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Por Fernando Souto, no blog do Nassif - Não
vou comentar muito sobre as falas do meu xará Haddad. Vou me concentrar
no que sei e que vi, para dizer que em grande parte dos estudantes
estão sim certos.
Fui
analista de crédito num banco privado em 2006/7 em São Paulo, e neste
banco, muitas empresas de ônibus eram clientes. muitas mesmo. e havia um
jeito bem especial de lidar com elas.
Ocorre
que para uma empresa ganhar empréstimo, ela tem de ter fundamentos
econômicos financeiros – ou seja capacidade de pagar. E aí é que o
bicho pega: pelas demonstrações contábeis oficiais, praticamente nenhuma
empresa de ônibus teria condição de pegar empréstimos. E por quê?
Porque são estas são as demonstrações (balanços e dres) exibidas para os
governos, a partir das quais se geram as planilhas de custo e, em
seguida, as tarifas.
Havia
coisas estranhas, das quais dois pontos eu me lembro com maior atenção:
O ativo imobilizado era muito baixo (ativo imobilizado é o que a
empresa tem de propriedade, portanto seriam frotas de ônibus e
propriedades das empresas).
Muitas, mas muitas apresentavam patrimônio
liquido negativo – ou seja acumulavam, por anos consecutivos, prejuízos
que superavam o capital social da empresa. As contas nunca fechariam —
as receitas seriam baixas perante as despesas. Além disto, as empresas
possuem passivos muito maiores que ativos, e como ativos tem de ser
igual ao passivo mais patrimônio liquido, este tinha de ser negativo.
Com
uma situação financeira dessas, uma empresa não toma emprestado. E aí
vai o pulo do gato (que dá medo de contar): é óbvio que estas
informações estão deturpadas (sendo gentil), e vou explicar como. Tanto
era assim que nós tínhamos uma planilha em excel que fazia o calculo do
real balanço destas empresas.
Os
pontos são os seguintes: o ativo imobilizado não está declarado nestes
balanços. É como se a ideia do pequeno empresário que não distingue o
próprio bolso do caixa da empresa fosse levada às alturas. Donos de
empresas têm parte da frota em nome próprio (ou de laranjas).
Ou, então,
compram em nome da empresa e depois “revendem” para terceiros
(sócios), após quitados os financiamentos. Os terrenos nos quais estão
as garagens das empresas são de propriedade dos sócios e também não
aparecem no balanço.
Por fim, essas empresas não pagam encargos
trabalhistas, adiando-os ao máximo, para aproveitar, quando aparece, uma
renegociação. Fazem isso para aumentar muito o exigível de longo prazo,
propositalmente, além de ganhar caixa extra pago pelo governo.
Cientes
dessas informações, para fazer a análise consolidávamos o patrimônio
dos sócios (que na verdade seriam das empresas) com o das empresas. É
claro que elas davam lucro na realidade – afinal estes empresários
seriam tão idiotas de continuar pra sempre num setor com altos fluxos de
dinheiro se tivessem sempre prejuízos? Mas tem mais…
Àquela
época, e ainda hoje, existem várias empresas que atendem o transporte
urbano – em São Paulo, Rio de Janeiro e outras tantas cidades –, mas são
poucas famílias que controlam de fato esta estrutura. Fazem isso
indiretamente, através de sociedades.
Em São Paulo, se não me engano,
eram cinco famílias, que tomaram o setor na privatização da CMTC. Quando
estas empresinhas começam dar muitos problemas, elas fecham e abrem
outro CNPJ, com outros sócios. Fornecedores e especialmente funcionários
ficam a ver navios.
Por falar em funcionários, lembram-se do que falei
sobre os direitos? Pois bem, deixem-me explicar uma coisa que acontecia
até com os gerentes do banco, quanto mais com os funcionários.
No dia a
dia, esses empresários são representados por “gerentões” armados. Se
eles não querem atender alguém, e no contato comum todos os
funcionários, são esses representantes que cuidam da negociação. Então,
por exemplo — isso já ouvi dos próprios motoristas comentando no Rio —
quem vai entrar na justiça pra cobrar direitos, na melhor das
possibilidades nunca mais trabalhara em qualquer outra empresa de
ônibus. Se encher muito o saco, vai buscar o direito e não volta.
Para
quem acha que eu estou exagerando, ficam 2 dicas: procurem noticias
sobre assassinatos de sindicalistas de ônibus. de vez em quando tem um. E
outra: no final do debate de 2004 na rede globo, naquela eleição
fatídica em que marta perdeu do José serra, ela comenta que teve de
entrar com colete a provas de balas numa reunião com empresas de ônibus
(trabalhei com um cara da alta cúpula do governo dela, e ele comentava
que ela e o secretario sempre iam de colete, e que os empresários
levavam seguranças armados e que sempre tinham de passar detectores de
metais para tirar as armas dos caras).
Enfim,
o que eu queria dizer é o seguinte: sei que o Haddad fez mestrado na
minha faculdade de Economia, portanto não é de todo inábil com números e
devia abrir as tais planilhas de custo. Seria bom puxar um bom auditor
pro lado dele, e usar as críticas como legitimação pra rever esse
lamaçal todo.
Seria uma forma de aproveitar esta pressão contra estas
empresas. A não ser que realmente seja só o apoio de financiamento em
época de eleição que valha a pena… Em suma, é uma grande máfia, e não
vai ser fácil desarmá-la – só que também, se for pra defendê-las,
poder-se-ia ter mantido o Serra, certo?
E
realmente não são só vinte centavos. Acho que a força desta garotada
que está na rua – e que une Istambul, Occupy WallStreet, 15m na Espanha e
todos os outros – vem do cansaço de ver todas as decisões importantes
de interesse público serem dominadas por grandes interesses de pequenos
grupos privados – e em todos os casos, defendidos na porrada por um
Estado policialesco.
E
pra não dizer que não falei das flores, fiquem com essa pequena pérola
de genialidade empreendedora baronesca do imperadores do transporte
publico do Brasil. Na Veja, claro, em 1998. (se o setor não dá lucro, porque eles estão tão ricos?)
E
sobre um barao especifico (um dos mais poderosos), no Rio de Janeiro.
(ps1: parece que é o sogrão do Paes. ps2: vejam quantos sócios ele tem
três como em outro baronato, a família comprou uma empresa de aviação).
http://brasiliaempauta.com.br/public/arquivos/3811AdificildecolagemdoClaBarata.pdfLink desta Matéria: http://brasiliaempauta.com.br/artigo/ver/id/2206/nome/Como_as_empresas_de_onibus_maquiam_seus_custos
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