domingo, 11 de dezembro de 2011

Gestores de Universidades Federais são alvos de inquéritos.


BRASÍLIA - Centros de excelência em formação profissional e pesquisa científica, universidades federais têm construído, paralelamente, uma escola de impropriedades na gestão de recursos públicos. Reitores, pró-reitores e ex-dirigentes de, pelo menos, 16 instituições, em 13 estados, são alvos de processos administrativos, auditorias, inquéritos e ações na Justiça por deslizes que vão do favorecimento a parentes e amigos ao desvio de verbas. Só o Ministério da Educação (MEC) apura 23 casos, envolvendo gestores de oito federais, que, se forem considerados culpados, podem perder seus cargos ou, se já afastados, ficar proibidos de voltar ao serviço público e ter as aposentadorias cassadas.

Na lista constam catedráticos que ganharam notoriedade recentemente, como o ex-reitor José Januário Amaral, que renunciou em meio a suspeitas de integrar um esquema de corrupção na federal de Rondônia (Unir). E outros que caíram em desgraça pública bem antes, casos de Timothy Mulholland, da Universidade de Brasília (UnB), envolvido em denúncias de irregularidades em fundações vinculadas à universidade; e de Ulysses Fagundes Neto, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), cujos gastos em viagens ao exterior foram o estopim de sua queda. Ambos saíram em 2008, mas ainda não receberam o veredicto do MEC, cujos processos disciplinares (PADs), não raro, são tão lentos que só acabam após os delitos prescreverem.

No Piauí, o reitor da UFPI, Luiz de Sousa Santos Júnior - campeão de PADs no MEC, com oito - acumula ações na Justiça por improbidade administrativa, além de inquéritos no Ministério Público Federal (MPF) e na Polícia Federal que apuram seu envolvimento numa coleção de irregularidades. Numa das ações, ele é acusado pelo MPF de favorecer com 16 contratos, firmados sem licitação, o empresário Cândido Gomes Neto, apontado como controlador de três empresas de publicidade. Em outra, é responsabilizado por gastos abusivos com cartão corporativo, cuja soma alcança R$ 405 mil.
Lei de licitação pública é burlada
A Procuradoria da República no Piauí quer multar o reitor por, supostamente, descumprir ordem judicial que o proíbe de firmar convênios com a Fundação Cultural e de Fomento a Pesquisa, Ensino e Extensão (Fadex), ligada à universidade, para obras e serviços sem previsão legal. E sustenta que a entidade tem sido usada por ele para driblar a exigência de contratar mediante concorrência pública. Empresas mantenedoras da Fadex, como a Construtora F. Ramalho, e que constam em seu estatuto, aparecem no Diário Oficial da União (DOU) também como beneficiárias de contratos da fundação e da UFPI.

O MEC apura a participação da D&P, empresa que pertenceu ao professor Iônio Alves da Silva, ex-coordenador de Comunicação da universidade e ligado ao reitor, em licitação para serviços de publicidade - o processo parou na Justiça. Também está sob investigação o suposto dano ao erário em obras do campus de Bom Jesus. E o uso da Comissão Permanente de Seleção (Copese) para favorecer parentes e pessoas ligadas aos seus integrantes. Por esse motivo, o pró-reitor de Pesquisa, Saulo Brandão, responde a ação de improbidade do MPF.

Na UFPI, foi necessária a intervenção de procuradores da República até para que o nome de uma colega do reitor no Departamento de Química, posto como homenagem num prédio da universidade, fosse retirado. Em representação, o Diretório Central dos Estudantes (DCE) e a Associação de Docentes (ADUFPI) pedem que o MEC apure a suposta concessão de bolsas, pela Fadex, a Santos Júnior e a uma de suas filhas. Ele nega.

País afora, também estão sob investigação casos de irregularidade em licitações e malversação de verbas na federais de Rio, Amazonas, Pará, Minas, Sergipe, Acre e Pernambuco. No Rio Grande do Sul, o ex-reitor da Universidade de Santa Maria (UFSM) é réu da Operação Rodin, da Polícia Federal, que apurou o suposto desvio de R$ 44 milhões do Detran-RS, por meio de fundações ligadas à universidade. Ele também é um dos investigados no controle interno do MEC. Em Pernambuco (UFPE), um dos alvos são contratações reiteradas das mesmas empresas para fornecer materiais de construção.

Em 23 de novembro, o Tribunal de Contas da União (TCU) mandou suspender licitação da federal de Juiz de Fora (UFJF) para ampliar o hospital universitário. A obra está orçada em R$ 136,8 milhões. Os motivos são um sobrepreço de R$ 15,7 milhões, apontado na auditoria, restrições à competitividade e indícios de conluio entre as únicas três construtoras que participaram da concorrência. Os preços apresentados por elas foram tão parecidos que a primeira classificada, com o maior desconto, tinha uma diferença de apenas 0,38% em relação ao valor de referência.

Na decisão, relatada pelo ministro José Múcio, o tribunal pede à PF e ao MPF que apurem o caso. E afirma que, embora tenha pedido correções no edital em ocasião anterior, a universidade não o fez.

No Rio, o TCU aplicou este ano multas de R$ 20 mil ao ex-reitor da UFRJ Aluísio Teixeira, e de R$ 5 mil à vice-reitora de sua gestão, Sylvia da Silveira Mello Vargas, por impropriedades em parceria com o Sindicato Nacional dos Oficiais de Marinha Mercante (Sindmar) para a instalação de um simulador aquaviário. Os recursos do projeto foram destinados por emenda da deputada Jandira Feghali (PCdoB). O equipamento foi instalado na entidade, presidida na época pelo marido da parlamentar, Severino Almeida Filho.

Segundo o relatório que embasou a decisão, a aquisição feriu a Lei de Licitações e foi direcionada ao Sindmar. Além disso, permitiu-se "o envolvimento da universidade em benefício de uma organização sindical". O equipamento, sustenta o tribunal, sequer era necessário à UFRJ. A reitoria nega irregularidades. Houve recursos ao acórdão, mas o tribunal manteve as multas e deu prazo para o pagamento.

Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/pais/gestores-de-universidades-federais-sao-alvos-de-inqueritos-3425418#ixzz1gEjAIpFt
© 1996 - 2011. Todos direitos reservados a Infoglobo Comunicação e Participações S.A. Este material não pode ser publicado, transmitido por broadcast, reescrito ou redistribuído sem autorização. 

Minas Sem Censura: Folha 2006 desmente Veja 2011.


A insuspeita Folha de S.  Paulo, em matéria de 16 de junho de 2006 (matéria abaixo), informa sobre a validação da “Lista de Furnas” como autêntica, pela criminalística da Polícia Federal. Matéria de Veja, que chegou às bancas neste sábado aposta no esquecimento e na confusão, para desinformar. Segundo a revista semanal a “Lista de Furnas” é produto de uma fraude. A PF diz que não. Nesse caso, em quem você acredita?

São Paulo, sexta-feira, 16 de junho de 2006.

Novo laudo da PF indica que lista de Furnas é autêntica.

Assinados por ex-diretor da estatal, papéis citam campanhas de Alckmin e Serra entre beneficiárias; tucanos negam veracidade

Rubens Valente, Folha de S. Paulo

A Polícia Federal confirmou ontem a autenticidade da chamada “lista de Furnas”, documento de cinco páginas que registra supostas contribuições de campanha, num esquema de caixa dois, a 156 políticos durante a disputa eleitoral de 2002. No total, eles teriam recebido R$ 40 milhões.

Segundo a assessoria da direção geral da PF, em Brasília, perícia do INC (Instituto Nacional de Criminalística) concluiu que a lista não foi montada e que é autêntica a assinatura que aparece no documento, de Dimas Toledo, ex-diretor de engenharia de Furnas, empresa estatal de energia elétrica. A PF informou, contudo, que não tem como atestar a veracidade do conteúdo da lista. Os papéis citam empresas que teriam colaborado para um caixa dois administrado por Dimas Toledo.

Entre as campanhas eleitorais supostamente abastecidas pelo esquema estão as do então governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, hoje candidato à Presidência pelo PSDB, do ex-prefeito de São Paulo José Serra (PSDB), atual pré-candidato ao governo paulista, e do atual governador mineiro, Aécio Neves (PSDB). As campanhas em 2002 teriam recebido, respectivamente, R$ 9,3 milhões, R$ 7 milhões e R$ 5,5 milhões. Tucanos negam.

Lobista
A perícia foi feita em papéis originais entregues à PF pelo lobista mineiro Nilton Monteiro, 49, que diz tê-los recebido das mãos de Dimas, no início de 2005, quando o então diretor de Furnas tentava convencer políticos de vários partidos a mantê-lo no cargo.

Acusado de calúnia por 11 deputados estaduais de Minas Gerais, Nilton Monteiro decidiu entregar em 5 de maio os originais aos delegados da PF de Brasília Luiz Flávio Zampronha, Pedro Alves Ribeiro e Praxíteles Praxedes, que conduzem as investigações.

Até então, a PF tinha em seu poder apenas uma cópia autenticada. A perícia na cópia, também feita pelo INC, apontou indícios de montagem e fraude.

Dimas Toledo, que exerceu a diretoria entre 1995 e 2005, até a denúncia de caixa dois feita à Folha pelo ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), sempre negou ter assinado os papéis (leia texto nesta página).

“Ele assinou [a lista] na minha frente. Ele me usou até um determinado momento, depois me abandonou”, disse ontem Monteiro. O lobista afirma ter se aproximado de Dimas em 2004 por ser, à época, procurador da empreiteira JP Engenharia. A empresa estava interessada em assinar um contrato com Furnas em torno de um projeto de infra-estrutura que havia sido suspenso pela diretoria de engenharia.

Segundo o lobista, Dimas contou que havia uma ação nos bastidores para tirá-lo do cargo e, por isso, pediu-lhe ajuda para fazer um trabalho de lobby com políticos de vários partidos.

O lobista afirmou que, no início de 2005, Dimas fez quatro cópias da lista. Os supostos destinatários das cópias, sempre segundo Monteiro, seriam Aécio Neves, Roberto Jefferson, o presidente do PMDB, Michel Temer, e o então presidente do PSDB, Eduardo Azeredo.

Mas as cópias não chegaram a ser entregues, segundo Monteiro. Ele diz que o original ficou com uma pessoa ligada a um escritório de advocacia do Rio. “Ela ficou como guardiã dos documentos até agora.”

Materia copiada: http://www.viomundo.com.br/politica/minas-sem-censura-folha-2006-desmente-veja-2011.html

sábado, 10 de dezembro de 2011

Privataria - A reportagem investigativa da década

Amaury Ribeiro Jr.

Autor:
 
Fui ontem à coletiva do repórter Amaury Ribeiro Jr, sobre o livro que lançou.


Minha curiosidade maior era avaliar seu conhecimento dos mecanismos do mercado financeiro e das estruturas de lavagem de dinheiro. 

Amaury tem um jeito de delegado de polícia, fala alto, joga as ideias de uma forma meio atrapalhada – embora o livro seja surpreendentemente claro para a complexidade do tema. Mas conhece profundamente o assunto. 

Na CPI dos Precatórios – que antecedeu a CPI do Banestado - passei um mês levando tiro de alguns colegas de Brasília ao desnudar as operações de esquenta-esfria dinheiro e a estratégia adotada por Paulo Maluf. Foi o primeiro episódio jornalístico a desvendar o submundo das relações políticas, mercado financeiro, crime organizado. 

No começo entendi os tiros como ciumeira de colegas pela invasão do seu território por jornalista de fora. Depois, me dei conta que havia um esquema Maluf coordenando o espírito de manada, no qual embarcaram colegas sem conhecimento mais aprofundado do tema. 

Minhas colunas estão no livro “O jornalismo dos anos 90”, mostrando como funcionavam as empresas offshore, o sistema de doleiros no Brasil, as operações esquenta-esfria na BMF e na Bovespa, as jogadas com títulos estaduais. 

Repassei parte desse conhecimento ao meu amigo Walter Maierovitch, quando começou a estudar esse imbricamento mercado-crimes financeiros e, depois, na cerimônia de lançamento do Sisbin (Sistema Brasileiro de Inteligência). 

Mesmo assim, persistiu a dicotomia na cobertura: jornalistas de mercado não entravam em temas policiais e jornalistas policiais não conheciam temas financeiros. E a Polícia Federal e o Ministério Público ainda tateavam esse caminho. 

Aos poucos avançou-se nessa direção. A Sisbin significou um avanço extraordinário na luta contra o crime organizado. E, no jornalismo, Amaury Ribeiro Jr acabou sendo a melhor combinação de jornalismo policial com conhecimento de mercado. 

Quem o ouve falar, meio guturalmente, não percebe, de imediato, sua argúcia e enorme conhecimento. Além de ter se tornado um especialista nas manobras em paraísos fiscais, nos esquemas de esquentamento de dinheiro, tem um enorme discernimento para entender as características de cada personagem envolvido na trama. 

Mapeou um conjunto de personagens que atuam juntos desde os anos 90, girando em torno do poder e da influência de José Serra: Riolli, Preciado, Ricardo Sergio, Verônica Serra, seu marido Alexandre Burgeois. É uma ação continuada. 

Entendeu bem como se montou o álibi Verônica Serra, uma mocinha estreante em Internet, naquele fim dos anos 90, com baixíssimo conhecimento sobre tendências, modelos de negócios, de repente transformada, por matérias plantadas, na mais bem sucedida executiva da Internet nacional. 

Criou-se um personagem com toque de Midas, em um terreno onde os valores são intangíveis (a Internet) para justificar seu processo de enriquecimento.

Mas todo o dinheiro que produzia vinha do exterior, de empresas offshore.  Talvez o leitor leigo não entenda direito o significado desses esquemas offshore em paraísos fiscais. São utilizados para internalizar dinheiro de quem não quer que a origem seja rastreada. Nos anos 90, a grande década da corrupção corporativa, foram utilizados tanto por grandes corporações – como Citigroup, IBM – para operações de corrupção na América Latina (achando que com as offshores seriam blindadas em seus países), como por políticos para receber propinas, traficantes para esquentar recursos ilícitos. 

Ou seja, não há NENHUMA probabilidade de que o dinheiro que entrou pelas contas de Verônica provenha de fontes legítimas, formalizadas, de negócios legais. 

Ao mesmo tempo, Amaury mostra como esse tipo de atuação de Serra o levou a enveredar por terrenos muito mais pesados, os esquemas de arapongagem, os esquemas na Internet (o livro não chega a abordar), os assassinatos de reputação de adversários ou meros críticos. É um modo de operação bastante tipificado na literatura criminal. 

No fundo, o grande pacto de 2005 com a mídia visou dois objetivos para Serra: um, que não alcançou, o de se tornar presidente da República; o outro, que conseguiu, a blindagem. 

O comprometimento da velha mídia com ele foi tão amplo, orgânico, que ela acabou se enredando na própria armadilha. Não pode repercutir as denúncias de corrupção contra Serra porque afetaria sua própria credibilidade junto ao universo restrito de leitores que lêem jornais, mas não chegam ainda à Internet. 

Ao juntar todas as peças do quebra-cabeças e acrescentar documentos relevantes, Amaury escancara a história recente do país. Fica claro porque os jornais embarcaram de cabeça na defesa de Daniel Dantas, Gilmar Mendes e outros personagens que os indispuseram com seus próprios leitores. (Só não ficou claro porque o PT aceitou transformar a CPI do Banestado em pizza. Quais os nomes petistas que estavam envolvidos nas operações?) 

E agora? Como justificar o enorme estardalhaço em torno do avião alugado do Lupi (independentemente dos demais vícios do personagem) e esconder o enriquecimento pessoal de um bi-candidato à presidência da República? 

Mesmo não havendo repercussão na velha mídia, o estrago está feito. 

Serra será gradativamente largado ao mar, como carga indesejada, aliás da mesma forma que está ocorrendo com os jornalistas que fizeram parte do seu esquema.

A CPI dos Precatórios

No PDF, o livro “O jornalismo dos anos 90”.  A partir da página 147, minhas colunas sobre a CPI dos Precatórios, onde já se revelava todo o imenso esquema do crime organizado no país, os doleiros, a operação em Foz do Iguaçu, as concessões do Banco Central etc. 

A ironia da história é que, em determinado momento, consegui convencer o banqueiro Fábio Nahoum – testa de ferro do Maluf – a passar informações ao relator da CPI, senador Roberto Requião. Como testemunhas do encontro, a repórter Mônica Bérgamo – que teve um comportamento impecável quando Requião e alguns colegas de Brasília tentaram desqualificar minhas revelações – e o então senador José Serra. 

Não podia imaginar que um dos esquemas que operava na região era do próprio Serra.

Matéria copiada: http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/a-reportagem-investigativa-da-decada

Sob críticas, UE encerra ajuda ao desenvolvimento para emergentes

Favela de Santa Marta, no Rio: pobreza persiste no Brasil

A partir de 2014, a União Europeia vai suspender a ajuda ao desenvolvimento para um total de 19 países emergentes, a maioria na América Latina. ONGs não concordam com a decisão.


Em tempos de vacas magras, também a Comissão Europeia precisa reavaliar seus gastos. 

Ao apresentar, nesta quarta-feira (07/12), em Bruxelas, o projeto de orçamento de política externa da UE para o período 2014-2020, o comissário do Desenvolvimento, Adris Piebalgs, anunciou que novos modelos de cooperação terão de ser encontrados para 19 países emergentes, já que partir de 2014 sua assistência bilateral será encerrada.

Na América Latina, a medida afetará Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador, México, Panamá, Peru, Uruguai e Venezuela. Além desses países, deixarão de receber ajuda para o desenvolvimento China, Irã, Malásia, Maldivas, Tailândia, Cazaquistão, Índia e Indonésia.

Perda para os pobres

A seleção desses 19 países baseou-se na classificação da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), disse à Deutsche Welle Catherina Ray, porta-voz de Peibalgs. "Trata-se de uma classificação internacionalmente reconhecida. Suspendemos a assistência a todos os países com uma renda média-superior, como é o caso de quase todos os emergentes."

A categoria "média-superior" da OCDE inclui as nações com um Produto Interno Bruto (PIB) entre 3.000 e 9.400 dólares. "O segundo critério que aplicamos se refere àqueles com um PIB superior a 1% do PIB médio mundial. Esses países são suficientemente ricos para financiar com seus próprios meios a luta contra a pobreza. São eles que devem decidir que estratégia aplicar para ajudar aos pobres que seguem existindo em muitos deles."

Isso é precisamente o que criticam as organizações não governamentais de ajuda ao desenvolvimento. "Os pobres seguem abandonados à própria sorte", comenta Michael Flacke, do Serviço da Igreja Evangélica da Alemanha para o Desenvolvimento (EED). As ONGs também empregam o índice de classificação da OCDE, mas somente como um entre vários critérios, já que o crescimento econômico não serve como indicador exclusivo.

Flacke cita o exemplo da China: "Um país com recursos suficientes para satisfazer as necessidades de toda a sua população. No entanto, 20 milhões de pessoas vivem lá em situação de pobreza absoluta." Como esse grupo representa apenas uma pequena percentagem do total demográfico chinês, "não há vontade política do governo para reverter essa situação".

Além disso, acrescenta o porta-voz do EED, os indicadores econômicos pouco ou nada revelam sobre a situação dos direitos humanos, cuja defesa "representa um papel-chave na ajuda ao desenvolvimento", assinalou em entrevista à Deutsche Welle.

Equador e a lógica da UE
 "É uma boa notícia que alguns países não mais necessitem de ajuda ao desenvolvimento. Este é precisamente o objetivo da assistência: que um dia os países receptores estejam em condições de superar seus problemas pelos próprios meios. Por isso, é muito positivo esses países terem alcançado um nível de bem-estar que lhes permite definir, eles mesmos, suas políticas de desenvolvimento", resumiu Catherine Ray a posição do órgão que representa.

O embaixador do Equador na Alemanha, Jorge Jurado, compartilha desse ponto de vista. Ele vê no corte da ajuda para seu país a partir de 2014 "um impacto muito positivo, pois já estamos jogando nas ligas superiores da América Latina, e isso mostra que nosso governo está trabalhando de forma efetiva para tirar nosso país do subdesenvolvimento".

Ainda assim Jurado classifica como "lamentável o fato de que ainda exista uma série de aspectos que realmente merecem a cooperação da UE em todos os sentidos, e nós a consideramos bem-vinda". Por outro lado, o diplomata se "surpreende" com a brevidade do prazo até a suspensão da assistência. "Porque de alguma forma creio que se poderia ter negociado para que fosse mais longo no caso equatoriano, para que pudessemos aproveitar ainda melhor a cooperação." O Equador registra, no ano em curso, 8% de crescimento, assim como uma média de crescimento de 4,5% nos últimos cinco anos.

Problemas à vista
Com tais indicadores, o país reflete uma tendência generalizada em toda a América Latina. O mais recente relatório da Comissão Econômica das Nações Unidas para a América Latina (Cepal) sobre o desenvolvimento na região confirma a avaliação positiva que faz a Comissão Europeia.

Em 2010, o número de pessoas em condições de pobreza foi o mais baixo dos últimos 20 anos. Desde 1990, a taxa de pobreza diminuiu 17 pontos percentuais, de 48% para 31%, ou seja: uma queda de 204 milhões para 177 milhões de pessoas pobres, sobre o total de 550 milhões de habitantes da América Latina.

Entretanto, a Cepal prevê que em 2012 se farão também sentir na região os efeitos da crise nos Estados Unidos e na Europa. Para o ano em curso, o prognóstico de crescimento ainda é de 4,4%, segundo anunciou recentemente em La Paz a secretária executiva da Cepal, Alicia Bárcena. Porém, em 2012 haverá problemas no fluxo financeiro, nas remessas de dinheiro, investimentos e no comércio, antecipou.

Cooperação continua
O fim da ajuda bilateral não marca o fim do diálogo e da cooperação, ressalva Catherine Ray, da Comissão Europeia. "Seguiremos cooperando estreitamente com esses países. Os grandes desafios como a mudança climática, as políticas de segurança, o combate ao tráfico de drogas e de pessoas são temas que nos afetam a todos, igualmente."

Nessas áreas, a Comissão pretende criar novas associações com as 19 nações emergentes, que seguirão recebendo fundos de Bruxelas. "Estamos convencidos de que esses países estão muito desenvolvidos, dispõem de um sistema tributário e de recursos próprios, e há alguns anos estão representando um papel cada vez mais importante no cenário global." De fato, a China e o Brasil assinalaram em mais de uma ocasião sua disposição de auxiliar a Europa a superar a atual crise do euro.

Até 2015, a UE quer elevar sua ajuda ao desenvolvimento para 0,7% do PIB, com maior ênfase a temas como direitos humanos, democratização e boa governança. No momento, a UE é a maior doadora de ajuda ao desenvolvimento em nível mundial. De 2014 a 2020, ela prevê o emprego de 57,5 bilhões de euros na cooperação internacional, o que representa um acréscimo de 38% em relação ao período 2007-2013.

Autoria: Mirjam Gehrke (av)
Revisão: Alexandre Schossler

Matéria copiada: http://www.dw-world.de/dw/article/0,,15587981,00.html

Reflexões - I: Sociedade civil, ONGs e esfera pública





Postado por Emir Sader 20/11/2011.

A grande virada na obra de Marx vem da descoberta de que as relações de classe cruzam o conjunto da sociedade capitalista.

Depois de operar com as categorias herdadas do liberalismo, como Estado/sociedade civil, ele fez o que chamou de “anatomia da sociedade civil” e encontrou la dentro as classes e a luta de classes.

Nas últimas décadas, conforme a luta democrática voltou a ter peso – depois de subestimada, em geral, pela esquerda – a categoria de sociedade civil reapareceu. Como está na sua própria natureza, ela se opõe ao Estado e desloca as relações de classe, como um retorno ao liberalismo clássico, de forma paralela à volta do liberalismo no plano econômico – com o nome de neoliberalismo.

No marco dessa categoria passaram a abrigar-se organizações de distinto tipo, desde aquelas estreitamente ligadas aos movimentos sociais e a outras formas de resistência à ditadura militar, até outras, muito mais ambíguas. Esse amálgama é possível porque a categoria de sociedade civil se presta a isso. Ela significaria “o que não é Estado”, permitindo que se abriguem nesse amplo guarda-chuvas as associações do agronegócio e as dos trabalhadores rurais, as dos proprietários de bancos e as dos bancários, a dos donos de escolas privadas e as dos estudantes, além de outras expressões da “sociedade civil” ainda mais problemáticas, como os narcotraficantes, as milícias, etc., todas pertencentes à “sociedade civil”.

Todas elas tem em comum falta de transparência, porque se autoproclamam representantes da sociedade civil, mas a eleição dos seus dirigentes, as origens dos fundos, a forma de tomada de decisões, tendem a não ser transparentes. Basta ver como se pode facilmente fundar uma ou varias ONGs e se candidatar a receber recursos públicos ou simplesmente acobertar negócios escusos.

Além da ambiguidade – para não dizer má fé - da definição de “não governamentais”. Essa posição antigovernamental se soma facilmente às posições neoliberais, não tem fronteiras em relação a “parcerias” com grandes empresas privadas e suas fundações, embora definam limites frontais contra o Estado.

Com a reaparição do liberalismo, ressurgiu com força sua visão da democracia e do Estado. A democracia viria da delimitação e do controle externo da ação do Estado, que seria, por definição, o inimigo central da democracia, que teria nos indivíduos, congregados na sociedade civil, seus elementos constitutivos.

Do que se trataria seria de controlar o Estado pela sociedade civil, para garantir a democracia. Quanto mais Estado, menos democracia, o que o neoliberalismo teorizou como Estado mínimo. Limitar o Estado, para que o mercado assuma a centralidade. Na teoria, esse papel seria o da sociedade civil, que mal recobre, na realidade, o mercado.

Essa concepção negativa do Estado abandona o caminho da democratização do Estado. É a concepção liberal, reatualizada pela ideia de controle do Estado pela sociedade civil – representada por ONGs e outras associações que pretendem assumir essa representação.

A política que mais avançou na construção da democracia no Brasil foi a do orçamento participativo, que fortaleceu a esfera pública no interior do próprio Estado, em detrimento dos interesses mercantis. A luta democrática não é externa ao Estado, mas o cruza. No Estado estão representados interesses distintos, até mesmo contraditórios, os mesmos que cruzam a sociedade.

A separação entre os dois, de caráter liberal, perde esse aspecto, fundamental, da realidade – toda ela cruzada pelas determinações sociais. A sociedade civil é uma ficção, assim como o Estado que se contrapõe a ela, todos sem determinações de classe.

Democratizar é desmercantilizar, é afirmar a esfera pública em detrimento da esfera mercantil. É fortalecer o papel dos cidadãos em detrimento dos consumidores. É levar a democratização para o próprio seio do Estado.

Máteria copiada: http://www.cartamaior.com.br/templates/postMostrar.cfm?blog_id=1&post_id=821

São Paulo - Danilo: “Nunca vi tanto prazer em espancar gente; é a segurança da impunidade”

por Conceição Lemes

Danilo Paiva Ramos tem 30 anos, é antropólogo, faz doutorado na USP, onde é pesquisador. Domingo, 5 de dezembro, ele foi à casa de amigos assistir ao jogo Corinthians vs Palmeiras. Na volta, acabou espancado na Paulista por um PM.

Muito indignado, fez um boletim de ocorrência no 78º Distrito Policial e um relato da arbitrariedade e da violência daquele fim de noite e mandou, por e-mail, para muita gente (Veja aqui). 

Ontem, terça-feira, 7 de dezembro, eu conversei com Danilo, entre a ida dele à Corregedoria e à Ouvidoria da Polícia Militar e o novo exame de corpo de delito, no Instituto Médico Legal. Ele deu mais detalhes do que aconteceu desde o instante em que desceu na estação Trianon-Masp, do metrô.  O que impressiona é a segurança da  impunidade por parte de autores e responsáveis.

Viomundo — Vocês estavam em quantos?

Danilo Ramos – Eu estava sozinho, voltando para casa! Desci no metrô Trianon-Masp e vi na calçada da Paulista um grupo tocando tambor, festejando o pentacampeonato, todos superpacíficos. Eu vestia a camiseta do Corinthians, parei para olhar.  Em questão de uns cinco minutos, já estávamos sendo espancados.

Eu não percebi que um grupo de policiais se formou atrás de mim. Quando vi, já estava apanhando.  Como eu estava um pouco distante do pessoal que batucava, fui um dos primeiros com que os policiais se defrontaram. Todos com cassetetes na mão, eles vieram “varrendo” a calçada da Paulista. Bateram primeiro na palma da mão, depois na barriga…É  pra não deixar marcas.

Viomundo — No seu relato, você diz que tentou conversar com o policial agressor, para saber por que estava apanhando. Depois, falou com um suposto sargento que estava no local. Gostaria que você repassasse esses momentos. 

Danilo  Ramos — Na verdade, eu demorei um pouco para entender o que estava acontecendo. m soldado me agrediu mais de uma vez. Fiquei muito indignado. Perguntei o nome dele, que não respondeu. Continuou me xingando, me ameaçando.

Perguntei então por que estava fazendo aquilo. Respondeu que as pessoas da Paulista precisavam dormir, descansar.  Depois, atrás dele, veio outro PM, com cassetete, berrando que iria me espancar de verdade.

Nessa hora, vi um senhor mais alto, com quem  algumas pessoas da multidão estavam indo conversar. Reparei pela identificação que era sargento e fui questioná-lo: “Eu estou sendo espancado por um soldado seu e preciso saber o nome dele”.

“Me aponta quem é esse soldado”, devolveu-me. Apontei, porque era fácil reconhecê-lo pelo aparelho que usava nos dentes. “Eu não conheço esse soldado”, respondeu. “Se você quiser uma identificação, anota aí a minha.” Estava escrito 3 sgt LUIZ.

As pessoas já estavam correndo e um rapaz veio me tirar dali: “Sai, sai, que eles vão te pegar mesmo!”

Fui saindo com o pessoal. Daí,  sozinho, desci a Pamplona e fui para a minha casa. No caminho, tirei a camiseta, pois havia um monte de viaturas circulando e fiquei com medo de que me seguissem e me espancassem mais severamente.

Cheguei em casa, atemorizado, tremendo, conversei com a minha esposa e fomos ao 78º DP, na rua Estados Unidos.

Na delegacia, assim que comuniquei ao delegado que iria fazer um boletim de ocorrência contra um soldado que tinha acabado de me espancar na Paulista, ele alterou a voz, começou a gritar, insinuando que eu tivesse feito alguma coisa com esse soldado: “Polícia não bate à toa, você deve ter feito alguma coisa, você deve ter provocado”.

“Eu não provoquei”, rebati. “Eu tratei o soldado por senhor o tempo todo, enquanto ele me xingava. Eu tratei também o sargento por senhor o tempo inteiro…”

E prossegui: “Os PMs xingam para provocar até a gente perder a razão. Justamente por isso eu tratei todos como senhor. E o pessoal do grupo também não estava xingando, estava superpacífico, não estava fazendo nada demais. Agora se esse é modo com que o senhor trata as vítimas na sua delegacia, eu vou procurar outra”.

Aí, o delegado [Marcelo da Silva Zompero] disse: “Espera que eu preciso pegar o seu nome”.
Diante da intimidação, reagi: “O senhor vai me passar o seu nome também, porque ele vai constar no outro BO”.

Ele parou: “Então vou registrar o BO aqui para você”.  Daí em diante, ele começou a me tratar como vítima, foi muito cortês, fez todos os procedimentos necessários.  Inclusive disse que eu deveria procurar a Corregedoria da Polícia Militar.

Do 78º DP, ligaram para alguns batalhões e não conseguiram identificar quem estava fazendo a operação na Paulista naquele horário.

Viomundo — A que horas foi isso?

Danilo  Ramos –  A agressão, por volta da meia noite. A ida à delegacia, em torno da meia noite e meia.

Na madrugada de domingo para segunda, eu fui ainda ao IML [Instituto Médico Legal], para fazer exame de corpo de delito. Eu estava com a mão inchada — ainda está um pouco — e com dores fortes no abdômen, que eu ainda estou sentindo.

Fui atendido por uma médica que fez um exame que durou menos de 1 minuto. Ela simplesmente olhou pra mim, preencheu um papel e mandou que eu entregasse o protocolo na delegacia.

Hoje pela manhã [ontem, 7 dezembro] fui à Corregedoria da PM. Lá fui bem tratado, eles fizeram uma primeira pesquisa para saber quem que poderia ser o sargento, mostraram algumas fotos para eu identificar…

O soldado que me agrediu eu consigo mais ou menos identificar, mas o sargento, não.

Aparentemente para essas ações da PM eles formam um grupo com soldados de batalhões diferentes…

Eu registrei queixa por abuso de autoridade. Mas eles me disseram que houve também outra contravenção, que foi a prevaricação do suposto sargento. Porque eu lhe comuniquei que um dos seus soldados tinha me espancado e ele ignorou, fez como se não fosse problema dele também.  Na Corregedoria, pediram outro exame no IML que vou fazer agora à tarde.

Viomundo — E na Ouvidoria da PM, como foi?

Danilo  Ramos -- Fui à Ouvidoria assim que saí da Corregedoria. Fiz uma solicitação para que acompanhassem o caso. Lá quem me atendeu foi o senhor Bira, que disse que a prática de os soldados trabalharem sem identificação está realmente muito comum e que isso foi usado recentemente na ação da PM na USP. Foi o senhor Bira, aliás, que acompanhou o caso da USP.

Ele chegou a dizer que, infelizmente, existe até uma conivência do governador com este tipo de ação. Há uma série de fatos que comprovam esse tipo de atitude da PM e que continua a ser praticada, pois eles têm a segurança de que não vai acontecer nada com eles.

Viomundo — O que mais te assustou nessa história?

Danilo Ramos — Eu tenho 30 anos. Participo do movimento estudantil, de passeatas, desde 2.000.  Trabalhei interior de São Paulo e no sul do Pará com o MST (Movimento dos Trabalhadores Sem Terra), trabalho na Amazônia numa região de fronteira, onde tem exército, trafico de drogas.

Eu nunca vi tanto prazer em espancar, parecia que eles estavam brincando enquanto espancavam a gente. À medida que eu e outras pessoas questionavam, eles xingavam mais, batiam mais.

Prazer mesmo, sadismo puro, com a segurança da impunidade.  Ninguém ali podia fazer qualquer coisa contra eles… Fiquei superchocado, não consigo dormir direito, tenho pesadelos durante a noite, é um terror absurdo.

Viomundo – E agora o que vai fazer? 

Danilo  Ramos — Fiz o texto, que vocês publicaram, estou tentando divulgar da maior forma possível. Eu quero identificar essas pessoas, eu quero que o soldado e o sargento sofram processo administrativo e criminal.

Por isso eu declarei na Corregedoria e te digo agora: eu quero uma resposta da PM, do governador, ou seja lá de quem for, sobre esse tipo de tática que os soldados estão utilizando.

Antigamente, você só ouvia falar de atrocidades da PM na periferia das grandes cidades, como São Paulo, no sul do Pará… Eles tiram os distintivos, espancam as pessoas, matam.

Agora, isso se tornou uma coisa rotineira. Se na avenida Paulista, com um monte de câmeras, eles fazem isso, é porque têm certeza de que nada vai lhes acontecer .

Pelo que a ouvidoria me explicou, todos os processos acabam arquivados. Portanto, de pronto, eu sei que isso não vai dar em nada. Agora, eu realmente faço questão de que o meu nome apareça, de que a minha instituição apareça. Se o Estado não der nenhuma segurança aos seus cidadãos, isso vai acontecer. De novo. E, de novo. E, de novo. É uma lógica muito perversa a gente  correr risco, porque o Estado garante a impunidade.






Leia também:
Antropólogo da USP é espancado por PM na avenida Paulista

Souto Maior: Depois da irracionalidade


Máteria copiada: http://www.viomundo.com.br/denuncias/danilo-ramos-nunca-vi-tanto-prazer-em-espancar-gente-e-a-seguranca-da-impunidade.html

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Presente de Natal do Serra: saiu o livro do Amaury!

Chegou o presente de Natal que a tucanada mais temia.

A CartaCapital que sai amanhã  traz na capa o livro  que há mais de um ano vem fazendo os mais ilustres tucanos roerem as bem tratadas unhas.

A Privataria Tucana, a reportagem de Amaury Ribeiro que se transformou, ela própria, em notícia, vai aos porões dos anos infames do Governo FHC, onde o patrimônio do povo brasileiro migrou para mãos privadas, deixando grossos pingos de sujeira que a nossa zelosa imprensa nunca quis ver.

Recebemos o livro hoje, por cortesia da Editora – a Geração Editorial -  e a noite será dedicada à leitura do texto, para comentar.

Por enquanto, fica a entrevista dada por Amaury à CartaCapital, reproduzida pelo Conversa Afiada, de Paulo Henrique Amorim.

CartaCapital: Por que você decidiu investigar o processo de privatização no governo Fernando Henrique Cardoso?
Amaury Ribeiro Jr.: Em 2000, quando eu era repórter de O Globo, tomei gosto pelo tema. Antes, minha área da atuação era a de reportagens sobre direitos humanos e crimes da ditadura militar. Mas, no início do século, começaram a estourar os escândalos a envolver Ricardo Sérgio de Oliveira (ex-tesoureiro de campanha do PSDB e ex-diretor do Banco do Brasil). Então, comecei a investigar essa coisa de lavagem de dinheiro. Nunca mais abandonei esse tema. Minha vida profissional passou a ser sinônimo disso.

CC: Quem lhe pediu para investigar o envolvimento de José Serra nesse esquema de lavagem de dinheiro?
ARJ: Quando comecei, não tinha esse foco. Em 2007, depois de ter sido baleado em Brasília, voltei a trabalhar em Belo Horizonte, como repórter do Estado de Minas. Então, me pediram para investigar como Serra estava colocando espiões para bisbilhotar Aécio Neves, que era o governador do estado. Era uma informação que vinha de cima, do governo de Minas. Hoje, sabemos que isso era feito por uma empresa (a Fence, contratada por Serra), conforme eu explico no livro, que traz documentação mostrando que foi usado dinheiro público para isso.

CC: Ficou surpreso com o resultado da investigação?
ARJ: A apuração demonstrou aquilo que todo mundo sempre soube que Serra fazia. Na verdade, são duas coisas que o PSDB sempre fez: investigação dos adversários e esquemas de contrainformação. Isso ficou bem evidenciado em muitas ocasiões, como no caso da Lunus (que derrubou a candidatura de Roseana Sarney, então do PFL, em 2002) e o núcleo de inteligência da Anvisa (montado por Serra no Ministério da Saúde), com os personagens de sempre, Marcelo Itagiba (ex-delegado da PF e ex-deputado federal tucano) à frente. Uma coisa que não está no livro é que esse mesmo pessoal trabalhou na campanha de Fernando Henrique Cardoso, em 1994, mas sob o comando de um jornalista de Brasília, Mino Pedrosa. Era uma turma que tinha também Dadá (Idalísio dos Santos, araponga da Aeronáutica) e Onézimo Souza (ex-delegado da PF).

CC: O que você foi fazer na campanha de Dilma Rousseff, em 2010?
ARJ: Um amigo, o jornalista Luiz Lanzetta, era o responsável pela assessoria de imprensa da campanha da Dilma. Ele me chamou porque estava preocupado com o vazamento geral de informações na casa onde se discutia a estratégia de campanha do PT, no Lago Sul de Brasília. Parecia claro que o pessoal do PSDB havia colocado gente para roubar informações. Mesmo em reuniões onde só estavam duas ou três pessoas, tudo aparecia na mídia no dia seguinte. Era uma situação totalmente complicada.

CC: Você foi chamado para acabar com os vazamentos?
ARJ: Eu fui chamado para dar uma orientação sobre o que fazer, intermediar um contrato com gente capaz de resolver o problema, o que acabou não acontecendo. Eu busquei ajuda com o Dadá, que me trouxe, em seguida, o ex-delegado Onézimo Souza. Não tinha nada de grampear ou investigar a vida de outros candidatos. Esse “núcleo de inteligência” que até Prêmio Esso deu nunca existiu, é uma mentira deliberada. Houve uma única reunião para se discutir o assunto, no restaurante Fritz (na Asa Sul de Brasília), mas logo depois eu percebi que tinha caído numa armadilha.

CC: Mas o que, exatamente, vocês pensavam em fazer com relação aos vazamentos?
ARJ: Havia dentro do grupo de Serra um agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) que tinha se desentendido com Marcelo Itagiba. O nome dele é Luiz Fernando Barcellos, conhecido na comunidade de informações como “agente Jardim”. A gente pensou em usá-lo como infiltrado, dentro do esquema de Serra, para chegar a quem, na campanha de Dilma, estava vazando informações. Mas essa ideia nunca foi posta em prática.

CC: Você é o responsável pela quebra de sigilo de tucanos e da filha de Serra, Verônica, na agência da Receita Federal de Mauá?
ARJ: Aquilo foi uma armação, pagaram para um despachante para me incriminar. Não conheço ninguém em Mauá, nunca estive lá. Aquilo faz parte do conhecido esquema de contrainformação, uma especialidade do PSDB.

CC: E por que o PSDB teria interesse em incriminá-lo?
ARJ: Ficou bem claro durante as eleições passadas que Serra tinha medo de esse meu livro vir à tona. Quando se descobriu o que eu tinha em mãos, uma fonte do PSDB veio me contar que Serra ficou atormentado, começou a tratar mal todo mundo, até jornalistas que o apoiavam. Entrou em pânico. Aí partiram para cima de mim, primeiro com a história de Eduardo Jorge Caldeira (vice-presidente do PSDB), depois, da filha do Serra, o que é uma piada, porque ela já estava incriminada, justamente por crime de quebra de sigilo. Eu acho, inclusive, que Eduardo Jorge estimulou essa coisa porque, no fundo, queria apavorar Serra. Ele nunca perdoou Serra por ter sido colocado de lado na campanha de 2010.

CC: Mas o fato é que José Serra conseguiu que sua matéria não fosse publicada no Estado de Minas.
ARJ: É verdade, a matéria não saiu. Ele ligou para o próprio Aécio para intervir no Estado de Minas e, de quebra, conseguiu um convite para ir à festa de 80 anos do jornal. Nenhuma novidade, porque todo mundo sabe que Serra tem mania de interferir em redações, que é um cara vingativo.

Matéria copiada: http://www.tijolaco.com/