Um ano e pouco depois do golpe, a ruptura do tecido democrático revela graves cicatrizes nos principais músculos da economia.

 
Por Gilberto de Souza – do Rio de Janeiro

A continuidade dessa pantomima em que um setor da Justiça visa prevalecer, ao lado de um segmento político da sociedade, no caso os partidos de direita, sobre um outro com o seu conjunto de legendas de centro-esquerda e, assim, definir os rumos políticos de uma nação, tem conduzido a sociedade como um todo ao desespero. O cidadão mais absorto dos meandros jurídico, parlamentar e econômico já percebeu uma situação plena de hipocrisia no discurso vazio que prevalece desde a ruptura democrática, há pouco mais de um ano.
Por pura cegueira política, no efeito manada gerado em um conluio entre segmentos cartelizados da mídia alinhada ao establishment e o financiamento exterior, de fortunas ligadas à ultradireita em parceria com instituições da iniciativa privada nacional, milhares de brasileiros serviram ao propósito pré-definido no Congresso para, mais uma vez, interromper o ciclo democrático. O golpe segue adiante.

Golpe de Temer

Um ano e pouco depois, a ruptura do tecido democrático revela graves cicatrizes nos principais músculos da economia. Indústria, comércio e serviços aprofundam as curvas de declínio na mesma medida em que os empregos desaparecem. Ainda que a equipe econômica do presidente de facto, Michel Temer, se esforce em iludir os incautos, os sinais macroeconômicos seguem negativos. A curva declina em ângulo similar à credibilidade do governo. Temer permanece no Palácio do Planalto a despeito dos 96% de brasileiros que o querem fora de lá. O quanto antes.
As tais “forças de mercado”, no entanto, ainda apostam que o mesmo grupo que conseguiu afastar a presidenta deposta Dilma Rousseff (PT) estarão íntegras até a aprovação da última medida capaz de retirar direitos dos trabalhadores. O jogo de cena do senador peemedebista Renan Calheiros (AL) conseguiu adiar, por mais alguns segundos, a morte da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). Mas telefone toca. O Telegram secreto funciona. E os acordos mais nefastos sempre se consolidam, quanto os interesses são adequados à canalhice em geral. Tal cenário é o próprio Boulevard dos sonhos desfeitos, da poetisa Marianne Faithfull.

Gilberto de Souza é jornalista, editor-chefe do diário Correio do Brasil.