por Marco Aurélio Mello, DoLaDoDeLá
Lembrei-me do episódio que narro em seguida depois de ver o nome de
Carlinhos Cachoeira de volta ao noticiário, no caso envolvendo o senador
Demóstenes Torres.
Partindo de onde partiu, resolvi por as “barbas de molho”. Por quê? Explico.
Era 2004. Trabalhava na TV Globo, em São Paulo.
Um deputado estadual do Rio, não me lembro mais quem, havia passado
para o Fantástico a gravação que incriminava Waldomiro Diniz, então
assessor da Casa Civil do primeiro governo Lula.
O “furo” da Revista Época (leia-se Editora Globo),
em fevereiro daquele ano, abriu caminho para a CPI dos Bingos, na Câmara
Federal e excitou a mídia, que festejava a descoberta do caixa dois da
campanha do PT à presidência.
De quebra, enfraquecia o principal artífice do projeto político ora no poder: José Dirceu.
Luiz Carlos Azenha e eu fomos incumbidos, em São Paulo, de produzir
uma reportagem especial esmiuçando a gravação entre Cachoeira e Diniz a
procura de desdobramentos.
Produzimos um vt de quase 8 minutos. A princípio seria para o JN (duvidávamos, por causa da longa duração), depois passaram para o Fantástico e, por fim, reeditamos para o Jornal da Globo, depois de cortes e mais cortes.
A certa altura da edição, toca o telefone na minha mesa. Pasmo,
atendo, do outro lado da linha, Carlos Augusto Ramos, Carlinhos
Cachoeira, o próprio. Pergunto aos meus botões: como foi que ele
descobriu a produção da nossa reportagem? E mais, quem teria dado o meu
ramal a ele?
Conversamos com franqueza e cordialidade. Ele desqualifica a
reportagem que estamos fazendo e diz (numa tentativa de barganhar a seu
favor) que tem como nos dar com exclusividade o caminho para o caixa
dois do PSDB (seria uma isca?).
Digo a ele que não tenho poder para mudar o trabalho em curso, mas
sugiro que me explique qual é a denúncia exatamente, para encaminhar à
direção.
Ele me conta que o negócio de caça-níqueis, bingos e loterias deixou
de ser rentável e que migou para o ramo de medicamentos genéricos, mais
“limpo” e atrativo. Estava disposto a contar “em off” como era o esquema
na Anvisa para liberação das fórmulas.
Era denúncia grave. Envolvia o ex-ministro da Saúde e candidato
derrotado à presidência, José Serra, e o ex-presidente da República,
Fernando Henrique Cardoso, que, segundo meu interlocutor, teria até
participado de um encontro com ele, Cachoeira, e outros na base aérea de
Anápolis, quando de um evento da aeronáutica.
Desligo o telefone, consulto o arquivo e bingo! Temos a imagem do
então presidente desembarcando e sendo recebido na pista da base aérea
de Anápolis, no dia apontado por Cachoeira. Peço para “descer” a imagem e
conto para o Azenha.
Decidimos fazer uma menção discreta dentro da reportagem, para não
chamar a atenção da nossa chefia, e que, indo ao ar, poderia servir de
pista para repórteres investigativos, cujos veículos fossem mais isentos
e independentes.
Diante desta nova bomba, que poderia equilibrar o jogo em favor do
governo Lula que, àquela altura, estava imobilizado nas cordas,
apanhando sem parar, apresentei um relatório à chefia e fui pessoalmente
contar ao chefe de reportagens especiais, Luiz Malavolta, o que
tínhamos em mãos.
“Pode esquecer”, disse o Mala. “Denúncia contra o Serra a casa não
vai dar”. Dito e feito. Até hoje ninguém abriu a caixa preta da
indústria farmacêutica dos genéricos. Ou será que o Amaury Ribeiro Jr.
não desvendará esse mistério para nós em: A Privataria Tucana 2?
Por isso, quando ouço falar de Carlinhos Cachoeira, Revista Época, Globo e congêneres já fico com uma preguiça danada.
Foi o que disse ao meu sobrinho dia desses: “Toda denúncia serve ao
interesse de alguém.” No caso desta última, envolvendo o senador por
Goiás, a quem interessa?
FONTE:http://www.viomundo.com.br/denuncias/marco-aurelio-mello-a-quem-interessa-a-denuncia-envolvendo-demostenes-torres.html
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