De pé de chinelo o ex-senador Gilberto Miranda não
tem nada; sua tentativa de construir um porto na ilha dos Bagres, em
Santos, para milhares de containers empresariais, e com R$ 2 bi de
dinheiro público, é a parte principal da Operação Porto Seguro; Miranda
tem interesses cruzados com o vice-presidente Michel Temer e o
ex-presidente José Sarney.
247_ Tem gente que só pensa grande – e o ex-senador Gilberto
Miranda é uma dessas pessoas. Ele representa, neste momento, o maior
interesse financeiro, empresarial e estratégico enrolado nos grampos,
investigações e prisões feitas pela Polícia Federal na Operação Porto
Seguro.
Os interesses de Miranda em torno da construção a ser financiada
com R$ 2 bilhões dos cofres públicos de um porto marítimo na Ilha dos
Bagres, em Santos, são tão grandes que derrubam a primeira versão de
agentes da PF para as próprias descobertas, que apontava a Porto Seguro
como "coisa de chinelagem", quer dizer, de deliquentes pés de chinelo.
Tudo o que Gilberto Miranda não é, é pé de chinelo. Dono de uma das
maiores fortunas do Brasil, construída após atividades de articulação
empresarial na antiga Zona Franca de Manaus, a partir do final da década
de 1980, ele é filhote político do presidente do Senado, José Sarney,
graças a quem entrou para a política como suplente de senador pelo
Amazonas.
Nos últimos tempos, Miranda vinha articulando o financiamento público
do Porto dos Bagres, buscando apoios para seu intento não apenas em
Sarney, mas também no vice-presidente Michel Temer, cuja presença por
meio de correligionários em cargos estratégicos no Porto de Santos é
histórica.
Muito mais do que obter uma licença ambiental para permanecer com sua
mansão e heliponto na Ilha das Cabras, na entrada do canal de Ilhabela,
o que Giberto Miranda tentava por meio de movimentos sobre o escritório
da Presidência da República em São Paulo e, mais especialmente, em
contatos com os irmãos Paulo e Rubens Vieira – presos no domingo 25 e
que ocupavam, respectivamente, diretorias na Agência Nacional de Águas
(ANA) e na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) – era obter
autorizações para abrigar grandes containers na Ilha dos Bagres.
Na
prática, Miranda estava perto de chegar a ter seu próprio porto marítimo
sem precisar buscar regularmente uma concessão ou investir pesado na
infraestrutura necessária. Com um parecer favorável do agora
ex-advogado-geral adjunto da União, José Webber Holanda Alves – demitido
pela presidente Dilma e investigado pela PF por ter padrão de vida
considerado incompatível com seus rendimentos --, Miranda estava se
aproximando do seu objetivo.
Ele ainda pretende, na Ilha dos Bagres, ter
um porto capaz de armazenar milhares de coitainers, operando
diretamente com as maiores empresas do Brasil. Mas no meio do caminho
chegou a Polícia Federal.
Abaixo, reportagem a respeito publicada no jornal Folha de S. Paulo:
MARIO CESAR CARVALHO, JOSÉ ERNESTO CREDENDIO DE SÃO PAULO.
No cargo de advogado-geral-adjunto da União, José Weber Holanda
ajudou o ex-senador Gilberto Miranda na aprovação do projeto de um
complexo portuário de R$ 2 bilhões na ilha de Bagres, área de proteção
permanente ao lado do porto de Santos.
A obra, que ocuparia 1,2 milhão de m² - área similar à do parque
Ibirapuera -, dependia de autorização do Ibama, da Secretaria de Portos e
da Secretaria de Patrimônio da União. Todos aprovaram.
Weber atuava com Paulo Rodrigues Vieira, preso na última sexta pela
Operação Porto Seguro da Polícia Federal sob acusação de comandar um
grupo que fazia tráfico de influência em órgãos federais.
O empreendimento na ilha de Bagres, cuja construção começaria em 2013, é o maior negócio flagrado na ação.
Weber era o braço direito do ministro Luís Inácio Adams na AGU
(Advocacia-Geral da União), órgão que defende os interesses do governo.
Indiciado pela PF, ele foi afastado do cargo.
A procuradora que atua no caso, Suzana Fairbanks, escreveu que uma
das conversas telefônicas entre Vieira e Weber, em abril, sugere o
pagamento de propina a Weber.
Vieira diz: "Eu trouxe aquele volume resumido. Tem o volume resumido que eu mandei comprar pra você e preciso te entregar".
Para a procuradora, "Paulo [Vieira] provavelmente estava pagando
Weber por seu auxílio, enquanto adjunto da AGU, no parecer que
fundamentaria a licença [...] de terminal no porto de Santos".
De acordo com a PF, "livros", "exemplares" e "volume" são expressões cifradas para designar dinheiro.
O projeto foi aprovado pelo Ibama em um ano, tempo considerado
inusual. Casos assim costumam demorar até três anos. A procuradoria do
Ibama é vinculada à AGU.
Em outra ligação, Vieira diz que foi ele quem escreveu parecer sobre o projeto: "Foi até eu que deu aquela redação".
A PF diz ter indícios de que os pareceres oficiais chegavam prontos
para os órgãos do governo. Um dos indícios aparece numa conversa de maio
entre Miranda e Vieira.
O ex-senador pergunta se Glauco [Moreira, procurador-geral da Agência
Nacional de Transportes Aquaviários] atenderia pedido do grupo.
"Ele dá sequência?", quer saber Miranda. Vieira responde: "Dá!
Principalmente se levar pronto. Principalmente se levar mel na chupeta".
Uma assessora da Secretaria do Patrimônio da União, Evangelina Pinho,
chegou a viajar num jato de Miranda para tratar do projeto na ilha.
As gravações mostram que Miranda festeja quando o governador de São
Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), assina um decreto em que reconhece a
"relevância econômica e social da obra".
A empresa do projeto, a SPE, foi criada em 2009. O principal
acionista chama-se Baron CV, firma registrada na Holanda com capital de
R$ 25 milhões. A PF suspeita que Miranda seja um dos sócios.
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