Ambientais em Missão de Paz: Novo Modelo Econômico para a América Latina e o Caribe”.