“A feiúra é superior à beleza, porque dura para sempre”.
O autor dessa frase, Serge Gainsbourg, era feio e franzino, narigudo e orelhudo, tinha olheiras e dentes podres.
Além disso, vivia bêbado, fumava sem parar e consumia drogas em volumes industriais. Tinha, por assim dizer, o gosto da sarjeta. Mesmo assim foi um dos maiores sedutores de seu tempo, os libertários anos 60: basta citar, entre as mulheres que se renderam ao seu encanto e charme, Brigitte Bardot, Catherine Deneuve, Juliette Gréco e Jane Birkin.
Gainsbourg também colecionava escâncalos e foi preso diversas vezes: gravou na Jamaica A Marselhesa em versão reggae, queimou dinheiro em público em protesto contra o aumento dos impostos e, num programa ao vivo na TV, já na década de 80, disse à cantora Whitney Houston: “Você é muito bonita, e eu quero te comer”.
O maior sucesso de Gainsbourg, a canção-orgasmo ‘Je t’aime, moi non
plus’, foi escrita originalmente para Brigitte Bardot, no final dos anos
60, mas a atriz se recusoua gravá-la por conta do conteúdo sexual – a
melodia é pontuada por gemidos de prazer explícito. A versão de 1974,
um dueto Gainsbourg/Birkin, foi censurada no Brasil, na Inglaterra, na
Espanha e em Portugal e condenada pelo Vaticano.
É uma música cafona e
canalha, com vocação para trilha sonora de romance de motel, mas virou cult para
mais de uma geração. A casa onde Gainsbourg morou no bairro de
Saint-Germain-des-Prés, com as paredes cobertas de poemas rabiscados, é
até hoje um ponto turístico.

Do relacionamento com Jane Birkin, aliás, nasceu Charlotte
Gainsbourg, com quem Serge gravou outra canção polêmica, ‘Lemon Incest’:
no clipe insinuante,
pai e filha cantam deitados numa cama.
Hoje Charlotte é a atriz
preferida do também polêmico Lars Von Trier.
Outra curiosidade é que a
atriz que interpreta Jane , Lucy Gordon, em Serge Gainsborg – O homem que amava as mulheres, em cartaz nos cinemas (trailer aqui), se matou quando o filme estava na etapa de edição.
O longa de estreia do artista gráfico Joann Sfar conta as peripécias
de Gainsbourg com competência e evidente admiração do diretor por seu
personagem – a quem já dedicara um livro em quadrinhos.
É uma declaração
de amor, mais que uma investigação preocupada em esclarecer os enigmas
da vida do cantor. Como declarou o cineasta, “Eu amo demais Gainsbourg
para tentar trazê-lo à realidade. Não são as verdades em torno dele que
me interessam, mas suas mentiras.”
Trata-se portanto de uma reinvenção,
mais que de uma reconstituição realista e atenta aos detalhes da
verossimilhança. A infância do menino judeu sob a ocupação nazista, por
exemplo, é evocada de forma poética, com a composição visual, a luz e as
cores tendo um papel mais importante que o texto.
E, para ilustrar as
crises criativas e existenciais de seu personagem, Sfar inseriu na trama
um boneco que representa a sua voz interior - presença recorrente nos
momentos mais radicais da turbulenta trajetória de Gainsbourg. Num
esforço para realçar traços, relações e momentos marcantes, a cronologia
é muitas vezes atropelada, mas o resultado é o desejado: um filme de
atmosfera, mais que uma cinebiografia.
Serge Gaindbourg, o Baudelaire dos anos 60, morreu de ataque cardíaco
em 1991, após uma vida de excessos em tempo integral. O mito continua
vivo, servindo de consolo e inspiração para os feios e charmosos.
FONTE: http://g1.globo.com/platb/maquinadeescrever/2011/07/13/o-importante-e-ter-charme-a-vida-turbulenta-de-serge-gainsbourg/
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